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segunda-feira, dezembro 25, 2017
Os sinais silenciosos que antecedem um golpe em "The Handmaid's Tale"
segunda-feira, dezembro 25, 2017
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Para a
revista “New Yorker”, publicação dos leitores bem pensantes liberais dos EUA, a
série “Handmaid’s Tale” (2017-) é um “distópico conto feminista” da atual era
Trump. Mas enquadrar a produção da plataforma de streaming Hulu nesse clichê é
confirmar aquilo que a própria série alerta: ao qualificar os sinais do
conservadorismo apenas como excrescências religiosas de gente ignorante é mau
informada, reduzimos tudo a uma estranha normalidade, sem percebemos os sinais silenciosos cotidianos que antecedem os golpes políticos. Em “The Handmaid’s Tale” a
América foi dominada por um estado teocrático fundamentalista cristão. Um
desastre ambiental tornou a maioria das mulheres estéreis. As poucas mulheres
férteis foram subjugadas e transformadas em “servas”, reduzidas a aparelhos
reprodutores de uma elite dominante masculina. O Congresso, a Casa Branca e o
Supremo Tribunal foram massacrados e a Constituição foi substituída pela leitura
radical dos versículos da Bíblia.
domingo, dezembro 10, 2017
Curta da Semana: "Where Are They Now?" - uma cilada destruiu Roger e Jessica Rabbit
domingo, dezembro 10, 2017
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Onde estão os ícones da animação
dos anos 1980 como He-Man, Roger e Jéssica Rabbit (do filme "Uma Cilada Para Roger Rabbit"), o Esqueleto, Garfield, Popeye,
Mumm-Rá, muito tempo depois do auge? Como seria a realidade das suas vidas
atuais? O animador inglês Steve Cutts (conhecido por narrativas críticas sobre
a vida moderna) os imagina viciados, obesos, compulsivos, desempregados ou
subempregados em call-centers e caixas de supermercados. Esse é o argumento do
pequeno curta “Where Are They Now?” (2014): heróis que perderam a batalha final
contra inimigos mais poderosos do que vilões desse ou do outro mundo: o mundo
corporativo, o trabalho precarizado e o desemprego crônico. E terminaram
esquecidos porque acabaram ficando parecidos demais com os espectadores.
quinta-feira, novembro 30, 2017
O jogo da simulação de censura Globo/Gabriel Bá
quinta-feira, novembro 30, 2017
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Nas
redes sociais indignação. O desenhista Gabriel Bá apareceu no talk show da
Globo “Conversa com Bial” com seu indefectível boné verde – marca registrada do
artista. Só que dessa vez com a estrela vermelha coberta de forma improvisada
com duas fitas isolantes preta. “Evite números ou símbolos para que não haja
associação a marcas ou partidos políticos”, teriam dito os figurinistas nos
camarins. “Censura!”, gritaram internautas. Se foi mesmo censura, como pode a
Globo fazê-la de forma tão tosca e improvisada? O episódio apresenta algumas
dissonâncias que sugerem mais uma estratégia de manipulação. Mas dessa vez não mais no campo
semiótico da “dissimulação” – esconder, mentir, censurar. Mas agora no campo da
“simulação”: propositalmente tornar o evento visível (a suposta “censura”).
Para quê? Para a Globo tentar se livrar de mais um dos seus dilemas: depois de
anos de oposição política explícita explorando símbolos e números de forma até
subliminar, agora, candidamente, tenta demonstrar que possui uma linha
editorial “imparcial”. E o artista, assim como os indignados críticos,
participaram inconscientes desse blefe.
sábado, setembro 23, 2017
Resposta ao post "Sexo e Luto: Nietzsche, Wagner e as músicas mais tocadas nas rádios brasileiras", por Elvis Silva
sábado, setembro 23, 2017
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Publicamos o comentário do nosso leitor Elvis de Almeida
Silva sobre a recente postagem desse Cinegnose de 17/09/2017 “Sexo e Luto: Nietzsche,
Wagner e as músicas mais tocadas nas rádios brasileiras” como um artigo, pela
sua riqueza de informações e argumentos que ajudam a detalhar aspectos
polêmicos da postagem anterior. Principalmente a afirmação de Nietzsche de que
“Wagner é uma neurose” e sua implicações com o nazismo. Uma discussão
importante para entendermos como a moderna indústria do entretenimento consegue
absorver tudo aquilo que em dado momento na arte e na cultura foi vanguardista,
inovador e arrojado. Para depois ser padronizado e estereotipado.
domingo, junho 04, 2017
Doria Jr. é vanguarda de um experimento e São Paulo o laboratório
domingo, junho 04, 2017
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Subir numa
escavadeira para posar para as câmeras em demolições na Cracolândia, qualificar
como “bobagem” quando questionado sobre as ameaças de agressão física do
secretario André Sturm contra agentes culturais, o humilhante vídeo demitindo
uma secretária de governo análogo à estética visual dos vídeos do ISIS,
qualificar as ruas de São Paulo como “lixo humano” e pulverizar e despachar a
Virada Cultural para lugares distantes entre si. Arrogante? “João Noia?” O
gênio do prefeito João Doria Jr. é saber que foi eleito pela e para a mídia
corporativa e que “opinião pública” resume-se a câmera e teleprompter. Sabe que
nada deve ao respeitado público já que é uma experiência de vanguarda de um
projeto no qual São Paulo é o laboratório. Por isso, de forma atávica, repete
como farsa o roteiro do assalto nazifascista ao poder e guerra contra a
sociedade: começa pelo banimento da “arte degenerada”, passando pela
desautorização e humilhação das opiniões contrárias, terminando com a “Nova
Berlim” paulistana na Cracolândia e “sacar revólveres” quando ouve falar em
cultura.
sexta-feira, maio 12, 2017
Para quê serve a astrologia de massas?
sexta-feira, maio 12, 2017
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Na década de 1950 o alemão Theodor Adorno (pelo olhar sócio-psicanalítico) e o francês Roland Barthes (pelo ponto de vista da semiologia) empreenderam pesquisas sobre as colunas de astrologia, respectivamente do Los Angeles Time e do semanário Elle. Ambos chegaram à mesma reposta: a astrologia de massas serve para exorcizar o real. A astrologia deixa de ser uma abertura para o Oculto, o Onírico e o Imaginário para se transformar num espelho realista e disciplinador da própria rotina diária dos leitores. Será que essa resposta pode ser aplicada à astrologia de massas atual, mais de cinquenta anos depois dessas análises?
quinta-feira, maio 04, 2017
A morte de Belchior e a construção do estereótipo do "maluco beleza"
quinta-feira, maio 04, 2017
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Belchior foi um verdadeiro objeto voador não
identificado na MPB. Por décadas a mídia corporativa tentou enquadrá-lo em
alguma categoria: “rapaz romântico”, “brega”, “figura de voz fanhosa e bigodão”
etc. E nos últimos anos, procurou encaixá-lo na narrativa “desaparecido/aparecido” e, por
fim, na sua morte, transformá-lo no estereótipo do “maluco beleza”. Para quê?
Para enquadrá-lo na derradeira narrativa do modelo negativo moralizante: o
“maluco beleza” irresponsável que não conseguiu dar a “volta por cima” numa suposta
carreira que descia ladeira abaixo. Belchior sabia que a mídia fazia tábula
rasa da sua obra e, por isso, de forma autoconsciente virou um OVNI da MPB. A
forma como a grande mídia “reciclou” a morte de um ser inclassificável confirma
uma tese do pensador Theodor Adorno sobre a função do entretenimento na
Indústria Cultural: apertar ainda mais os arreios que nos prendem à disciplina
do mundo do trabalho.
terça-feira, fevereiro 14, 2017
A celebração da troca do desejável pelo possível em "La La Land"
terça-feira, fevereiro 14, 2017
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Por que “La La Land - Cantando Estações” é o
grande favorito ao Oscar? Porque está sintonizado com o espírito do tempo desse
início de século: nostálgico, vintage, metalinguístico e com um amargo
realismo. O filme capta a essência do gênero musical clássico, levando o clichê
de “quebra e retorno a ordem” (pessoas que dançam, cantam e sonham, mas que
depois voltam à realidade como se nada tivesse acontecido) ao limite. A nostalgia pela era de ouro de Hollywood
e do jazz são o consolo para um casal que vê seus sonhos desapontados. Misturando
alusões a filmes musicais clássicos, “La La Land” é uma fábula de como o amor
nos dá força para realizar o possível. Mas, ao mesmo tempo, pode entrar na
contabilização dos sacrifícios de termos perdido tudo aquilo que era desejável.
quarta-feira, fevereiro 01, 2017
Eike Batista: Efeito Heisenberg e lixo midiático reciclado
quarta-feira, fevereiro 01, 2017
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A política brasileira parece estar sendo
dirigida pelos misteriosos desígnios das “coincidências”. Os exemplos mais
recentes: a morte do ministro do STF Teori Zavascki no Triângulo das Bermudas da
política em Paraty e a prisão do pobre homem rico “foragido” Eike Batista,
repletos das sempre recorrentes “coincidências” e timings oportunos envolvendo
a onipresente TV Globo. Qualquer tentativa de explicar essas “coincidências”
(rapidamente definidas pela narrativa midiática como “fatalidades” das
“trapaças da sorte”) é logo rotulada como “teoria conspiratória”. Mas o show
midiático da “caça” ao “foragido” Eike Batista acrescenta alguns ingredientes a
mais: o chamado Efeito Heisenberg, no qual a mídia cobre um evento criado por
ela mesma; e o linchamento midiático: depois dos petistas agora são as
celebridades, subprodutos da própria mídia. Linchamento que combina
entretenimento e expiação da dor e introjeção da culpa pelo fracasso
profissional e pessoal de milhões de brasileiros no naufrágio da crise
econômica. Mesmo no seu fim, Eike Batista se tornou útil como um lixo midiático
reciclável no bode expiatório da vez.
domingo, agosto 21, 2016
Curta da Semana: "Third Reich" - Hitler não morreu para os "The Residents"
domingo, agosto 21, 2016
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A
banda mais estranha da história do rock faz um vídeo obscuro e surreal de um
dos discos mais enigmáticos dos anos 1970. Estamos falando da banda “The
Residents” e do disco “Third Reich N’Roll” de 1976. Ao comemorar o trigésimo
aniversário em 2001, “The Residents” lançaram o box com DVD e CD chamado “Icky
Flix”. Ao longo de décadas os membros da banda se mantiveram incógnitos, não
dão entrevistas e nos shows apresentam-se em estranhos disfarces. O vídeo-clip “Third
Reich” do DVD Icky Flix” é tão estranho quanto a banda. Se o pensador Theodor
Adorno estivesse vivo, certamente gostaria desse curta – Hitler e o
nazi-fascismo foram destruídos, mas seu “modus operandi” permaneceu na Indústria
Cultural.
segunda-feira, agosto 01, 2016
Curta da Semana: série "Bendito Machine" - relaxe, tudo está sob controle
segunda-feira, agosto 01, 2016
Wilson Roberto Vieira Ferreira
“Relaxe, tudo está sob controle” é o que sempre parecem nos dizer as
máquinas e as tecnologias. Por isso elas nos fascinam e nos gratificam a ponto
de se tornarem modernas religiões. É o que nos mostra a série com cinco curtas de
animação “Bendito Machine” (2006-2014). Produzida pelo estúdio espanhol
Zumbakamera, cada episódio apresenta máquinas que sempre parecem “defecar” pequenas
criaturas globulares com olhos que nos controlam por meio da oferta dos
prazeres da ambição e gula. Em tempos de apps virais como o Pokémon GO chegando
em terras brasileiras, assistir a essa série é obrigatório.
sexta-feira, julho 15, 2016
Autoajuda é negação psíquica em "The Invitation"
sexta-feira, julho 15, 2016
Wilson Roberto Vieira Ferreira
As
ricas mansões das colinas de Hollywood escondem estranhas seitas e comunidades
formada por celebridades, diretores e produtores da indústria do
entretenimento. Em uma dessas ricas casas um grupo de amigos que não se via há
dois anos é convidado para um jantar. Lá encontrarão os anfitriões: uma
ex-esposa e seu novo marido, entusiastas de uma nova seita que promete “um novo
recomeço”. Esse é o thriller psicológico “The Invitation” (2015) de Karyn
Kusama onde as seitas de autoajuda se revelam na verdade grandes mecanismos de
negação psíquica onde a linha que separa a sanidade da loucura começa a
desaparecer. Os convidados daquele jantar conhecerão da pior forma possível a
máxima freudiana: “o reprimido sempre retorna”.
sexta-feira, abril 08, 2016
Grande mídia resgata espécimes do Brasil Profundo
sexta-feira, abril 08, 2016
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Esqueça os folclóricos tipos urbanos produzidos pela recente onda do
neoconservadorismo político e cultural como, por exemplo, os coxinhas, coxinhas
2.0, simples descolados etc. Esses tipos ainda são de um “Brasil Renitente”. Com o baixo astral generalizado posto em prática pela grande mídia, a pesada
atmosfera psíquica nacional revela agora novos espécimes, dessa vez de um “Brasil
Profundo”: retrofascistas e protofascistas, tipos-ideais mais perigosos e
beligerantes: pequenos escroques, acadêmicos e intelectuais obscuros, músicos
que fizeram sucesso no passado e que foram esquecidos, ex-anônimos que
confundem militância profissional com fundamentalismo religioso e oportunistas
de toda sorte. Todos, ao mesmo tempo, parecem ter sido resgatados do ostracismo
e infernos pessoais graças à incansável atividade da grande mídia em produzir
novos personagens que sustentem suas pautas.
Depois desses tempos de neoconservadorismo político e cultural nos
brindar com uma rica fauna urbana composta por coxinhas, coxinhas 2.0, novos tradicionalistas,
simples descolados, “rinocerontes” etc. (sobre esses tipos urbanos clique aqui, aqui e aqui), a pesada atmosfera psíquica que
baixou no País, decorrente da polarização política e da intensa atividade do
contínuo midiático para gerar baixo astral, produziu o habitat perfeito para
novos e exóticos espécimes.
Eles vieram do Brasil Profundo! Vamos listar alguns desses exemplares:
Espécime 1 – Nome: Ju Isen. Modelo anônima, famosa por tirar a roupa em uma das manifestações
Anti-Dilma na Avenida Paulista em São Paulo, tentou repetir a dose como
destaque no desfile da Unidos do Peruche e foi expulsa do Sambódromo. Outras
modelos desconhecidas tentaram seguir o exemplo em outro protesto da mesma avenida
de São Paulo, seminuas e segurando cartazes anti-PT ostentando enormes óculos
de marca. Uma se excedeu ao ficar totalmente nua e foi levada presa pela
Polícia Militar.
Espécime 2 – Nome: Junior de França. Ajuda a organizar o acampamento de manifestantes pró-impeachment em
frente ao prédio da Fiesp em São Paulo. Às vezes se passa por jornalista,
outras vezes por ator, mas na verdade recruta homens e mulheres para participar
de feiras. É acusado de estelionato e de tentar fazer sexo com modelos, segundo
matérias na TV Record e no Portal R7 – clique aqui.
Espécime 3 – Nome: Douglas Kirchner. Transformado em personagem nacional atuando em parceria com a revista Época no vazamento de denúncias contra
Lula, o procurador do Ministério Público Federal Douglas Kirchner tem uma
controversa militância religiosa e uma conturbada vida amorosa. Fiel de uma
seita denunciada por explorar crianças e adolescentes, foi acusado de agredir
fisicamente a esposa e mantê-la em cárcere privado no interior de uma das
igrejas da seita. Ministra o seminário “Casamento Gay e Marxismo Cultural” onde
ataca a igualdade de sexos e defende que o feminismo é um “ideal agnóstico das
esquerdas” – sobre a história desse espécime clique aqui.
Espécime 4 – Nome: Janaina Paschoal. Assustando até os apoiadores do impeachment da
presidenta Dilma, numa performance resultante do cruzamento de Death Metal com o desempenho da atriz Linda Blair no filme O Exorcista, a professora de Direito Janaina
Paschoal fez um discurso em ato de apoio ao impeachment na Faculdade de Direito
do Largo do São Francisco em São Paulo. Transtornada e transfigurada fez
alusões ao poder de uma “cobra” que mantém o país no “cativeiro de almas e
mentes”. “Acabou a República da Cobra!”, gritava ensandecida em um discurso que
lembrava um bispo evangélico fora do controle.
“De onde vem essa gente?”
Como perguntou certa vez o Homem-Aranha, cansado depois de enfrentar o Monstro
de Areia e o Venon: “de onde vem toda essa gente?”.
Pequenos escroques, acadêmicos e intelectuais obscuros, músicos que
fizeram sucesso no passado e que foram esquecidos, ex-anônimos que confundem
militância profissional com fundamentalismo religioso e oportunistas de toda
sorte.
Todos de repente parecem ter sido resgatados, todos ao mesmo tempo, de
seus ostracismos, infernos e limbos pessoais para serem reciclados, ressignificados
pela grande mídia e se tornarem a esperança de um futuro melhor – ou uma “ponte
para o futuro”, bordão que subliminarmente vem repetindo a todo momento, em
alusão ao documento do PMDB divulgado como proposta para um futuro governo
pós-impeachment.
Em toda a crise política, talvez a melhor contribuição dada pela grande
mídia foi a de trazer à tona esses personagens do Brasil Profundo, pescados nas
águas turvas de uma conturbada psicologia de massas.
Uma verdadeira contribuição no campo da Etnografia e da Antropologia
Urbana: ressuscitar espécimes que estavam em estado latente, hibernos, apenas
esperando a atmosfera ideal para que voltassem a respirar em plenos pulmões.
Espécimes redivivos que agora podemos finalmente ter a oportunidade de
estuda-los in loco.
Brasil Renitente e Brasil Profundo
Por “Brasil Profundo” não estamos nos referindo a uma referência
geográfica como um “interior” ou “periferia”. Mas como o ponto mais profundo de
um inconsciente coletivo ou “sombra”, no sentido dado pela psicanálise
junguiana.
Muito mais profundo do que o imaginário da “Casa Grande e Senzala” de um
país ainda marcado pelos signos de distinção de classes (elevador social,
uniformes de empregadas domésticas etc.), marcas de uma antiga ordem escravocrata. Onde até mesmo um publicitário como Nizan Guanaes (Publicidade, símbolo de uma suposta modernidade brasileira) é capaz de revelar esses velhos estereótipos em sua coluna na Folha, reclamando sobre o fim das empregadas domésticas: “Preciso de uma Dona Flor, mas
que não precisa ter o corpo da Sônia Braga – precisa é cozinhar”, explicou. –
Folha, 16/11/2011.
Esse não é ainda o Brasil Profundo, é o Brasil Renitente.
Ego embrutecido
“Quem é duro consigo mesmo, também é com os demais”, dizia o sociólogo
Theodor Adorno na sua célebre fórmula do psiquismo do nazi-fascismo. Certamente
esta fórmula poderia ser aplicada nesse estudo dos espécimes do Brasil
Profundo.
Em comum, todos eles vieram do esquecimento e obscurantismo. São pessoas
apegadas aos valores da meritocracia e competição, o que mais torna essa
condição de anonimato em profunda frustração de um ideal de ego também atormentado
por um profundo ressentimento.
Ju Isen busca a oportunidade que lhe proporcione, pelo menos, a condição
de sub-celebridade; Kirchner, o típico concurseiro de editais públicos,
espécime que massacra o próprio psiquismo em busca da aprovação – após a
vitória, com o ego tão embrutecido e encouraçado, torna-se frio, indiferente em
diversos graus, como, por exemplo, no conservadorismo político e de costumes.
Janaina Paschoal, com seu ego igualmente embrutecido em um meio tão competitivo
e masculinizado como o campo do Direito; e Júnior de França, oportunista de
ocasião no mundo das sub-celebridades que vivem a fama como farsa.
Ressuscitados do seu estado de torpor pela eletricidade das mídias,
descobriram que tinham nas mãos uma hiper-tecnologia: redes sociais e dispositivos
móveis para poderem amplificar em tempo real seu ódio e ressentimento.
Retrofascismo
Como alertava o sociólogo canadense Arthur Kroker no final do século
passado, o futuro seria do “retrofascismo”: uma situação ambivalente de
hiper-tecnologia e primitivismo. Kroker dizia que “o fascismo é a revolta dos
derrotados”. A vida dirigida pelo ódio de si mesmo (o ressentimento pelo
ostracismo e obscurantismo) vingando-se através da destruição do outro - leia KROKER, Arthur. Data Trash, New York: Saint Martin's Press, 1994.
Como nos informa o prefixo “retro”, esses espécimes protofascistas são
nostálgicos de um passado de pureza onde supostamente haveria lei e ordem. Nos
nazifascistas do trágico passado, a pureza da raça em um Idade do Ouro; nos
retrofascistas, a ordem militar que nos mantinha seguros de feministas, gays e
comunistas - sobre o conceito de retrofascismo clique aqui.
Brasil Profundo e Neodesenvolvimentismo
Ao contrário do Brasil Renitente, o Brasil Profundo foi parido nessa
última década. A inclusão de milhões de brasileiros à sociedade através do
consumo (que o economicismo e neodesenvolvimentismo faziam o PT acreditar que
por si só geraria consciência política e de cidadania) na verdade produziu um
perverso efeito inverso: despolitização por meio da percepção de que qualquer
direito seria um oportunista substituto do mérito e do trabalho.
Estado policial e militarismo é a atmosfera ideal para esses espécimes
protofascistas – a oportunidade de destruir o outro mandando à favas todas as
formas de direitos e garantias sociais. Destruir todos esses preguiçosos
corruptos que vivem à sombra do Estado com bolsas famílias e créditos
educativos.
A ironia é que esses espécimes são perdedores na corrida meritocrática:
concurseiros que se mataram em concursos públicos para conseguirem estabilidade
dentro de um Estado tão odiado, pequenos escroques, oportunistas intelectuais e
acadêmicos condenados à própria mediocridade, além de roqueiros esquecidos pelo
mercado.
Ressuscitados por uma grande mídia ávida por novos personagens que deem
sustentação às suas pautas, sentem na nova atmosfera a chance de vingar no
outro a dureza com que tratam a si mesmos.
Fora de suas tocas onde se mantiveram hibernos, hoje esperam uma
tradução política para, mais uma vez na História, ocuparem o Estado.
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sexta-feira, março 18, 2016
De anti-Collor a anti-Dilma: 24 anos depois midiatização e neomoralismo
sexta-feira, março 18, 2016
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Depois de pouco mais de duas décadas o País está às voltas com
manifestações de apoio ao impeachment de um presidente da República. As
manifestações do último domingo na Avenida Paulista, em São Paulo, foram
consideradas “sem precedentes”, tanto em número de participantes quanto à
infraestrutura formada por trios elétricos, canhões de luzes, áreas VIP e todo
um aparato voltado para o “ethos” de um perfil sócio-econômico acostumado a
serviços e hábitos de consumo de alto nível. Pesquisas como a do Datafolha confirmaram
isso. É importante comparar por dentro, nas ruas, as manifestações anti-Collor
de 1992 e a atual anti-Dilma em aspectos como atmosfera, comportamento, marcas
geracionais, signos de consumo etc. Essa comparação pode revelar as profundas
mudanças na opinião pública brasileira – midiatização, neomoralismo e a
ascensão do “cinismo esclarecido”.
Vinte quatro anos depois surgem nas ruas do País manifestações de apoio
a um impeachment de um presidente da República. Esse humilde blogueiro tem
idade suficiente para ter vivido essas duas épocas: das manifestações marcadas
pelo protagonismo dos jovens chamados “caras-pintadas” em 1992 aos protestos
atuais cercado de toda uma parafernália de adereços e fantasias como patos
amarelos gigantes, bonecos infláveis “pixulecos” e Dilma presidiária chagando a
grupos vestidos de Batman e toda a sorte de super-heróis.
sábado, março 12, 2016
A vida é uma gigantesca piada cósmica no filme "Entertainment"
sábado, março 12, 2016
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Uma produção que está na lista dos dez filmes mais estranhos de 2015. Em "Entertainment" (2015) um comediante de “stand up comedy” chamado Neil Hamburger (o alterego do humorista Gregg Turkington) vive uma espécie de autoexílio em uma turnê de shows improváveis por hotéis, bares de beira de estrada e toda sorte de espeluncas em lugares perdidos em desertos na fronteira EUA-México. Um comediante sisudo, desajeitado e amargo que conta piadas enquanto toma copos de drinks no canudinho. A incauta plateia espera piadas que a faça rir das desgraças alheias para se sentirem melhor nas suas vidas tão cinzentas quanto o deserto. Mas tudo que Neil Hamburger lhes apresenta são piadas carregadas de raiva. E também a suspeita de que todos nós estamos metidos em alguma gigantesca piada cósmica.
segunda-feira, outubro 26, 2015
"MasterChef Júnior", a adultificação das crianças e o fim da vergonha
segunda-feira, outubro 26, 2015
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O episódio do assédio sexual através das redes sociais sofrido pela menina Valentina na primeira edição do reality televisivo “MasterChef Júnior” é a
ponta do iceberg de um movimento mais profundo e perigoso: o fim da vergonha
como a barreira que continha a sedução pela barbárie e a adultificação das
crianças pelas mídias. Sexismo, ódio, assédio sexual e intolerância que invadem
as redes sociais lembram as sombrias profecias de escritores libertinos do
século XVIII de que um dia as perversões privadas se tornariam virtudes
públicas. E as crianças, transformadas em mini-adultos em um programa de final
de noite onde correm contra o tempo segurando o choro, são o reforço
motivacional para os telespectadores acordarem no dia seguinte e repetirem as
mesmas situações na fábrica ou no escritório.
Os leitores devem
já conhecer a opinião desse Cinegnose
em relação ao reality show MasterChef da Band: é um bullying gastronômico – um
programa de final de noite com o objetivo de reforçar subliminarmente a
ideologia pela qual seremos regidos quando acordarmos no dia seguinte para
trabalhar: o princípio do desempenho.
Correr contra o
tempo em busca da eficácia, eficiência, produtividade, mérito e cumprimento de
metas sob as chibatadas de algum superior do tipo gerente, diretor, gestor etc.
MasterChef transforma isso em diversão ao nos deliciarmos em ver pessoas
angustiadas e esbaforidas correndo contra o relógio sob gritos e olhares
inquiridores de chefes de cozinha. Igual o que acontecerá com o telespectador
no dia seguinte na vida real na fábrica, escritório ou em outra empresa
qualquer.
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