A vida imita a arte? Ou há algo mais complexo nas relações entre a
ficção midiática e os eventos reais? O Cinegnose tenta dissecar essa questão
fazendo o Top 10 dos filmes e séries que supostamente teriam previsto eventos
reais como atentados, assassinatos, descobertas científicas e conquistas
tecnológicas. Profecias? Coincidências? Ou contaminações sincromísticas do “continuum”
midiático que envolve a todos nós?
Para o Gnosticismo
a realidade é uma ilusão. Para além das considerações filosóficas, ontológicas
ou cosmológicas dessa afirmação, para o Cinegnose a hipótese sincromística
seria mais um argumento a favor dessa suspeita gnóstica. Pelo Sincromisticismo,
as relações entre a realidade e as narrativas ficcionais midiáticas sobre a
realidade são mais complexas do que o velho provérbio de que “a vida imita a
arte”.
Haveria uma
complexa relação entre os conteúdos midiáticos sedimentados em memes e
arquétipos e os acontecimentos sociais, econômicos e políticos. A onipresença
dos meios de comunicação criaria um “contínuo midiático atmosférico” que
apresentaria estranhas contaminações da ficção na realidade. E o movimento
contrário: a realidade contaminando a ficção, de maneira que filmes tornam-se
peças de uma agenda (agenda setting) política ou econômica mais ampla.
O exemplo mais
atual é o do filme de Ridley Scott Perdido
em Marte (The Martian, 2015) que
é lançado no momento em que a NASA e o presidente Barack Obama mobilizam
esforços para aprovar orçamento no Congresso para o projeto de uma missão
tripulada ao planeta vermelho. Logo depois do lançamento do filme, a NASA
anuncia a descoberta de água em Marte.
Nesse caso temos
uma visível estratégia de relações públicas chamada de agenda setting, tática
de criar uma suposta pertinência de uma pauta para a opinião pública.
Mas o caso mais
intrigante é como a ficção é capaz de contaminar a realidade, como se fosse uma
espécie de neo-platonismo realizado: memes e arquétipos baixam à Terra
provenientes do Mundo da Ideias Midiáticas e materializam-se. Algumas vezes de
forma trágica.
Vamos examinar dez
casos de contaminação da realidade pela ficção - coincidências, profecias,
efeitos de imitação (copycat effect) ou eventos sincromísticos.
10. Team America (2004) e o ataque ao hospital dos Médicos Sem Fronteiras
Team America: Detonando
o Mundo (Team America: World Police, 2004), é uma comédia politicamente
incorreta onde os personagens são marionetes em cenas explicitamente violentas
com mísseis, artes marciais e tiroteios associados à luta de heróis americanos
contra o terrorismo internacional. O Team America (a polícia mundial do título
cuja missão é proteger o mundo dos terroristas) é comicamente catastrófica em
seus rompantes de heroísmo.
A sequência inicial
é impagável. Terroristas muçulmanos aparecem em uma praça em Paris onde estão
muitas crianças, mulheres e idosos. Um deles carrega uma mala-bomba.
Derrepente, aparece o Team America numa blitz com mísseis e bazucas. Para
derrotar os terroristas, o Team America manda Paris literalmente para os ares.
Diante dos parisienses atônitos, o Team America brada: “derrotamos os
terroristas”, ao custo de vidas civis. Os Americanos destruíram Paris para
deter os terroristas… que planejavam destruir Paris! - veja a cena abaixo.
O bombardeio da
força aérea Americana a um hospital no Afeganistão onde atuava a organização
Médicos Sem Fronteira, matando 22 pessoas, foi uma mórbida semelhança com a
ficção. A resposta inicial das autoridades militares: havia a suspeita de o
hospital “abrigar terroristas”. Uma tragicômica repetição do heroism cego do
Team America.
Depois a versão
mudou para “danos colaterais”. E depois o ataque foi qualificado como “erro”. A
amoralidade dos cômicos herois da ficção repete-se de forma trágica no chamado
“destino manifesto” a que se arrogam os EUA: de proteger o mundo das “forças do
Mal”.
9. As estranhas profecias de Americathon (1979)
Em 1979, um filme
estranhamente profético foi escrito por Phil Proctor e Peter Bergman, estrelado
por John Ritter, Fred Willard, e Harvey Korman.
John Ritter
interpreta o presidente de um futuro EUA (1998) imerso na crise financeira e
energética. Entre as hilariantes previsões 20 anos no futuro estava que a China
iria abraçar o capitalismo e se tornar uma superpotência econômica global. A
Nike, à época uma incipiente empresa de calçados no Oregon, iria se tornar um
conglomerado multinacional. A URSS entraria em colapso e o Comunismo acabaria. As
pessoas iriam pagar bem caro por bebidas de cafés especiais. E os EUA estariam
imersos em dívidas com investidores estrangeiros.
Depois da queda do
Muro de Berlim em 1989, a atual liderança econômica mundial da China e a crise
econômica dos EUA pós explosão da bolha especulativa imobiliária de 2008, será
que tudo que Americathon mostrou em
1979 foi mera coincidência?
8. Síndrome da China (1979): o vazamento de uma usina nuclear
O ano de 1979
parece ter sido pródigo em profecias. Síndrome da China é a história de dois
jornalistas (Michael Douglas e Jane Fonda) que descobrem falhas de segurança em
uma central energética nuclear. Depois de testemunharem um quase colapso,
Douglas e Fonda convencem Jack Lemmon a expor a riscos da energia nuclear para
o mundo.
O filme foi
lançado em 1979 e muito criticado pela indústria de energia nuclear como um ato
irresponsável e sensacionalista por lucrar com o medo. Porém, apenas 12 dias depois
do lançamento do filme uma estação de energia nuclear na Pensilvânia teve um
superaquecimento em um dos reatores, levando os técnicos nucleares ao pânico.
Dentro de poucas
horas altos níveis de radiação foram encontrados na localidade e uma evacuação
foi rapidamente ordenada. Os efeitos foram devastadores para a saúde mental da
comunidade local, mas para Hollywood foi uma feliz coincidência: Síndrome da
China aproveitou as semelhanças entre os dois eventos e faturou um enorme
sucesso de bilheteria.
7. Super Mario Bros. (1993) e o atentado do WTC de 2001
Em 1993 deu-se o
início dos filmes de videogames: o filme Mario Bros., uma adaptação do game da
Nintendo, foi estrelado por Bob Huskins como o Mario, John Lenguizamo como o
Luigi e Denis Hopper como o ditador King Koopa. A certa altura do filme quando
o nosso universo e o do vilão Koopa começam a se fundir, pessoas e prédios em
Nova York começam a desaparecer e passar para o outro universo. O mais notável
são os desaparecimentos das torres gêmeas do skyline da cidade.
Claro, não há
colisões de aviões, mas a maneira como desaparece é muito sugestiva. A torre
sul vai em primeiro lugar e um grande buraco abre na segunda torre. Cria-se uma
imagem muito estranha, criando-se um imediato paralelo com a tragédia de oito
anos depois.
O que só levantou
teorias conspiratórias sobre ligações entre a Al Qaeda, Bin Laden não só com o
filme, mas com o próprio videogame da Nintendo.
Mas uma coisa é
certa: de tanto verem Nova York ser destruída por Hollywood, os terroristas
tivera uma inspiração e tanto.
6. Série Os Simpsons previu Donald Trump presidente e a partícula Higgs-Boson
A ascendência nas
pesquisas da candidatura do midiático Donald Trump para a Casa Branca nos EUA
tem surpreendido a muitos. Mas não para os redatores de Os Simpsons: há 15 anos
um episódio previu um Donald Trump presidente e as devastadoras consequências –
um país de joelhos pela má gestão financeira e dependente da China.
O episódio Bart to The Future foi ao ar em março de
2000 onde vemos uma cartomante que dá a Bart um vislumbre de 2030 algumas
semanas depois de Trump ter desocupado a Casa Branca. Além do país estar
dependente da ajuda externa da China, os EUA estão à mercê de bandidos
geneticamente melhorados por um programa projetado por Trump para ajudar a
juventude da nação sua pureza racial – lembremos que a campanha atual de Trump
é “Fazer a América Grandiosa Novamente”, além de recentemente ter chamado os
mexicanos de “estupradores” e “traficantes de drogas”.
Lisa Simpson é eleita
para suceder Trump e herda a incontrolável dívida nacional.
A série tem
surpreendido com previsões de eventos mundiais nos mais variados campos como
política, medicina e até física teórica. Em 1997 um episódio previu um surto de
Ebola que em 2015 devastou a África Ocidental. Em 1998 no episódio The Wizard of Evergreen Terrace vemos
Homer Simpson rabiscando em uma lousa uma complicada equação. Físicos
experientes disseram que a equação apresentava uma aproximação aparentemente
funcional de uma teoria sobre a massa da chamada “partícula de Deus”, a
Higgs-Boson. A série antecipou-se em
década à descoberta recente por especialistas do acelerador de partículas
europeus do CERN.
Além disso,
aparentemente a série previu a queda política da Síria provocada pela Primavera
Árabe em um episódio de 2001 chamado New
Kids on The Blecch: mostra uma guerra em um país não especificado do
Oriente Médio. Os inimigos dos EUA estavam em um jipe com a marca de uma
bandeira que não era usada por nenhum movimento naquele momento – mais de uma
década depois a mesma bandeira passou a ser usada por um grupo de rebeldes
sírios.
Os teóricos da
conspiração surtaram!
5. Série Family Guy e o atentado na Maratona de Boston
Em 2013 bombas
foram detonadas junto à linha de chegada na Maratona de Boston, nos EUA,
matando três pessoas e ferindo outras 264. O episódio Turban Cowboy da animação
Family Guy teria previsto o incidente onde o protagonista Peter ganha a maratona
depois de matar o resto dos participantes (é mostrado muito sangue e corpos
desmembrados) e, sem querer, detona duas bombas com um telefone celular (veja
sequência abaixo).
O enredo é tão
semelhante aos trágicos acontecimentos de Boston que as cenas foram excluídas
das retransmissões, assim como foram retirados vídeos do YouTube onde se
comparam imagens do atentado com as cenas de “Family Guy”. Para alimentar os
teóricos da conspiração, muitos links do site “Infowars” do jornalista Alex
Jones e do blog “Gamba” com “evidências da operação “False Flag” foram
estranhamente bloqueadas no Facebook. Eu mesmo postei links de ambos os sites
que logo vieram com a seguinte mensagem “Forbidden You don't have permission to
access on this Server”. O que só alimenta a espiral conspiratória de
interpretações.
4. The Lone Gunmen (2001): profecia ou denúncia?
Em março de 2001
foi ao ar o episódio piloto da série The Lone Gunmen, um spin-off da série
Arquivo X. Os chamados “Pistoleiros Solitários” são três hackers de
computadores que dedicam suas vidas para descobrir segredos do governo. No
episódio uma fação do governo finge ser terroristas e assume remotamente o
controle de um avião e pretende lançá-lo contra as torres gêmeas do WTC em Nova
York. O propósito da conspiração é usar o ataque como justificativa para
iniciar uma Guerra contra o terrorismo internacional, ao mesmo tempo criando um
bode expiatório externo para os problemas nacionais e aumentando os lucros da
indústria de armamentos.
Teorias similares
foram invocadas após a estranha coincidência do atentado real em Nova York. A
série produzida pelo canal Fox foi pouco depois cancelada sob a alegação de
“baixos índices de audiência”.
3. Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembrança (2004) previu a “Engenharia dos sonhos”?
No filme Brilho Eterno... Joel e Clementine
submetem-se a um procedimento neuro-eletrônico oferecido pela empresa Lacuna
Inc. (o nome é bem sugestivo): apagar as lembranças de ser relacionamento
amoroso depois de uma dolorosa separação. Isso foi em 2004. Recentemente,
neurocientistas holandeses divulgaram um estudo que abre a possibilidade de
apagar a memória de fatos desagradáveis: uma eletroconvulsoterapia (ECT) para
“alvejar e despedaçar a memória de um episódio perturbador dos pacientes”.
Essa ainda é uma
terapia dolorosa porque envolve convulsões por impulsos elétricos. Mais próximo
à cartografia da mente através de uma interface na tela de um computador está
na experiência da engenharia dos sonhos dos ratos realizada pelo MIT, publicado
pela Nature Neuroscience em 2012 – sobre isso clique
aqui.
2. Game of Death (1978) – Bruce Lee previu a morte do filho?
Game of Death é um filme estrelado por Bruce Lee
sobre uma estrela de filmes sobre artes marciais que é forçado a fingir a própria
morte para descobrir quem está tentando matá-lo. Uma cena crucial no filme
mostra um golpe que dá errado quando uma arma cenográfica é carregada com uma
bala real e atira no personagem de Lee. O que torna esta cena tão perturbadora
é o evento que pareceu prever. Em 1993, Brandon Lee, filho de Bruce Lee estava
filmando The Crow, quando uma arma
cenográfica foi acidentalmente carregada com uma bala real e disparou em
cena, matando Brandon Lee. Em outras palavras,
Brandon Lee morreu exatamente da mesma forma como o personagem de Bruce Lee fez
no filme de 1978.
1.
Mulher na Lua (1929) – NASA realizou sonho nazista?
Décadas antes da
NASA sequer sonhar em colocar o homem na Lua, este filme alemão do diretor
Fritz Lang (Metrópolis) faz previsões surpreendentemente precisas sobre o
futuro da exploração espacial. Não só apresenta a tecnologia do foguete de
vários estágios para escapar da atmosfera, a utilização de combustível sólido,
a contagem regressiva no lançamento, os efeitos da gravidade zero, roupas
espaciais e o efeito orbital de “estilingue” aplicado ao foguete pela
proximidade Terra-Lua.
Viagens espaciais era uma verdadeira febre popular na Alemanha pré-nazi.
O filme ganhou apoio da Sociedade Alemã para Viagem Espacial (VfR), formado por
Werner Von Braun que mais tarde lideraria o projeto dos foguetes nazistas como
também o programa espacial da NASA que levaria o homem na Lua.
Os EUA acabaram
concretizando um antigo projeto nazista apresentado de forma seminal em Mulher na Lua? Essa talvez seja a origem
das teorias conspiratórias que narram a espetacular fuga da elite nazista para
uma base no lado oculto da Lua como mostra de forma cômica o filme Iron Sky (2012) – sobre o filme clique
aqui.