Um prato cheio de mistérios, OVNIs, coincidências e conspirações. “Wavelength”
(1983) de Mike Gray (documentarista e ativista político) e produzido por um
advogado não menos ativista é um daqueles filmes estranhamente esquecidos por
críticos e cinéfilos. No momento atual em que autoridades vêm a público cobrar
dos governos que o fenômeno OVNI seja assumido oficialmente, “Wavelength” é
relembrado como um filme supostamente baseado em um caso real ocorrido em
Hunter Liggett, sul da Califórnia. Principalmente após declaração de um físico
que trabalhava em laboratório de pesquisas do governo dos EUA e uma testemunha do incidente que se diz surpreendido
com a precisão da narrativa do filme: “Quem fez esse filme estava lá ou conheceu alguém que esteve lá”.
O filme “Wavelength” é um prato cheio para os
teóricos da conspiração especializados nas conexões entre OVNIs e governos, a
chamada “parapolítica”. Tanto pelo conteúdo da narrativa do filme e, principalmente, pelos eventos e coincidências que cercaram a sua produção que
pesquisadores como Christopher Knowles qualificam como “sincromísticos”.
Esse sci-fi
independente e de baixo orçamento foi esquecido pelo público e até mesmo pelos
cinéfilos ao longo dos anos. Relembrar desse obscuro filme e dos eventos em
torno dele é oportuno, principalmente depois que duas autoridades que ocuparam
posições-chave em governos manifestaram a necessidade de ser assumido
oficialmente a existência dos OVNIs: o ex-ministro de defesa do Canadá, Paul
Heyller (acusou os EUA de “acobertamento”), e o ex-presidente russo Dmitry
Medvedev que falou sobre “arquivos secretos oficiais sobre o assunto” em um
rede de TV daquele país.
E, principalmente, após Henry Deacon (ex-físico que
trabalhava em pesquisas com Alta Energia no Lawrence Livermore Laboratory das
Forças Armadas dos EUA e atualmente trabalhando em Divisões Espaciais da
Motorola GEG e consultor em projetos da Marinha dos EUA) afirmar em uma
entrevista que o filme “Wavelength” teria sido baseado em um incidente real de
queda de OVNI e aprisionamento de tripulantes do aparelho em laboratórios
subterrâneos em um lugar chamado Hunter Liggett na Califórnia: “muitas das
testemunhas morreram no Vietnã e outras foram assassinadas. Talvez eu seja a
única testemunha do que aconteceu. O resto da história é um sci-fi dos anos 80
chamado “Wavelength”. Eu nunca tinha ouvido falar nele até vê-lo anos depois no
Arizona. O filme descreve o incidente de forma clara e exata, incluindo a
utilização de uma base abandonada no Sul da Califórnia. Quem fez esse filme
estava lá ou conheceu alguém que esteve lá” (“Henry Deacon – All Interviews”,
Project Camelot).
Mike Gray, diretor e autor do roteiro do filme,
nega isso. Mas coincidências significativas de eventos que cercaram a produção
do filme e mesmo muitos estranhos detalhes de locação do filme apontam, se não
para um diretor esquivo, pelo menos para o exemplo de um filme sincromístico.
Em outras palavras, “Wavelength” seria um daqueles filmes que concretizam por
meio de som e imagens o zeitgeist ou
“formas-pensamento” de um determinado momento ou época.
O filme
“Wavelength” pode ser considerado um sombrio e
raivoso filme feito em estilo semidocumentário. Na época os críticos associaram-no
à onda de filmes sobre seres alienígenas como “Contatos Imediatos” e “ET”.
Porém, esse filme não apresenta o mesmo espírito otimista de “irmandade
galática” desses filmes, talvez um reflexo de toda utopia new age hippie dos anos 1970 nesses filmes de Spielberg.
David Carradine faz um músico pop chamado Bobby que
tenta retomar a sua carreira. Ele vive ao lado das famosas colinas de Hollywood
e próximo ao que parece ser uma base militar abandonada.
Em um bar conhece Iris (Cherie Currie), vão para a
casa de Bobby e passam a noite juntos. No meio da noite Iris é despertada por
“pensamentos”
ou vozes na sua cabeça. Ela parece ter poderes extra-sensoriais
que os conduzem à base militar abandonada e, depois, para os arredores onde
encontram um respiradouro no meio do mato que os conduzirá a uma complexa rede
de túneis e laboratórios militares sob as colinas de Hollywood. Lá estão
confinados três ETs submetidos a bizarras e agressivas experiências pelos
cientistas. Na verdade Iris estava ouvindo seus pedidos de socorro e sentia
suas dores.
Os aliens
têm o aspecto de três crianças humanas com as cabeças raspadas, talvez uma
estratégia do diretor em um orçamento apertado. Eles precisam desesperadamente
sair do subterrâneo, pois são seres que se alimentam da luz do Sol. Sem isso,
eles começam a sugar a energia de quem estiver por perto, fazendo morrer alguns
cientistas da base. Os militares interpretam isso como uma doença por
“contaminação radiativa” dos seres e decidem fugir e selar todas as saídas. Na
confusão Bobby e Iris conseguem libertar os seres e fogem a tempo antes do
fechamento do complexo subterrâneo.
Começa daí a fuga dos protagonistas com as Forças
Armadas dos EUA no encalço.
Eventos sincromísticos
O primeiro detalhe surpreendente do filme é que a
“base” militar abandonada das primeiras sequências do filme é real. Não é bem
uma base, mas um estúdio cinematográfico secreto chamado Lookout Mountain
localizado nas colinas de Hollywood e que funcionou entre 1947 e 1969. Sob o
comando da Força Aérea produziu filmes secretos, por exemplo, sobre as
experiências nucleares pelo Departamento de Defesa e Comissão de Energia
Atômica. Recentemente o estúdio foi colocado à venda por seis milhões de
dólares.
O diretor Mike Gray afirmou em entrevistas que
morava nas proximidades das colinas de Hollywood e próximo a Lookout Mountain,
onde conheceu o ator David Carradine. Ele apenas juntou tudo isso e surgiu o
argumento do roteiro.
Mike Gray foi escritor e ativista político,
conhecido pelos seus documentários e trabalhos de não-ficção. Formado em
Engenharia Aeronáutica trabalhou para a “Aviation Age” e mais tarde com
publicidade em Chicago. Mas começou a produzir documentários com forte teor
político como o filme sobre o assassinato do membro do movimento “Panteras
Negras” Fred Hampton, em 1968.
Em Hollywood experimentou um momento altamente sincromístico:
escreveu o roteiro do conspiratório filme “Síndrome da China” (1979) que
descreve um grave acidente em uma usina nuclear em Los Angeles. Duas semanas
depois do lançamento do filme, ocorreu o acidente real na usina de Three Mile
Island que lhe faria alcançar a notoriedade.
Mais tarde, em 1981, produziu o documentário para
TV “The Rocket Pilots” onde usou suas conexões com a indústria aeroespacial
para fazer dispendiosas tomadas na Base Aérea de Edwards. Com esse forte foco
foi um passo para a realização de “Wavelength”, mas Gray insiste que o filme
nada teve a ver com o incidente real com OVNI.
Gray dirigiu e escreveu um filme sobre aliens sério, raivoso e politicamente
carregado. Um filme independente financiado por Maurice Rosenfield, um advogado
conhecido por ações judiciais classistas.
Por isso muitos acreditam que na verdade o tema ETs
e laboratórios subterrâneos foi nada mais do que uma alegoria. Na verdade Gray
tratou de forma indireta sobre o infame MKUltra Project (que permaneceu oficialmente
ativo de 1953 a 1973, mas muitos afirmam que suas experiências permanecem atualmente
em igrejas evangélicas e seitas místicas), projeto secreto do governos dos EUA
que envolveu pesquisas sobre métodos para manipular estados mentais e alterar
funções cerebrais mediante administração de LSD, hipnose, privação sensorial,
tortura, isolamento, abusos verbais e sexuais etc.
Uma sequência significativa no filme (veja fotos acima) é quando Iris
para em frente em uma das paredes do laboratório subterrâneo onde vemos
pequenos quadros contendo frases com códigos de conduta a serem aplicados pelos
soldados. Para os pesquisadores em parapolítica, são algumas ideias do MKUltra
a ser incutidos em soldados com técnicas de lavagem cerebral. Isso explicaria o
porquê dos baixos índices de tentativas de fuga por soldados norte-americanos
capturados: estariam condicionados psicologicamente a resistirem a qualquer forma
de interrogatório ou situações de privação psicológica.
No final fica a questão: como enquadrar o filme “Wavelength”?
É um filme sobre parapolítica sobre OVNIs? Um caso sincromístico? Ou um simples
filme feito por ativistas políticos querendo denunciar os abusos cometidos
pelos projetos secretos do governo norte-americano?
O fato é que depois desse filme Mike Gray passou a
interessar-se pelo tema: produziu uma temporada para a adaptação à TV do filme “Starman”
(1984) de John Carpenter e foi convidado a dirigir a segunda temporada de “Star
Trek: The Next Generation”.
O filme nunca foi lançado em DVD. Abaixo um VHS-rip. As legendas (em inglês) podem ser encontradas clicando aqui.
O filme nunca foi lançado em DVD. Abaixo um VHS-rip. As legendas (em inglês) podem ser encontradas clicando aqui.
Ficha Técnica
- Título: Wavelength
- Diretor: Mike Gray
- Roteiro: Mike Gray
- Elenco: Robert Carradine, Cherie Currie, Keena Wynn
- Produção: The Rosenfield Company, Wavelength Film Company
- Distribuição: Embassy Home Entertainment (1984)
- Ano: 1983
- País: EUA