domingo, março 28, 2010

"Alice no País das Maravilhas" e Sophia: a Viagem do Herói Gnóstico

"Talvez Alice e Sophia sejam simplesmente as principais personagens da história arquetípica da viagem do herói que parte da segurança do lar em direção de terras estrangeiras que fazem pouco sentido, mas eventualmente oferecem grandes lições. A diferença é que Carroll e os gnósticos se atreveram a usar mulheres como protagonistas."

Reproduzimos e traduzimos abaixo o post de Miguel Conner para o blog Aeon Byte Gnostic Radio onde o autor (apressentador do programa radiofônico semanal em Chicago "Radioshow on Gnosticism") faz não apenas uma leitura gnóstica do clássico "Alice no País das Maravilhas" como, também, as conexões do autor Lewis Carroll com o Ocultismo e com todo o fluxo esotérico que invadiu as sociedades conservadoras vitorianas no século XIX. Essas conexões explicariam os profundos simbolismos míticos de Alice associado ao arquétipo de Sophia, a recorrente jornada do herói gnóstico que da Plenitude e Queda alcança,ao final, a Ressurreição e Renovação.


"Alice no País das Maravilhas" e o Ocultismo
Miguel Conner


O sucesso da adaptação de Tim Burton de “Alice no País das Maravilhas” não deve surpreender ninguém. "Alice no País das Maravilhas" (e sua sequência "Através do Espelho”) tem fascinado crianças e adultos há mais de um século e meio, merecendo sucessivas edições impressas e remakes em diferentes formas de mídias.

Muito tem sido escrito sobre as peripécias da Alice, mas muito pouco sobre as inspirações ocultistas da estória e do seu criador, Lewis Carroll (nome real de Charles Dodgson). Isto é surpreedente, considerando que “Alice no País das Maravilhas” é uma das obras mais mística e surreais de toda a literatura. Para além do seu impacto na cultura e arte contemporânea, o livro influenciou o ocultismo (Aleister Crowley exigia que seus discípulos lessem tanto "Alice no País das Maravilhas" como "Através do Espelho").

Além da estória se constituir numa vibrante metáfora sobre uma criança no mundo estranho e, muitas vezes ilógico, dos adultos, Carroll poderia ter escondido idéias ocultas em seu clássico?

É documentado que Carroll era um membro da Sociedade de Pesquisas Psíquicas, uma organização fundada por um pastor anglicano para o estudo do Espiritismo, Percepção Extra-Sensorial (PES), clarividência e todo o tipo de atividade paranormal (entre os membros da sua filial americana estavam William e Henry James).

Martin Gardner afirma em "The Annotated Alice ' que Carroll era um forte defensor da PES e psicocinese. O próprio Carroll escreveu que a mente poderia romper os reinos sobrenaturais:

"Tudo parece apontar a existência de uma força natural, aliada à eletricidade e à força nervosa, através do cérebro, e que pode atuar sobre o cérebro. Acho que vai chegar o dia em classificaremos isso entre as forças naturais conhecidas, e as suas leis tabuladas e, quanto aos cientistas céticos que sempre fecham os olhos até o último momento para todas as provas que aponta para além do materialismo, terão de aceitá-la como um fato comprovado na natureza" (p.53).
Isto claramente ecoou em 'Alice no País das Maravilhas ", onde a lagarta possui o poder de ler a mente de Alice.

Em "Através do Espelho", de repente, Alice pega uma caneta e começa a escrever palavras ininteligíveis em um livro antes do rei branco. Gardner afirma que essa cena foi incluída porque Carroll acreditava na “Escrita Automática” (quando um espírito desencarnado utiliza-se da mão de um médium) (p. 147).

Este poderia ser o segredo do enigma esotérico famoso de Carroll: "Por que um corvo é como uma escrivaninha?" Afinal, os corvos são mensageiros simbólicos dos mortos, enquanto a Escrita Automática (realizada em uma mesa) é também uma forma de comunicação com os mortos.

Por último, relata-se que Carroll era possuidor de uma grande coleção de livros sobre o ocultismo (pág. 53).

É surpreendente a quantidade de provas sobre o seu interesse místico e como isso influenciou seus escritos. Carroll era diácono da Igreja Anglicana, assim como um homem muito privado, que não concedia entrevistas. E aí está o mistério sobre o desaparecimento dos seus extensos diários.
Aparentemente nada parece ser abertamente gnóstico em “Alice no País das Maravilhas” até reconhecermos alguns dos principais temas em torno da heroína.

A saga do Alice tem impressionantes paralelos ao mito da queda de Sophia, tal como descrito em alguns contos gnósticos:

. Ambas, de tédio, curiosidade e desobediência, são jogados em uma dimensão existencial (Alice - Sophia – O Chaos).
. Ambas, frequentemente, perdem a sua direção e os seus sentidos, e até ao auxiliadas por seres maliciosos (Alice - O Gato de Cheshire / Sophia - O Cristo Cósmico).
. Ambas parecem criar bizarras criaturas que elas têm de superar (Alice entidades diferentes, mas o dragão Jabberwocky-como é o exemplo mais famoso / Sophia-Jehovah, que aparece para ela sob a forma de um dragão)
. Ambas devem passar por testes emocionais para que possam retornar ao seu lar primordial (Alice-Inglaterra; Sophia-O Pleroma).
. Ambas representam a busca gnóstica da alma caída em busca do autoconhecimento, que trará restauração e liberação da matéria corrompida (Alice deve resolver diversas adivinhações e, muitas vezes, refletir sobre sua própria natureza / Sophia deve descobrir e pronunciar as preces corretas para compreender a si mesma e seu lugar dentro do reino eterno que ajudou a criar).
. Ambas percebem que eles são parte do sonho vívido de um Ultra-Ser Supremo (Alice - O Rei Vermelho / Sophia - O Espírito Virgem/Bythos).
. Ambas têm nomes que representam grandes virtudes humano (“Alice” significa Verdade/ “Sophia” significa Sabedoria).

Mesmo o maior evangelho gnóstico dos últimos tempos, o filme Matrix, faz alusão a “Alice no País das Maravilhas”. Isso acontece quando Morpheus (o deus dos sonhos) ensina Neo (Jesus gnóstico) que ele deve despertar não só acima de todas as realidades falsas, mas também confrontá-las:

"Imagino que agora você está se sentindo um pouco como a Alice. Hein!? Caindo no buraco do coelho!?

'Esta é a sua última chance. Depois disso, não há como voltar atrás. Você toma a pílula azul - A história acaba, e você acorda em seu quarto e acreditar no que quiser acreditar. Se tomar a pílula vermelha vai permanecer no País das Maravilhas e eu te mostrarei o quão profundo é buraco do coelho. "

Talvez Alice e Sophia sejam simplesmente os principais personagens da história arquetípica da viagem do herói que parte da segurança do lar em direção de terras estrangeiras que fazem pouco sentido, mas eventualmente oferecem grandes lições. A diferença é que Carroll e os gnósticos se atreveram a usar mulheres como protagonistas.

Em que medida Carroll usou seu conhecimento sobre ocultismo, isso nunca será plenamente conhecido. É simplesmente aceito que o diácono anglicano e matemático escreveu histórias para impressionar uma garota que o inspirou.

O que se sabe é que Carroll se junta a uma lista de artistas de prestígio que, a despeito de viver em sociedades conservadoras, mergulhou no fluxo do esoterismo e tirou das águas intemporais a criatividade mística. Pouco importa se 'Alice no País das Maravilhas' foi conscientemente influenciada pelo Gnosticismo. Como o Bispo Stephan Hoeller disse certa vez: "Qualquer artista sério já é um meio Gnóstico”.

Essas idéias podem realmente adicionar novas interpretações de leitura sobre os textos gnósticos, que nunca Lewis Carroll viveu para ver. É uma pena, porque tanto Carroll como os gnósticos apreciam trocadilhos, as interpretações selvagens, paisagens fantasiosas ricas em significados que não têm sentido a menos que possua a Sabedoria (Sophia) de uma criança ou a sagacidade de um filósofo-poeta. E aí é que reside a eterna ligação entre aqueles que mergulham no fluxo de esoterismo e as águas intemporais da criatividade mística.

Um exemplo divertido que Carroll pôde apreciar pode ser encontrada no Evangelho de Filipe, onde afirma que “a Verdade (Alice) não veio ao mundo (País das Maravilhas / A Matrix) nua, mas ele (ela) veio por meio de letras e imagens. O mundo (País das Maravilhas / A Matrix) não receberá a verdade (Alice) de qualquer outra maneira.”

Ou poderia seria Carroll acreditar, tal como Alice e Sophia, que os gnósticos tenham simplesmente despencado num buraco de coelho?

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domingo, março 14, 2010

Quero Ser John Malkovich: Reencarnação e Identidade pelo ponto de vista Gnóstico

Um filme estranho, bizarro e esquisito. A partir de um argumento absolutamente nonsense ( Um homem consegue um novo emprego. Lá encontra uma porta, escondida, que leva até a mente do ator John Malkovich, onde pode permanecer durante 15 minutos, até ser cuspido numa estrada. Impressionado com a descoberta, resolve alugar a passagem para outras pessoas, dentre elas o próprio John Malkovich) o filme aborda profundos simbolismos em torno da Identidade e Reencarnação.

Diferente da maioria das religiões ocidentais, o objetivo final gnosticismo não é encontrado na vida após a morte. Os gnósticos procuraram se tornar “Cristos vivos”, ou seja, buscar vencer a ignorância e a morte. Neste estado, os mistérios da criação e não só iriam se manifestar, o tempo e o espaço se dissolveriam diante da consciência, e todas as ilusões da realidade entrariam em colapso. Como podemos perceber nessas duas passagens dos evangelhos apócrifos de Felipe e Tomé:

“Se você viu Cristo, tornou-se Cristo
Essa pessoa não será mais um cristão, mas o próprio Cristo
Se alguém consegue conquistar a ressurreição, jamais morrerá”
(Evangelho de Felipe)

“Jesus disse: Quem beber da minha boca se tornará como eu, eu mesmo passarei a ser essa pessoa,
e as coisas ocultas serão reveladas a ele”
(Evangelho de Tomé)

O Gnosticismo vê na reencarnação uma perversa estratégia do Demiurgo (Yaldabaoth, o falso deus, criador do cosmos material que, inebriado pelo poder, acredita ser a única divindade reinante no universo) para nos manter presos nesse mundo através do esquecimento. Condenados a recomeçar sempre do zero, não somamos conhecimentos, esquecemos por subtração.
Para muitos gnósticos, a falha em alcançar esse objetivo simbolicamente significava ficar aprisionado dentro do círculo infinito do dragão cósmico que come o seu próprio rabo, o Ouroboros (veja figura abaixo).

“Mas o que é aparente é que o Gnosticismo despreza a reencarnação, tanto quanto a condenação eterna ou a extinção.A razão óbvia é que ser preso dentro do Ouroboros implica no veneno do esquecimento contínuo e ignorância, opostos ao antídoto libertador da Gnose. Uma vida ou mil é tão inútil, a menos que um indivíduo possa acender a centelha divina e tornar-se como Cristo. Apesar da imagem dos gnósticos ser a de smísticos tranqüilo, a verdade é que o gnosticismo tem subjacente um sentido de urgência que, como a reencarnação, também está ausente da maioria das religiões ocidentais.” (CONNER, Miguel. “Do Gnostics Believe in Reincarnation?” In: Aeon Byte, disponível em http://aeonbyte.blogspot.com/2010/03/examiner-article-do-gnostics-believe-in.html)


Reencarnação é esquecimento, a condenação de recomeçar sempre do zero. Isso significaria a perda da identidade. Um filme que magistralmente faz uma parábola dessa questão é o enigmático e surreal filme Quero Ser John Malkovich

A marionete é o símbolo principal desse filme. Além do simbolismo óbvio presente na narrativa (Craig - John Cusack - utiliza-se da sua habilidade de titereiro para manipular identidades e a marionete como paralelo à condição manipulada de John Malkovich), há um significado mais profundo: as marionetes são descendentes diretos dos antigos ídolos divinos, adorados e animados pelos seus sacerdotes.

Victoria Nelson no livro The Secret Life of Puppets demonstrou como na cultura popular do século XX temos um aumento do fascínio por autômatos e bonecos com o surgimento do conceito marionete-mestre (humana ou divina) inserida dentro de uma cosmologia gnóstica das relações entre homem/autômato e homem/deus . Esse fascínio por autômatos ou marionetes dentro desse gnóstico esquema simbolizaria a maneira pela qual podemos avaliar a própria experiência humana, ou seja, como nos vemos como prisioneiros dentro de um cosmos hostil. Além disso, as marionetes se metamorfosearam, na modernidade, em figuras como robôs, ciborgues, andróides e, mais recentemente, na hibridação do corpo humano. Só que, agora, com um ingrediente a mais: a criação de uma mediação para a qual a consciência humana se transfira e transcenda a prisão da carne. O anseio humano em migrar para mediações idealmente modeladas.

O filme simboliza esse anseio pelas mediações em diversos momentos. Podemos observar isso em dois diálogos. Após Maxine transar com Malkovich sabendo que Lotte estava na sua cabeça, provocativamente comenta com Craig:

Craig: Você me tortura de propósito?
Maxine: Eu me apaixonei.
Craig: Acho que não. Eu me apaixonei, e pessoas apaixonadas ficam assim.
Maxine: Escolheu o tipo não correspondido. Isso faz mal para a pele!
Craig: Você é má Maxine!
Maxine: Sabe como é ter duas pessoas olhando para você, com total luxúria e devoção através do mesmo par de olhos?

Pessoas apaixonadas umas pelas outras, mas que necessitam de mediações para consolidarem os relacionamentos. Uma espécie de sexo platônico onde o objeto da paixão é visto através de olhos ideais, despertando impulsos exibicionistas em Maxine. Ou a aspiração pelas mediações decorre da negação da condição física atual:

Primeiro cliente da JM Inc.: Quando dizem que posso ser outro o que querem dizer?
Craig: É exatamente o que dissemos. Podemos colocá-lo no corpo de
outra pessoa por 15 minutos.
Primeiro cliente da JM Inc.: Posso ser quem eu quiser?
Craig: Bem, você pode ser John Malkovich.
Primeiro cliente da JM Inc.: Perfeito! É minha segunda escolha, mas é maravilhoso. Sou um homem gordo. Sou triste e gordo.”
A Reencarnação e a Mediação

Esta discussão liga-se ao tema da Identidade, associada, também, à questão da Mediação e da Reencarnação: ser através do Outro (pessoa, marionete etc.). E também a revolta e o desejo de se libertar das cordas que controlam a identidade: quem o manipula, quem está, na verdade, dentro de você controlando-o?

A primeira seqüência do filme sintetiza esta dupla dimensão do tema da Identidade. Vemos Craig manipulando uma marionete e fazendo o que ele denomina de “Dança do Desespero e da Desilusão”. Craig manipula a marionete como uma mediação para si mesmo, como ele diz a certa altura do filme (na voz de uma marionete): “Craig, por que você gosta tanto de marionetes”, pergunta Maxine. “Maxine, não tenho certeza. Talvez seja a idéia de ser outra pessoa por um instante. Estar em outra pele, pensar e mover-se diferentemente, sentir de outra maneira”, diz a marionete de Craig. Ao mesmo tempo, o boneco olha para cima, descobre que não passa de uma marionete, revolta-se e começa a quebrar o quarto em miniatura no pequeno palco da oficina de Craig. O boneco revolta-se com a sua condição e quer libertar-se do manipulador. Será a condição de John Malkovich mais à frente na estória.

O que temos aqui é o tema da crise de identidade no mundo contemporâneo. Craig é um titereiro que, embora talentoso, está desempregado. Sua esposa Lotte fala que ele deveria arrumar um pequeno emprego. “Quem vai querer contratar um titereiro numa economia invernal como a de hoje”.

Craig passa de titereiro talentoso a arquivista na Lestercorp (por ter mãos rápidas) e, após o trabalho, explora o “bico” de ganhar dinheiro com o portal que conduz à cabeça de John Malkovich. Mas, nessas três situações, há uma coisa que as une: a busca de uma mediação que o faça transcender a sua vida frustrada e melancólica: no começo, as marionetes e, no final, a cabeça de John Malkovich.

No primeiro caso, a transferência é simbólica, no segundo é literal: transferir sua consciência para a Mediação. A narrativa associa esta transferência a um aspecto religioso ou místico: a reencarnação.

Todos os personagens centrais do filme, e os clientes da JM Inc., querem viver os 15 minutos na cabeça de John Malkovich. Procuram transferir-se para uma mediação como forma de transcenderem das suas existências infelizes. É uma parábola do espírito de final de século, onde as novas tecnologias do virtual vão oferecer através de avatares, perfis criados em blogs, orkuts, twitters etc. a possibilidade de viverem outras ou múltiplas identidades. No filme os personagens perceberão que é uma falsa gnose.

Ao contrário, o grupo do Dr. Lester procura a verdadeira gnose. Pretende alcançar a vida eterna pregando um “pequeno” golpe no Demiurgo: driblar a lei da Reencarnação. A mitologia gnóstica vê na reencarnação uma perversa estratégia do Demiurgo para nos manter presos nesse mundo através do esquecimento. Condenados a recomeçar sempre do zero, não somamos conhecimentos, esquecemos por subtração. O grupo de Lester alcança a imortalidade não mais reencarnando, mas transferindo a consciência para um “corpo recipiente” na sua fase mais madura em termos de consciência e formação mental. Eles têm até a meia-noite do dia designado para transferirem-se, pois, caso contrário, “seriam absorvidos, presos, enjaulados no cérebro do anfitrião, impossibilitado de controlar qualquer coisa, sentenciados a ver o mundo através dos olhos de outra pessoa”, como afirma Dr. Lester. Ou seja, a prisão da Reencarnação, tal qual denunciada pelo Gnosticismo. Enquanto Craig, Maxine e Lotte querem transferir-se para a mediação pelo desejo de ver o mundo através dos olhos de outras pessoas, o grupo de Lester quer mais do que isso: mantendo intacto o núcleo da consciência, pular de um corpo para o outro alcançando a imortalidade e mantendo a identidade.

Ficha Técnica:
  • título original:Being John Malkovich
  • duração:01 hs 52 min
  • ano de lançamento:1999
  • estúdio:Propaganda Films
  • distribuidora:USA Films / UIP
  • direção: Spike Jonze
  • roteiro:Charlie Kaufman
  • produção:Steve Golin, Vincent Landay, Sandy Stern e Michael Stipe

sábado, março 13, 2010

Porões, Metrôs e Becos: a simbologia da caverna no cinema

A simbologia da caverna tem uma longa história que envolve não só a filosofia e o desenvolvimento da racionalidade ocidental mas, inclusive, o destino da experiência do sagrado na atualidade. Isso vai se refletir numa variada simbologia e iconografia presentes em filmes dos mais variados gêneros. (Foto: sequência de Cloverfield - 2008)

A tradição das cavernas como ante-câmera de um mundo subterrâneo, terra dos mortos, o meio do caminho para o contato com deuses em uma realidade separada da humana, está presente desde tempos arcaicos. Filósofos gregos pré-socráticos, por exemplo, estavam fundamentados numa tradição da busca da sabedoria na escuridão, e não na luz, através da incubação de sonhos em cavernas. Aqueles que se iniciavam nesses lugares sagrados participavam de uma jornada no reino dos mortos na esperança de encontrar uma divindade que se tornaria seu amigo ou mentor. Tais cultos apresentavam a caverna como lugar de cura e conexão com o transcendental mundo para além dos nossos sentidos.

A partir de Platão e Sócrates temos uma virada: a caverna será apresentada como uma parábola da limitação da percepção derivada da experiência sensorial, portanto, um lugar de onde devemos escapar para encontrar a verdade. Essa parábola mostra a visão de mundo do ignorante, que vive no senso comum, e do filósofo na eterna busca da verdade. Aprisionado no interior de uma caverna, limita-se a ver sombras nas paredes projetadas do mundo exterior (o Mundo das Idéias, oposto ao mundo das coisas sensíveis).

Seis séculos depois, a crença em um mundo superior escondido por trás das formas transitórias dos sentidos continua presente nos antigos cultos helenísticos, escolas filosóficas e novas religiões, mais notadamente o Cristianismo. Esse abandono da tradição das cavernas, corresponderá a uma oposição entre as formas da busca da Verdade: espisteme versus gnosis, fé versus mística, razão versus intuição. O mundus subterraneus, local dos mistérios, sonhos e da morte, canal de conexão com o transcendente, é recalcado pela simbologia da Luz que desvenda todos os mistérios e ilumina a ignorância.

Este modelo de um cosmos construído em dois níveis (o mundo superior onde reside o criador e um mundo inferior, cópia deteriorada das instâncias superioras) é secularizado pelo racionalismo científico e pelo protestantismo. A decretação do fim dos milagres pelo protestantismo (ou o fim do contato direto com os reinos espirituais) e a redução do mundo a um único nível pela ciência (o mundo empírico) nada mais faz do que secularizar a antiga dualidade helenística em uma moderna dualidade: sujeito e objeto, ego e id, cultura e natureza etc.

Mas a luz da episteme cria sombras. O mundo subterrâneo não está realmente morto. Uma espécie de "sub-zeitgeist" surgirá na cultura popular onde o sobrenatural somente se manifestará em reinos escuros, demonizados.
“Pense na mais profunda garagem de veículos nos últimos dez filmes de ação que tenha assistido, sempre mostrado como lugar de perigo e discórdia, onde o herói ou a heroína é atacado pelo vilão, onde perseguições de carros terminam em destruição em massa. Ou as misteriosas regiões em metros onde almas mortas se manifestam como hordas de sem-tetos. Ou os labirintos desses filmes sempre localizados sob ficcionais Chinatowns. Ou os numerosos mundos alternados ou secundários dos filmes de ficção-científica, incluindo as cavernas de misteriosos planetas como no filme Alien (1979) repletos de sinistros ovos que infectam a tripulação da nave Nostromo com um destrutivo e agressivo organismo que mata cada organismo que o hospeda. Ou a idéia, repetida de uma maneira ou outra em quase toda ficção em realidade virtual ou filme de que o que vemos em torno de nós é uma ilusão criada para mascarar uma outra realidade que reside abaixo ou acima de nós.” (NELSON. Victoria. The Secret Life of Puppets. Havard University Press, 2001, p.6)
Com a revolução científica do século XVII acompanhado pelas primeiras expedições polares, o mundus subterraneus passou a não ser mais aceito como uma real locação e foi transformado em um fictício local transcendental e psicológico na literatura e nos filmes. A tradição das cavernas como o local para o impulso da busca pelo sagrado na escuridão e nos sonhos é demonizado na moderna cultura como locais perigosos onde habita o Mal. E o mago ou mentor desse reino (dos zoroastras padres da antiga Persia aos medievais alquimistas) é transformado no estereótipo do cientista louco cujas energias que tenta manipular provém das trevas subterrâneas.

O Fascínio pela “experiência religiosa imediata”


Esse simbolismo e iconografia da caverna nos filmes é o que fascina o público. Lá está o vilão, o mal, aquele que quebra a ordem da Luz, a episteme, do mundo lógico e científico do cotidiano. Nos oferece aquilo que Jung definiu como “experiência religiosa imediata”, à experiência numinosa, nos termos colocados por Rudolf Otto traduzido pela frase mysterium tremendum fascinans et augustum. O numinoso é um efeito que apodera e domina o sujeito, mais sua vítima do que criador. Condição do sujeito e independente da sua vontade, a percepção da presença do numen suscita o sentimento de grandeza, de maravilhamento, de respeito. É a percepção do misterioso, do inteiramente outro que ultrapassa a esfera do usual, do inteligível e do familiar. O mysterium representaria o das ganze Andere (o totalmente outro), o qualitativamente diferente, que apresenta dois conteúdos: o tremendum, elemento repulsivo, que causa medo ou terror, e o fascinans, o que atrai, fascina. É esta experiência religiosa imediata, a experiência numinosa (fascinante por ser uma manifestação do magma reprimido do inconsciente e repulsivo por ser a erupção do Estranho, ou seja, daquilo que é potencialmente desestabilizador) que necessita ser controlada pelos sistemas simbólicos religiosos para que a natureza ambígua e perturbadora do numen seja diluída.

Com o enfraquecimento da gnosis e o “fim dos milagres” decretado pelo cristianismo protestante, assim como a influência da chamada ilustração científica que afasta inclusive homens religiosos que não conseguem conciliar a religiosidade com a ciência, novas formas de mediação devem ser criadas. Surgem formas secularizadas de, simbolicamente, lidar com a “experiência religiosa imediata”, isto é, com o fluxo do psiquismo humano que vem à tona na vida cotidiana. O cinema seria uma delas.

Sagrado como “quebra da ordem”


A tradição da caverna busca o inteiramente outro, a transcendência, a ruptura como uma totalidade instaurada. A mitologia da caverna tal qual interpretada por Platão e Sócrates é o ato inaugural da liquidação do indivíduo, reduzido à condição de ignorância diante da Verdade (Logus, episteme etc.).

Ver a ordem sendo quebrada pelo cientista louco, pelo serial killer, pelo terrorista ou por vilões egressos dos reinos subterrâneos (cavernas, laboratórios em porões, metrôs – no filme Advogado do Diabo (1999) o diabo somente se desloca por metrô em Nova York) fascina o espectador por trazer essa experiência religiosa arcaica e arquetípica.

Porém, o perigo da experiência sagrada é racionalizada e colocada sob controle na narrativa fílmica: os vilões são punidos, a “caverna” é destruída ou enterrada para sempre e a Episteme e a Razão se impõe como único destino possível.


Postagem Relacionada:

Da Jornada do Herói de Vogler à Jornada do Herói do Filme Gnóstico

segunda-feira, março 08, 2010

Da Jornada do Herói de Vogler à Jornada do Herói do Filme Gnóstico

A mítica Jornada do Herói descrita por Vogler como a base universal de todo roteiro parece se assemelhar à jornada da narrativa do protagonista do filme gnóstico (Queda, Ascensão, Plenitude). Porém, há uma diferença essencial: a Teologia Negativa

Na semana passada, durante a aula da disciplina Estrutura de Roteiro ministrada por mim no curso de Comunicação (Publicidade e Propaganda) da Universidade Anhembi Morumbi (UAM), discutíamos o personagem mítico do Herói, tal qual descrito por Christopher Vogler no livro Jornada do Escritor. Baseado nas idéias do historiador e pesquisador em Mitologias Joseph Campbell, a Jornada do Herói com toda a galeria de personagens (o Pícaro, a Sombra, o Arauto, o Camaleão etc.) seria, para Voegler, a estrutura narrativa básica de todo ou qualquer roteiro cinema por se basear em um modelo de narrativa mítica presente em todas as culturas e épocas.
O que chama a atenção na descrição de Vogler é o motivo que impulsiona o herói a iniciar a jornada mítica:

“O estímulo para esta jornada é a mudança de algo em seu mundo comum, e ele parte para buscar a restauração deste mundo, ou ele está insatisfeito em seu mundo e parte para provocar uma mudança. Em ambos os casos o motivo da jornada é a falta de alguma coisa. O herói se sente incompleto e vai em busca de sua plenitude. O resultado é a transformação do próprio herói. Mesmo que o ambiente não se altere o herói não o enxerga mais da mesma forma.” VOGLER, Christofer. A Jornada do Escritor)

Para muitos leitores desse Blog ou que acompanham as discussões sobre o filme gnóstico, essa descrição feita por Vogler parece se assemelhar em muito com o protagonista do filme gnóstico. Os estados alterados de consciência dos protagonistas gnósticos (a suspensão do Viajante, a paranóia do Detetive e a melancolia do Estrangeiro) partem também de insatisfações e incompletudes. Todos buscam a plenitude.
Porém, com uma diferença fundamental: a Teologia Negativa. Ou, em termos fílmicos, a ruptura com a ordem ou totalidade. O protagonista gnóstico não só se transforma interiormente como essa renovação implica a ruptura, in totum, com uma percepção ontológica do real.

Uma pequena história da "quebra da ordem"

A história da “quebra da ordem” no cinema é interessante. No chamado “cinema slapstick” (os filmes mudos “de pastelão”), a trajetória do herói o conduz ao clássico happy end anárquico: os heróis vencem os desafios e limitações impostos pelo sistema (social, policial, econômico etc).

Como, por exemplo, no antológico final do filme de Harold Loyd O Homem Mosca (The Safety Last, 1923) onde, após escalar um prédio com as próprias mãos em busca de emprego e casamento, apesar de atrapalhado seguidamente por um policial, vence todos os percalços, chega ao topo e encontra sua noiva para o beijo final.

Aliás a figura do representante da ordem, o policial, é ridicularizada. Desde o grupo The Keystone Cops (um ajuntamento de policiais desajeitados que cada missão se reverte em catástrofes que pervertem a ordem), a figura do policial é ridicularizada e nunca consegue prender ninguém. Os personagens de Chaplin, o Gordo e o Magro, Harold Loyd e, mesmo na fase sonorizada, os Três Patetas, sempre escapam da polícia, denunciando a hipocrisia da Lei a inutilidade em aderir ao sistema.

Com a depressão econômica pós crash da Bolsa de Nova York em 1929 o proletário se retira do cinema para dar lugar às classes médias, exigindo um enquadramento moral e político na produção cinematográfica. Principalmente a partir dos filmes musicais, o esquema passa a ser quebra e retorno da ordem constante nas narrativas. Por exemplo, nos musicais todos começam a cantar e dançar e, de repente, retornam aos seus papéis sociais como se nada tivesse acontecido. Essa autêntica fantasia-clichê se desenvolve, varia e se atualiza ao longo das décadas e gêneros cinematográficos.

Desde os filmes de terror (onde o monstro ou serial killer assassina primeiro jovens que fazem sexo, consomem drogas ou, simplesmente, desobedecem os pais), passando por road movies (como em Sem Destino - Easy Rider, 1969 - ou Thelma e Louise - Thelma e Louise, 1991 - onde os protagonistas morrem após romperem a ordem) até os filmes policiais ou de ação (onde o happy end, diferente dos filmes slapstick, é moralista com o herói restabelecendo a ordem política e social), temos diversas variantes dessa fantasia clichê.

Já os filmes gnósticos apresentam uma peculiar forma de ruptura com a “ordem”: a gnose. Mas essa ruptura não é apenas uma ruptura com a ordem política ou social, mas a ruptura com a própria noção ontológica de realidade. A ruptura com a Totalidade e com racionalizações confortantes que abrigam o indivíduo dentro de um “sentido” ou “propósito”.

Vejamos dois filmes que trabalham com um tema potencialmente gnóstico: o simbolismo do controle remoto como um aparelho que altera ou interfere não apenas na TV mas na própria realidade presentes em A Vida em Preto e Branco (Pleasantville, 1998) e Click (Click, 2006).
Em Click um arquiteto workholic ganha um estranho controle remoto universal que lhe permitirá acelerar ou retroceder as situações de diferentes partes da sua vida. O que poderia dar margens a questionamentos ou, no mínimo, ao medo ou êxtase metafísico ou filosófico, ao contrário, reverte-se num imediato interesse instrumental: acelerar as partes “chatas” da vida (jantar com a família, levar o cão para passear, carícias preliminares com a esposa antes do sexo etc.) para que ele possa se concentrar no trabalho.

A narrativa se desloca do potencial interesse metafísico ou gnóstico (a realidade como um constructu, uma artificial sucessão de imagens holográficas) para um viés moralista, onde o protagonista será punido por romper com os valores familiares.
Ao contrário, em A Vida em Preto e Branco, outro estranho controle remoto ganho de um não menos estranho técnico de TV, fará dois jovens serem tragados para o interior de uma série televisiva dos anos 50. Essa jornada fará os jovens heróis questionar não só os valores do mundo em preto e branco da década de 50, como os valores da atualidade deles (os anos 90). Os seus questionamentos serão marcados por uma forte simbologia e iconografia de origem bíblica do Velho Testamento (Paraíso, maçã, dilúvio, arbustos incandescentes etc.).

É a partir desse estado alterado de consciência iniciado pelo controle remoto, que os heróis vislumbram uma outra realidade que transcende aquela da tela de TV ou da realidade dos jovens da década de 90 dominado pelas imagens da MTV.

Assim como a mítica jornada do herói descrita por Voegler, os protagonistas realizam uma transformação íntima. Porém, isso implica em ruptura e transcendência (ou “quebrada ordem”, em termos fílmicos). A totalidade seja social ou divina/cósmica é negada: nem a ilusão e muito menos a ilusão de realidade, mas a busca de um terceiro elemento para além das oposições ou dualidades que esse cosmos nos impõe.

Tal qual a Teologia Negativa que revela a existência de Deus a partir da sua negação (ou da impossibilidade da linguagem expressar a sua existência) e, como pretende Theodor Adorno com a sua dialética negativa ("Dialética Negativa é Teologia Negativa", afirmava), revelar a falsidade do Todo buscando a transcendência no particular ou individual, o filme gnóstico busca a partir da negação (ás vezes niilista) da ordem de uma totalidade (social, divina, religiosa) a plenitude última que seria a superação dos termos do cosmos material presente.

A "transformação" do herói ao final da jornada mítica como descrita por Vogler é ainda marcada pela positividade: é muito menos uma transformação e muito mais uma adaptação íntima a uma totalidade que o envolve. A penalidade seria a da morte trágica, como ao final do filme Thelma e Louise.

domingo, março 07, 2010

Grupo de Pesquisas da UAM discute filmes de Mel Gibson

Filmes dirigidos por Mel Gibson, principalmente o polêmico A Paixão de Cristo, buscam uma transcendência religiosa ou filosófica ou são meros reflexos do neo-conservadorismo político e cultural da passada era Bush?
O Grupo de Pesquisas sobre Religião e o Sagrado no Cinema e Audiovisual, formado no ano passado na Universidade Anhembi Morumbi (UAM), deu início ao ciclo de seminários avançados. O primeiro componente do grupo a expor suas pesquisas foi Cléver Cardoso T. de Oliveira (estudante de Rádio e TV da UAM e estudante de Filosofia da USP) onde apresentou as conexões entre dois filmes de Mel Gibson (Paixão de Cristo - The Passion of Christ, 2004 e Apocalypto - Apocalypto, 2006) com conceitos do filósofo político teuto-americano Leo Strauss (1899 - 1973).

Autor do livro "Direito Natural e História" é tido por muitos como o pai intelectual de todo o neo-conservadorismo norte-americano e da cúpula de dirigentes do governo Bush e das suas políticas neo-liberais. Sua obra procura combater o relativismo do olhar multiculturalista da antropologia, isto é, através da Razão e do Direito Natural, tenta encontrar um ponto de referência filosófico que permita o estabelecimento de juízos sobre culturas diversas no tempo e no espaço.

Através desse referente, por assim dizer, fixo que pairaria sobre todos os relativismos culturais, poderíamos entrar no interior de uma cultura e participar dela, ao contrário do olhar antropológico ocidental que se distância por meio de uma espécie de “olhar de sobrevôo”.

Para Cléver, os filmes de Mel Gibson A Paixão de Cristo e Apocalypto procuram exatamente isso ao utilizar-se de recursos fílmicos que permitam ao espectador, muito mais do que uma identificação, entrar no corpo do próprio protagonista e personagens.

Recursos como o da linguagem falada nos filmes ser a da própria época retratada (aramaico em Paixão de Cristo e a linguagem maia Yucateco em Apocalypto), um áudio “hiperreal” (sons exageradamente audíveis como a dos instrumentos de flagelo de Cristo utilizados pelos soldados romanos, o ranger da madeira da Cruz sob o peso de Cristo, as flechas que cortam o ar em Apocalypto etc.), os planos de câmera em ponto de vista (como de Cristo que cai quase sem sentidos após ser torturado e vê a todos ao redor de um plano invertido, o ponto de vista das cabeças decepadas que rolam pela escadaria da pirâmide maia, entre outros exemplos analisados por Cleverson.

A discussão ficou em torno dessa questão: será que essa transcendência que Mel Gibson procura no sentido de que nos despojemos do ponto de vista da cultura da atualidade e entremos na cultura daquela época retratada para que possamos fazer um juízo racional (será que os judeus foram os verdadeiros assassinos de Cristo? Será que a vingança do protagonista em Apocalypto foi justa ao defender sua família a fúria sanguinária dos maias) é muito menos religiosa ou filosófica e muito mais reflexo do conservadorismo político da era Bush? Afinal, esse esforço em buscar um D

ireito Natural para além do Direito Positivo que nos permitiria julgar ações no interior de uma dada cultura não seria um discurso que cairia como uma luva para a política internacional de luta contra o “eixo do mal” do governo Bush Jr.? Como, por exemplo, impor a democracia, mesmo que seja à força através do sacrifício de milhares de civis inocentes, a países distantes geográfica e culturalmente.

Em Apocalypto, por exemplo, a cena final do filme (os maias avistando a chegada das caravelas dos conquistadores espanhóis) vai de encontro ao ponto de vista da xenofobia do neo-conservadorismo: a força dos estrangeiros é proporcional ao enfraquecimento moral interno da cultura ocidental (vítima do relativismo e do niilismo). A epígrafe que abre o próprio filme (“Uma grande civilização não é conquistada de fora, até que tenha destruído a si mesma por dentro”) é uma pista para podermos considerar esse filme uma fábula neo-conservadora sobre a política internacional.

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