terça-feira, dezembro 31, 2019

Descoberta do "entrevistado onipresente" deixa jornalismo corporativo de calças na mão


“Entrevistado cativo”, “cosplay de povo”, “popular onipresente”, “entrevistado profissional”... Ele virou um hit nas redes sociais enquanto a grande mídia foi pega com as calças nas mãos – ele é a carta na manga de repórteres e a revelação do modus operandi do jornalismo atual: a “editorialização dos acontecimentos”. A fabricação de acontecimentos e entrevistas para cumprir uma pauta pré-elaborada pelas chefias de redação. Ele chama-se Henrique, aparentemente um entrevistado aleatório, mas sempre pronto para dar a opinião sobre qualquer assunto em diversos noticiosos da Globo Nordeste e em outras emissoras locais. Um “papagaio de pirata” (categoria organizada que caça links ao vivo de TV na busca de alguns minutos de fama) promovido a especialista em generalidades que sempre acerta na mosca sobre aquilo que a pauta espera que o “povo” fale. Henrique Filho é apenas a ponta folclórica de um fenômeno mais amplo: a produção de não-acontecimentos no jornalismo. Quer seguir carreira no jornalismo? Aprenda a confirmar as pautas confiadas a você pelos aquários das redações. Aprenda a encontrar a “notícia certa”.

domingo, dezembro 29, 2019

A banalidade do tédio conjugal e da pós-morte na série "Forever"


Amor, casamento, rotina, tédio. Uma série sobre amor e a rotina da vida conjugal onde duas pessoas casadas e entediadas tentam não ser chatas uma com a outra. Até o momento em que essa tragédia banal se transforma numa questão cósmica entre a vida e o pós-morte. Essa é a série da Amazon “Forever” (2018-), uma estranha “quase-comédia” sobre pessoas absolutamente banais:  e se você decidisse transformar a sua vida em tudo aquilo que será, como você continuaria encontrando alegria na banalidade familiar, dia após dia, ano após ano? Será que até mesmo depois da morte? E se o inferno for mesmo a repetição, como fala Stephen King, onde até mesmo os segredos do pós-morte são tão banais quanto a rotina entediante dos vivos? 

sábado, dezembro 28, 2019

Ataque ao "Porta dos Fundos": canastrice, false flags e psi-zumbis


Sim... Nós também temos terroristas! Mas não importa se estão em vídeos mal produzidos ou dirigidos, falando um espanhol com sotaque carioca ou mesmo um português macarrônico, e soltando palavras-clichê como “burguês” ou “revolucionário” a cada cinco segundos. Dizem representar “Comandos” ou “Sociedades” cujos nomes fariam rolar de rir os integrantes do grupo de humor Monty Python. Bem-vindo ao mundo das false flags Tabajara, terroristas canastríssimos de segunda mão em vídeos toscos, como o da “Frente Integralista Brasileira” que reivindicou a autoria do ataque à produtora do Porta dos Fundos. O que é mais engraçado? O vídeo “terrorista” ou um esquete do Porta dos Fundos?  Clamam por uma ação da Justiça contra um “atentado terrorista”, cuja prova é uma “false flag” tosca e mal produzida. Então o que há de real e mais preocupante nesse não-acontecimento? Certamente o vídeo deve ter vindo das insondáveis profundezas da Deep Web. Mas não de Integralistas. Mas de “Incels” (Celibatários Involuntários), Hominis Sanctus ou de algum tipo de supremacismo branco e hetero ressentido – o farto exército industrial de reserva psi-zumbi pronto para servir ao primeiro cripto-comando de um Estado Policial que busca o pretexto para impor o “Patriot Act Tabajara”.

quinta-feira, dezembro 26, 2019

A sensibilidade cosmológica gnóstica do filme "Ad Astra - Rumo às Estrelas"


“... para a exploração de novos mundos, para pesquisar novas vidas, novas civilizações, audaciosamente indo onde nenhum homem jamais esteve”. Essa abertura da série clássica “Jornada nas Estrelas” (1966-69) mostrava como o gênero ficção científica sempre buscava um significado do homem no cosmos. Mas “Ad Astra – Rumo às Estrelas” (2019) é mais um filme que desconstrói essa premissa do sci-fi clássico: ao lado de “Prometheus” de Ridley Scott e, indo além para outros gêneros, como “Apocalypse Now” e “As Aventuras de Pi”, “Ad Astra” transforma a jornada do filho em busca do pai nos confins do sistema solar como a alegoria da própria busca humana por Deus. O peregrino cristão em busca da Cidade Celestial e a Jornada do Herói são os grandes arquétipos explorados pela narrativa, porém com a atual sensibilidade cosmológica gnóstica - uma jornada semelhante a uma espiral que nos conduz para dentro de nós mesmos, diante de um Universo vazio, hostil e sem propósito.

segunda-feira, dezembro 23, 2019

A invenção do não-acontecimento do Natal


Nessas épocas de festas de final de ano, não faltam as críticas de que tudo não passaria de manipulação de uma sociedade consumista. Presentes, comidas e bebidas nos entorpeceriam, fazendo-nos esquecer dos verdadeiros valores cristãos da fé, perdão e compaixão. Mas o dinheiro não arruinou o Natal: ele fez o Natal. Ao lado de outros megaeventos importados como Halloween e Black Friday, o Natal é mais uma tradição inventada a partir do século XIX nos EUA: primeiro, como invenção de um país jovem e carente de tradições e que, por isso, invejava a Europa com seus castelos e reis. E segundo, pelas lojas de departamentos a partir de 1841 – a invenção de uma narrativa mercadológica que criou, por exemplo, o embrulho natalino para sacralizar os presentes e criou o Papai Noel como figura secular de Cristo. Como o espírito natalino foi inventado, escondendo sua natureza de não-acontecimento? Isso é que o “Cinegnose” explica nessa véspera de Natal – jamais existiu o “verdadeiro Natal”.

sábado, dezembro 21, 2019

O pub inglês e o espírito do tempo no filme "Heróis de Ressaca"


“Heróis de Ressaca” (The Word’s End, 2013) é o filme final da chamada “Three Flavours Cornetto Trilogy” do diretor inglês Edgar Wright – iniciada com “Quase Todo Mundo Morto” (2003) e “Chumbo Grosso” (2007). Um filme profético por ter conseguido captar o chamado “espírito do tempo”: a onda cultural que mais tarde se cristalizaria na vitória da campanha do “Leave” – o Brexit que faria o Reino Unido afundar na crise política. Um bizarro e engraçado mix de sci-fi, comédia e ação, uma conspiração extraterrestre e o típico pub inglês e todo o seu “ethos” (beber, brigar e transar) como o símbolo de resistência de uma invasão. Em “Heróis de Ressaca” os britânicos sentem-se literalmente ilhados, resistindo a uma invasão globalista ou extraterrestre que quer tirar deles seu principal símbolo: o pub. Um grupo de jovens adultos retorna à cidade natal trinta anos depois para cumprir um desafio não realizado: finalizar a odisseia de um circuito composto de 12 pubs. Mas o que encontram é uma sinistra conspiração que coloca em xeque a própria humanidade. Filme sugerido pelo nosso leitor Dudu Guerreiro.

quarta-feira, dezembro 18, 2019

No décimo aniversário do Cinegnose, o Top 10 dos filmes gnósticos de 2019


Esse é um aniversário especial: o Cinegnose completa nesse mês uma década no ar! Foram dez anos de evolução em três fases bem distintas – primeiro, como um site sobre Gnosticismo (filmes e filosofia gnósticas); segundo, como um site Gnóstico (desenvolvendo um “olhar gnóstico” sobre cultura, mídia, cinema e audiovisual); e na fase atual, um olhar gnóstico mais amplo se estendendo para os aspectos políticos da comunicação e crítica midiática. Fase atual e controvertida cuja atmosfera de polarização no País atingiu em cheio o Cinegnose, com a perda de muitos leitores que questionaram a “politização” de um blog sobre cinema. Comemorando essa primeira década, o Cinegnose apresenta o Top 10 dos melhores filmes gnósticos que passaram pelo radar do blog em 2019. São filmes PsicoGnósticos, TecnoGnósticos, CosmoGnósticos e CronoGnósticos. 

segunda-feira, dezembro 16, 2019

Fabricando a "pirralha" Greta Thunberg: a engenharia social do consenso climático


Bolsonaro é o “Meu Malvado Favorito” da esquerda. Que, irritado, chama a ativista ambiental sueca de 16 anos, Greta Thunberg, de “pirralha”. Pronto! A esquerda adere acriticamente à ativista que de repente se tornou uma heroina por se tornar um desafeto do capitão da reserva. Esse é o gênio da atual guerra semiótica criptografada dentra da qual todas as oposições políticas estão como sob o encanto de um feitiço. Greta Thunberg é a atual peça “femográfica” chave da engenharia de opinião pública por trás do “Green New Deal”, a estrela do momento do maior experimento de mudança comportamental já realizado em escala global. A fabricação da narrativa da “garota solitária” indignada diante das mudanças climáticas é a superfície publicitária de um crucial momento do Capitalismo. Uma ação de engenharia social para criação de consenso sem - privatização da questão climática e o crescimento explosivo das ONGs que se transformaram numa indústria turística disfarçada de voluntariado para jovens privilegiados do Ocidente. E, principalmente, como as celebridades fetichizadas em uma sociedade de rápida erosão cultural se transformaram em um poderoso ativo do capitalismo e militarismo para a criação de soluções corporativas para o clima.

sábado, dezembro 14, 2019

Lula joga um balde de água fria na guerra da comunicação


“Acho que o PT não tem que fazer o jogo rasteiro que eles fazem. Contra a raiva deles, precisamos vender sorrisos...”. Dessa maneira, Lula jogou um balde de água fria nas pretensões de que a esquerda poderia pensar em uma virada na guerra da comunicação. A entrevista concedida ao blog “Nocaute”, do jornalista Fernando Moraes, foi sintomática por expor dois erros fundamentais em como a esquerda avalia a questão da Comunicação: (a) o poço de lama em que se transformaram as redes sociais seria intrínseco à militância digital – a única maneira de fazer politica digital seria por meio de baixarias, porque rende mais cliques e audiência do que a “verdade”; (b) o que ocorreu nas eleições de 2018 teria sido uma novidade tecnológica, cara e bancada ilegalmente. A questão é que não há nada de novo sob o Sol, a não ser a tecnologia digital que turbinou uma descoberta de 70 anos atrás nas pesquisas em Comunicação e que a esquerda insiste em ignorar: apesar de todo poder hegemônico, as mídias não têm o poder em massificar conteúdos – as informações somente circulam na sociedade quando líderes de opinião sancionam conteúdos em suas redes de influência social. Enquanto a esquerda continua na ilusão da massificação a direita domina o campo viral dos líderes de opinião, sejam eles analógicos ou digitais. 

quarta-feira, dezembro 11, 2019

O espelho humano sombrio do Vale do Silício no filme "Empathy, Inc."


Misture dois filmes gnósticos como “Quero Ser John Malkovich” (1999) com “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças (2004), numa atmosfera que lembra o episódio “Play Test” da série “Black Mirror” e filmado em preto e branco como fosse um clássico filme de mistério noir. Esse é “Empathy, Inc.” (2018), um típico produto do subgênero independente “alt sci-fi”: os temas da ficção científica são usados como pano de fundo para críticas sociais e existenciais. Um avanço extremo de Realidade Virtual de uma startup tecnológica leva um protagonista desesperado financeiramente a uma armadilha de aparências e perigos – uma “máquina de criar empatia” capaz de supostamente curar depressões e frustrações de clientes, mas que na verdade revela o que esconde: o capital financeiro especulativo de curto prazo que alimenta o Vale do Silício. E se nossos corpos forem apenas criações virtuais que nos aprisionam? Seríamos apenas fantoches em uma condição gnóstica de prisão tecnológica? Filme sugerido pelo nosso leitor Alexandre Von Keuken. 

domingo, dezembro 08, 2019

Série "The Morning Show" abre a caixa-preta de um telejornal

A série “The Morning Show” (2019-) é o carro-chefe da estreia do novo serviço de streaming da Apple TV + da gigante empresa de tecnologia. Tem tudo para ser tão impactante como foram outras séries como “House of Cards” ou “Breaking Bed” - trata de questões complicadas como má conduta sexual, misoginia descontrolada, mulheres em posição de poder e como o jornalismo atual está perdido num cenário geral de radicais transformações tecnológicas e midiáticas. E nesse cenário, como o chamado “infotenimento” aos poucos vai deixando de ser apenas um gênero para redefinir o próprio jornalismo: transformado em protagonista da informação, o jornalista torna-se ele próprio a notícia para entreter o telespectador sob a aparência da investigação e da busca da verdade. “The Morning Show” promete na primeira temporada abrir a caixa-preta dos bastidores de um telejornal.

quinta-feira, dezembro 05, 2019

Mídia não dá nomes aos bois em Paraisópolis e reforça amnésia social


Um fantasma ronda o País: a desconexão entre as palavras e as coisas. Aquilo que no começo desse século a coluna de humor de José Simão na “Folha” chamava de “tucanês” (inspirado na linguagem prolixa de Fernando Henrique Cardoso e do PSDB) se hipertrofiou como discurso jornalístico e da própria mediação da realidade em um arco de vai das corporações a ONGs: eufemismos, neologismo, discursos indiretos, etc. O resultado é uma espécie de “amnésia social” na qual são denegados os três traumas que fundam essa nação: a escravidão, o golpe militar que instaurou a República e a ditadura militar de 1964 a 1985. As mortes na comunidade de Paraisópolis, em São Paulo, pela ação repressiva policial em outro estigmatizado “pancadão”, são recorrências do retorno do reprimido do inconsciente coletivo nacional. Para a mídia não há extrema direita, ditadura e reprodução da desigualdade. Há “conservadores”, “governo polêmico” e “desafios” a serem superados por “boas práticas”. Sem dar nomes aos bois, a grande mídia e o País estão condenados a viver no ciclo vicioso de depressões e crises de euforia. 

domingo, dezembro 01, 2019

Curta da Semana: "Black Friday": como salvar-se do Marketing do Apocalipse?


Amélie é uma ex-funcionária de uma rede de varejo chamada New Price. Ela é assombrada pelas lembranças da última Black Friday, quando retorna à cena traumática. Esse é o curta-metragem canadense “Black Friday” (2018), inspirado na história de um funcionário da rede Wal-Mart que morreu pisoteado em 2008 na abertura das portas de uma loja na Black Friday. Do discurso motivacional do gerente da loja aos funcionários análogo a um culto religioso, à corrida selvagem de consumidores invadindo a loja como zumbis no filme “Amanhecer dos Mortos”, tudo nos conduz a uma estranha relação com as mercadorias no Capitalismo pós-crash de 1929 – a salvação do sistema de produção-consumo através de uma espécie de “Marketing do Apocalipse”: todo dia é o última dia para a Salvação. Há muito o consumo abandonou o valor de uso para se esgueirar pelo imaginário da moralidade e da religião. Se o consumo em si é moralmente bom, então temos que consumir sua inutilidade como forma de merecermos a aprovação “divina”. É sincrônico que a Black Friday ocorra no mesmo mês do histórico crash da Bolsa de Nova York e um dia após o feriado religioso de Ação de Graças.

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