sábado, dezembro 31, 2011
Você Sabe que é Gnóstico quando...
sábado, dezembro 31, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Miguel Conner, escritor norte-americano de sci fi e editor/apresentador do programa radiofônico "Aeon Bytes Gnostic Radio" (programa de debates e entrevistas semanais sobre temas do Gnosticismo, literatura e cultura pop), elaborou uma lista de itens que caracterizam se você é gnóstico. Apesar do tom irônico e, às vezes, engraçado, dá para perceber a seriedade das teses do gnosticismo em cada item. Mais do que isso, demonstram que o Gnosticismo não é uma religião, doutrina ou filosofia plenamente sistematizada como afirma Stephen Holler: "O Gnosticismo é uma certa atitude da mente, uma ambiência psicológica (...) um certo tipo de alma é, por sua própria natureza, gnóstica". Se pelo menos o leitor se enquadrar em um desses itens abaixo, pode se considerar com uma séria inclinação à visão de mundo gnóstica.
sexta-feira, dezembro 30, 2011
Os Fantasmas do Tempo no Filme "Christmas Carol"
sexta-feira, dezembro 30, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O livro “Christmas
Carol” (Um Cântico de Natal, 1843) de Charles Dickens é atemporal por
apresentar dois grandes arquétipos que marcarão a vida moderna: Fantasmas e o Tempo.
Ao fazerem uma adaptação usando animação digital (através da tecnologia de “captura
de performance”), a Walt Disney Pictures e o diretor Robert Zemeckis ("De Volta para o Futuro" e "Forrest Gump") produzem
um efeito paradoxal: esvaziam o olhar crítico de Dickens sobre o início da
modernidade ao reduzir a narrativa à estética videogame por meio de uma
tecnologia moderna. O Ocultismo e a problematização do Tempo, marcas da
literatura do século XIX como formas de questionar a modernidade, são temas
oportunos para uma reflexão nesses momentos que antecedem a celebração de Ano
Novo onde todos querem reter um momento do tempo, que então será passado.
O livro clássico de Charles Dickens “Christmas Carol” já recebeu centenas de adaptações. É um dos livros mais lidos,
lembrados e citados de todos os tempos. A narrativa conta a estória de Ebenezer
Scrooge, velho ranzinza e sovina que passou a vida inteira juntando uma
fortuna, desprezando qualquer contato com as pessoas. Ele odeia o Natal por
achar que é uma época onde as pessoas gastam mais do que têm e ironiza como
gente tão pobre pode ser feliz. Na noite de Natal recebe a visita de três
fantasmas (que mostram para ele as visões do passado, do presente e do futuro)
levando-o a uma transformação íntima e reavaliando o significado da vida.
Só para ficar no cinema (as adaptações do livro de Dickens
abrangem teatro, televisão, ópera, história em quadrinhos etc.) existem
adaptações desde 1901. Desde então praticamente toda década há alguma
adaptação, referência ou revisitação da obra, passando pelos mais diversos
gêneros.
De Walt Disney temos o personagem do Tio Patinhas (Uncle
Scrooge) inspirado no protagonista avarento do livro de Dickens, um curta de
1983 “Mickey’s Christmas Carol” e o recente “Os Fantasmas de Scrooge” (Christmas
Carol, 2009) dirigido por Robert Zemeckis (“De Volta para o Futuro”, “Forrest
Gump” e “Contato”).
Essa produção repete a velha fórmula dos estúdios Disney: a
capacidade de lidar com temas trágicos, pesados e adultos de uma forma
divertida para crianças e jovens ao diluir simbolismos arquetípicos. No caso da
adaptação de Zemeckis, a utilização da tecnologia chamada “captura de
performance” onde a animação digital é feita a partir do escaneamento das
expressões dos atores. O diretor já havia utilizado essa tecnologia em “A lenda
de Bewulf” e “Expresso Polar”, mas em “Os Fantasmas de Scrooge” há um estranho
efeito: se a maior qualidade do conto de Dickens é a sua atemporalidade, na
produção Disney a tecnologia converte a narrativa, em muitos momentos, em um
videogame com cenas de ação desnecessárias. Os grandes temas arquetípicos da
obra de Dickens (que induzem à reflexão existencial e moral das ações humanas) são
esvaziados pelo ritmo frenético e uma estética cujas opções que o protagonista
sovina tem que tomar parecem alternativas de um game em computador.
quarta-feira, dezembro 28, 2011
O Filme "El Método" e a "Gameficação" da Realidade
quarta-feira, dezembro 28, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Games de simulações de atividades militares, administrativas etc. poderiam representar que a própria realidade pretensamente simulada já é, igualmente, um game? A “gameficação”,isto é, a exploração do elemento “lúdico” como ferramenta de administração treinamento, gestão etc, seria o sintoma da "gameficação" da própria realidade? O filme "O Que Você Faria? (El Método, 2005) remete a essas questões ao denunciar que as organizações atuais estão se convertendo em games perversos e autistas.
quarta-feira, dezembro 21, 2011
Papai-Noel Vinga-se do Cristianismo no Filme "Uma Noite de Fúria"
quarta-feira, dezembro 21, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Um filme “trash” como “Uma
Noite de Fúria” (Santa’s Slay, 2005) trás muito mais verdades do que toda a
filmografia que pretende trazer fé e esperança por meio de uma figura tão
controvertida como Papai-Noel. A recorrência de filmes que apresentam uma visão
“pagã” ou “satânica” do mito natalino, confirma as origens histórico-políticas de Papai-Noel: Santa Claus e Satã são os dois lados de uma mesma
moeda criada pela Igreja para que o Cristianismo ganhasse hegemonia sobre
culturas dominadas por rituais de fertilidade que relembravam os ciclos da
natureza, morte e renascimento.
Em postagem anterior, ao analisarmos o filme finlandês “Rare
Exports: A Christmas Tale”, cujo diretor foi buscar no folclore finlandês as
origens pagãs do Papai-Noel (selvagem, sem nenhuma boa vontade e perseguidor de
crianças), discutíamos a existência de um imaginário subterrâneo no mito
natalino, muito recorrente no cinema. Um imaginário bem diferente e menos
altruísta do que a tradição cristã que credita as origens de Papai-Noel a São
Nicolau (século IV DC).
A lista de filmes que apresenta essa visão “alternativa” do
Papai-Noel (ou “Santa Claus”) é imensa. Só para listar alguns: Bad Santa (2003), Black Christmas (1974),
Christmas Evil (1980), Silent Night, Deadly Night (1984), Jack Frost (1996),
Don´t Open Till Christmas (1984) etc. Definitivamente, não são filmes recomendáveis para serem assistidos na noite de Natal, mas dão o que pensar:
porque essa recorrência dessa figura maligna do Papai-Noel no cinema? Apenas exemplos da estética
trash? Filmes que simplesmente querem romper com a monotonia da figura do bom
velhinho? Ou simplesmente diversão sadomasoquista?
Se acreditarmos que os filmes são muito mais do que mero
entretenimento, mas documentos primários para estudarmos a sensibilidade, o
imaginário ou os sintomas culturais de uma época, então temos que levar a sério
a recorrência de certos temas, simbologias ou iconografias nas narrativas
fílmicas. Evitar o julgamento simplista que pretende descartar filmes sob rótulos como "comercial", “trash” ou "de entretenimento". Em outras palavras, recorrências no cinema sempre são sintomas de sérios conteúdos
antropológicos ou culturais da espécie (mitos, arquétipos, imaginários,
mitologias etc.).
O filme “Uma Noite de Fúria” (Santa’s Slay, 2005) é mais um
exemplo de filme que explora esse imaginário subterrâneo do Papai-Noel. Mesmo para
quem não gosta do gênero, o filme vale pela sequência inicial: uma família vai
iniciar a ceia de Natal (com participações especiais de James Caan, Fran Drescher, Chris Kattan etc.) entre
diálogos ríspidos e cínicos com acusações veladas e ironias sobre infidelidade,
preconceitos e um peru que virou “sola de sapato” de tão duro. De repente, eis
que desce pela chaminé, destruindo todos os tijolos da lareira, um Papai-Noel
com a aparência de um viking enlouquecido que inicia uma bizarra série de
assassinatos, massacrando toda a problemática família.
segunda-feira, dezembro 19, 2011
Papai-Noel Pode Matar em "Rare Exports: a Christmas Tale"
segunda-feira, dezembro 19, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Se Papai Noel é um personagem tão altruísta, por que ele trabalha na clandestinidade? Por que muitas crianças temem a figura de Papai Noel em shoppings e parques? Por que a constante presença de papais-noéis assassinos e aterrorizantes na cinematografia? Essas questões em relação ao mito do Papai Noel são as motivações para o jovem diretor finlandês Jalmari Helander a desconstruir o imaginário desse personagem. Jalmari vai buscar as origens do mito natalino no folclore pagão, anterior à conversão cristã e norte-americana através da publicidade da Coca-Cola: há um imaginário subterrâneo e esquecido em torno do mito do Papai-Noel que insistentemente ressurge na cultura.
Jalmari tem dedicado sua carreira a expor a verdade de que o Papai Noel não é tão bom quanto parece. Após dois curtas premiados sobre o tema (a origem Finlandesa do personagem, antes da sua reconversão pela Coca-Cola no século XX), o diretor nos premia com essa pequena pérola do fantástico: “Rare Exports: a Christmas Tale”, vencedor de festivais do gênero terror e fantástico como Locamo na Suiça e Sitges na Catalunha.
Por que muitas crianças choram de medo na presença dessas figuras que habitam shopping centers e lojas no natal? Por que insistentemente o cinema de terror explora esse lado assustador do personagem (por exemplo: "Elves" - 1989 ou "Santa's Slay" - 2005)? Há até um nome para esse tipo de fobia infantil: coulrofobia, o medo que se estende, também, para a presença de palhaços ou "clowns".
Embora as origens oficiais ou cristã do Papai-Noel (ou "Santa Claus") estejam associadas à figura de São Nicolau, um jovem bispo de Myra (Turquia) do século IV DC (conhecido pela generosidade e por dar presentes, tornado-se o santo padroeiro das crianças), há uma origem pagã anterior a sua conversão pela Igreja. Uma origem de moralidade ambígua e cruel, própria das origens dos contos de fadas que acabou sedimentando-se em um imaginário subterrâneo que resiste aos tempos.
sexta-feira, dezembro 16, 2011
Segundo Aniversário do Blog "Cinema Secreto: Cinegnose" - um resumo
sexta-feira, dezembro 16, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
No dia 8 de dezembro de 2009 era publicado o primeiro post do blog “Cinema Secreto: Cinegnose”: “O Filme Gnóstico: uma Introdução”. O Blog é uma continuidade do projeto de mestrado desenvolvido na Universidade Anhembi Morumbi entre 2007 e 2009 “Cinegnose: a recorrência de elementos gnósticos na recente produção cinematográfica norte-americana (1995 a 2005)” sob a orientação do Prof. Dr. Luiz Antônio Vadico e do Grupo de Pesquisa CNPQ “Religião e Sagrado no Cinema e Audiovisual”.
A principal preocupação editorial do Blog nesse segundo ano
foi a de trazer para a prática as reflexões da filosofia gnóstica. Depois do
primeiro ano onde a preocupação inicial era amadurecer os principais pontos
filosóficos, teológicos e cosmológicos do Gnosticismo, além de dar aos leitores
a sua dimensão histórica (origem, evolução e, principalmente, o atual “revival”
na indústria do entretenimento), nesse segundo ano procuramos dar uma linha
menos “doutrinária”.
Percebíamos na oportunidade que o termo “gnosticismo” estava
carregado de uma percepção religiosa, sectária ou doutrinária. A filosofia
gnóstica pode ser tudo, menos isso: pelo contrário, ao sustentar posições
heréticas e anti-religiosas por oferecer uma compreensão “invertida” e teologicamente
“negativa”, o Gnosticismo se situa historicamente numa posição underground de
rebelião.
Nesse segundo ano, portanto, o blog procurou seguir duas
linhas editoriais: primeiro, uma massiva análise fílmica indo para além dos
clássicos filmes gnósticos na área sci fi, fantástico etc. Procuramos
demonstrar que as narrativas míticas e arquétipos gnósticos estão presentes em
diversos gêneros, desde dramas ou animações hollywoodianos (“O Paraíso é logo Ali” ou “Kung Fu Panda”, filmes “trashs” e indepentes (“Ultrachrist” e
“Rubber, o Pneu Assassino”) e produções audiovisuais (Mister Maker: o sabor gnóstico para crianças).
terça-feira, dezembro 13, 2011
O Olhar Gnóstico de Kubrick
terça-feira, dezembro 13, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Recluso e avesso a jornalistas, o cineasta Stanley Kubrick revela em uma das suas poucas entrevistas um olhar bem particular para a vida: para ele, vivemos em um Universo indiferente e sem sentido que corrói a nossa vontade de viver. Nossa única saída seria desafiar essa indiferença ao suprir de Luz a "vasta escuridão" da existência. Esse olhar gnóstico pode ser a chave de compreensão da obra de Kubrick, principalmente da chamada "Trilogia Star Child": "Dr. Fantástico", "2001" e "Laranja Mecânica".
Semana passada li o livro "Stanley Kubrick Interviews". O diretor de clássicos como "Laranja Mecânica", "O Iluminado" e "Barry Lyndon" era avesso a entrevistas: preferia que os filmes falassem por ele. Esse livro reúne as poucas entrevistas do recluso cineasta falecido em 1999, abrangendo o período que vai de 1959 a 1987, revelando diversos interesses de Kubrick tais como a exploração espacial, psicanálise, efeitos da violência e religião.
O destaque é uma entrevista concedida a Eric Nordern para a revista "Playboy" em 1968. Na oportunidade Kubrick revelou uma surpreendente visão gnóstica da existência
cuja convicção pode ser a chave de entendimento na análise dos filmes do
diretor, principalmente das produções da trilogia dessa época iniciada com “Dr.
Fantástico” em 1964 e encerrada com “Laranja Mecânica” em 1971, a chamada trilogia
“Star Child”, como veremos abaixo.
Primeiro, vejamos esse trecho da entrevista de Kubrick a Eric Norden
onde discute uma especial forma de niilismo diante da existência: a maneira de
lidar com um Universo indiferente e sem sentido a partir do resgate do
“imaculado sentido de admiração das coisas simples” da infância, esquecido por
nós na medida em que desenvolvemos a consciência da morte na vida adulta:
domingo, dezembro 11, 2011
A Princesa não quer acordar em "A Bela Adormecida"
domingo, dezembro 11, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Concorrente à Palma de Ouro em Cannes, “A Bela Adormecida” (Sleeping
Beauty, 2011) da estreante diretora australiana Julia Leigh desconstrói o conto
de fadas clássico: e se a princesa não quisesse acordar? O cenário é o de uma
sociedade onde o trabalho foi precarizado e a “princesa” é uma “freelance” numa
roda-viva de subempregos marcada pela frieza emocional e onde príncipes foram
substituídos por um submundo de milionários sexualmente pervertidos em uma
mansão de “serviços à inglesa”.
Na versão original do francês Charles Perrault do conto “A Bela Adormecida” uma princesa é amaldiçoada a
dormir por cem anos até ser despertada pelo beijo de um belo e corajoso príncipe
que enfrentou uma floresta de espinhos venenosos para entrar no castelo. Cinquenta e dois anos depois da última releitura desse conto por Walt Disney em 1959, a
escritora australiana Julia Leigh ("The Hunter" e "Disquiet"), em sua estreia como diretora, revisita a
clássica estória de uma forma invertida: e se a princesa não quisesse acordar? Ela
não possui um reino, mas é solitária. E sempre visitada por homens que não são
mais príncipes, mas visitantes de uma só noite que se aproveitam sexualmente
dela enquanto está imersa no seu sono voluntário.
Indicado à Palma de Ouro
de Cannes nesse ano, o filme “A Bela Adormecida” reduz o clássico conto de
fadas ao seu núcleo mítico ou arquetípico: o sono e o esquecimento. Através de
uma narrativa estranha, espectral, etérea e fria narra a trajetória de uma “princesa”
contemporânea, Lucy (Emily Browning), uma estudante universitária em Sidney, Austrália,
de pele branca leitosa e cabelos de cor vermelho-ouro, onde, tal qual um
hamster correndo em uma roda de gaiola, vive em uma ciranda de subempregos e
identidades fragmentadas: cobaia remunerada de um laboratório, garçonete em um
café, operadora de uma fotocopiadora em um escritório e, ocasionalmente,
prostituta em pubs frequentados por yuppies.
Como pano de fundo, uma
relação complicada com a mãe alcoólatra e com um amigo chamado Birdman que também
está lentamente morrendo no alcoolismo e com quem Lucy, estranhamente, tem uma
relação de culpa. Aliás, também é estranha a roda-viva de subempregos à qual
Lucy se submete: tal como um zumbi, sem expressar sentimentos, automaticamente
exerce suas funções. Ela parece uma sonâmbula que voluntariamente quer se esquecer
de algo como forma de proteção emocional.
quarta-feira, dezembro 07, 2011
A "Religião das Máquinas" no Filme "13° Andar"
quarta-feira, dezembro 07, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O sucesso de crítica e
de público de “Matrix” (1999) acabou, à época, eclipsando o filme “13° Andar”
(The Thirteenth Floor, 1999) , considerado muito superior. Embora guardassem aspirações
bastante similares (discutir a condição humana diante das tecnologias de
simulação e virtualização), “13° Andar” substituiu a profusão de referências e
diálogos filosóficos de “Matrix” (uma estratégia desesperada para justificar
lutas marciais, ação e bullet-times) por uma narrativa que por si mesma instigava
essas questões filosóficas. Porém, ambos os filmes se tornaram documentos do
imaginário tecnocientífico dominante no final de século XX onde associava a
tecnologia computacional com uma motivação mística por transcendência
espiritual, uma verdadeira “religião das máquinas”.
Se o historiador francês Marc Ferro estiver correto, todo
filme é uma representação da sensibilidade ou do imaginário de determinada
época, tornando, especialmente o cinema de ficção, um excelente caminho para a
história psicossocial, nunca atingida pela análise de outros tipos de
documentos (Veja FERRO, Marc. Cinema e História, São Paulo: Paz e Terra, 1992.
No final da década de 1990, dois filmes marcaram o ápice de
um ciber-imaginário marcado pelo crescimento especulativo da Internet,
tecnologias computacionais e realidade virtual: “Matrix” e o “13° Andar”, ambos
lançados em 1999.
A partir do lançamento bombástico do Windows 95 toda a
imprensa especializada e produções acadêmicas foram tomadas por duas tendências
distintas: primeiro, pelo espírito messiânico que via nas tecnologias virtuais o
potencial para revolucionar a economia real e, ao mesmo tempo, o crescimento
das técnicas motivacionais ou de auto-ajuda explicitamente baseados em modelos
computacionais (o cérebro e o próprio Self como um software reprogramável). E,
segundo, o espírito distópico que via na virtualização do real uma armadilha na
qual a humanidade cairia ao esquecer as demandas da realidade.
Porém, essas duas visões distintas guardavam algo em comum:
o ciber-misticismo. Os filmes “Matrix” e o “13° Andar” representaram essa
síntese de final de século ao unir através do cibermisticismo esses dois
enfoques opostos dos mundos tecno-empresarial e acadêmico. Ambos os filmes aproximam
tecnociência e misticismo ao apresentarem a tecnologia computacional como
mediação possível para a transcendência espiritual.
segunda-feira, dezembro 05, 2011
"O Clube da Luta": a Busca da Gnose entre o Consumismo e a Violência
segunda-feira, dezembro 05, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A atmosfera
distópica e niilista do filme “O Clube da Luta” (Fight Club, 1999) do diretor
David Fincher (“A Rede Social”) cria um cenário trágico, mas, principalmente,
ambíguo. O filme parece ter sido composto dentro de uma “zona cinza”, entre a
vida obscura e anônima onde alimentamos sonhos de consumo e a busca de alguma
saída messiânica, negativa e totalitária. A narrativa procura o meio termo: a
busca da iluminação espiritual por meio da busca de si mesmo através do
silenciamento do corpo e do pensamento, nem que seja através da violência.
Buscar a iluminação através do desprezo pelo “mísero composto universal” do
qual fazemos parte.
Incomunicabilidade, alienação e impossibilidade de
transformação são temas recorrentes na filmografia do diretor David Fincher:
entre o recente “A Rede Social” (onde um gênio em algoritmos de Havard com
grande dificuldade em se relacionar desconta sua ansiedade difamando pessoas em
um blog) e o mais antigo “Vidas em Jogo” de 1997 (um milionário frio e
solitário é submetido a um tratamento de choque por meio de um "roller play game" contratado pelo irmão na esperança de conscientizá-lo), temos o cultuado e
enigmático “Clube da Luta” com os mesmos temas, porém carregado de uma
ambiguidade explosiva como veremos abaixo.
Baseado no livro homônimo de Chuck Palahniuk de 1996, para
Fincher o grande tema de “Clube da Luta” era a emancipação assim como os filmes
“A Primeira Noite de um Homem” (The Graduate, 1969) ou “Juventude Transviada”
(Rebel Whithout a Cause, 1955), mas, dessa vez, para jovens adultos na faixa
dos 30 que vivem na sociedade atual que impede o amadurecimento: “fomos
projetados para sermos caçadores, mas vivemos em uma sociedade de shoppings.
Não há mais pelo que caçar, pelo que lutar, superar ou explorar. No interior
dessa sociedade da castração é que foi criado o protagonista do filme”, afirma
Fincher para completar: “para o protagonista encontrar a felicidade o único
caminho possível será viajar através de uma iluminação no qual mate seus
familiares, seu deus e seu professor” (VEJA Smith, Gavin (Sep/Oct 1999). "Inside Out: Gavin Smith Goes
One-on-One with David Fincher". Film Comment 35 (5): pp. 58–62, 65,
67–68.)
sexta-feira, dezembro 02, 2011
Será a Realidade um Filme Mal Produzido? (Parte 3) - Filmes "Mad City" e "Wag the Dog"
sexta-feira, dezembro 02, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Com essa postagem encerramos a
trilogia sobre as mutações na percepção da realidade. Na década de 1990 dois
filmes iniciam uma nova visão crítica da mídia e do Jornalismo: “O Quarto Poder”
(Mad City, 1997) de Costa Gavras e “Mera coincidência” (“Wag The Dog”, 1997) de
Barry Levinson. Em ambos os filmes a crítica não está mais na manipulação
política dos fatos por jornalistas e interesses econômicos, mas em uma denúncia
“metafísica” de que a realidade estaria tornando-se um “constructo” do próprio
aparato midiático que pretende representá-la como notícia e informação. A realidade
progressivamente assume aspectos de um estúdio de TV a céu aberto a tal ponto
que não mais se distingue a verdade e a mentira, a ficção e a realidade.
A década de 1990 foi marcada por uma safra de filmes
hollywoodianos que começam a tematizar as relações da mídia e jornalismo não
apenas com os fatos ou as notícias, mas com a própria realidade. Se em outras
décadas tivemos diversos filmes que denunciavam o caráter manipulador dos
interesses políticos e econômicos de repórteres e dos conglomerados midiáticos
(A Montanha dos Sete Abutres, 1951; Todos os Homens do Presidente, 1976;
Network: Rede de Intrigas, 1976 etc.), na década de 1990 acompanhamos produções
que vão além da denúncia da manipulação ao lançar uma estranha suspeita: o que
entendemos como “realidade” pode estar se tornando um gigantesco estúdio onde
acontecimentos são produzidos direta ou indiretamente pela presença dos
aparatos de captação do real (câmeras, microfones, repórteres etc.): Ed TV
(1999), Show de Truman (Truman Show, 1998), Herói por Acidente (Hero, 1992), O
Quarto Poder (Mad City, 1997), Mera Coincidência, (Wag the Dog, 1997) etc.
Vejamos o caso do filme “O
Quarto Poder”. Desde o filme “Z” (1969) sobre abusos da ditadura militar na
Grécia, Costa Gavras se notabilizou como adepto do cinema político, mas nesse
filme em particular o diretor abandona o campo da política institucional (o
Estado, o Poder, a Repressão Política etc.) para entrar no ambíguo tema do jogo
de mútuos reflexos entre mídia e realidade.
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