Através da linguagem das mercadorias a grande mídia e a sociedade de
consumo conseguem produzir efeitos ideológicos através de meios não
ideológicos: a captura dos nossos afetos, uma dimensão pré-cognitiva e corporal
que é cooptada por uma cadeia semiótica para produzir emoções e decisões de
consumo e políticas. Esse foi o tema de mais um encontro do curso “A Linguagem
das Mercadorias”, ministrado por esse humilde blogueiro, na pós em Comunicação e Semiótica da Universidade Anhembi
Morumbi. Afastando a confusão que normalmente fazemos entre as noções de afeto,
sentimento e emoção, as discussões revelaram a ainda pouca estudada dimensão
dos fenômenos da percepção: como o mundo e principalmente as mídias nos afetam não só mentalmente mas, principalmente, fisicamente e como essas
sensações podem ser instrumentalizadas.
Dando
continuidade ao curso “A Linguagem das Mercadorias” na pós em Comunicação em
Semiótica da Universidade Anhembi Morumbi, nesse segunda-feira aprofundamos a
noção de “signo-afeto” – na aula anterior discutimos o conceito de
“signo-fetiche” presente tanto em Marx como em Freud e as suas aplicações na
sociedade de consumo contemporânea – sobre esse tema clique
aqui.
O
principal objeto das discussões foi apresentar como as estratégias semióticas
da linguagem das mercadorias consegue capturar nossos afetos para direciona-los
através de construções simbólicas que suscitem emoções e pensamentos
previamente indexados nas imagens publicitárias.
Afastando a
confusão que normalmente fazemos entre as noções de afeto e emoção, tomamos o
conceito de afeto como afecção, isto é, a materialidade da
sensação, a concreticidade da experiência – nosso percepção e o corpo são
constantemente afetados por sensações e intensidades como cores, sons, cheiros,
texturas, tonalidades, timbres etc., que nos sinalizam para a existência de
alguma coisa, evento ou realidade e que, posteriormente, os simbolizamos em
emoções ou pensamentos – a chamada “cadeia semiótica” ou cognição.
Em outras palavras, as afecções antecedem a cognição. É a realidade em
seu estado mais puro, extra-linguístico, anterior ao pensamento e às próprias
emoções, que são culturalmente construídas a posteriori.
Fenomenologia dos afetos
Fenomenologia da percepção: formas básicas da sintaxe visual à serviço de produtos e marcas |
Essa discussão aberta pela fenomenologia peirciana abre a possibilidade
de apreendermos e estudar uma dimensão pré-sígnica que embora não seja
ideológica (essa dimensão seria a própria “carne do mundo”, como dizia o
filósofo Merleau-Ponty) ela poderia ser instrumentalizada para finalidades
ideológicas ou simbólicas como a própria linguagem das mercadorias.
Passamos então a concentrar as discussões da aula nas formas como a
comunicação visual da linguagem das mercadorias aprisionam essas afecções no
sentido de direcioná-las para situações emocionais ideais para o consumo
simbólico de produtos e marcas.
Usando o referencial da semiótica peirciana passamos a estudar as
chamadas dominantes na comunicação
visual: elementos básicos da sintaxe visual (ponto, linha, forma, movimento,
cor, tonalidade, dimensão, textura e escala) usados para criar “fluxos
sinestésicos” (como dizia o cineasta Eisenstein) que criem reações corporais
que serão associadas a produtos e marcas.
O efeito físico dos afetos
Passamos então a fazer alguns estudos de casos envolvendo os packshots publicitários (a apresentação do produto no filme de tal forma que
fiquem detalhados em alta intensidade cor, textura etc., para produzir efeitos
sinestésicos) e na exploração dominantes de forma dos layouts e seus efeitos
psicanalíticos – sobre essa relação entre a exploração das formas geométricas
básicas e o psiquismo humano clique aqui.
Fluxos sisnestésicos produzem afetos corporais
|
Esse efeito físico é o que podemos chamar de “sinalização” onde, através
do afeto, somos chamados e seduzidos pela intensidade e repercussão corporal
sinestésica que nos provoca – comer com os olhos, tocar o corpo ou a superfície
lisa e brilhante de um carro com os olhos.
Em seguida essa afecção se transformará em “informação”: através da
retórica publicitária do discurso ou na montagem fílmica – justaposições,
metáfora, analogias etc., essa afecção pré-linguística será direcionada para a
cadeia semiótica produzindo a emoção do consumo: essa garrafa suando de gelada
que lhe deu sede através dos olhos é Brahma. Entramos aqui no campo
propriamente ideológico ou simbólico onde a intensidade das afecções que nos
capturou são “capturadas” por um nome, uma marca, um produto ou um símbolo
político ou religioso. É a própria origem da construção do signo e da
“realidade” como nós a conhecemos mentalmente.
Storytelling: histórias nos afetam mais que discursos |
Marina Silva: Storytelling no marketing político
Também
discutimos como esse processo do signo-afeto também repercute no marketing
político, como no atual cenário com a entrada em cena da candidata Marina
Silva. Analisamos a construção da sua imagem por meio daquela estratégia
semiótica que vem sendo chamada de Storytelling.
É sabido
que as narrativas ou só o ato de contar histórias tem uma grande capacidade de
nos afetar – nos imaginamos nas histórias e o nosso próprio corpo reage a isso.
O próprio neuromarketing descobriu em mapeamentos neuronais sobre os efeitos
nos consumidores diante de peças publicitárias, que as narrativas, histórias ou
descrições estimulam não apenas as partes cognitivas do cérebro, mas inclusive
aquelas relacionadas às afecções.
Ao
contrário dos outros candidatos como Aécio e Dilma (promovidos classicamente
como “produtos” que apelam para a cognição e emoção), o marketing de Marina, ao
promove-la como personagem de uma história que começa do coração da Amazônia e
que termina na predestinação à presidência ao escapar de um desastre aéreo,
atinge à dimensão da afecção dos eleitores – sobre essa exploração do
Storytelling na política clique
aqui.
No
próximo encontro (08/09) continuaremos essa discussão do signo-afeto na
linguagem das mercadorias analisando como as afecções são semioticamente
capturadas e convertidas em emoções como viciosidade, compulsão, o sexo e o
erotismo por meio de ferramentas psicanalíticas aplicadas ao consumo.
Os encontros do curso “A
Linguagem das Mercadorias” ocorrem todas as segundas-feiras na sala 752 –
Unidade 7 do campus Vila Olímpia da Universidade Anhembi Morumbi em São Paulo –
Rua Casa do Ator, 275. O curso vai até o dia 22/09.
Para maiores informações
sobre a pós-graduação em Comunicação e Semiótica da Universidade Anhembi
Morumbi clique aqui.
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