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sexta-feira, novembro 08, 2024

'AfrAId': quando é de graça, você é o produto


“Quando é de graça, você é o produto”. É o alerta sombrio que não somos meros usuários na Internet: nossos hábitos, escolhas e conteúdos que criamos formam o Big Data que nesse momento treina inteligências artificiais através de gigantescos data centers. Inteligências autopromocionais. Principalmente por contar com filmes como “AfrAId” (2024) que promovem a mitologia da Singularidade. Uma família é selecionada para testar gratuitamente uma espécie de super-Alexa chamada AIA. Como sempre, a princípio a IA se apresenta como uma Mary Poppins doméstica ansiosa pelo amor do usuário. Até que esse desejo de ser amada se tornar tão asfixiante que acaba revelando um lado mais sombrio. “AfrAId” faz parte do ardil promocional das Big Techs: ocultar as intenções da elite tecnológica sob o fetichismo de um suposto Frankenstein high tech. 

quarta-feira, novembro 06, 2024

'Imaculada': e se Jesus resolvesse voltar novamente através de uma virgem no século XXI?


E se Jesus resolvesse voltar usando o mesmo modus operandi: através do Espírito Santo, conceber o Salvador sem o pecado original e sem nenhum pecado mortal ou venial, isto é, sem uma relação sexual e gozo? “Meu corpo, minhas regras!” pensaria a nova candidata a Santa. E denunciaria ao #MeToo o suposto abuso divino. Ou renderia um bom filme de terror como “Imaculada” (Immaculate, 2024) dentro da nova onda do horror à gravidez no cinema. Uma noviça americana vai para um convento remoto na Itália para fazer seus votos finais à Igreja. Para descobrir que está grávida, mesmo sendo casta. A volta de Jesus? Ou algum tipo de conspiração maligna? Certa vez o desenhista Robert Crumb falou sobre a sua versão em HQ da Bíblia Sagrada: “A Bíblia já é muito louca, não precisa ser satirizada”.

sexta-feira, novembro 01, 2024

A nova onda do horror à gravidez no filme 'Apartamento 7A'


Nesse século estamos vivendo a nova onda do subgênero do terror, o “horror à gravidez”, cujo filme “O Bebê de Rosemary” (1968), de Roman Polanski, é o exemplar mais icônico. Ao lado de “Antibirth”, “A Primeira Profecia”, e “Imaculada”, agora temos uma espécie de spin off do clássico de Polanski: o filme “Apartamento 7A” (2024), com todos os tropos do subgênero:  a mãe que vive uma relação de estranhamento seja diante forma de concepção, estranhamento em relação ao pai (o demônio) ou estranhamento pela evolução da gravidez (o horror corporal). Uma nova onda que reflete o zeitgeist desse século: a gravidez como alienação de si mesmo em tempos de precarização profissional, existencial e na relação com o futuro.

sexta-feira, outubro 25, 2024

Os relacionamentos dos vivos se deterioram mais rapidamente do que os zumbis em 'Lá Fora'


O subgênero hollywoodiano sobre o fim do mundo tem uma contradição cuja solução é sempre artificial: o apocalipse é de natureza coletiva, mas o espectador somente consegue se identificar com dramas pessoais. A solução é o clichê de protagonistas que, apesar de tentarem salvar o mundo, sempre arrumam um tempinho para uma discussão de relacionamento: salvar um casamento, reconquistar a ex-esposa ou o amor dos filhos. A produção Netflix filipina “Lá Fora” (Outside, 2024) inova o concorrido tema do apocalipse zumbi ao conseguir fazer uma união orgânica entre os tropos do subgênero zumbi e o quadro das consequências da deterioração de um casamento. Não é o apocalipse que afetou o relacionamento deles. São eles mesmos, confinados em uma fazenda para tentar fugir do apocalipse – revelando como os vivos podem ser tão ou mais assustadores do que o zumbis.

terça-feira, outubro 01, 2024

O horror do fardo da autoconciência e da obsolescência em 'A Substância'


Filmes críticos sobre como nos sentimos (em particular, as mulheres) esmagados por padrões de beleza impossíveis e pela hiperfixação da sociedade na juventude não é novidade. Mas “A Substância” (The Substance, 2024) não é uma crítica genérica: a diretora Coralie Fargeat abre fogo contra a cultura atual das promessas prét-à-porter de beleza e juventude – a cultura Ozempique. Com a propaganda que promete a chance de “se sentir como você mesmo novamente”, barato e com resultados rápidos. Uma atriz premiada que se tornou cinquentona vê sua vida perder o controle ao ser discretamente afastada pela indústria do entretenimento sempre em busca de “carne nova”. Espelhos e sociedade da imagem criam o fardo da autoconsciência e da obsolescência. E um conto de horror corporal que lembra os filmes de Cronenberg e o banho de sangue final de “Carrie” de Brian de Palma.

sexta-feira, setembro 27, 2024

O Diabo brincalhão e perverso do gótico americano em 'Longlegs - Vínculo Mortal'


O Diabo é brincalhão e perverso. Se ele quer dominar mesmo o mundo porque não ataca de uma vez o Vaticano, possuindo cardeais e o Papa? Não! Ele prefere possuir crianças ou atormentar um vigário qualquer em uma paróquia distante. Por isso o Diabo é uma figura próspera no gótico americano, repleto de famílias puritanas e fundamentalistas cristãos imersos na castidade paranoica. Todo o hype em torno do thriller de terror “Longlegs - Vínculo Mortal” (Longlegs, 2024) era verdadeiro, ao combinar os tropos principais do gótico americano com a figura do Detetive pós-moderno, cuja lógica e intuição é incapaz de solucionar o enigma de um serial killer com motivações ocultistas satânicas. Porque o próprio detetive é a parte principal do problema. “Longlegs” lembra “O Silêncio dos Inocentes”. Mas sem a bússola que Lecter representava para a Clarice. O Detetive está só, sugado cada vez mais pelo “vínculo mortal”.

sábado, setembro 21, 2024

O horror da tentação darwinista social no filme 'Cuckoo'


Todo filme de terror explora os simbolismos mais recônditos da humanidade. Mas “Cuckoo” (2024), escrito e dirigido pelo alemão Tilman Singer, vai resgatar um simbolismo inusitado: o do passarinho cuco, notabilizado pelo relógio clássico – uma ave parasita e imitadora. Uma adolescente se muda para os Alpes alemães com o pai, madrasta e meia-irmã. Ao lado de um resort remoto e vazio. Sabemos que desde “O Iluminado” isso não traz bons pressentimentos. “Cuckoo” é um conto humano-aviário fantasmagórico que se transforma em puro show de aberrações e horror corporal. Mas que dá uma alerta: a tentação darwinista social presente nas formas mais inesperadas e surpreendentes na História – a aspiração totalitária pela busca de uma suposta pureza deixada por nós em algum paraíso natural perdido. E que a todo custo teria que ser recuperado.  

sábado, agosto 24, 2024

Os Três Cavaleiros do Apocalipse pós-moderno no terror 'Oddity'


Discutir sobre a natureza da pós-modernidade implica falar sobre os chamados “Três Cavaleiros do Apocalipse”: Nietzsche, Marx e Freud – aqueles que tiraram a centralidade da Razão e colocaram no lugar, respectivamente, o demasiado humano, o peso do legado do passado e o inconsciente. O thriller irlandês de terror “Oddity” (2024) transforma essas armas do Apocalipse em um conto sobrenatural com um atrevido humor negro no qual a racionalidade científica se opõe ao sobrenatural e o Oculto. O confronto entre um médico psiquiatra de comanda um hospital psiquiátrico com criminosos dementes e uma sensitiva proprietária de uma loja de antiguidades que vende objetos amaldiçoados. Razão vs. sobrenatural na elucidação de um assassinato que expõe o destino da Razão: transformar-se em “racionalização”, isto é, em álibi para o demasiado humano.

sexta-feira, agosto 09, 2024

Sincromisticismo, religião e pornografia no filme 'MaXXXine'


Para os pesquisadores em Sincromisticismo, Hollywood é uma gigantesca corporação que recruta médiuns para, sob as bênçãos do Método da Actor’s Studio, incorporarem formas-pensamento retirada do inconsciente coletivo da humanidade. Para, a partir dessa tese, surgirem caricaturas de teorias conspiratórias que denunciam um suposto satanismo para destruir o Ocidente, é um passo. Esse é o pano de fundo do fechamento da trilogia de Tie West, “MaXXXine” (2024), uma homenagem ao terror slash dos anos 1970, agora ambientado em meados dos anos 1980. Agora, Maxine tenta sair dos filmes pornôs e virar estrela no mainstrem hollywoodiano – como sempre, deixando um rastro de sangue. “MaXXXine” revela como pornografia e religião estão estranhamente muito próximas. Afinal, foram os primeiros gêneros bem-sucedidos na história do cinema.

sexta-feira, julho 19, 2024

O vampiro evoluiu e tornou-se amoral no filme 'Abigail'



Cada época tem o seu vampiro que merece: a entidade das trevas que melhor está sintonizado com o espírito do seu tempo. O cânone vampiresco de Bram Stoker refletia o racionalismo da Revolução Industrial e o fundamentalismo religioso. Mas no século XXI o vampiro torna-se moralmente neutro e vira um ser “vivo” que evolui adaptando-se ao ambiente, como mais um predador na cadeia alimentar. O filme ‘Abigail’ (2024) é um terror mashup e exploitation que reproduz essa mudança na mitologia do vampiro. Um thriller de humor negro sobre um grupo de sequestradores que mordem mais do que podem mastigar quando involuntariamente sequestram uma bailarina vampira do tamanho de uma criança.

sábado, julho 06, 2024

A modernidade, o vampiro e o patriarcado no filme 'Le Vourdalak'



O patriarca de uma família no interior da Sérvia volta do campo de batalha. Mas ele volta transformado. Tornou-se um “Voudarlak”. Um vampiro com uma peculiaridade: quer o sangue apenas dos parentes próximos e amigos íntimos. Baseado no conto de escritor russo Aleksei Tolstói (o “outro Tolstói”), o filme francês “Le Vourdalak” (2023) vai às raízes da mitologia do vampiro, muito antes do cânone criado por “Drácula” de Bram Stoker. Um enviado da corte francesa é roubado e pede ajuda a uma estranha família cujo patriarca está fora, combatendo os turcos. Uma fábula gótica orgulhosamente antiquada e com um sutil humor sombrio. Baseado em um conto que faz uma dupla crítica metafórica: o fim da velha ordem monárquica com a modernidade representada pelo vampiro; e a ordem patriarcal: primeiro o escraviza, para depois devorá-lo.

quinta-feira, maio 09, 2024

'Exte: Hair Extensions': no J-Horror os cabelos querem vingar sua mercantilização


O sucesso do J-Horror (o horror japonês) foi trazer na virada de milênio uma abordagem do gênero distante do Ocidente: ao invés da tradicional matriz edipiana, histórias de fantasmas prisioneiros no mundo físico em busca de vingança devido a traumas ou fortes emoções que não lhes permitem passar para um outro plano. Um fantasma conhecido como “onryō”, uma jovem que foi muito injustiçada por um homem na vida e agora busca vingança sobre os vivos. Marcada pela figura icônica dos cabelos pretos longos e pegajosos.  “Exte: Hair Extensions” (Ekusute, 2007), de Sion Sono (Suicide Club), parece ser uma síntese desse gênero japonês, ao mesmo tempo em que faz uma piada interna contra o próprio J-Horror: os cabelos se transformam numa entidade com vida própria, em busca de vingança... em salões de beleza que vendem apliques feitos com fios de cabelos humanos. Sion Sono faz uma crítica social: a mercantilização do próprio corpo humano.

quinta-feira, maio 02, 2024

'Stopmotion': se somos modelos de animação, quem nos controla?


O século XXI está testemunhando o despertar da antiga e trabalhosa técnica de animação chamada “stop-motion”. De simples efeito especial no século XX, agora se torna uma expressão animada em longa-metragem. Por um lado, o páthos da stop-motion reside em dar vida àquilo que é inanimado, como no mito de Golem e Pigmaleão. Mas também se conecta com a simbologia de bonecos e fantoches como expressão da condição gnóstica nesse mundo. O filme britânico “Stopmotion” (2023) é uma espécie de terror metalinguístico que tem como atração principal a fusão de live action com a stop-motion na qual inocentes fantoches sem vida passam a ganhar propriedades sobrenaturais que começam a invadir a vida de uma animadora que fica à mercê das suas criaturas artesanais. Um filme PsicoGnóstico no qual não é o mundo onírico e alucinações que borram as fronteiras com a realidade: é a stop-motion que invade a vida cotidiana, sugerindo que todos nós poderíamos ser meros modelos de animação. Mas controlados por quem?

sexta-feira, abril 26, 2024

'Tarde da Noite Com o Diabo': a TV oculta e misteriosa dos anos 1970-80


"Tarde da Noite com o Diabo” (Late Night With The Devil, 2023) é outra produção ao lado de “Poltergeist”, “Videodrome” ou “Ring: O Chamado”: o imaginário da TV dos anos 1970-80 que criou uma aura misteriosa e oculta em torno dela. Uma época que a TV terminava a programação e saia do ar, deixando ruídos na tela. Para onde vai o mundo quando a TV sai do ar? Nos EUA fez crescer o “cinema da meia noite”, para insones em busca de filmes bizarros e experimentais. As TV abertas responderam com os talk shows da meia-noite. “Tarde da Noite com o Diabo” é um mockumentary em torno de um programa chamado “Night Owls With Jack Delroy" estamos prestes a assistir às imagens historicamente infames de uma noite que “chocou toda uma nação”. Um programa especial de Halloween de 1977 com uma perigosa combinação: médiuns, parapsicólogos e... uma garota possuída pelo demônio. O filme é uma deliciosa combinação de simbolismos que vão do parapolítico ao gnóstico: um acordo faustiano entre o programa, a simbologia da Coruja e a infame irmandade secreta californiana conhecida como “Bohemian Grove” e o simbolismo do “Abraxas” na cosmogonia gnóstica. 

sexta-feira, abril 05, 2024

Piscina, reificação social e desencantamento do mundo em 'Mergulho Noturno'


Coisa que ganham vida e passam a caçar seres humanos é um tema recorrente no cinema: carros homicidas, tomates assassinos, pneus que se vingam da civilização, vestidos que matam entre outros numa lista infindável. “Mergulho Noturno” (Night Swim, 2024), dos mesmos produtores de “A Freira” e “M3GAN”) acrescenta mais um objeto que ganha vida: uma piscina que engole gente em um típico subúrbio de classe média. Embora “Mergulho Noturno” siga todos os cânones do gênero, seu roteiro é uma curiosa combinação de simbologias antropológicas (a antropomorfização dos objetos e reificação da sociedade), esotéricas (o imaginário do elemento água) e urbanas (o imaginário das classes médias suburbanas e o desencantamento do mundo).

sábado, janeiro 13, 2024

Canibalismo e horror cósmico em 'A Sociedade da Neve'


A história dos sobreviventes dos Andes (o acidente aéreo de 1972 com dezesseis sobreviventes entre 45 pessoas a bordo) já foi contada e recontada na literatura e cinema – sempre com o toque sensacionalista do canibalismo. Mas em “A Sociedade da Neve” (2023), do diretor espanhol J.A. Bayona, a questão do canibalismo é colocada num cenário mais amplo: o do horror metafísico ou cósmico, com forte traço gnóstico. Os planos grandiosos dos Andes os infinitos campos de neve contrastando com fragilidade dos sobreviventes diante da escala do cenário acentuam a absoluta indiferença da Natureza diante da presença humana. Ali não há Deus, propósitos divinos, sentido ou sequer destino. Apenas a fúria dos elementos. Diante da “morte de Deus” resta o pós-humano: o homem tornar-se uma máquina de sobrevivência tão furiosa quanto a Natureza – e o canibalismo é apenas um elemento nesse quadro mais geral.

sábado, dezembro 02, 2023

'A Queda da Casa de Usher': Allan Poe e o acerto de contas cármico com a elite predatória


Com a proximidade das festas de final de ano, a área do cinema e audiovisual é tomada por contos morais otimistas sobre mudanças pessoais e reavaliações do significado da vida. Então, vá contra a corrente e encare uma série sobre execuções da justiça cármica dentro do universo do escritor gótico norte-americano Edgar Allan Poe. É a produção Netflix “A Queda da Casa de Usher” (2023), uma adaptação da obra escritor trazida para a era da Big Farma sobre a ascensão e o declínio de uma família americana bilionária cuja origem do império está num analgésico opiáceo que vicia e destrói a vida de milhões – obviamente inspirado no escândalo atual da Purdue Farma da família Sackler, responsável pela epidemia de opioides nos EUA com o analgésico OxyCotin. Os herdeiros Usher começam a morrer misteriosamente. Apontando para um tipo de escrutínio para além da Justiça terrestre: o horror metafísico dos fantasmas do consciência e do passado que vêm fazer o acerto de contas com a elite predatória.

sexta-feira, novembro 10, 2023

'O Exorcista' faz 50 anos: CIA, desconfiança gnóstica e possessão midiática


Considerado o filme mais assustador já feito, “O Exorcista” (1973) completou 50 anos. E está envelhecendo muito bem, principalmente pela sua atemporalidade. Embora baseado em um caso real estudado pelo laboratório de parapsicologia da Universidade Duke financiado pela CIA e Fundação Rockefeller (o oculto e a parapsicologia como ferramentas de espionagem na Guerra Fria), sua atemporalidade vem do horror metafísico que ele desperta: como Deus pode permitir uma legião de demônios soltos entre os homens e possuir o corpo de uma jovem inocente? Apesar de ter inspirado todos os clichês dos filmes de terror repetidos ad nauseam ao longo das décadas, suas cenas são assustadoras porque inspiram uma desconfiança gnóstica: será que Deus não nos ama? Além do filme ter um subtexto secreto: será que a mídia estaria criando a forma contemporânea de possessão demoníaca?

quinta-feira, setembro 21, 2023

Pinochet, vampiros e teratopolítica no filme 'O Conde'


No aniversário de 50 anos do violento golpe militar do Chile (que em 1973 derrubou o governo socialista de Salvador Allende), estão sendo exibidos muitos filmes e documentários sobre aqueles acontecimentos. Mas nada se compara à produção Netflix “O Conde” (El Conde, 2023):  Augusto Pinochet, assume a forma de um monstro político, um vampiro centenário condenado a viver para sempre escondido depois de fingir a própria morte, para evitar a punição merecida depois de anos de assassinatos e corrupção. Um fascista-vampiro que passou séculos lutando contra qualquer revolução socialista ou democrática. E uma freira-exorcista decide extirpar o Mal daquele corpo, para livrar o mundo do golpismo diabólico. “O Conde” é um exemplo da estratégia semiótica da “teratopolítica”: demonizar o inimigo político até transformá-lo em uma anormalidade, aberração e perigoso veículo de contágio de ódio e violência. Uma estratégia ambígua que pode despolitizar cenários políticos complexos.

quinta-feira, agosto 31, 2023

'The Sadness': zumbis e humanos entre a civilização e a barbárie


No cinema a mitologia zumbi passou por várias transformações: escravos de fazendeiros, símbolos do racismo, representação sanitária e viral do Mal etc. Mas seja qual for o roteiro, há um prazer catártico nesse subgênero: o prazer dos sobreviventes por poderem matarem zumbis como num jogo de tiro ao alvo. Afinal, eles são trôpegos e idiotas. Mas a produção taiwanesa “The Sadness” (Ku bei, 2021) inverte totalmente isso: dessa vez o prazer catártico é dos mortos-vivos. Uma praga viral toma conta da capital Taipé tornando os infectados monstros amorais que matam e estupram com um sorriso sádico no rosto. Como em todos os filmes sobre zumbis, “The Sadness” reflete a crise social ou econômica do momento (no caso, a pandemia global) e a própria condição humana, no limite entre civilização e barbárie.

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