"Flowers" (2015) e "I Am a Ghost" (2012) são duas pequenas gemas da atual safra de filmes independentes que comprovam uma recorrência nos filmes desse início de século: narrativas sobre protagonistas presos em algum lugar entre a vida e a morte - a morte pode não ser um libertação, principalmente se você deixou essa existência sem fazer um acerto de contas com seus traumas e fantasmas. Filmes que fazem um surpreendente encontro entre Espiritismo e Psicanálise, merecendo estar "Em Observação" pelo Cinegnose. Além de serem filmes que comprovam a atual mudança de foco dos filmes gnósticos.
Título:
Flowers (2015)
Diretor: Phil Stevens
Plot: Seis mulheres despertam em um espaço apertado sob
as tábuas do assoalho da casa de seu assassino. Elas estão em uma espécie de
limbo entre a vida e a morte. As mulheres terão que se arrastar e fazer o seu caminho
através do sangue, vísceras e sujeira até chegarem ao interior da casa. Uma vez
dentro, passarão por uma série de provações até saberem o que aconteceu
com elas e como foram parar ali.
Título: I
Am a Ghost (2012)
Diretor: H. P. Mendoza
Plot: Emily é um espírito perturbado que assombra sua
própria casa perguntando-se por que não pode sair dali. Com a ajuda de uma
clarividente contratada pelos atuais donos da casa para livrá-la de espíritos,
Emily é forçada a participar de sessões mediúnicas que aos poucos se
transformam em verdadeiras sessões de psicanalise para tentar descobrir mistérios
perturbadores que levaram à sua morte. Dessa maneira Emily poderá passar para o
“próximo lugar”.
Por
que estão “Em Observação”? – Esse blogue “Cinegnose” vive procurando recorrências no cinema. E uma
recorrência marcante nesse início de novo século é a de filmes sobre
protagonistas presos em algum lugar entre a vida e a morte que são
forçados a buscar dentro de si mesmos as
causas desse exílio espiritual. São um conjunto de filmes que parecem querer
provar dois pontos: primeiro, morrer muitas vezes não quer dizer “partiu dessa
para uma muito melhor” – a morte pode significar a perpetuação dos mesmos
traumas e fantasmas que nos acompanharam por toda vida. E segundo: a possibilidade
de uma gnose (iluminação espiritual) pós-morte.
Alguns filmes dessa recorrência: Os Outros (The Others, 2001), O Terceiro Olho (The Eye Inside, 2004), A Passagem (Stay, 2005), Um Olhar do Paraíso (The Lovely Bones,
2009) e agora os independente Flowers
e I Am a Ghost - assista aos trailers abaixo.
"I Am a Ghost" |
Além desses filmes representarem uma
guinada na trajetória dos filmes gnósticos (até chegarmos em Matrix, os
protagonistas eram prisioneiros em mundos virtuais criado por demiurgos
tecnológicos) ao mostrarem protagonistas prisioneiros em mundos interiores criados
por traumas e memórias, essa recorrência fílmica mostra uma surpreendente
aproximação entre Espiritismo e Psicanálise.
E a casa com suas divisões em cômodos,
sótão etc., como uma espécie de cartografia da mente dos espíritos prisioneiros
– o sótão como o inconsciente, o quarto como a cena do trauma e assim por
diante. Isso parece estar mais evidente em I
Am a Ghost que será tema de uma postagem específica do “Cinegnose” ainda
nessa semana.
No caso de Flowers, o que impressiona
nesse filme é que não há diálogos: o filme é uma série de vinhetas focando cada
uma das mulheres mortas em seus primeiros momentos após o despertar naquele
limbo fétido e horripilante. Acompanhamos a trajetórias das seis mulheres (as
“flores” do título) ao som de uma música ambiente etérea e atmosférica.
"Flowers" |
Por isso, a proposta de Flowers parece a de criar uma
experiência estética e sensorial com o espectador. Toda a emoção dos
personagens é expressada pelo corpo – suas expressões, movimentos e posturas
expressam sentimentos interiores e a forma como eles explorarão o ambiente
acabará por revelar o motivos das suas próprias mortes.
Flowers parece partilhar de uma linha
anti-realista no cinema do qual fizeram parte o russo Eisentein, Buñuel (o
cinema surrealista), Abel Gance (o cinema impressionista francês) e o próprio
Chaplin que acreditavam numa vocação abstrata do cinema: o cinema deveria ser
menos um veículo narrativo e muito mais um espaço para experiências sensoriais,
metafísicas e estéticas do espectador.
E o que também impressiona: são filmes
de baixíssimo orçamento – Flowers
feito com vísceras de animais reais e muitos truques ilusionistas de edição e
montagem; e I Am a Ghost onde com
apenas dez mil dólares fez um primoroso cruzamento entre o filme Os Outros com
Nicole Kidman com a atmosfera assustadora dos corredores do hotel do filme O
Iluminado de Kubrick.
O
Que Esperar? – A crítica vem
apontando para esses dois filmes como um sopro de renovação no gênero do
horror: experimentais, mas ao mesmo tempo acessível ao gosto daqueles que
procuram o horror extremo. Flowers e I Am a Ghost são pequenas gemas
escondidas na atual enxurrada de produções independente nos EUA que gravitam em
torno dos blockbusters hollywoodianos.
I
Am a Ghost já possui releases na
Internet e será objeto de análise específica do “Cinegnose” nessa semana.
Quanto a Flowers, esse humilde
blogueiro aguarda um release para uma análise mais detalhada.