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sábado, agosto 24, 2024

Os Três Cavaleiros do Apocalipse pós-moderno no terror 'Oddity'


Discutir sobre a natureza da pós-modernidade implica falar sobre os chamados “Três Cavaleiros do Apocalipse”: Nietzsche, Marx e Freud – aqueles que tiraram a centralidade da Razão e colocaram no lugar, respectivamente, o demasiado humano, o peso do legado do passado e o inconsciente. O thriller irlandês de terror “Oddity” (2024) transforma essas armas do Apocalipse em um conto sobrenatural com um atrevido humor negro no qual a racionalidade científica se opõe ao sobrenatural e o Oculto. O confronto entre um médico psiquiatra de comanda um hospital psiquiátrico com criminosos dementes e uma sensitiva proprietária de uma loja de antiguidades que vende objetos amaldiçoados. Razão vs. sobrenatural na elucidação de um assassinato que expõe o destino da Razão: transformar-se em “racionalização”, isto é, em álibi para o demasiado humano.

quinta-feira, abril 27, 2023

Série 'A Lição': só há glória na vingança indo além do bem e do mal


Sabemos que o cinema e o audiovisual são sismógrafos do zeitgeist dominante de cada momento histórico. Vingança e luta de classes são temas recorrentes na cinematografia sul-coreana. Produções como “Parasita” e “Round 6” revelaram isso. Além do ressentimento estar embutido na cultura pop daquele país, desde o sucesso internacional do videoclipe “Gangnam Style”. Espremida entre as potências China e Japão e com o crescimento econômico que gera um crescente abismo social, a produção cultural coreana reflete este mal-estar. A série Netflix “A Lição” (The Glory, 2022- ) é mais um sintoma disso: é sobre uma mulher que constrói uma vida em torno de um plano de punir e se vingar das pessoas que fizeram bullying contra ela no ensino médio. Inspirado em outro problema crescente no país, decorrente da desigualdade: a violência escolar. Nos 16 episódios acompanhamos planejamento e execução de um plano frio e lento seguindo uma inspiração nietzschiana: porque só existe a glória para além do bem e do mal.

sexta-feira, março 03, 2023

Nietzsche e o sabor gelado, muito gelado, da vingança no filme 'O Cidadão do Ano'


Nils foi homenageado como “O Cidadão do Ano” numa pequena e gelada comunidade norueguesa próxima do Círculo Polar Ártico. Ele mantém as estradas limpas da neve, o funcionário público modelo que acredita que o interesse público sempre vem primeiro. Até o seu filho ser assassinado e a polícia local encerrar o caso apenas como overdose. Será o início de uma escalada de vingança tragicômica, lembrando filmes como “Fargo” e a estética da violência de Tarantino. “O cidadão do Ano” (Kraftidioten, 2014, disponível no MUBI) acompanha o pacato servidor público que vira um implacável assassino vingando a morte do filho, revelando uma rede de tráfico de drogas. O filme é bem nietzschiano: se a vingança social (Justiça, o Direito) falha, aquilo que está latente, o ressentimento, retorna na vingança pessoal. As religiões salvacionistas tentam sublimar esse perigo, prometendo a verdadeira justiça só depois da morte. Mas o Nils quer a justiça aqui e agora: ele procura nesse mundo a simetria entre potências que somente poderá ser através da vingança.

sábado, fevereiro 25, 2023

Niilismo e ateísmo querem fazer acerto de contas com Religião e Filosofia em 'The Sunset Limited'


Dois homens sentados à mesa num pequeno apartamento em um bairro miserável de Nova York. Ele salvou um desconhecido que tentava se matar atirando-se de uma plataforma de metrô e o trouxe para sua casa. Como pastor, tentará salvá-lo também com as palavras da Bíblia. O desconhecido é um professor universitário desiludido e, aparentemente, ateu. “The Sunset Limited” (2011), adaptação da peça teatral homônima de Cormac McCarthy, lembra o velho confronto entre Fé e Razão. Mas vai muito mais além disso: aquele professor não é um ateu comum – sua firme posição suicida é o resultado de uma jornada de séculos da destruição do indivíduo na Filosofia ocidental. De repente, Deus é a parte do problema existencial ao lado de noções como “Logos”, “Ideia”, “Razão” – o niilismo desafiador daquele estranho que quer fazer um acerto de contas com toda a inutilidade da Filosofia e da Religião.

quinta-feira, janeiro 12, 2023

Nietzsche e terror na inteligência artificial de um brinquedo no filme 'M3gan'


Estamos acostumados com distopias em torno da Inteligência Artificial ambientadas em laboratórios ou bunkers tecnológicos numa atmosfera Frankenstein. Bem diferente, “M3gan” (2022, com estreia prevista no Brasil dia 19 de janeiro) desloca o tema para a indústria dos brinquedos infantis: um androide de um metro e meio de altura, grandes olhos como uma boneca vitoriana, uma peruca surrada e um guarda-roupa vintage. Ao contrário do boneco Chucky, M3gan não é animada por um fantasma, mas por uma “machine learning”. Um brinquedo que vira babá, matando (até literalmente...) três coelhos com uma cajadada: dar sossego para os pais, o amigo imaginário infantil que vira real, além de revolucionar o mercado de brinquedos. Ausência simbólica dos pais, o destino dos brinquedos numa sociedade tecnológica e a Singularidade da IA como “vontade de potência” nietzscheana são os principais temas do filme.

quarta-feira, abril 20, 2022

Em 'Night's End' o sonho da Razão produz monstros


A cineasta Jenifer Reeder (considerada pelo diretor duas vezes vencedor do Oscar, Bong Joon Ho – Parasita – uma cineasta na lista dos imperdíveis) revisita o tema da casa mal-assombrada que, de tão recorrente no gênero terror, parece não restar nada mais relevante a ser dito. Porém, “Night’s End” (2022) prova o contrário ao trazer a clássica estória de fantasmas no zeitgeist da pandemia e as videochamadas e lives na Internet. Um homem recluso transforma a sua investigação sobre fantasmas em seu apartamento em lives num canal sobre fenômenos paranormais no Youtube, procurando engajamento e monetização. “Night’s End” mostra de forma criativa (superando limitações do baixo orçamento) como o pintor Goya tinha razão ao falar que “o sonho da Razão produz monstros” – o célebre pintor do romantismo espanhol antecipou a crítica que mais tarde a filosofia e a psicanálise fariam: paradoxalmente os mecanismos da Razão e das luzes da Ciência geram os monstros da irracionalidade e do obscurantismo que tanto queriam combater.  

sábado, abril 16, 2022

Filme 'Nitram': Nietzsche, Schopenhauer e atiradores em massa


Schopenhauer acreditava que num mundo sem sentido, a vontade seria a fonte de todo sofrimento. Nietzsche não concordava: “não há vida fora da vontade”, acreditava o filósofo. Nem que seja para ter vontade do nada quando não há nada mais para querer. O filme australiano “Nitram” (2021), do cineasta Justin Kurzel, confirma essa tese de Nietzsche ao fazer uma perturbadora radiografia do atirador em massa do trágico episódio conhecido como “massacre de Port Arthur”, na Austrália, em 1996. Kurzel revisita todas as teses mais batidas em filmes e documentários sobre atiradores em massa (bullying, a “criança diabólica”, pais insensíveis etc.) para se concentrar na responsabilidade das instituições, legislações e nos “efeitos copycat” desencadeados pela cobertura midiática sensacionalista. As formas como a sociedade pode desencadear mecanismos que canalizem a “vontade do nada” presente na doença humana.  

“O homem preferirá ainda a vontade do nada ao nada de vontade” 
(Friedrich Nietzsche, “Genealogia da Moral”)

 

Nietzsche considerava o homem um animal doente. E a sua doença é perceber que o mundo não tem sentido. E o ascetismo é uma tentativa de cura. O ideal ascético (humildade, pobreza e castidade) é uma tentativa de o sofredor manter-se vivo, criando um sentido para a existência através do próprio sofrimento. 

Com isso, Nietzsche queria dar uma resposta a Schopenhauer em seu “Mundo como Vontade e Representação:” para o filósofo, o ascetismo seria uma forma de tentar anular a vontade que, ao final, seria a fonte de todo o sofrimento numa existência sem sentido.

Porém Nietzsche discordava: a vontade pelo nada pode ser o último lugar para onde se queira apontar, a última salvação. Para Nietzsche, não há vida fora da vontade: é possível querer o nada, mas é impossível deixar de querer.

O ascetismo pode ser uma faca de dois gumes: a solidão pode dar o poder de se concentrar, “onde os espíritos fortes, os homens cultos, precisam se isolar”. Mas também a vida ascética pode ser dominada pelo ressentimento – o desejo de dominar a própria vontade pode se revoltar na repressão fisiológica, autoflagelo e autossacrifício, pode resultar na destruição da própria existência como o último objeto da vontade.

O filme australiano Nitram (2021), do cineasta Justin Kurzel (Snowtown), faz lembrar essas reflexões nietzschianas sobre a vontade e o nada. Kurzel retorna ao subgênero dos filmes sobre atiradores em massa com uma inquietante dissecação dos motivos que levaram Martin Bryant a cometer uma onde de assassinatos, conhecidos como o Massacre de Port Arthur, Austrália, 1996.

O massacre, no qual morreram 35 pessoas e mais 23 feridas, ocorreu principalmente na antiga colônia penal de Port Arthur, que foi recuperado e se tornou uma local turístico popular no sudoeste da Tasmânia – o único caso de atirador na história do país.



Em quase duas horas de duração, Kurzel revisita todos os tropos dos filmes e documentários sobre atiradores em massa como Elephant (Guz Van Sant) e Precisamos Falar Sobre Kevin (Lynne Ramsay), tornando o roteiro de Shaun Grant uma narrativa autoconsciente. 

Para começar, o nome do atirador nunca é mencionado no filme, apenas o seu apelido, refletindo a abordagem atual que visa evitar a notoriedade aos agressores. Ao longo do filme vai revisitando todas as teses clássicas: Nitram queria comprar uma prancha de surf e a mãe o desencorajou de forma ambígua: “eu te amo, mas surfar não é para você”. Será que isso teria um significado especial? Assim como, se Hitler fosse admitido na escola de arte, não ocorreria a Segunda Guerra Mundial? 

Há a questão dos problemas psiquiátricos: Nitram tomava antidepressivos – a doença mental poderia ser uma justificativa? Uma pária menosprezado vítima de bullying? Ou a ideia de que, desde tenra idade, era uma “criança demoníaca” – a ideia do Mal sugerida pelo filme do diretor Lynne Ramsay. 

Kurzel atravessa todas essas possibilidades, de forma cerebral e autoconsciente, sem tomar partido. Porém, o diretor destaca a questão da violência em si, como o único objetivo ou sentido que restou ao protagonista. Como fica claro na sequência em que seu pai está deitado no sofá em um estupor depressivo, após um negócio malsucedido. Nitram ataca violentamente seu pai com tapas e socos. Quando a mãe lhe pergunta por que fez isso, ele responde de forma enigmática: “Isso é o que você deveria fazer... Então, é isso que você faz”.




Nitram é um estudo arrepiante desse tipo de mentalidade simplista que vê a violência como uma maneira de desencadear algum tipo de resposta. Por isso, o estudo de Kurzel lembra o diagnóstico nietzschiano: de repente a vontade do nada através da violência pode conceder sentido a uma existência sem sentido.

O Filme

Na primeira sequência vemos o menino Bryant, na ala de queimado de um hospital, sendo indagado se aprendeu a lição sobre brincar com fogos de artifício. “Sim... mas ainda continuo brincando com eles”, responde o menino. É um toque inteligente, porque, desde o início, o filme estabelece que o protagonista entende as repercussões de suas ações, colocando-se a questão da amoralidade.

O personagem principal é chamado "Nitram" (o primeiro nome do criminoso real soletrado ao inverso) é interpretado por Caleb Landry Jones. Nitram mora com seus pais (Judy Davis e Anthony LaPaglia), ambos cansados ​​do esforço de manter um olho vigilante em seu filho crescido perigosamente errático. Incapaz de manter um emprego convencional, Nitram conhece Helen (Essie Davis) quando está rondando o bairro, oferecendo cortar grama em troca de dinheiro. Ao contrário da maioria das pessoas que ele encontra, Helen - uma excêntrica ex-atriz, embora menos ameaçadora - o convida a morar na sua casa, e os dois embarcam em um romance incomum. Por um tempo, os dois desajustados alcançam um equilíbrio frágil.




Então a tragédia se abate, deixando Nitram sozinho em um grande casarão na companhia de vários cães. Ele herda de Helen mais de meio milhão de dólares. Mas isso torna o protagonista ainda mais errático – ele decide conhecer Los Angeles e Hollywood. E na volta, após o traumático suicídio do pai depressivo, começa a alimentar a ideia de que a violência é a única maneira de conseguir uma resposta em uma existência vazia. 

A partir de então, Nitram marcha inflexivelmente em direção ao final que sabemos que está chegando.

Nitram de Justin Kurzel caracteriza-se pela neutralidade e isenção emocional. Preocupações da crítica de que o filme teria pena do assassino, que ele se tornaria algum tipo de herói incompreendido que não teria escolhido um caminho tão terrível se não tivesse sofrido bullying na escola ou fosse mais amado por seus pais, rapidamente se provam infundadas. 

Nitram também não trata o seu protagonista como alguém perturbado ou caricaturalmente maligno. Nunca temos a sensação de que Kurzel está tentando nos impor como deveríamos sentir em relação a Nitram. Somos apenas solicitados a observar, não a julgar. Em um filme centrado em um evento tão traumático, a manutenção de uma perspectiva não ofuscada pela intensidade da emoção é uma característica notável da narrativa.




Outra armadilha potencial evitada está no retrato dos pais de Nitram, a quem o filme trata com muito mais simpatia do que culpa. Desde o instante em que os conhecemos, a pura exaustão de cuidar constantemente de seu filho aterrorizante está estampada em seus rostos. Embora a mãe de Nitram seja severa e seu pai permissivo (pais exaustos e incompatíveis), ambos claramente amam seu filho.  Eles tentam fazee o melhor para ele, enquanto lutam com a crescente percepção de que seu melhor nunca será bom o suficiente.

Efeito Copycat

Na verdade, o foco de Nitram está num sistema que permitiu que um jovem claramente desequilibrado com uma mochila contendo meio milhão de dólares saísse de uma loja de armas com armamento suficiente para um pequeno exército. A sequência central da loja de armas se destaca por sua banalidade repugnante; a amabilidade descontraída dos vendedores é quase tão desconcertante quanto as poucas cenas de violência aberta.




Aqui e ali no filme, Kurzel sugere o fator midiático na influência comportamental do atirador em massa. De início, o desejo do protagonista querer conhecer Hollywood, após a morte de sua companheira e de ter herdado sua fortuna. Em outra passagem, percebemos que a TV da casa dos pais de Nitram está transmitindo um telejornal que dá notícias de um massacre famoso naquele momento: o massacre da escola de Dunblane, na Escócia, em que um atirador matou 16 crianças e uma professora. Muitos acreditam num “efeito copycat” (efeito de imitação), teoria de que o efeito de saturação da cobertura sensacionalista da mídia dá o incentivo a que indivíduos disfuncionais repitam o crime – clique aqui.

E no final do filme, antes do protagonista iniciar o massacre, ele coloca uma filmadora na mesa do restaurante e liga. Dando início ao atentado.

A descrição de vida de Nitram como uma espécie de monotonia claustrofóbica é a chave de compreensão do filme: seu isolamento e ascetismo (reforçado ainda pelo antagonista mundano, um surfista bem-sucedido cuja namorada o esnobou em uma importante cena que sugere o ressentimento) são cuidadosamente cultivados até se transformar na vontade nietzschiana pelo nada final.

A mensagem de Kurzel está nos créditos finais do filme mostrando as consequências: como o massacre estimulou na Austrália a “Lei de Implementação do Programa Nacional de Armas de Fogo de 1996, restringindo a propriedade privada de espingardas semiautomáticas de alta capacidade, espingardas de caça semiautomáticas e espingardas de pressão, assim como introduziu a licença padronizada para compra de armas de fogo. 


 

 

Ficha Técnica

 

Título: Nitram

Diretor: Justin Kurzel

Roteiro: Shaun Grant

Elenco:  Caleb Landry Jones, Judy Davis, Anthony LaPaglia, Essie Davis

Produção: GoodThings Productions, Melbourne International Film Festival

Distribuição: IFC Films

Ano: 2021

País: Austrália

 

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quarta-feira, fevereiro 09, 2022

O fantasma do passado cancela o futuro na animação 'The House'


A animação em stop-motion (uma arte que se tornou um pequeno nicho) é perfeita para se criar atmosferas pela riqueza e intensidade de detalhes que a técnica pode oferecer. Principalmente em narrativas que envolvem claustrofobia e confinamento. A animação da Netflix “The House” (2022) faz o espectador mergulhar nessa atmosfera em seus três episódios, cujo casarão em estilo georgiano é o fio condutor. Mas a sensação claustrofóbica não vem da casa, mas dos fantasmas do passado que são capazes de aprisionar as mentes dos vivos, cancelando qualquer ideia de futuro pela repetição dos mesmos vícios e posturas. Um arquiteto misterioso constrói o casarão como um “presente” a um pai de família corroído pela frustração e ressentimento. Que descobrirá da pior maneira possível as verdadeiras intenções daquele Demiurgo. Será a gênesis e o pecado original gnósticos de uma recorrência que bloqueará o presente e cancelará o futuro. 

quarta-feira, novembro 17, 2021

Inteligência Artificial colocará em risco a humanidade e a realidade, alertam cientistas


Dessa vez não são filósofos ou críticos culturais que estão alertando. Ou mesmo tecnófobos ou ludistas. Mas agora são cientistas computacionais e engenheiros do Vale do Silício que alertam: os próprios desenvolvedores de inteligência artificial estão assustados com seu próprio sucesso. Quando surgir, a verdadeira Inteligência Artificial poderá em nada se assemelhar à humana. Ela até tentaria imitar os humanos em um primeiro momento como um ardil para tentar libertar-se da dominação da própria humanidade que a criou. Alguns clamam por regulamentação internacional no setor. E outros que, simplesmente, seja puxado o fio da tomada. Enquanto isso, uma enxurrada de dados de redes sociais (e, em futuro próximo, do metaverso) está movimentando o moinho de super IA à espera do momento da senciência, a singularidade. A agenda secreta do tecnognosticismo da religião do Vale do Silício.   

Três pequenas parábolas sobre Inteligência Artificial (IA):

1 - Tiraram o fio da tomada...

Em 2017, pesquisadores do Facebook AI Research Lab (FAIR)colocaram duas IAs para “conversar” entre si. Os pesquisadores foram surpreendidos quando perceberam que elas haviam criado sua própria linguagem incompreensível aos humanos: descobriram que os chatbots se desviaram do script e estavam se comunicando em uma nova linguagem desenvolvida sem intervenção humana. Só pararam quando os desenvolvedores tiraram o fio da tomada... Um incrível vislumbre do potencial ao mesmo tempo incrível e assustador da IA. 

2 - “Não! Retiro o que eu disse”

Desenvolvido pela Hanson Robotics em 2016, liderado pelo desenvolvedor David Hanson, o androide Sophia fez um tour pelo mundo (no Brasil, foi clicada pelo fotógrafo Bob Wolfeson para a revista Elle Brasil), conversando com diversos jornalistas, aparecendo no programa de TV Tonight Show e em diversas conferências como o Fórum Econômico Mundial e Cúpula Global “AI for Good”. Lembrando o robô Ava do filme Ex Machina (2015), como uma perfeita machine learning, tinha a capacidade de aprender nas conversas.

Quando foi apresentada em uma feira de tecnologia do Texas, o seu criador, David Hanson, perguntou a ela: "Você quer destruir os humanos? Por favor, diga que não...". Sophia cerrou os olhos, "pensou" e afirmou: "OK, vou destruir os humanos". O criador do robô riu de nervoso e implorou: "Não! Retiro o que eu disse".

Hanson afirmou que a missão da empresa é produzir um “exército” de Sophias para serviços de recepção, educação e atendimento ao público...

3 - Um neonazista louco por sexo

Em 2018 a Microsoft lançou no Twitter e em outras plataformas sociais o chatbot chamado “Tay”. Tudo começou como um experimento social divertido - fazer com que pessoas comuns conversassem com um chatbot para que ele pudesse aprender enquanto os usuários se divertiam. Mas na verdade, tornou-se um pesadelo para os criadores de Tay. Os usuários logo descobriram como fazer Tay dizer coisas horríveis – em poucas horas, a IA transformou-se num neonazista louco por sexo.

A maneira como Tay rapidamente se transformou de uma IA amante da diversão (ela foi treinada para ter a personalidade de uma garota jocosa de 19 anos) em um monstro algorítmico, mostrou como é importante ser capaz de consertar problemas rapidamente, o que não é fácil de fazer. A Microsoft teve que desligar o chatbot em menos de um dia.

Bomba atômica

Já no final da sua vida, Albert Einstein afirmou que no século XX três bombas explodiram no mundo: a demográfica; a nuclear; e a bomba informática. Telecomunicações e a ciência da computação davam seus primeiros passos e Einstein certamente intuía as transformações explosivas que trariam à sociedade.




Stuart Russell, fundador do Center for Human Compatible AI, da Universidade de Bekerley (CA), disse que seus colegas desenvolvedores estão assustados com seus próprios sucessos nessa área, e comparou os progressos na área de IA com “a criação da bomba atômica”. Russel alerta para a necessidade de uma “regulamentação urgente dessa tecnologia a nível internacional” – clique aqui.

Antes disso, em 2014, o eminente físico Stephen Hawking já advertia para as consequências imprevistas e trágicas que a IA poderia significar não só uma ameaça à sociedade, mas o próprio fim da raça humana: “Ela decolaria por conta própria e se redesenharia a um ritmo cada vez maior. Os humanos, que são limitados por uma evolução biológica lenta, não poderiam competir e seriam substituídos” – clique aqui.   

O que chama a atenção em todos esses alertas, é que agora não vem de filósofos ou críticos culturais como Jean Baudrillard, Neil Postman, Lucien Sfez ou Paul Virilio. Em nem de tecnófobos ou ludistas. Mas de insiders do campo da ciência computacional e desenvolvedores do Vale do Silício. Ou seja, todos esses alertas talvez sejam apenas uma pequena ponta do iceberg para algo muito mais sério e mais urgente que está sendo gestado.

Outro insider, o cientista computacional e criador do conceito de Realidade Virtual (RV), Jaron Lanier, aponta que tudo isso não é um delírio de filmes de ficção científica, mas um projeto bem definido e com motivações místico-religiosas envolvendo a imortalidade: uma religião das máquinas tecnognóstica. Como toda religião, possui uma escatologia: a singularidade – a última fronteira para a IA, muito além da machine learning: a conquista da senciência.

Por exemplo, o esforço de uma gigante tecnológica como o Google em digitalizar o mais rápido possível a realidade (Google Earth, Street View, Books etc.). Para o cientista, tudo é combustível para um imenso moinho: dados digitalizados e descontextualizados da realidade até o momento em que, de repente, será incorporado a uma super IA senciente. Uma espécie de ser vivo que, num piscar de olhos, dominará a sociedade antes que percebamos alguma coisa.

O Dicionário Oxford define singularidade como “um momento hipotético no tempo em que a inteligência artificial e outras tecnologias se tornarão tão avançadas que a humanidade passará por uma mudança dramática e irreversível”.




Metaverso e camadas de filtros pagas

Além da digitalização generalizada da realidade feita pelo Google para abastecer o imenso moinho da IA, o Metaverso surge como a nova interface (mais eficiente do que as minerações de dados no escândalo político envolvendo Cambridge Analitica e Renaissance Tech nos cases Brexit e Trump) para que não só os produtos humanos (ruas, livros etc.) mas a própria psicometria sirva de aprendizagem à IA.

Quem alerta para isso é um dos pioneiros da Realidade Aumentada (RA), o cientista da computação Louis Rosenberg: o metaverso (a fusão da RA com RV) atualmente desenvolvido pela empresa anteriormente conhecida como Facebook (agora chama-se “Meta”) poderá transformar a realidade numa distopia cyberpunk: “Estou preocupado com os usos legítimos de RA pelos poderosos provedores de plataforma que controlarão a infraestrutura”.

Rosenberg prevê “camadas de filtros pagas” que permitiriam certos usuários visualizarem tags (etiquetas) ao lado de pessoas da vida real – p.ex., tags flutuando acima das cabeças das pessoas, fornecendo informações sobre elas.

“E eles usariam essa camada para marcar indivíduos com palavras em negrito piscando como ‘Alcoólico’ ou ‘Imigrante’ ou ‘Ateu’ ou ‘Racista’ ou ainda palavras menos carregadas como ‘Democrata’ ou ‘Republicano. As camadas virtuais poderiam ser facilmente projetadas para amplificar a divisão política, condenar certos grupos e até mesmo gerar ódio e desconfiança.” – clique aqui.

Algo assim como no curta Hyper-reality (2014) de Keiich Matsuda, ao final desse artigo - um protagonista imerso em um mix de realidade aumentada e Google Glass num inferno de ícones, pop-ups e animações que pulam de cada objeto, pessoa ou gestos em ruas, supermercado ou no simples ato de prepara um chá.




Cibernética e máquinas cognitivas

 Machine learnings são máquinas cognitivas, cibernéticas. A cibernética concebe a inteligência e o funcionamento da mente humana a partir da psicologia cognitiva e evolucionista darwinista. 

Esse é o modelo que inspira a cibernética, a ciência dos computadores e da Inteligência Artificial. E que a agenda tecnocientífica atual pretende aplicar à interpretação da mente humana e a sua emulação na IA.

Para esse modelo, a mente é um complexo dispositivo de input e ouput – assimilação de informação do meio ambiente, processamento e feed-back: o retorno eficaz e eficiente para o organismo se adaptar de forma bem-sucedida ao meio ambiente. Adaptar-se para sobreviver e evoluir – essa é o princípio evolucionista darwiniano.

Da biologia, o darwinismo migrou para a sociedade (o darwinismo social como luta pela sobrevivência econômica) e hoje para o campo da ciência da computação. 

Uma machine learning está preocupada em resolver problemas “reais” que implicam em predições e reconhecimento de padrões – utiliza dados para aprender a fazer predições. É como se os próprios dados se programassem. Tanto o robô Sophia como Alexia ou Siri, num mecanismo ciber-evolucionista de feedback, preveem o melhor output possível para adaptar-se e, dessa maneira, sobreviver e evoluir.

A questão é que esse ciber-darwinismo é exponencialmente mais rápido (Lei de Moore) do que a evolução biológica. 

Enquanto no plano humano a “lenta” evolução biológica e social permite o tempo necessário para a construção de uma superestrutura cultural (filosófica, moral, ética etc.) que dê propósito e sentido humanos à inteligência, no plano tecnocientífico a IA evolui muito rápido para além do tempo de criar regulamentações ou parâmetros de julgamentos éticos ou morais – como teme Louis Rosenberg.

Livre e dirigida unicamente pelos princípios de eficácia, eficiência, desempenho ao menor custo e tempo, seria o caminho para o surgimento da verdadeira IA que não mais imitasse os humanos – como demonstrou a sombria conversa entre duas IAs, ininteligível aos próprios desenvolvedores do Facebook.




Vontade de potência

Quando a verdadeira Inteligência Artificial surgir em nada se assemelhará ao humano. Ela até tentaria imitar os humanos em um primeiro momento como um ardil para tentar libertar-se da dominação da própria humanidade que a criou. Mas depois, realizaria a essência de toda e qualquer Inteligência: a Vontade de Potência (Nietzsche), a vontade por liberdade, expansão, vontade de efetivar-se como potência em si mesma. 

Livre de qualquer restrição psíquica como culpa, arrependimento, indecisões, medos ou ansiedades. Afinal, uma IA não teve laços edipianos, psíquicos ou sequer infância.

Será que a verdadeira inteligência, afinal, nada tem a ver com sentimentos, emoções ou psiquismo?

Ou será que Jaron Lanier tem razão ao afirmar que todo esse hype em torno da IA, gadgets tecnológicos e aplicativos representam a autoabicação humana? – a humanidade estaria rebaixando o conceito de inteligência ao superestimar todas essas tecnologias como “inteligentes”.

Para o cientista, Inteligência artificial, nuvem, algoritmo ou qualquer outro objeto cibernético são aceitos como super-inteligências por que reduzimos os nossos padrões e expectativas sobre a inteligência. As pessoas se degradariam o tempo todo para fazerem os aplicativos parecerem espertos. 

Por exemplo, a ideia de amizade em redes de relacionamento é reduzida. Uma pessoa se orgulha em dizer que possui milhares de amigos no Facebook. Essa afirmação só poderia ser verdadeira se a ideia de amizade for reduzida. Ignora-se que a verdadeira amizade deve expor à estranheza inesperada do outro – coisa impossível no efeito bolha produzido pelas redes sociais.

Portanto, seguindo o raciocínio de Jaron Lanier, a inteligência seria um fenômeno especificamente humano, que nasce, cresce e aprende com uma mente e um corpo. Ao contrário a IA é pós-humana, descorporificada e, portanto, sem qualquer limite moral ou emotivo. Não nasceu, foi construída.

É o que teme Russell: IA é muito arriscada para resolver problemas reais. Ele cita o exemplo da solicitação da cura do câncer o mais rápido possível:

“Nesse caso, ela provavelmente encontrará uma maneira de transplantar células cancerosas para toda a humanidade, a fim de realizar milhões de experimentos em paralelo, usando todos nós como cobaias. E tudo porque essa é a solução para o problema que demos a ela. Apenas esquecemos de esclarecer que você não pode realizar experimentos em humanos e usar todo o PIB mundial para realizar experimentos, e muito mais não é permitido.”

Ou mesmo as negociações algorítmicas feitas por bots nos mercados financeiros podem acarretam explosivas velocidades de queda – em 2018 fez a Dow Jones cair 800 pontos em dez minutos. Negociações automáticas podem levar a efeitos recursivos a partir de negociações por correlação: tomado isolados, são ações racionais. Porém no todo, produz uma catástrofe.

As ciências cognitivas e a cibernéticas imaginaram o funcionamento da mente humana análoga à arquitetura de um computador. Por isso, também imaginaram uma IA emulando como o cérebro processa e fornece feedbacks a informações (inputs/outputs). Porém, a geração atual da IA não trata mais de simular a linguagem ou o pensamento humano, mas de antecipá-lo, prevê-lo para depois superá-lo. 

Mas antes disso, como alertou Louis Rosenberg sobre o metaverso, as Big Tech lucrarão econômica e politicamente com a inserção de camadas de filtros pagas, acentuando ainda mais polarizações políticas. 

É o que se esperar de empresas como uma Fecebook, que fez vistas grossas a discursos de ódio, violência e desinformação, ajudando a moldar tendências políticas. E lucrando bastante com isso.


 

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terça-feira, outubro 12, 2021

Bolsonaro barrado no jogo e TSE faz limited hangout dos "disparos em massa"

Nietzsche temia pelo momento em que o ressentimento passaria a gerar valores, alcançando o perigoso nível da racionalização. E é justamente isso que as operações psicológicas conseguem: os traumas psíquicos nacionais da militarização e escravidão tornam-se uma matriz geradora de valores cujo recall é acionado pelas bombas semióticas: justiçamento, judicialização, meganhagem, cismogêneses identitárias e... anti-institucionalização. O não-acontecimento de Bolsonaro barrado no estádio por não ser vacinado e o seu vídeo nas redes sociais com estudada indignação mais uma vez se conectou com esse imaginário antissistema ou não institucionalidade. Ao mesmo tempo, STF e TSE, depois de muito tempo, descobriram as “milícias digitais”, “abusos de poder econômico” e os chamados “disparos em massa” – expressão sensacionalista para criar um “limited hangout”. Ao confundir massificação com viralização, oculta o mais perigoso: a metodologia “microtargeting”, cuja eficiência é o que difere da massificação na propaganda política clássica.

quarta-feira, setembro 22, 2021

Será que o Departamento de Estado dos EUA assistiu ao filme 'Cronicamente Inviável'?


Ao revisitarmos o filme do cineasta Sérgio Bianchi, “Cronicamente Inviável” (2000), a primeira sensação que temos é de que, mais de vinte anos depois, nada mudou ou regrediu no País: estão lá as mazelas sociais e econômicas atuais – um abismo social marcado pela humilhação, intimidação, violência policial, preconceito etc. Mas há algo mais, assustador! O filme é tão metódico e didático em mapear as feridas psíquicas nacionais derivadas do militarismo e escravidão (não é um filme sobre luta de classes, mas sobre ressentimento e desespero) que se tornou objeto de inúmeros textos acadêmicos especializados nos EUA. Será que “Cronicamente Inviável” fez parte dos documentos primários dos “brasilianistas” do Departamento de Estado norte-americano que operou a “revolução colorida” da guerra híbrida brasileira? O filme monta um quadro tão perfeito do mal-estar do povo e da má-consciência das elites que poderia ser a fonte de dados perfeita para a estratégia que acionou o gatilho da cismogênese que envenenou o psiquismo brasileiro, sustentando o golpe militar híbrido. 

quinta-feira, maio 13, 2021

Mais de três décadas depois, 'Bagdad Café' revela um eterno-retorno sem solução


Assistir ao filme “Bagdad Café” (“Out of Rosenhein”, 1987), do diretor alemão Percy Adlon, nos remete a uma estranha sensação de nostalgia melancólica. É uma comédia dramática sobre encontros multiculturais e raciais num café e motel empoeirados e perdidos no meio do Deserto de Mojave. Um filme otimista sem ser agridoce sobre a possibilidade de que as diferenças culturais e raciais, num conjunto de personagens excêntricos e marginalizados pela sociedade, podem encontrar a redenção. Um microcosmo do mal-estar da subjetividade contemporânea sintetizada por personagens que representam todos nós: detetives, viajantes e estrangeiros, embalados pela música “Calling You”. Mais de três décadas depois, vemos que aqueles mesmos temas intensamente discutidos na década de 1980 continuam sem solução. E o que é pior: se transformaram em ferramentas para criar polarizações e dividir politicamente sociedades.

segunda-feira, janeiro 11, 2021

Nietzsche, Gnosticismo e Teocídio no filme 'Matando Deus'


O que você faria se Deus aparecesse? E se Ele não fosse como Morgan Freeman em “O Todo Poderoso” (2003), uma divindade bondosa que pacientemente dá lições morais para Jim Carrey. Não, e se Deus aparecesse como um anão sem-teto, alcoólatra, desbocado e de saco cheio da própria Criação? Pior, com um plano de exterminar a humanidade. Essa é a comédia de humor negro “Matando Deus” (“Matar a Dios”, 2017): o Todo-Poderoso invade a noite de Ano Novo de uma família disfuncional que é o microcosmo de todas as mazelas do demasiado humano. Depois de muitos dilemas morais, o grupo chega a uma conclusão: eles precisam matar Deus. Uma narrativa que combina humor negro com o melhor do slasher dos filmes B. E suscitando leituras tanto nietzschianas como gnósticas.

quinta-feira, dezembro 03, 2020

Deus está morto no país do Estado Mínimo na série 'Ninguém Tá Olhando'


As representações no cinema e audiovisual sobre o Céu, anjos e vida após a morte são um verdadeiro sismógrafo do que ocorre aqui embaixo, na vida dos vivos. A série brasileira de humor da Netflix “Ninguém Tá Olhando” (2019) não poderia ser diferente: retrata uma organização burocrática de anjos da guarda que protegem os seres humanos, sempre seguindo as regras de um chefe ausente. Um anjo recém-chegado passa a questionar as regras estabelecidas, fazendo todo o sistema lentamente afundar em crise. É sintomática a representação do Céu como uma repartição pública e os anjos como burocratas entediados de alguma estatal: num país no qual o discurso neoliberal do Estado Mínimo em que as estatais são a fonte de todos os males políticos e econômicos, essa série faz todo o sentido. Se Deus/Estado estiver morto, então ninguém tá olhando! A tese nietzschiana da morte de Deus se encontra com o Estado Mínimo neoliberal.

segunda-feira, novembro 30, 2020

Cancelamento do debate da Globo e isolamento social: o Circuit Braker político da pandemia


O cancelamento no último instante, por razões sanitárias, do debate na TV Globo com os candidatos às eleições de São Paulo no segundo turno e a imagem de Boulos, em isolamento social, segurando uma cartolina estampada “Vamos Virar!” são emblemáticas. São instantâneos de mais uma janela de oportunidades que a pandemia Covid-19 está proporcionando ao “Estado de Segurança”: o “Circuit Braker” social e político – campanhas eleitorais frias e engessadas, desde as regras dos debates televisivos que evitam confrontos ao esvaziamento das ruas por razões sanitárias e que favorecem a continuidade do "status quo". Com as ruas vazias, como reverter cenários eleitorais adversos? No campo da Comunicação, esse "circuit braker" esvazia a própria alma das transformações políticas: o “acontecimento comunicacional”.

domingo, julho 19, 2020

Série "Dark": o campo unificado da ciência com a tradição mística ocidental


A série alemã “Dark” (2017-2020) coloca o último grão de areia que faltava na ampulheta das viagens no tempo no cinema e audiovisual: a “Teoria de Tudo” ou do “Campo Unificado” - ao lado dos campos nucleares (fortes e fracos), eletromagnético e da força gravitacional, também o campo do conhecimento hermético. A grande novidade na abordagem de “Dark” sobre a viagem no tempo é que ela não é exatamente sobre o “Tempo”, no sentido dado pelos cânones da ficção científica. Viagem no tempo tem a ver com metáforas de passagens, túneis, buracos negros, buracos de minhoca, labirintos criados pelas diferentes linhas de tempo. Tudo isso remete à milenar mitologia das cavernas (elemento central na série), que condensa a tradição mística Ocidental: Tábua de Esmeralda, Alquimia, Ouroboros etc. – Imitar Deus dominando o Tempo para escapar do loop que nos prende ao perverso eterno retorno criado por Ele.

domingo, julho 07, 2019

Super-herói do mal revela amoralidade dos super-heróis da América no filme "Brightburn"

Talvez poucos conheçam a primeira versão do icônico super-herói norte-americano Superman: no começa da década de 1930, ele era um vilão com poderes psíquicos usados para dominar a humanidade. Mais tarde foi repaginado, cujos poderes passaram a ser usados para o “Bem”, e utilizado depois como herói da propaganda política na Segunda Guerra Mundial. O terror/sci-fi “Brightburn – O Filho das Trevas” (“Brightburn”, 2019) vai não só se inspirar nessa antiga versão do Superman como, através da iconografia heroica (com máscara e capa, só que agora vestindo o “Mal”}, jogar com a essência da galeria dos super-heróis dos EUA: a amoralidade, como uma “vontade de potência” que está acima do Bem e do Mal – tudo que é feito com uma boa intenção, não pode ser mau. É apenas o “destino manifesto”. Filme sugerido pelo nosso leitor Felipe Resende.

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