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quinta-feira, outubro 24, 2024

'Things Will Be Different': como esconder-se do destino do Tempo


Quantas vezes, em diversas situações, não falamos em “dar um tempo” ou “esperar a poeira baixar”. É como se tentássemos estancar a seta entrópica do tempo – o Tempo: a grande falha cósmica que condena toda a Criação ao fim, desordem e caos por meio do princípio termodinâmico da entropia. Mas também capaz de conspirar contra os nossos desejos e projetos pessoais. “Things Will Be Different” (2024) é um sci-fi ao mesmo tempo um thriller de ação, um quebra-cabeça e um drama de relacionamentos – um casal de irmãos rouba um banco e procura um lugar para se esconder até tudo se acalmar. Onde? Numa fenda aberta no tecido do tempo, um limbo atemporal entre passado, presente e futuro. Mas, como heróis prometeicos, terão que enfrentar não a polícia terrena, mas as autoridades do Tempo. 

quinta-feira, janeiro 11, 2024

Filme 'Intruso' e o amor na era da inteligência artificial


A premissa de “Intruso” (Foe, 2023) soa familiar, sobre a ideia de robôs e androides se tornarem tão reais que percamos as fronteiras entre simulação e realidade. Mas, lembre-se! Não estamos mais diante de replicantes sencientes e autônomos. Mas agora lidamos com inteligência artificial machine learning – algoritmos que “aprendem” conosco e não mais emulam, mas imitam. Num futuro em que o planeta está ambientalmente agonizante e a saída é o espaço sideral, um casal que mora em uma fazenda remota no Centro-oeste americano recebe a visita de um representante do governo convocando o marido para uma missão em uma colônia em outro planeta. Para dar continuidade ao casamento, no lugar ficará um clone com o qual a esposa nem perceberá a diferença. Para garantir isso, um pesquisador deverá passar um tempo com o casal para recolher o máximo de informações para que o clone seja o mais real possível. Em “Intruso” acompanhamos o que poderá ser o amor em tempos de inteligência artificial. 

segunda-feira, março 13, 2023

'Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo': Matrix na era quântica vence Oscar 2023


Passamos metade da nossa vida cometendo erros, e a outra metade tentando corrigi-los. O impacto da física quântica na cultura moderna foi estender ainda mais a angústia existencial: e se tivéssemos feito outras escolhas? Quais teriam sido minhas outras linhas do tempo? Viagens exponenciais no tempo e multiversos são os impactos na cultura pop de paradoxos quânticos como “o gato de Schrödinger” e a Interpretação dos Muitos Mundos de Hugh Everett. “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo” (2022) é uma rara visão cinemática que extrapola ao limite esses paradoxos, levando sete dos 11 prêmios que concorria no Oscar 2023: uma estressada sino-americana dona de uma lavanderia quase falida e com relações familiares em crise é arrastada para uma batalha cósmica em um anárquico redemoinho narrativo de multiversos - uma verdadeira Matrix da próxima era da computação quântica.

sábado, dezembro 10, 2022

Do demasiado humano ao AstroGnosticismo no filme 'Nr. 10'

O diretor holandês Alex van Warmerdam é conhecido por esse humilde blogueiro principalmente pelo filme “Borgman” (2013) sobre como uma família burguesa é capaz de se autodestruir pelo demasiado humano que nos habita. Mas, dessa vez, seu espírito desconstrutivista foi mais além: do demasiado humano para uma narrativa AstroGnóstica no filme “Nr. 10” (2021). Uma verdadeira montanha-russa, com guinadas secas no tom, como se quisesse brincar com o espectador: de uma simples comédia de erros, passando para um drama sobre pecados até dar uma guinada AstroGnóstica. “Nr. 10” começa no mundo profano do cotidiano (a rotina de trabalho, traições e mentiras numa companhia teatral) para convergir para o Sagrado: a busca de si mesmo pelas mãos de um estranho homem sussurrante que conduz o protagonista a um excêntrico Monsenhor que parece ter negócios muito além desse mundo.

sexta-feira, fevereiro 12, 2021

A solidão do Universo simulado no documentário 'A Glitch in the Matrix'



Muitos antes do filósofo Jean Baudrillard denunciar que o mundo estava dominado pela hiper-realidade dos simulacros, as irmãs Wachowski fazerem a “Trilogia Matrix” e o filósofo e matemático Nick Bostron lançar a suspeita de que o Universo poderia ser uma simulação (fazendo físicos e astrofísicos correrem atrás de provas), o lendário escritor Philip K. Dick defendia para uma audiência atônita, em 1977, que vivemos numa realidade programada por computador. Na verdade, apenas um dos diversos mundos simulados. Baseado na filmagem dessa palestra de PKD em Metz, França, o diretor Rodney Ascher (“Room 237”) lançou o documentário “A Glitch in the Matrix” (“Uma Falha na Matrix”, 2021) no qual entrevista cientistas, artistas digitais e pesquisadores. Ascher não quer tanto entender a lógica da teoria, mas entender o que leva as pessoas a acreditarem na hipótese da simulação: solipsismo? Solidão? Algum mal-estar espiritual entre o Céu e a Terra? 

domingo, fevereiro 10, 2019

O apocalipse foi a própria Criação em "Oblivion"

Se "Matrix" (1999) foi o auge hollywoodiano do gnosticismo pop, “Oblivion” (2013) é outro filme que consegue sintetizar o mito central dos gnósticos: o apocalipse já aconteceu, e foi a própria Criação: um erro cósmico no qual nos tornamos prisioneiros da ilusão e do esquecimento. Tom Cruise é Jack, um técnico de manutenção de drones e robôs cumprindo sua última missão na Terra: conduzir os recursos naturais remanescentes de um planeta devastado para uma lua de Saturno, último refúgio humano. Mas Jack aos poucos começa a questionar os propósitos da sua missão. Principalmente quando a mulher dos seus recorrentes flashs de memória aparece na queda de uma nave.

quarta-feira, novembro 01, 2017

As 10 revelações gnósticas na série "Philip K. Dick's Electric Dreams"


Philip K. Dick escreveu seus contos sob a sombra do macarthismo da Guerra Fria onde a lealdade e confiança eram as principais armas contra a traição e delação de um sistema totalitário. Mas para ele, esse sistema não era apenas político, mas cósmico – obra de um Deus demente, um Demiurgo Criador que nos aprisiona por meio da ilusão moral (culpa) e ontológica (o princípio de realidade). A nova série da rede britânica Channel 4 “Philip K. Dick’s Electric Dreams” (2017-) adapta esses contos de ficção científica que conduziram o escritor até a violenta epifania mística em 1974, na qual teve visões, sonhos e revelações místico-religiosas que o levaram ao gnosticismo cristão. Os 10 contos que compõem a primeira temporada da série apresentam não só a atmosfera do anticomunismo da Guerra Fria do momento em que foram escritos. Mas didaticamente nos mostra os 10 grandes princípios da Revelação Gnóstica que orientaram toda a obra do escritor. Por isso Philip K. Dick tornou-se visionário: cada vez mais a realidade atual se assemelha a um conto dele.

sábado, outubro 21, 2017

Replicantes, mulheres empoderadas e o Feminino Divino em "Blade Runner 2049"


Por que as mulheres são as personagens principais de “Blade Runner 2049”? Depois de os replicantes amarem a própria vida mais do que os humanos a si mesmos, descobrem que ser inteligentes, fortes e resistentes só os tornam ainda mais escravos dos humanos. Os replicantes Nexus 8 vão ao encontro daquilo que é essencialmente humano, embora esquecido por todos nós: amor, nascimento e alma. Fiel ao Gnosticismo de Philip K. Dick no livro que inspirou a saga “Blade Runner”, Denis Villeneuve e o roteirista Hampton Fancher constroem uma narrativa baseada na oposição central da Cosmologia Gnóstica: a diferença entre “Criar” e “Emanar”: a Wallace Corporation cria ou fabrica replicantes, enquanto os replicantes descobrem tudo aquilo que pode ser “emanado” – aquilo que não se cria, mas nasce: amor e alma. Esse é o centro do conflito de “Blade Runner 2049”, no qual o mito gnóstico do Feminino Divino (assim como em “Mother!” de Aronofsky) é fundamental. Mulheres empoderadas, tanto para o bem quanto para o mal. 

quinta-feira, março 16, 2017

"Radio Free Albemuth" politiza o Gnosticismo e vai além da ficção científica


Em um passado alternativo em 1985, Mark Chapman matou Mick Jagger ao invés de John Lennon e os EUA vivem sob o domínio de um Estado totalitário. Um grupo subversivo planeja incitar a revolução por meio de hits musicais com mensagens subliminares.  E o líder, produtor da gravadora, é inspirado por epifanias místicas enviadas pela VALIS (“Vasto Sistema Vivo de Inteligência Alienígena”) por meio de um satélite que secretamente orbita o planeta. Esse é o filme “Radio Free Albemuth” (2010), a melhor adaptação cinematográfica já feita de um livro do escritor gnóstico Philip K. Dick. Uma produção que conseguiu ir além dos cânones da ficção-científica (que sempre orientaram as adaptações hollywoodianas de K. Dick – robôs, aliens e planetas distantes), traduzindo para a tela as especulações filosóficas que sempre inspiraram o escritor: Gnosticismo, Cabala, Hermetismo e Budismo. Mas, principalmente, como K. Dick,  através da sua obra, conseguiu politizar o Gnosticismo através do tema da paranoia.

sábado, fevereiro 25, 2017

Uma jornada espiritual felina em "Virei um Gato"


Apesar de contar com dois vencedores do Oscar (Kevin Spacey e Christopher Walken) a comédia romântica familiar “Virei um Gato” (Nine Lives, 2016) foi destruída pela crítica: o que esses atores consagrados estão fazendo nessa catástrofe? Eles devem ter contas pesadas para pagar! Mas para o Cinegnose esse filme é um trunfo que confirma uma tese: desde que o Gnosticismo deixou de ser uma exclusividade de filmes cults e foi adotada pelos filmes populares a partir dos anos 1990, os elementos gnósticos deixaram de figurar apenas em sci-fis e dramas cerebrais, para também incursionar em comédias, thrillers e outros gêneros. Por trás de camadas de clichês de uma comédia popular, “Virei um Gato” nos conta a narrativa gnóstica de transformação íntima através da jornada espiritual no corpo de um gato e, principalmente, por um “salto de fé” ao mesmo tempo literal e simbólico, a exemplo de filmes gnósticos mais sérios como “Vidas em Jogo” (1997) e Vanilla Sky (2001).

segunda-feira, janeiro 30, 2017

I Ching, Cinema e mundos quânticos na série "The Man in The High Castle"


Qual a relação entre o milenar livro-oráculo "I Ching", o Cinema no século XX e a hipótese dos Múltiplos Mundos da Física Quântica? A busca dessas conexões é o desafio para o espectador que assiste à série da Amazon Studios “The Man In The High Castle” (2015 - ) livremente inspirado no livro do escritor sci-fi gnóstico Philip K. Dick de 1962. Um mundo invertido no qual os países do Eixo (Alemanha, Japão e Itália)  ganharam a Segunda Guerra Mundial e os EUA, destruídos pela Grande Depressão, foram conquistados pelo Reich e o Império do rei Hirohito. Porém, a posse de estranhos rolos de filmes de procedência misteriosa passa a ser politicamente importante tanto para Resistência como para Hitler: neles, outros mundos são revelados. Tal como no I Ching, devemos encontrar o imutável em mundos fugazes e em constante mutação. Mas pode tornar-se uma arma política: o controle do Tempo, passado e futuro de toda a humanidade.

terça-feira, agosto 09, 2016

Rebelião gnóstica e Hipótese Fox Mulder na série "Mr. Robot" - primeira temporada


A série de TV “Mr. Robot” (2015-) de San Esmail é vista pela crítica como um mix de “Matrix” com “Clube da Luta” onde a violência de socos e Kung Fu é substituída pela cultura do cyber-ativismo hacker. Mas a série vai mais além. Entra nos temas principais do gnosticismo sci-fi do escritor Philip K. Dick: paranoia, amnésia, esquizofrenia e identidade em um sistema onde a mentira é a base de toda a confiança: um sistema econômico onde débitos e dívidas se sustentam na crença de que, apesar de toda a virtualidade das transações financeiras, o dinheiro existe em algum lugar como base moral de todo o valor. E tudo pode ser destruído da noite para o dia por hackers que pretendem salvar o mundo através de linhas de programação. Como explicar essa mensagem de rebelião gnóstica em série de TV em uma grande rede dos EUA? Talvez a chamada “Hipótese Fox Mulder” explique.

domingo, janeiro 10, 2016

Chegamos ao futuro: nasceu Roy, o replicante de "Blade Runner"


“É com muita satisfação que comunico que o replicante Roy Batty, modelo Nexus 6 – MAA10816, entrou em funcionamento nessa sexta-feira, 8 de janeiro de 2016. Parabéns ao envolvidos!”. Esse é o texto que acompanhou um meme que circulou nas redes sociais lembrando que mais uma vez chegamos ao futuro – em 21/10 do ano passado estivemos também no futuro com “De Volta Para O Futuro 2”. Roy, o icônico replicante do filme "Blade Runner - O Caçador de Androides" (1982) de Ridley Scott, já nasceu e daqui a quatro anos terá uma violenta crise existencial ao descobrir que tem tão pouco tempo de vida. O que significa para nós essa estranha sensação de chegarmos ao futuro através de filmes como “2001”, “1984”, De Volta Para O Futuro” e “Blade Runner”? É o que o “Cinegnose” pretende descobrir.

Quando chegou o ano de 1984, foi irresistível não fazer comparações com o clássico livro de Orwell 1984:  o futuro mundo distópico projetado pelo escritor inglês em 1949 teria sido enfim realizado? O Estado Big Brother imaginado por Orwell aconteceu? Ele é comunista ou capitalista? A “novilíngua” já está presente nas mídias de massas?

terça-feira, outubro 08, 2013

A maldição do filme "Blade Runner - O Caçador de Andróides"



Clássico do cinema de ficção científica, “Blade Runner – O Caçador de Andróides” (1982) é marcado por coincidências significativas que muitos interpretam como uma “maldição”: as empresas que colocaram seus logos e produtos no filme tiveram ao longo da década problemas financeiros, queda de receita ou simplesmente faliram. Sabendo-se que o filme foi baseado no livro do escritor gnóstico Philip K. Dick e o título do filme retirado de livros dos autores undergrounds William Burroughs e Alan Nourse, propomos uma hipótese sincromística: poderia o filme “Blade Runner” ter se tornado um cavalo de Tróia que sob uma embalagem comercial inoculou em Hollywood uma egrégora gnóstica de contestação aos demiurgos corporativos?

Pesquisando o campo do Sincromisticismo e motivados pela nossa última postagem do blog sobre as estranhas coincidências nas últimas tragédias em Washington (vela links abaixo), resolvemos voltar nossa atenção para estranhas coincidências que podem ser encontradas no campo da produção cinematográfica. É uma área rica em sincronicidades ou “coincidências significativas”, talvez por trabalhar com tantos arquétipos, formas-pensamento e egrégoras do inconsciente coletivo da humanidade. Muitas vezes esses sincronismos são popularmente denominados como “maldições”.

Um dos mais conhecidos são as coincidências que envolvem o personagem do Coringa na série Batman, principalmente após a morte do ator Heath Ledger: a sombra do poderoso arquétipo teria feito mais uma vítima, suspeita que ficou ainda mais forte após a declaração do ator Jack Nicholson: “Eu o avisei!”. Nicholson já havia interpretado o sinistro personagem no “Batman” na versão de Tim Burton (1989) e parecia saber de algo mais.

terça-feira, agosto 21, 2012

Nova versão de "O Vingador do Futuro" neutraliza visões de Philip K. Dick

A versão atual de “O Vingador do Futuro” (Total Recall, 2012) à primeira vista parece ser mais fiel ao conto de Philip K. Dick ao adotar uma narrativa mais séria, grave e sombria do que o original de 1990 de Paul Verhoeven. Mero engano. Como é possível um filme hollywoodiano assumir a virulência de um escritor que denunciava conspirações cósmicas e pregava a revolta contra sistemas autoritários de controle em nome de ideais ocultistas e esotéricos? Por meio de sutis estratégias que neutralizam as visões radicais de K. Dick permitindo ao espectador voltar para a sua rotina como se nada tivesse acontecido depois que as luzes do cinema forem acesas.

Desde que o escritor norte-americano Philip K. Dick atendeu à campainha da sua casa em março de 1974 e surgiu uma menina de entrega de uma farmácia usando um delicado colar de onde pendia um peixe dourado, sua vida nunca mais foi a mesma. Se desde a década de 1950 K. Dick escrevia livros e contos sobre conspirações cósmicas, universos paralelos, amnésia, paranoia, estados ambivalentes entre a realidade e ilusão e revolta contra sistemas autoritários de controle, essa prosaica experiência de atender a uma entrega confirmou tudo o que imaginava: viu um raio cor de rosa sair do peixe (símbolo do Cristianismo primitivo) e atingi-lo na região do terceiro olho (sobre esse episódio da gnose do escritor veja links abaixo).

A partir daí, o tecido da realidade se esgarçou para K. Dick que passou a vislumbrá-la como um constructu a partir de memórias artificiais implantadas em cada um de nós: descobriu em uma espécie de epifania religiosa que seu verdadeiro eu estava em uma realidade alternativa, arquetípica, negada pela artificialidade dessa realidade.

O conto “We Can Remember it for You Wholesale” (“Recordações por Atacado”) publicado em 1966 é um dessas visões de K. Dick sobre a fragilidade da noção de realidade (como escreve no conto “um conjunto de reações bioquímicas do cérebro estimuladas por impulsos visuais”). Após o grande sucesso de “Blade Runner – O Caçado de Andróides” de 1982, baseado em um livro de K. Dick (Do Androids Dream of Eletric Sheeps?), Hollywood interessou-se pelos insights assumidamente gnósticos do escritor.

sábado, março 24, 2012

°°°°°°°°°A Paranoia Gnóstica de Philip K. Dick no Filme "O Homem Duplo"

Baseado no livro escrito por Philip K. Dick em 1977, o filme “O Homem Duplo” (A Scanner Darkly, 2006) foi profético, principalmente após as recentes notícias do projeto da CIA em fazer uma “Internet das coisas” a partir da tecnologia de “computação em nuvem”: o monitoramento total a partir dos objetos que utilizamos no dia-a-dia. “O Homem Duplo” narra uma sociedade devastada por uma droga sintética e monitorada integralmente por um “scanner holográfico” e apresenta a paranoia como a única possibilidade de encontrar a “centelha interior” em um mundo onde a tecnologia supera todos os pesadelos criados pela literatura ou pelo mundo onírico. 

 Desde 1982 com o filme “Blade Runner – O Caçador de Andróides” roteiristas e produtores de Hollywood passaram a ter um nítido interesse pela obra do escritor de sci fi assumidamente gnóstico Philip K. Dick. As diversas adaptações posteriores dos livros do autor (“O Vingador do Futuro”, “Minority Report”, “O Pagamento” etc.) sempre acabaram ressaltando os atributos heroicos dos protagonistas em tramas movimentadas para se conformar aos ditames de Hollywood. 

Em “O Homem Duplo”, adaptação do livro de 1977 “A Scanner Darkly”, encontramos o mesmo protagonista dividido, tema recorrente em sua obra – como era o próprio autor que tinha a vida marcada pela divisão esquizofrênica: a ambiguidade que as pessoas devem assumir em uma sociedade de vigilância total onde a paranoia diante de um inimigo invisível rege a vida de todos. 

Temos um filme focado não mais nas ações hollywoodianamente heroicas dos protagonistas, mas na paranoia de “losers” imersos em uma sociedade totalitária.

No caso do livro “A Scanner Darkly”, K. Dick foi profético ao mostrar uma sociedade monitorada integralmente por um “scanner holográfico” e ao apresentar a percepção paranoica como a única possibilidade de verdade em um mundo onde a tecnologia supera todos os pesadelos criados pela literatura ou pelo mundo onírico. 

segunda-feira, fevereiro 20, 2012

As Nuvens Atônitas: Temas Gnósticos no Cinema Popular

As sequências em "bullet time" do filme "Matrix" ("The Matrix", 1999) teriam se inspirado em trechos dos Evangelhos Apócrifos Gnósticos do início da Era Cristã? As narrativas do cinema hollywoodiano atual parecem se estruturar em dois mitos: o "monomito" da jornada do herói (Queda,Martírio, Morte e Ressurreição) e o "insight"  místico de que a realidade é uma ilusão.

Em minhas pesquisas iniciais sobre Cinema e Gnosticismo no Mestrado, o texto “The Clouds Astonished – Gnostic Themes in Popular Cinema” (As Nuvens Atônitas – Temas Gnósticos no Cinema Popular) foi um dos primeiros subsídios encontrados na Internet. O problema é que o texto parece ser apócrifo, apenas assinado por iniciais ou pseudônimo. Há tempos esse texto circula por fóruns de discussão sobre cinema, sem se saber exatamente a fonte.

A despeito da sua natureza não-científica, o texto oferece um interessante paralelismo entre as visões criadas em trechos dos evangelhos apócrifos gnósticos e sequências de filmes, como no filme “Matrix”: os efeitos em “bullet time” e o congelamento de ações e objetos enquanto a câmera gira comparado com a imagem descrita no Evangelho “Atos de João” que descreve o momento do nascimento de Cristo onde as “nuvens ficaram atônitas” e os “pássaros pararam” em pleno voo.

Além disso, o texto sugere uma estrutura mítica a partir da qual os filmes gnósticos são construídos: em primeiro lugar esses filmes partilhariam de um “monomito” comum a todos os filmes, a narrativa do “herói de mil faces” tal como descrita pelo historiador e mitólogo Joseph Campel (veja CAMPBEL, Joseph. “O Herói de Mil Faces”, Pensamento, 1995) – o drama da jornada de queda, martírio, morte e ressurreição do herói. Sobre essa narrativa comum o filme gnóstico construiria outra narrativa arquetípica: o súbito “insight” do herói de que a realidade seria uma ilusão.

O texto ainda lança uma hipótese para o súbito aparecimento de temas míticos gnósticos no cinema popular contemporâneo: esses filmes expressariam uma nova sensibilidade a partir do surgimento das interfaces virtuais e os efeitos com imagens geradas em computador: o crescimento dessas tecnologias no horizonte cultural que sugere uma noção plástica da realidade, como uma estrutura ilusória que poderia ser construída e manipulada.

Confira abaixo esse texto:

segunda-feira, janeiro 09, 2012

Gnosticismo é o "Jazz" das Religiões

Certa vez Louis Armstrong disse a um jornalista: "Cara, se você for perguntar o que é o Jazz, então nunca saberá". Algo semelhante ocorre com termos como "Gnosticismo" ou "Gnose" na história das religiões: devem ser mais experimentados do que compreendidos. Pelas suas próprias origens sincréticas (uma fusão de platonismo, neo-platonismo, estoicismo, budismo, antigas religiões semíticas e cristianismo), o Gnosticismo poderia ser facilmente comparado ao Jazz que, pelas suas origens, também foi resultante de intensas misturas e adaptações.

O que é Gnosticismo? Seja pelo ponto de vista histórico (conjunto de seitas sincréticas de religiões iniciatórias e escolas de conhecimento nos primeiros séculos da era cristã) ou pelo ponto de vista dos renascimentos na era moderna (grupos e, por analogia, a todos os movimentos que se baseiam no conhecimento secreto da “gnose”) são definições que podem levar à generalização e confusão.

Mesmo com a descoberta, em 1945, de textos gnósticos do século IV em Nag Hammadi (Egito), muitos concordam que o tema ainda continua com muitos pontos dúbios.

Hoeller e Conner preferem abordar o Gnosticismo como uma “atitude da mente” ou uma “predisposição ideológica” que surge em ambientes de grande agitação artística e cultural. “Se você é um artista sério, já é meio gnóstico”, afirma Conner. Nessas condições, o Gnosticismo está fadado a um novo renascimento.

Mas há um consenso: o Gnosticismo e seus derivados esotéricos nunca fizeram parte da cultura sancionada pelas instituições. Desde o triunfo do cristianismo ortodoxo após Constantino, a tradição gnóstica entrou para o subterrâneo dos movimentos sociais. Bem sucedido em seus canais subterrâneos, eventualmente ofereceu a pensadores revolucionários e artistas subsídios importantes para críticas aos sistemas opressivos políticos, sociais ou culturais.

É por esse caminho que Miguel Conner (escritor norte-americano de sci fi e editor/apresentador do programa radiofônico "Aeon Bytes Gnostic Radio" - programa de debates e entrevistas semanais sobre temas do Gnosticismo, literatura e cultura pop) vai focar o Gnosticismo ao compará-lo ao Jazz no campo musical. Impossível de ser definido, o Jazz escapa a qualquer descrição ou análise mecanicista. Para Conner, o Gnosticismo se enquadraria nessa mesma natureza. Pelas suas próprias origens sincréticas (uma fusão de platonismo, neo-platonismo, estoicismo, budismo, antigas religiões semíticas e cristianismo), o Gnosticismo poderia ser facilmente comparado ao Jazz que, pelas suas origens, também foi resultante de intensas misturas e adaptações.

quarta-feira, novembro 23, 2011

O Futuro como Profecia Auto-Realizadora no filme "O Pagamento"

Embora seja a pior adaptação no cinema de uma obra do escritor norte-americano de sci fi Phip K. Dick, o Pagamento (Paycheck, 2003) propõe a discussão de um interessante paradoxo temporal: a profecia auto-realizadora como tática de engenharia de opinião pública para que futuros alternativos sejam induzidos e manipulados. Mentiras ou boatos podem paradoxalmente se auto-realizarem como verdades. Isaac Assimov chamava isso de "Psicohistória".

Desde o filme “O Caçador de Andróides” (Blade Runner, 1982), Hollywood descobriu o escritor de ficção científica assumidamente gnóstico Philip K. Dick. A maioria das adaptações de seus contos ou livros completos obtiveram sucesso comercial ou crítico: “O Caçador de Andróides”, “O Vingador do Futuro”, “Screamers”, “Minority Report”, “Scanner Darkly” e o recente "Agentes do Destino". Porém, o filme “O Pagamento” foi certamente a pior das adaptações.

Logicamente, a culpa não foi de K. Dick mas dos produtores por convidarem John Woo, diretor que se notabilizou pela prioridade às cenas de ação em seus filmes (“A Outra Face” e “Missão Impossível 2”). Para quem está familiarizado com a obra e filmes baseados em Philip K. Dick facilmente reconhecemos em “O Pagamento” alguns dos seus temas mais caros: perda da memória e paradoxos temporais. Mas John Woo, ao adaptar a estória de ficção científica transformou-a, no final, em uma mera narrativa de ação.

Por isso, vamos resgatar nessa postagem o tema que acreditamos seja o principal na obra “Paycheck” e que foi pouco desenvolvido pela direção de John Woo: o paradoxo do tempo recursivo.

Primeiro vamos fazer uma breve sinopse: Michael Jennings (Ben Affleck) é um especialista em engenharia reversa: analisa o produto da empresa concorrente e desenha uma nova versão que excede as características originais. Ao finalizar esse trabalho, suas memórias correspondentes ao período de tempo em que trabalhou são apagadas com a ajuda técnica do seu amigo Shorty (Paul Giamatti) para proteger a propriedade intelectual de seus clientes.

James Hethrick (Aaron Eckhart), CEO da empresa Allcom, oferece um misterioso trabalho que envolve um projeto ultra-secreto da área de ótica, com uma duração de no mínimo três anos. Em troca do apagamento das memórias desse período, Hethrick oferece participação nas ações da empresa. Ele completa o trabalho e descobre que desistiu dos milhões de dólares em ações em troca de um enigmático envelope contendo uma série 20 diferentes objetos, aparentemente sem nenhum nexo: chave, um maço de cigarros, óculos de sol, uma bala de revólver.

Por que desistiu de uma fortuna em ações por um envelope contendo esses prosaicos objetos? Perplexo, Jennings se vê numa situação onde a Allcom tenta matá-lo, ao mesmo tempo em que agentes do FBI tentam capturá-lo por suspeita de um crime que não lembra ter cometido.

sábado, agosto 20, 2011

A Guinada Metafísica de Hollywood

Hollywood vem experimentando uma guinada metafísica nos últimos anos. Filmes como "Show de Truman", "Mera Coincidência", "O Quarto Poder", "Matrix", "Vanilla Sky" até o recente "A Origem", vêm apontado para uma tendência de auto-reflexão ao tomar a própria mídia e as novas tecnologias como tema, porém num sentido metafísico: e se considerarmos que a própria realidade está deixando de existir como tal? O que chamamos de realidade já teria se reduzido a uma fina interface gerada pela presença das mídias e tecnologias que a observam. Por que este tema do colapso das fronteiras entre essência e aparência, realidade e simulacro torna-se recorrente em Hollywood? 


Boris Groys (filósofo e crítico de arte alemão) acredita que o cinema mainstream hollywoodiano entrou numa fase metafísica, numa espécie de auto-reflexão. Ao contrário do cinema europeu que se preocupa com o tema do humano, demasiadamente humano, Hollywood vem recentemente tomando a própria mídia e as tecnologias de comunicação como foco. Groys salienta que esta auto-reflexão nada teria a ver com a perspectiva iluminista, isto é, a de procurar o trabalho sujo, a arte feia por trás da bela ilusão da realidade produzida tanto pelo dispositivo cinematográfico como pela sua narrativa.
“Para sabê-lo, muito mais úteis parecem ser a sociologia, a análise econômica, a análise de poder etc. Sem prejuízo do que todas essas veneráveis ciências são capazes, incorrem elas num erro fundamental. Não consideram a possibilidade de que a própria realidade, inclusive toda a sociologia, a ciência econômica etc., possa ser um filme mal produzido.”[1]
Para discutirmos os aspectos políticos ou ideológicos que permeiam o processo de representação ou esteticização da realidade no cinema temos as ciências como a Sociologia ou a Economia. Mas, e se considerarmos que a própria realidade, cercada por um ambiente altamente midiatizado pelas tecnologias de comunicação e informação, estaria se tornando, ela própria, um campo de eventos cada vez mais artificiais? 

Explicando melhor, e se a própria estrutura dos acontecimentos se tornasse cada vez mais moldada ou influenciada pela presença massiva dessas tecnologias ao ponto que os eventos progressivamente se esvaziassem em seu estatuto ontológico de fatos fechados em si mesmo, espontâneos, históricos?

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