domingo, novembro 25, 2012
O homem prisioneiro do tempo em "Matadouro 5"
domingo, novembro 25, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O filme “Matadouro 5” (Slaughterhouse Five, 1972) é um dos mais niilistas e desesperançados
filmes gnósticos: sem saída, o homem é prisioneiro no tempo e condenado por alienígenas a repeti-lo por toda a eternidade. O que torna o filme
“Matadouro 5” um clássico dos filmes com temática gnóstica é que ele inicia uma
crítica metafísica de fatos que tradicionalmente são abordados pelo viés da
crítica política ou social. No filme, a guerra não é mais enquadrada pela
crítica ideológica ou política, mas, agora, como mais um fato dentro de um
absurdo plano cósmico levado a cabo por demiurgos alienígenas.
sexta-feira, novembro 23, 2012
A máfia midiática elimina o Estado em "Generation P"
sexta-feira, novembro 23, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Che Guevara ensina
lições sobre o novo capitalismo e o marketing moderno em meio a viagens
lisérgicas e místicas de um protagonista que tenta se adaptar à Rússia
pós-comunismo. “Generation P” (2011) do russo Victor Ginzburg consegue fazer
uma adaptação de um livro considerado impossível de ser transposto ao cinema: “Babylon”
do escritor Viktor Pelevin. Ginzburg faz uma espécie de revisionismo da recente
história russa pós-comunismo sob o irônico título “Generation P” – o “P” de Pepsi-Cola
referindo-se àqueles que abraçaram o produto como o gosto oficial da nova
liberdade. Na verdade, Ginsburg mostra um verdadeiro circo onde misticismo e
religião se misturam com imagens midiáticas geradas com recursos digitais por
profissionais egressos do mundo da publicidade comandados por uma poderosa
máfia que, secretamente, controla o Estado e define os destinos da Rússia.
Em 1997 o Barry Levinson dirigiu
“Mera Coincidência” (Wag The Dog) onde um presidente norte-americano às
vésperas da reeleição envolve-se em um escândalo sexual na Casa Branca. O staff do presidente contrata um produtor
de Hollywood para criar uma fictícia guerra com a Albânia para, através de
recursos de marketing e edição digitais de vídeos, fazer a mídia morder a isca
e repercutir uma guerra fake que desvie a atenção da opinião pública do
escândalo sexual.
“Generation P” do russo Victor
Ginzburg é mais radical: e se o próprio Estado e todos os seus eventos
políticos (corrupção, atentados e guerras) forem fake? Isto é, e se os eventos políticos ou o próprio Estado não
passarem de imagens midiáticas geradas com recursos digitais por profissionais
egressos do mundo da publicidade comandados por uma poderosa máfia que,
secretamente, define os destinos da Rússia? Presidentes, políticos e ministros
nada mais seriam do que os próprios componentes dessa máfia que foram
escaneados e inseridos digitalmente nos noticiários, propaganda política e
eventos reais produzidos cinematograficamente. E tal escaneamento ocorreria
dentro de um ritual antigo babilônico a Ishtar, deusa do amor!
segunda-feira, novembro 19, 2012
A angústia da existência no filme "eXistenZ"
segunda-feira, novembro 19, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Se Basilides (um dos primeiros professores
gnósticos em Alexandria, Egito, no século II da Era Cristã) fizesse um filme,
certamente teria sido “eXinstenZ” (1999). Um filme onde o canadense David
Cronenberg leva a relação entre o homem e a tecnologia ao limite do niilismo, do
vazio e da angústia. Não tanto pelo fato das fronteiras entre real/virtual e
verdade/ilusão desaparecerem em um sofisticado jogo virtual. Mas pela forma
como um jogo transforma-se em fetiche erótico e religioso pelo marketing de uma
poderosa corporação, impedindo a transcendência espiritual: de que a própria
existência transforme-se em eXistenZ.
Basilides nutria uma radical desconfiança em relação à linguagem porque a verdade sobre Deus estaria além do
conhecimento humano: a linguagem não conseguiria apreender a
plenitude e o eterno porque nela o
homem torna-se obcecado em apreender as qualidades do devir nomeando-as através
de conceitos e palavras estáticas uma realidade que é difusa, fluída, relativa. Preso
nessa intransitividade entre os sistemas simbólicos e Deus, o homem se tornaria
prisioneiro dos próprios conceitos e palavras, não conseguindo ouvir, dentro de
si, a reminiscência do Uno, do Pleroma, da plenitude original que o uniria a
Deus.
Na
modernidade essa angústia gnóstica é secularizada principalmente pela Filosofia
existencialista, por exemplo, em Heidegger: o conceito de “Deus” é transformado
em “Ser” e a angústia humana está na impossibilidade de apreendê-lo em seu
sentido por meio de expressões ou enunciações. A impossibilidade da apreensão
ôntica do Ser joga o ser humano na existência: o “ser-aí”, “o ser-no-mundo” ou
o “ser-para-a-morte”.
“eXistenZ” de Cronenberg transpõe essa angústia tanto
gnóstica como existencialista para a discussão tecnológica: poderá o
desenvolvimento tecnológico em sua interface final (a biotecnologia onde corpos
e máquinas se integram por meio da informação) finalmente resolver essa
angústia de séculos de religião e filosofia? A virtualização tecnológica por
meio de jogos cada vez mais realistas baseados na interatividade e imersão dos
jogadores poderá traduzir a verdadeira natureza do Ser como jogo onde as ações
dos participantes é regida pelo princípio da aleatoriedade?
quinta-feira, novembro 15, 2012
O Mensalão e a agenda setting: a "Matrix" na prática
quinta-feira, novembro 15, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Muito discutida e ainda pouco compreendida, a essência do filme “Matrix”
(a hipótese da virtualidade do real) talvez já esteja presente no nosso
dia-a-dia mais do que imaginamos. A pesquisa “Agenda Setting e a Cobertura dos
Casos Mensalão e Cachoeira” feita por estudantes de jornalismo da Universidade
Anhembi Morumbi São Paulo como conclusão do curso “Estudos da Semiótica”
apresenta a constatação de que a mídia corporativa não tem mais o poder de
eleger presidentes ou forçar impeachments como no passado, mas ela é eficiente em estabelecer pautas e agendas
como a do atual julgamento do chamado “Mensalão”. Se a hipótese da agenda setting for correta, o que chamamos de “realidade”
poderia ser uma construção a partir de
percepções e cognições fornecidos por um ambiente midiático em que vivemos.
Virtuosismo tecnológico, capas
pretas, bullet time e todo o visual
ciberpunk marcaram as representações dos mundos virtuais em filmes como
“Matrix”: humanos enredados nos véus da ilusão criada por
computadores/demiurgos que nos escravizam. Mas descontando todo esse
sensacionalismo hollywoodiano em torno da hipótese da virtualidade do real,
podemos nos surpreender ao descobrir que a essência do tema de Matrix já está
presente em nosso dia-a-dia, tão diluído nos temas das nossas conversas e na
indústria de informação e entretenimento que nem nos damos conta: mais do que
uma figura retórica, já há muito tempo experimentamos a Matrix na prática!
Isso é
o que demonstra a pesquisa “Agenda Setting e a Cobertura dos Casos Mensalão e
Cachoeira”, trabalho de conclusão da disciplina Estudos da Semiótica da Escola
de Comunicação da Universidade Anhembi Morumbi – UAM/São Paulo (veja video abaixo). O grupo formado
pelos estudantes da graduação em Jornalismo Ana Carolina Cassiano, Cainã Ito,
Camila Albino, Gustavo Carratte e Renata Corona analisou as capas e primeiras
páginas dos principais veículos de imprensa de alcance nacional e chegou a uma
constatação empírica: até o início do segundo semestre o foco dos veículos como
jornais “O Globo”, “Folha de São Paulo”, “O Estado de São Paulo” e de revistas
como “Veja”, “Isto É” e “Época” “estava concentrado nas repercussões das
denúncias envolvendo o contraventor Carlinhos Cachoeira. O julgamento do
chamado Mensalão ainda era pouco comentado”.
segunda-feira, novembro 12, 2012
Os idosos nada têm a dizer na mídia
segunda-feira, novembro 12, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Quando o
envelhecimento e a morte deixam de ser simbolicamente incorporados na cultura
por meio de religiões e filosofias, o discurso midiático parece insistentemente
querer demonstrar que a velhice não existe, que é tudo uma questão de atitude
psicológica. Gerontologia, geriatria, engenharia genética e todo um aparato
tecno-científico é atualmente mobilizado para, associado à mídia, apresentar
sensacionais “lições de vida” e “superações”: idosos em praticas e comportamentos
análogos ao dos jovens criando não apenas uma aversão aos processos naturais de
envelhecimento mas, principalmente, a crise da função dos idosos como “elo
geracional”: a transmissão de sabedoria e conhecimento acumulados em uma
existência.
sábado, novembro 10, 2012
Sintoma e verdade nos zumbis
sábado, novembro 10, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Por que pessoas
fingem-se de mortos que se arrastam pelos centros urbanos do mundo, famintas
por cérebros e sangue dos vivos? Como interpretar um flash mob como o “Zombie Walk” onde centenas de
pessoas se transformam em realísticos zumbis, há onze anos espalhando-se por diversas
capitais do mundo? Desde as lendas afro-caribenhas de pessoas que retornam do
mundo dos mortos como assustadoras sombras de si mesmas até a recorrência dos
mortos vivos no cinema, o fascínio pelos zumbis já produziu uma razoável
bibliografia de pesquisadores que chegam a vê-los como um objeto de estudo
etnográfico. Mas é inegável que os mitos e lendas dos zumbis possuem uma dupla
dimensão: de um lado são sintomas de crises sociais e, do outro, possuem um
momento de verdade ao fazer nos lembrar da condição humana nesse mundo.
O flash mob “Zombie Walk” vem nos últimos anos ganhado cada
vez mais espaço na mídia e seus participantes aprimorando cada vez mais no
realismo das maquiagens e máscaras, trôpegos arrastando suas fantasias
lentamente através de centros urbanos pelo mundo. No evento surgido em 2001 na
Califórnia e que rapidamente se espalhou pelo mundo, vemos centenas de humanos
fingindo-se de mortos que apodrecem enquanto lançam olhares e gestos ameaçadores
para os desavisados, como se quisessem comer uns aos outros. Por que queremos
fazer tais coisas? Por que os zumbis ou mortos vivos acabaram se tornando uma
fantasia cinemática tão recorrente a ponto de produzir uma razoável
bibliografia de pesquisadores que chegam a tratá-los como objeto etnográfico?
Se olharmos atentamente a história da lenda dos zumbis, suas
origens e desenvolvimento até chegar no cinema e na mídia, perceberemos que ela
claramente apresenta duas dimensões: como sintoma social (conflitos de raça e
classes) e como arquétipo, isto é, como um simbolismo do inconsciente coletivo
que se filia ao imaginário dos autômatos, fantoches e bonecos como
representação da condição humana nesse planeta.
quinta-feira, novembro 08, 2012
O espelho global no safári africano do Tocantins
quinta-feira, novembro 08, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O projeto de um parque
temático milionário em pleno Tocantins (Out of África Brasil) promete trazer leões, rinocerontes,
antílopes, entre outros, das savanas africanas para um safári no cerrado brasileiro.
Definitivamente o Brasil se insere no imaginário da Globalização onde eventos,
geografias e culturas se desterritorializam para circular pelo mundo ao sabor
dos fluxos financeiros e midiáticos. Nesse imaginário os simulacros do “real” e
do “selvagem” parecem ter uma única função: tal qual uma transfusão de sangue,
injetar hiper-realidade em um real cujo sentido se enfraquece - o “selvagem” se
humaniza como um espelho da nossa própria desumanidade: o parque temático
selvagem torna-se mais “real” quanto mais é centrado no “show” da luta dos
predadores e presas como lição moral para a nossa “realidade”.
"Brasil e África se juntam depois de milhares de anos que uma
fissura nas placas tectônicas transformou o que hoje são dois continentes com
características tão semelhantes. Agora já podemos sentir o coração de África no
Tocantins." Essa é uma frase retirada do vídeo promocional de um projeto
de trazer para o meio do Tocantins um típico safári africano. No projeto orçado
em 350 milhões de dólares, em uma reserva de 100 mil hectares seriam colocados
mais de 400 indivíduos de espécies como leões, leopardos, elefantes e búfalos.
Em pleno cerrado brasileiro teríamos animais vivendo como nas savanas africanas
(clique aqui para ler a notícia).
É muito curiosa essa associação entre o deslocamento das placas
tectônicas que separaram os continentes por forças magnéticas do interior da
Terra e um investimento milionário que pretende reunir novamente África e
América do Sul através de um parque temático. Se no passado a deriva dos
continentes separou, agora a energia eletromagnética e espectral da indústria
do entretenimento vai unir.
Mas será que vai unir mesmo? Ou há uma semelhança irônica desses dois
fatos separados no tempo? Em outras palavras, e se no safári do Tocantins
estivermos experimentando o mesmo fenômeno de descolamento e desconexão do
passado? Continentes foram arrastados pelas forças internas do planeta; hoje
culturas e geografias são transformadas em signos pelas forças midiáticas e do
marketing para se deslocarem para pontos distantes das suas origens.
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