David Bowie conseguiu
escapar do obituário clichê que a indústria do entretenimento reserva ao astros
do rock: drogado, atormentado etc. Ele conseguiu elevar o rock da adolescência
para a maturidade. Bowie tinha uma obsessão secreta por doutrinas gnósticas, o
Oculto e o Paranormal. Tudo teria começado com a turnê Ziggy Stardust (1972-73)
e a misteriosa figura empresarial por trás do sucesso: Tony DeFries – figura
emblemática no pop, também associada ao sucesso de Madonna, a ressurreição de
Steve Wonder e o fim dos Beatles. Após a blitz de marketing global sem
precedentes, o sucesso tornou Bowie paranoico e obcecado por livros de autodefesa
psíquica. Nas entrevistas falava em “malevolência paranormal”. Como John Lennon
ainda nos Beatles, Bowie passou a colocar mensagens cifradas e enigmáticas em
suas músicas tentando chamar a atenção sobre algo muito sinistro por trás da
indústria do entretenimento.
Nascido David Robert
Jones em 1947, David Bowie sempre teve o gosto pela ficção científica e
“esquisitices espaciais” – refletido no seu filho Duncan Jones, diretor de
“esquisitices” sci fi como os filmes Lunar e Contra O Tempo.
Colocando em perspectiva sua obra, um tipo de arquétipo sempre esteve por trás
como força motriz das letras das suas músicas e performances ao vivo: a figura
do alienígena que caiu na Terra e que, tal como um messias, veio denunciar que
aqui nesse planeta vivemos uma condição semelhante – a de estrangeiros dentro
de nossas próprias vidas.
Muitos fãs de David
Bowie sabem que o cantor tinha uma obsessão secreta por doutrinas gnósticas,
ocultismo, o paranormal, Aleister Crowley e nazismo. Diversos livros
autorizados ou não já documentaram isso.
Também foi documentado
que em seus anos mais jovens teve um vivo interesse nos ensinamentos gnósticos
e cabala judaica. “Eu sempre tive interesse nos gnósticos”, afirmou Bowie em
1996 em meio a sua turnê comemorativa dos seus 50 anos.
Segundo relatos, no auge
da turnê Ziggy Stardust (1972-73) arrastava consigo uma biblioteca de livros
gnósticos e ocultistas. E mantinha frascos com a própria urina em geladeiras...
Foi o início da sua estranha fase paranoica: passou a usar pentagramas de
proteção (muitas delas estilizadas em maquiagens ou pentagramas de prata em sua
testa) contras sinistras forças espirituais. Dizia ver nos shows seres
desencarnados, praticava rituais ocultistas em camarins repletos com velas
pretas.
Segundo Jeremy Reed no
livro Nebulosa Diamond, no show do Los Angeles Amphitheatre em setembro
de 1974, Bowie teria visto “extraterrestres” no meio da plateia. Estava
aterrorizado com a possibilidade deles também estarem nos camarins. Bowie
pintou um pentagrama em sua testa para o show. Mesmo aterrorizado, o show foi
perfeito, um dos melhores. “Ele tornou-se um mutante automatizado, um androide do
rock. As pessoas pagavam para vê-lo na expectativa de que ele iria morrer no
palco” (p.68).
E no vídeo-clip
promocional do último álbum Black Star, voltam os mesmos temas
recorrentes da sua carreira: anjos (ou alienígenas) caídos, estrelas negras,
pentagramas e a denúncia da manipulação religiosa que nos cega e crucifica,
assim como o espantalho que figura no clip e o livro religioso com uma estrela
negra que Bowie empunha.
Auto-Defesa Psíquica
Bowie tinha um fascínio
por Hitler e o nazismo. Não que fosse nazista – sua mãe era irlandesa-judaica.
O que chamava a atenção dele eram os gigantescos comícios teatrais na época do
III Reich e como Hitler teria se tornado, segundo ele, “a primeira estrela pop”
capaz de hipnotizar os cidadãos alemães.
Ao lado de John Lennon,
talvez tenha sido o mais autoconsciente dos astros pop sobre o significado do
seu papel dentro da indústria do entretenimento – viver a ambiguidade de ter
consciência de influenciador da cultura popular ao mesmo tempo que, de alguma
forma, procurava se manter afastado das maquinações da indústria de controle
social.
John Lennon enfrentou
essa indústria pelas vias explicitamente políticas: rompeu com os Beatles
(segundo ele em entrevista, uma maquinação de “craftsmen” – “artesãos”, sobre
isso clique aqui) participou de
movimentos de protestos contra a guerra do Vietnã e luta pelos direitos civis
nos EUA chegando quase a ser deportado. Enquanto David Bowie escolheu a via
ocultista e esotérica – acreditava que a indústria do entretenimento, assim
como a máquina de cultura pop nazi, lidava com forças paranormais.
Por isso Bowie ficou
obcecado pelo livro Auto-Defesa Psíquica (1930) do ocultista britânico
Dion Fortune para se defender da “malevolência paranormal”.
Durante esse período
“paranoico” de Bowie que envolveu a turnê Ziggy Stardust e posteriores autoexílios
em Nova York e Los Angeles (1974-76) e mais tarde em Berlim (1976-79) a mídia tentou
enquadrá-lo no tradicional plot da estrela pop viciada em cocaína e
heroína, incapaz de lidar com o sucesso e o ego imenso. Apenas que, diferente
de astros como Kurt Cobain, Bowie sobreviveu para pular fora desse obituário
que a indústria do entretenimento já preparava para ele.
Malevolências paranormais
Um pouco antes da sua
morte John Lennon falou em uma entrevista sobre “craftsmen” por trás dos
Beatles. David Bowie falava em “malevolências paranormais” por trás da cultura
pop e, mais especificamente, por trás da persona de Ziggy Stardust que o lançou
ao topo do pop e para a história do rock.
O que David Bowie viu
que o fez mergulhar na filosofia gnóstica e ocultista?
No dia 28 de abril de
1972, uma estranha aparição surgiu nas telas do Reino Unido: uma figura
andrógina, pálida, com um sorriso torto e cabelo de fogo cantando Star Man:
“Há um homem das estrelas à espera no céu/ ele gostaria de vir nos conhecer/
mas teme que possa explodir nossas mentes”.
A música era
auto-referencial. Em 1972 ninguém havia imaginado uma criatura como essa,
diretamente oposta a uma juventude predominantemente homofóbica e uma sociedade
inglesa conservadora. Mas esse personagem como um alien que caíra na Terra,
alienado e solitário, tornou-se um símbolo de subversão radical. Alguns anos à
frente da onda punk.
O que chama a atenção de
biógrafos e pesquisadores sobre o rock é que David Bowie não era nenhum
recém-chegado à cena pop. Por quase uma década já lançava discos sem nenhum
sucesso, com uma rápida exceção com a música Space Oddity de 1969. Bowie
estava quase desistindo da carreira de roqueiro para se dedicar ao teatro e as
artes.
Quem é Tony DeFries?
Até conhecer uma
estranha e misteriosa figura do meio empresarial chamada Tony DeFries: “Garoto,
vou fazer de você uma estrela!”, teria dito a Bowie no primeiro encontro que
empresarialmente foi o divisor de águas da história do pop. A partir daí DeFries
fez um arranjo que não é usual para um executivo nesse nível: jogou caminhões
de dinheiro em Bowie e em todo seu entourage, como se jogasse arroz em
noivos que saem de uma igreja.
No livro Mate-me Por
Favor de Legs McNeil e Gillian McCain descreve a gastança em limosines,
festas em Hollywood e todos os excessos dos músicos da banda Spiders From
Mars que acompanhava Bowie. A ideia era mostrar para jornalistas e ao
cenário pop que Bowie já era sucesso, antes mesmo de sê-lo, numa tática
mercadológica inédita, excêntrica e empresarialmente suicida.
Ou DeFries estava muito
confiante no potencial de Bowie em que se tornasse da noite para o dia na
galinha dos ovos de ouro do rock ou havia algo mais acontecendo naquele
momento.
Mas quem era Tony DeFries?
Para pesquisadores e teóricos conspiratórios do rock, DeFries é uma figura
chave por trás de alguns eventos mais importantes da música pop: esteve
presente no nascimento de Madonna, na ressurreição da carreira de Steve Wonder,
na morte dos Beatles e no renascimento de Iggy Pop. Mas apesar da sua
importância, nunca foi entrevistado, jamais fez declarações públicas.
Bowie e DeFries |
Se formos ao Linkedin e
pesquisarmos o perfil de Tony DeFries veremos que ele é um agitador do mundo da
ciência e tecnologia. No perfil descobriremos que muitos dos projetos nos quais
está envolvido são conectados com o complexo industrial militar global. Além de
deter várias patentes de tecnologia de ponta – clique aqui para ver o perfil.
Que razões houve para
essa estranha parceria Bowie/DeFries na campanha de relações públicas (na
verdade uma blitz mundial) mais surpreendente na história do rock?
Muitos tentam conectar
DeFries com o famigerado Instituto Tavistock de Relações Humanas de Londres
ligado a pesquisas sócio-técnicas mas, principalmente, conhecido pelo
desenvolvimento de estratégias de mudança e controle social.
Bowie gnóstico
O fato é que a partir
desse momento as letras das músicas de Bowie passam a ser tomadas por
referencias a Aleister Crowley e da sociedade secreta ocultista do século XIX
Golden Dawn (“Estou mais perto da Golden Dawn/ vestindo um uniforme com imagens
de Crowley”- Quick Sand), imagerie nazista (“Estou vivendo em um filme
mudo/ retratando Himmlers no sagrado reino da realidade dos sonhos”- Quick
Sand).
Além de estranhos avisos
cifrados sobre ter aberto inadvertidamente algum tipo de caixa de pandora: “Não
olhe em seu tapete/ eu tirei algo de terrível dele, veja”- Breaking Glass;
ou “Ela abriu estranhas portas que nunca mais se fecharam”- Scary Monsters.
DeFrie e seu “cliente”
foram agentes de mudanças especificamente empregadas por Tavistock para ajudar
a moldar a opinião da cultura jovem. Bowie foi um instrumento para ajudar a
derrubar costumes sociais e tabus para emergir a Terceira Onda da sociedade
industrial e consumo: a customização do marketing e toda as mudanças
tecnológicas das plantas industrias das fábricas – da produção em massa para a
segmentada e sob demanda.
Mas Bowie viu algo mais
na histeria em torno de Ziggy Stardust alimentada pela grana de investimentos a
fundo perdido. Alguma coisa que chamou de “malevolência paranormal”. Ficou
paranoico, matou o personagem e partiu para um autoexílio por Nova York, Los
Angeles e Berlim.
Suas músicas se tornaram
cada vez auto-confidentes e gnósticas. De Ziggy Stardust ficou a figura do
alienígena que caiu na Terra, revolucionou a tecnologia, foi seduzido e depois
corrompido pela grandes corporações como no filme que protagonizou O Homem
Que Caiu na Terra (1976) – sobre o filme clique aqui.
O apego ao gnosticismo
como forma de denúncia cifrada para os fãs pode ser percebida em músicas como Love
The Alien – última música escrita na sua fase paranoica em Los Angeles e
gravada em 1985: o Evangelho como uma grande mentira, com Jesus Cristo que
jamais teria morrido na cruz e sua história como o resultado de uma engenharia
política. A ideia de uma Igreja que dominaria sonhos e desejos de incontáveis
gerações.
Assim como John Lennon
que buscou em músicas como I Am The Walrus fazer um acerto de contas com
a engenharia social por trás dos Beatles, Bowie passou explorar simbologias
gnósticas e ocultistas. Lennon deixou o campo dos simbolismos e passou para a
ação política explícita, o que, para muitos pesquisadores, teria lhe custado a
vida.
Ao contrário, Bowie
mergulhou ainda mais no Oculto (como atestam os últimos vídeo-clipes da sua vida
Black Star e Lazarus). Escapou do tradicional obituário que a
grande mídia reserva para as estrelas pop (drogado, atormentado etc.) e elevou
o rock da adolescência para a maturidade.
Graças a isso, Bowie
conseguiu manter a integridade das suas letras e a virulência da suas
auto-confidências gnósticas para a posteridade.
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