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sexta-feira, junho 21, 2024

Pregação evangélica, coaching e crime financeiro em 'O Vendedor de Ilusões: O Caso Geração Zoe'


Se o demônio existe, ele está na intersecção desses mundos: a pregação evangélica combinada com técnicas de vendas e coaching “ontológico”. O argentino Maximiliano Cositorto conseguiu isso e criou um dos maiores golpes recentes de “Esquema Ponzi”: a plataforma financeira Geração Zoe, uma espécie de Matrix financeira em que os trader lidavam com número irreais, gerando lucro imaginários exorbitantes. O documentário argentino Netflix “O Vendedor de Ilusões: O  Caso Geração Zoe” (2024) narra a ascensão e queda de um negócio que prometia ganhos estratosféricos e transformação pessoal coaching. Hoje Cositorto está preso e se diz vítima do sistema que o teria sabotado. Seguindo a pista deixada por Durkheim sobre a função social dos crimes, podemos compreender porque entidades reguladoras parecem fazer vistas grossas ao surgimento desses esquemas. Por contraste, ajuda a ocultar que na verdade toda a financeirização do capitalismo já é um gigantesco Esquema Ponzi.

quinta-feira, setembro 07, 2023

Em 'CEO em Fuga: A História de Carlos Ghosn' o mundo corporativo parece uma seita


Gênios e gurus do mundo corporativo vão e vem a cada estação, sempre com um sistema messiânico que promete novos “valores” e “visões” para o sucesso. E o início desse século teve o seu: o libanês-brasileiro Carlos Ghosn, que salvou Renault e Nissan da falência. Muito bem pago e intocável teve ascensão meteórica na escada corporativa, baseada em abordagem de gestão multiculturalista. Mas, no chão de fábrica, a receita é a de sempre: corte de custo e demissões em massa. O documentário Netflix “CEO em Fuga: A História de Carlos Ghosn” (2022) descreve como essa ascensão terminou numa fuga cinematográfica do Japão após ser preso em um escândalo financeiro: dentro de uma caixa de instrumentos musicais, direto para o aeroporto. “CEO em Fuga” revela como o mundo corporativo está cada vez mais parecido com uma seita.

sexta-feira, junho 09, 2023

A invenção social do diamante no documentário 'Nada é Eterno'


A Natureza leva um bilhão de anos para fazer um diamante. Mas bastam os 87 minutos do documentário Netflix “Nada é Eterno” (Nothing Lasts Forever,2022) para desconstruir a mitologia mercadológica do “sonho do diamante”: o mito da pedra “preciosa” e exclusiva, incrustrada em anéis que celebrariam a eternidade de noivados e casamentos. O documentário descreve como o cartel do diamante criou o mito da escassez que atribuiu um valor imaginário para a pedra. Principalmente, quando diamantes sintéticos secretamente invadiram o mercado – a nível molecular idênticas aos “originais”. “Nada é Eterno” nos convida a refletir sobre a produção artificial do valor das mercadorias no capitalismo e o seu simulacro puro: a inexistência das fronteiras entre o original e a cópia, o falso e o verdadeiro, o natural e o artificial.

sexta-feira, agosto 12, 2022

'Eis o Delírio do Mundo Conectado': será que a Internet sonha com ela mesma?


O lendário cineasta alemão Werner Herzog dessa vez volta sua atenção para a Internet, no documentário “Eis o Delírio do Mundo Conectado” (“Lo and Behold: Reveries of the Connected World”, 2016). Um documentário centrado numa questão que só poderia surgir da mente de Herzog: será que a Internet sonha com ela mesma? Sim! E a World Wide Web é o seu sonho, criada sobre a rede de computadores iniciada nos anos 1960 como projeto militar e científico: a Internet. Porém, a WWW foi por um caminho bem diferente daquele imaginado por um dos pioneiros: Ted Nelson – um projeto que imaginava uma espécie de Biblioteca de Alexandria em hipertexto. Ao contrário, a WWW cresceu regida por uma lei dos cassinos de Las Vegas: a Lei dos Grandes Números, na qual a Banca sempre ganha. E suas consequências são desenvolvidas no documentário: o rebaixamento da noção de inteligência na “Inteligência Artificial” e a “Internet do Eu” com dramáticos dilemas éticos morais trazidos por um Internet com interface invisível – a Internet das Coisas.

quarta-feira, junho 01, 2022

A produção social da loucura híbrida no documentário 'I Think We're Alone Now'


Não é por menos que a guerra híbrida tornou-se a tática de intervenção política mais bem-sucedida do século XXI, impulsionando “revoluções coloridas” por todo o planeta. A cultura pop, centrada no culto das celebridades, gerou a matéria-prima psíquica necessária para a criação das cismogêneses que evenenam as sociedades. O documentário “I Think We’re Alone Now” (2008) retrata dois fãs da cantora pop adolescente dos anos 1980, Tiffany, que passaram a acreditar que estavam envolvidos em um relacionamento intenso e pessoal com a celebridade. Fãs limítrofes prisioneiros na cilada imaginária do “duplo vínculo” (Gregory Bateson), condição esquizo criada por relações familiares danificadas e ampliada pela relação paradoxal dos espectadores com as mídias que diluem as fronteiras entre relação exclusiva/anonimato, intimidade/massificação, público/privado. Oferecendo a vulnerabilidade necessária para sociedades-alvo serem corroídas por dentro.

quarta-feira, abril 13, 2022

'Jimmy Savile: A British Horror Story': esconder mostrando aquilo que se pretende ocultar


A câmera é capaz de mentir mesmo mostrando aquilo que pretende esconder? Essa é a questão central do documentário Netflix “Jimmy Savile: A British Horror Story” (2022) sobre o escândalo que explodiu após a morte do icônico DJ, apresentador de TV e filantropo inglês – um rastro de mais de 500 vítimas de abusos e estupros, principalmente de menores de reformatórios, hospitais e instituições psiquiátricas. Jimmy Savile foi por 60 anos uma celebridade do showbiz, admirado por Margaret Thatcher, amigo da família real e com uma multidão de fãs. Boatos de assédios e abusos o acompanharam, mas Savile espertamente os alimentava na mídia, diante das câmeras, para depois ser tudo abafado pela sua credibilidade que os milhões que arrecadava para a caridade construíram. Será que Savile hipnotizou toda uma nação com seu jeito excêntrico e lunático? Assim como Dr. Caligari, no clássico do cinema alemão? O caso Savile revela esse ardil do vilão do filme que teria prenunciado o zeitgeist do nazifascismo.

terça-feira, dezembro 14, 2021

'Histórias que Nosso Cinema (não) Contava' e 'Os Motéis e o Poder': militares, sexo, poder ontem e hoje


Dois eventos sincronicamente ligados marcaram a ditadura militar brasileira: a criação da Embratur e o seu projeto de investimentos em motéis e a Embrafilme impulsionando os filmes da pornochanchada. Essa aparente contradição entre o discurso moralizante da defesa dos valores da família e de Deus e o estímulo ao erotismo e pornografia na verdade revela o “sadismo de potência” clássico dos governos totalitários. O documentário “Histórias Que o Nosso Cinema (Não) Contava” (2017) e o lançamento do livro “Motéis e o Poder”, de Ciça Guedes e Murilo Fiuza de Melo revelam essa peculiar relação entre sexo, poder e sociedade. Mas também nos fazem pensar numa comparação com a atualidade: diferente do golpe militar “old school” de 1964, hoje vivemos o golpe militar híbrido. Qual seria a atual relação entre sexo e poder? Acompanhando o psicanalista Erich Fromm, poderíamos responder: o “sadismo necrófilo de destruição”, forma de sadismo “frio” no qual a destruição se sobrepõe ao prazer da excitação pelo controle do outro. 

terça-feira, dezembro 07, 2021

'A disputa de Natal': documentário sobre o Natal 'alt-right' do passado que jamais existiu


Jeremy Morris acredita que tem uma missão: compartilhar o “espírito do Natal” com o maior número de pessoas possível. Por isso, todo ano transforma sua casa num enorme presépio com camelo, coral de 35 vozes, milhares de lâmpadas e inúmeras bugigangas festivas que atrai milhares de turistas. Nem que seja ao custo de uma batalha judicial (marcada pelo "lawfare" de Jeremy Morris - ele é advogado) contra a Associação de Moradores que viu um subúrbio residencial pacato virar uma caótica atração das festas de final de ano. Uma batalha que atraiu a simpatia de grupos de extrema-direita que viram em Morris um herói que lutava contra a intolerância religiosa de... comunistas e ateus! Esse é o documentário Apple TV+ “A Disputa de Natal” (“Twas The Fight Before Christmas”, 2021), um microcosmo que mostra como a América Profunda fez emergir o fenômeno alt-right do Trumpismo, depois irradiado para todo o planeta. Principalmente pela hiper-realidade midiática que enxerta a nostalgia de um passado que jamais existiu.

sábado, novembro 13, 2021

As mentiras do Capitalismo que lava mais verde em 'Bright Green Lies'



Antes de ler qualquer coisa a respeito da conferência ambiental COP 26 e a urgência midiática a respeito das mudanças climáticas, assista ao documentário “Bright Green Lies” (2021) e o leitor terá um perfeito contraponto. O documentário da cineasta Julia Barnes, baseado em livro homônimo, desvenda a principal mentira na qual se baseia todo o hype verde: a de que as chamadas “tecnologias limpas” parecem nascer em árvores – energia elétrica, solar e eólica são produtos de uma indústria tão ou até mais devastadora dos recursos naturais do que a velha “indústria marrom”. “Bright Green Lies” revela como o ambientalismo tornou-se uma estratégia de propaganda para “lavar mais verde” o sistema predatório do capitalismo e sociedade de consumo. E transformar seus ativistas em lobistas de uma indústria sedenta por verbas públicas e incentivos fiscais. 

terça-feira, setembro 28, 2021

'Our Brand is Crisis': como Hollywood apaga os rastros das PsyOps na América Latina


Rachel Boynton conseguiu registrar os bastidores da consultoria política Greenberg Carville Shum (GCS) que levou a vitória de Gonzalo Lozada à presidência, em 2002, na Bolívia, com o documentário “Our Brand is Crisis” (2005). Para depois, Lozada enfrentar as manifestações populares, resultando em dezenas de mortos, renunciar e fugir para os EUA. O documentário descreve como a propaganda política clássica foi substituída por operações psicológicas que exploram o medo e o ressentimento coletivo. “Modus operandi” padrão das “revoluções coloridas” das décadas seguintes. Dez anos depois, Hollywood produz “A Especialista em Crise” (“Our Brand is Crisis”, 2015), versão ficcional do documentário que tenta apagar os rastros da PsyOp da geopolítica dos EUA na Bolívia e América Latina - os aspectos mais comprometedores são apagados pela típica pseudo-neutralidade psicológica que envolve mecanismos de personalização narrativa, happy end mas, principalmente, a visão do processo eleitoral como uma mera competição de marcas na liberdade de um mercado de ofertas.

terça-feira, setembro 21, 2021

Por que jornalismo corporativo está tão incomodado com documentário 'Bolsonaro e Adélio'?



Nesse momento, o jornalismo corporativo reage com o fígado (e com muitas falácias lógicas e adjetivos) contra o documentário “Bolsonaro e Adélio: uma fakeada no coração do Brasil”. Até o deputado arrependido, Alexandre Frota, ganhou manchetes com o seu pedido de “CPI da Facada” sob o impacto do documentário nas redes – mesmo bolsonarista arrependido, Frota continua útil na guerra criptografada de informações alt-right, ao contaminar uma CPI com sua “credibilidade”. Para além da estratégia morde-assopra da grande mídia (no fundo, Bolsonaro ainda é a sua única “esperança branca” neoliberal), há algo mais profundo: um misto de inveja e pânico ao ver um didático exemplo de jornalismo investigativo, há muito convenientemente esquecido pelos veículos corporativos de imprensa – um tipo de jornalismo preguiçoso que confunde “investigação” com “checagem” ou “apuração”, prática de um jornalismo que trabalha unicamente sentado.

quarta-feira, setembro 15, 2021

"Três Estranhos Idênticos": será que Hitler ganhou a guerra?


Tudo começou como um típico final feliz de um melodrama midiático: três gêmeos idênticos, separados aos seis meses de vida e adotados por famílias diferentes, por acaso se reencontram no campus de uma universidade norte-americana. Nos anos 1980 viraram celebridades e objetos de uma insaciável curiosidade do público em talk shows e programas de auditório. Circo midiático que pretendia ocultar uma realidade sombria: uma obscura pesquisa científica liderada por um psiquiatra austríaco, cujos resultados jamais foram publicados, os financiadores são mantidos no anonimato e os registros originais estão judicialmente trancafiados no acervo da biblioteca da Universidade de Yale. É o que descreve o documentário “Três Estranhos Idênticos” (2018, disponível na Netflix) que sugere as conexões entre a American Eugenic Society (“eugenia”, termo usado para tornar a expressão “limpeza racial” menos forte) e os campos de concentração nazistas. O que nos leva a suspeitar que a sociedade norte-americana atual seria a versão triunfante do modelo que Hitler queria implantar. 

terça-feira, agosto 17, 2021

Documentário 'Generation Wealth': quando o império americano cair, levará o mundo junto



Um super-rico que ostenta uma casa que é a réplica da Casa Branca; um rapper que perambula com 14 quilos em ouro e pedras preciosas em anéis, colares e piercings, a bordo das maiores limousines da América; uma motorista de ônibus que perdeu as finanças e a família com caras cirurgias plásticas; um ganancioso especulador workholic condenado pela Justiça por fraude financeira e que vive recluso na Alemanha, longe da família. O documentário “Generation Wealth” (2018, disponível na Amazon Prime Video), da fotógrafa Lauren Greenfield, tenta montar o quebra-cabeças da mudança da noção de felicidade no capitalismo com um alerta:  a patologia social da busca da felicidade através da ostentação material e estética (que esconde a própria imobilidade social) esteve presente na queda dos grandes impérios na História. A diferença atual é que quando o império americano cair, levará o mundo inteiro junto.

quarta-feira, dezembro 30, 2020

Ano de 2020 foi a temporada mais audaciosa de Black Mirror na retrospectiva '2020 Nunca Mais'


O criador da série “Black Mirror”, Charlie Brooker, tem ouvido uma piada recorrente: de que 2020 foi a temporada mais ousada de Black Mirror. Certamente foi para dar uma resposta a essa piada que Brooker criou a retrospectiva mockumentary “2020 Nunca Mais” (“Death to 2020”), disponível na Netflix. Uma curiosa retrospectiva sobre fatos reais na perspectiva de personagens ficcionais como um jornalista new yorker, um historiador britânico liberal racista enrustido, uma dona de casa suburbana e supremacista, um digital influencer que passou o ano reposicionando o discurso ao estilo Felipe Neto, a Rainha inglesa que chama os telespectadores de “terráqueos”, a dona de casa que esgotou o acervo de séries da Netflix na quarentena, etc. O ano de 2020 realizou de tal maneira quase todos os pesadelos de Black Mirror que Charlie Brooker propôs um jogo ao espectador: uma retrospectiva de fatos reais feita por personagens ficcionais que narra os acontecimentos de cada mês como um episódio de uma temporada de mau gosto. 

sábado, outubro 17, 2020

'Jodorowsky's Dune': o maior filme que nunca foi feito

Um filme que talvez fosse mais importante do que “2001” de Kubrick. Diante do portentoso volume do roteiro e storyboard da adaptação do livro “Dune” feito pelo diretor franco-chileno Jodorowsky em 1975, os grandes estúdios de Hollywood tiveram medo e recusaram um projeto no qual tinha presenças confirmadas de Salvador Dali, Mick Jagger, Orson Welles, Gloria Swanson, David Carradine. Além de trilha musical original de Pink Floyd e Magma. “Dune” de Alejandro Jodorowsky transformaria “Star Wars” (lançado dois anos depois) numa pálida imitação. A história do maior fracasso bem-sucedido da história do cinema é contada no documentário “Jodorowsky’s Dune” (2013). Se realizado, o projeto “Dune” mudaria toda a estrutura dos blockbusters como conhecemos. Mas o roteiro, imagens e conceitos de Jodorowsky foram recusados, para depois serem imitados em doses homeopáticas a partir de ‘Star Wars’: ‘Alien’, ‘Bladerunner’, ‘Indiana Jones’, até chegar em ‘Matrix’ e ‘Prometheus’.

sexta-feira, setembro 18, 2020

Entre a utopia e a distopia, 'O Dilema das Redes' esquece do principal dilema do Capitalismo


“O Dilema das Redes” (The Social Dilemma, 2020) chega à Netflix na trilha de uma série de produções sobre a manipulação mercadológica e política dos dados de usuários das mídias sociais, desde a controvertida vitória eleitoral de Trump em 2016. Mas traz uma novidade: entrevista os primeiros executivos de Bigtechs como Twitter, Facebook e Instagram. Envergonhados, tentam explicar como projetos tão altruístas deram tão errado, como o botão do “Curtir” que pretendia “espalhar positividade pelo mundo”. O documentário tenta apresentar o “dilema” que dá título à produção: as redes e aplicativos simultaneamente entre utopias e distopias. Porém, não consegue enxergar o principal dilema que tem a ver com própria natureza do Capitalismo: bens de interesse público (comunicação, conhecimento, informação) apropriados como produtos de interesse privado – o lucro.

quarta-feira, setembro 16, 2020

'The Boys' e 'O Dilema das Redes': esquerda precisa de hackers e 'artivistas'

Ataques massivos de hackers de extrema-direita estão derrubando lives acadêmicas com temáticas progressistas revelando o campo mais bruto da guerra semiótica: os ataques cibernéticos em uma terra de ninguém no qual hackers agem livres como as gangs no deserto distópico de “Mad Max”.  Escandalizada, a esquerda ainda crê no senso de obrigação moral a direitos universais ou republicanos, simplesmente ignorando o paradigma comunicacional da viralização. Séries ficcionais como a segunda temporada de “The Boys” (2019-) e o documentário “O Dilema das Redes” (2020) mostram com a tática de viralização leva ampla vantagem sobre as estratégias tradicionais de propaganda. Restará à esquerda lutar no mesmo campo semiótico da extrema-direita, mesmo que seja nos limites da moral e da ética. Como mostra a “violência metafórica” do “Freedom Kick” do coletivo de artistas ativistas “Indecline”: vídeos de protesto com esculturas de cabeças hiper-realistas de Putin, Trump e... Bolsonaro – chegam aos países afetados pelas suas políticas para os seus opositores jogarem futebol com elas. A esquerda precisa de harckers e "artivistas".

sábado, setembro 12, 2020

Na série 'Ares', 'O Guia Pervertido da Ideologia' de Zizek encontra-se com as sociedades secretas


O documentário “O Guia Pervertido da Ideologia” (2012), com o filósofo Slavoj Zizek, no qual mapeia uma série de filmes para explicar a natureza atual da ideologia, certamente contaria com a série holandesa “Ares” (2020-) como mais um exemplo audiovisual. Disponível na Netflix, acompanha uma jovem e ambiciosa estudante de Medicina que, apesar de não carregar um sobrenome com pedigree, é convidada a entrar numa sociedade secreta de universitários que mais parece um culto. Cujos participantes são capazes de identificar seus tataravôs na conhecida pintura de Rembrandt “Ronda Noturna”. Um terror psicológico que sintetiza a ideologia cínica que permeia todas as elites: “Eu sei muito bem o que estou fazendo, mas mesmo assim faço”. Uma sociedade secreta que gira em torno de um culto aparentemente demoníaco cujo propósito principal é a expiação do sentimento de culpa - o legado do colonialismo da história da Holanda na sua elite: uma riqueza fundada historicamente na exploração, escravidão e violência.  

quinta-feira, setembro 03, 2020

A mercadoria notícia da grande mídia banaliza a pandemia e seus mortos


Por que, apesar de toda a extensiva cobertura midiática da pandemia, a percepção do público parece muito mais de fastio, cansaço, do que de mobilização e emergência? Parece que a pandemia foi banalizada, como se as notícias não passassem de mais do mesmo. A grande mídia se autodescreve como de “utilidade pública”: o cidadão precisaria de informações para se orientar num momento de crise sanitária. Porém, a notícia é mais um produto mercadológico com interesses privados: atrair anunciantes e proporcionar ao espectador/consumidor uma experiência positiva. Horror, indignação ou mal-estar são sensações evitadas por estratégias discursivas: abstração dos números e infográficos, “canastricização” dos mortos, as palavras “população” e “sociedade” substituindo “classes sociais” e a indignação seletiva: aglomeração nas praias não pode, ônibus e metrôs lotados sim... desde que a aglomeração esteja gerando mais-valia aos anunciantes do noticiário.  

quarta-feira, agosto 05, 2020

Com Felipe Neto Fake News vira bomba semiótica


Combate às fake news voltou à pauta da grande mídia depois de anos de silêncio desde o hipe de 2016 e a omissão durante a campanha presidencial de 2018. Volta à pauta com um garoto propaganda: o youtuber Felipe Neto, a versão digital de Luciano Huck em seu momento mercadológico de reposicionamento de discurso, fazendo “mea culpas” e dizendo que “leu muito” e mudou de opinião. Com o influenciador digital, convidado por Rodrigo Maia para debater o tema no Congresso, a grande mídia volta a repercutir o combate às fake news como mais uma bomba semiótica: desviar o foco da atenção do respeitável público para os malvados favoritos de sempre – o “gabinete do ódio” do clã Bolsonaro e as buchas de canhão do “Brasil profundo”. Desviar do quê? Da embaraçosa questão de quem financia as caras táticas digitais e que o Projeto de Lei das Fake News faz parte de um movimento em pinça: hoje, enquadra os perfis “fascistas”. Amanhã, será a mídia alternativa de oposição. Tudo dentro da legalidade. Como sempre, “em defesa da Democracia”.

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