quarta-feira, junho 13, 2018

Cinegnose discute bombas semióticas e guerra híbrida na FACIP/Universidade de Uberlândia



Na noite da última quinta-feira, 07/06, no Anfiteatro I do Bloco B da Faculdade de Ciências Integradas do Pontal/UFU – Universidade de Uberlândia – este humilde editor do “Cinegnose” ministrou a palestra de abertura do Curso “O Golpe de 2016 e o futuro da democracia”. “Guerra Híbrida e Bombas Semióticas” foi o tema discutido depois que esse blogueiro estoicamente enfrentou o pânico de avião. A contribuição que a Semiótica e as ciências da comunicação podem dar como ferramenta para dissecar a ação da grande mídia na guerra híbrida e as detonações das chamadas “bombas semióticas” que transformam opinião pública em “clima de opinião”. E também como referência para ações anárquicas anti-mídia, tendo em vista a centralidade da grande mídia e da judicialização da vida pública brasileira.

Com o gentil convite dos professores Ângela Teles e Marco Sávio, esse humilde blogueiro fez apalestra de abertura do curso Golpe de 2016: o futuro da democracia no Brasil no campus avançado da Universidade Federal de Uberlândia, em Ituiutaba, MG, neste último dia 07/06.

“Guerra Híbrida e Bombas Semióticas Brasileiras” foi o tema da discussão. Mas com uma pergunta como subtítulo: “Por que aquilo deu nisso?”

Por “aquilo” entendendo-se as famosas “jornadas de Junho” em 2013 (que nesse mês completam-se cinco anos), evento que até hoje parece que ainda não foi uma bem compreendido ou assimilado, principalmente pelo espectro político mais à esquerda. Mas que deram “nisso” – um governo ilegítimo com o maior índice de reprovação na História da República e dois acontecimentos simbólicos que comprovam atual estado de coisas: uma greve/locaute dos caminhoneiros que ameaçou derrubar um governo.

E o desinteresse da população em torno da Copa do Mundo (53% pelo Datafolha) como evidência que a população está mais preocupada é com seu futuro econômico e político incertos.

O Curso “O Golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil” vai de 09/06 a 01/09, aos sábados. Acompanhe aqui a programação. Estamos aguardando a publicação on line do vídeo da palestra para podermos disponibilizá-lo aqui no blog.


A recorrência da Guerra Híbrida


A fala desse editor do Cinegnose começou com uma simples constatação empírica: se a recorrência é um método científico válido (descobrir padrões, repetições etc.), então é bem significativo que o script das jornadas de manifestações que alcançaram o ápice em 2016 com o impeachment obedeceu o mesmo roteiro das diferentes “primaveras” que circularam o mundo.

Evidência de uma geopolítica dos EUA baseada na Guerra Híbrida: ao invés de SEALS ou mariners dando apoio militar a golpes, temos a política como extensão da guerra por vias semióticas.

Judicialização de todas as questões nacionais, ao lado do auxílio luxuoso das chamadas “bombas semióticas” que criam uma narrativa sobre climas de opinião, é o cerne dessa Guerra Híbrida. E por que “semióticas”? Por que essa área da comunicação vai para além da linguística, retórica e persuasão. Como operações semióticas criam climas de opinião, percepção, impressões difusas.

No início este humilde blogueiro apresentou a especificidade da atual tática de Guerra Híbrida em relação ao golpe militar de 1964 – enquanto lá tínhamos a estratégia hipodérmica de doutrinação, inculcação e massificação de slogans anticomunistas, o que temos na atualidade são “bombas” que explodem na opinião pública diretamente na psicologia de massas.


Engenharia cognitiva


Como? Esse foi o trabalho inicial da palestra em Ituiutaba. Vimos como a inteligência militar dos EUA já possuía essa familiaridade inovadora com essa verdadeira engenharia cognitiva. Enquanto Goebbels atuava no campo hipodérmico da ideologia e doutrinação, os EUA criavam a Ghost Army na invasão aliada pós Dia D – destacamento especial formados por carros militares infláveis, cenografia e sistema de som para criar a percepção nos inimigos de tropas e artilharias gigantescas em deslocamento. Em pânico, divisões nazistas na França batiam em retirada... sobre isso clique aqui.

Pois em táticas como essas já estava, em germe, toda a atual engenharia de opinião pública, cujo conceito se transforma em “clima de opinião”.

Os passos da guerra híbrida brasileira


Na palestra apresentamos os passo-a-passo das fases em que desenvolveu a Guerra Híbrida a partir de 2013.

Primeira etapa, percepção de caos. Com a grande mídia em consonância mostrando incêndios, bandeiras nacionais esgarçadas nas ruas, os icônicos black blocs (para onde eles foram?) e o rouba da narrativa pela mídia com o discurso da corrupção, cria-se o clima de incerteza, paranoia. Soma-se ao descontrole político, o suposto descontrole econômico. Imagem icônica: a apresentadora Ana Maria Braga com um colar de tomates... os tomates inflacionados assassinos!


Segunda etapa: Uma etapa mais, por assim dizer, “etnográfica” na qual a grande mídia começaria a criar as novas hostes de jovens neoconservadores que no futuro iriam vestir de camisas amarelas da CBF e sair nas ruas apoiando o impeachment: “novos tradicionalistas”, “simples descolados”, “coxinhas 2.0”, gourmetização etc. Uma nova geração formada pelos valores meritocráticos, anarcocapitalistas e desconfiança a tudo que pertença à esfera pública: política Estado, partidos, sindicatos etc.

Num terceiro momento, com as manifestações já evoluindo para “Não Vai Ter Copa!”, entra a naturalização da narrativa política através da narrative ficcional: miniseries e novelas que começam a replica o que ocorria nas ruas.

Um exemplo foi a minissérie da Globo Questão de Família na qual Eduardo Moscovis fazia um juiz da Vara de Família justiceiro. Eco de Sérgio Moro, o juiz de primeira instância que mais tarde se consolidaria em super-herói de bonecos infláveis nas manifestações.

Nesse momento, a palestra derivou para o conceito de “canastrice” como elemento politico-ideológico: como personagens e narrativas no mundo real são legitimadas através da ficção por personagens canastrões e overacting. Foi discutido o filme Mera Coincidência (Wag The Dog, 1997). Assim como Hitler e Mussolini emularam personagens dos filmes mudos (justificando suas performances canastronas em público), da mesma forma o juiz Sérgio Moro torna-se verossímil com os inúmeros filmes de super-heróis da Marvel e DC Comics que invadem os cinemas pelo planeta. “Coincidentemente” no auge das turnês das várias “primaveras” pelo planeta – afinal, para os super-heróis, acima do certo e do errado só existe a Justiça... e não importam aos meios.


O veneno da polarização política


E como quarta e última etapa, radicalização e polarização. O envenenamento do psiquismo nacional até ponto em que foi impossibilitado qualquer tipo de debate político.

Vimos, o quanto essa tática de polarização ecoa de pesquisas em comunicação como Paul Lazarsfeld, nos anos 1940 sobre pesquisas empíricas sobre seletividade e predisposição do público. E as táticas de ação direta de Gene Sharp – trabalhos com algoritmos em redes sociais (web bots, efeito-bolha etc.) para a incitação do ódio e intolerância.

Nessa altura, discutimos o filme Terra Prometida (Promised Land, 2012): como uma ação de engenharia de opinião pública pode ser capaz de controlar os dois lados de um debate, produzindo um controle dos resultados em um debate – e, no caso do filme, em uma eleição.

Próximo ao final vimos três critérios para detectarmos uma tática de engenharia de opinião pública: mídias em consonância, acumulação e onipresença. Conceitos mobilizados para criar climas de opinião que produzam “espiral do silêncio” – a falsa percepção que a sua opinião está em minoria, fazendo-o se calar ou adaptando a opinião a uma suposta maioria.

Sem haver uma voz sequer de contraponto ou meio termo, a grande mídia fechou totalmente à favor da agenda do golpe e o projeto econômico neoliberal. Em acumulação, com coberturas diretas, diárias etc. E com onipresença: diferentes mídias ou plataformas repercutindo a mesma agenda.


O que fazer?


E ao final e nas perguntas da plateia veio a clássica questão: o que fazer?

Esse humilde blogueiro insistiu na necessidade de a esquerda jogar no mesmo campo simbólico da direita. Simplesmente o apelo à racionalidade da opinião pública por meio de denúncias que revelem “a verdade” que está por trás do golpe não é o suficiente.

Se o que sustenta a grande mídia é a credibilidade e verossimilhança, então é aí que táticas anárquicas de “guerrilha semiológica” (Umberto Eco) deveriam atuar como bombas semióticas com sinal trocado. Através de táticas conhecidas como media prank e cultural jamming (pegadinhas e trolagens) caçar links ao vivo.

Como uma ação que interrompa o livre fuxo de informação dominante, crie dissonâncias como o famoso trompete que invade transmissões da Globo entoando “Olê-olê-olá-Lula-Lula”.

Para quê? Para criar um novo clima de opinião para que a espiral do silêncio dessa vez passe para os jornalistas da grande mídia.

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