O trágico acidente aéreo em Santos que vitimou o
candidato à presidência da República Eduardo Campos reacende por caminhos
mórbidos a esperança da grande mídia, com a pressão uníssona de que Marina
Silva assuma a candidatura. O timing da tragédia foi perfeito, num momento em
que já estava esgotado o arsenal de bombas semióticas midiáticas – a última foi
a irrelevância da não-notícia da “fraude da Wikipédia”. Mais do que que
levantar teorias conspiratórias, as sincronias e coincidências que cercaram o
acidente, somado a uma espécie de discurso do “destino manifesto”, do
“imponderável” e do “destino”, estão ajudando a preparar a talvez derradeira
bomba semiótica, dessa vez sincromística porque utiliza como matéria-prima a
simbologia arquetípica do “Mágico”, baseado em estratégia do mundo do Marketing e da Publicidade que manipula arquétipos
do inconsciente coletivo para a criação da imagem de marcas, produtos e
serviços.
Teorias
da conspiração não surgem por acaso. É por ser a realidade estranhamente
sincrônica que acaba sugerindo a suspeita de eventos milimetricamente
maquinados, como no caso da trágica morte do candidato à presidência da
República Eduardo Campos em um acidente aéreo na cidade de Santos-SP no último
dia 13.
Logo
após o incidente, redes sociais e grande mídia se apressaram a fazer um mórbido
inventário de “coincidências”: Eduardo Campos morreu no mesmo dia que o seu avô
Miguel Arraes; o DDD de Santos é o mesmo do dia da tragédia (13) que, por sua
vez, é o mesmo número que identifica o PT nas eleições; a soma das letras do
candidato morto soma 13; o acidente aéreo ocorre pouco tempo depois da denúncia
envolvendo o candidato Aécio Neves sobre um aeroporto construído com dinheiro
público ao lado de fazenda da sua família; em 2006, também no período de
eleições presidenciais, ocorreu o acidente aéreo do choque do Boeing da Gol com
um jato Legacy matando 154 pessoas; o acidente aéreo de Santos se soma a uma
sequência de acidentes como o desaparecimento do Boeing da Malaysian Airlines
no Oceano Pacífico (ou teria sido no Índico?), a queda de outro Malaysian na
Ucrânia e uma mais recente de um Boeing na África...
Mas
parece que ainda poucos estão vendo a maior de todas coincidências, uma feliz
surpresa para uma grande mídia politicamente combalida: o acidente aéreo vitima
um candidato de oposição ao Governo Federal no momento em que o arsenal das
bombas semióticas já tinha se esgotado, como pudemos diagnosticar em postagens
anteriores.
Como
vimos, a últimas arma foi a da não-notícia, detonada com a denúncia da suposta
fraude da CPI da Petrobrás (a hilária descoberta que existe media training nas
corporações) e a denúncia reduzida a pó de traque da “fraude dos perfis da
Wikipédia”. Era evidente que essa última arma era a mais frágil de todas que
foram detonadas desde as grandes manifestações de rua de junho do ano passado.
A repercussão dessas últimas explosões teve fôlego curto, pela própria natureza
de irrelevância da matéria-prima dessas bombas.
Grande mídia: do desânimo à euforia
Esse
desânimo ficava claro nas hostes dos intelectuais orgânicos da oposição como o historiador
Marco Antonio Villa. Se em maio no Jornal O
Globo, Villa declarava “Adeus, PT” onde comemorava “a derrota do PT e a
implosão do seu bloco político”, em julho, desiludido com a performance de
Aécio Neves e o êxito da Copa do Mundo, falava no mesmo jornal em “desilusão
com a política”, o “notório sentimento popular de cansaço” e o “voto como ato
inútil, que nada muda”.
Pois
em meio ao desânimo frente a um contínuo midiático que começava a se tornar
opaco e resistente às ondas de choque das últimas bombas semióticas, eis que
inesperadamente um jato com alta tecnologia aeronáutica pilotado por
profissionais experientes inexplicavelmente mergulha precisamente no único
espaço aberto em quarteirão de um bairro populoso de Santos, trazendo no seu
interior um candidato à corrida presidencial.
Em
questão de poucas horas o mercado financeiro demonstrou todo o seu insensível
pragmatismo: com a apreensão de que a vice de Eduardo Campos, Marina Silva, estivesse
também na aeronave as perdas do início do pregão da BM&FBovespa se
aprofundaram. Quando o mercado soube que ela não estava no voo os índices
voltaram a subir, sinalizando aquilo que a grande mídia já começava a
repercutir – o mercado financeiro quer Marina Silva para reduzir a incerteza
sobre uma possível vitória da Dilma no primeiro turno.
Do
desânimo e incertezas a grande mídia pulou imediatamente para a euforia
especulativa. Marco Antonio Villa, por exemplo, em poucas horas já tinha
superado seu niilismo político: “são duas campanhas... a que começa hoje
apresenta um quadro absolutamente imprevisível!”.
O Wishful thinking da grande mídia
Para a Folha, eleição é a ˜sucessão presidencial" |
O
Jornal O Estado de São Paulo já
declarava que “Morte de Campos embaralha a eleição e Marina é tratada por sucessora
natural” – tratada por “lideranças”, diz o jornal. Já a Folha
foi mais direta com a manchete “adversários se preparam para enfrentar Marina
Silva” e com um pequeno wishful thinking
com o título “mudança de rumo na SUCESSÃO presidencial”. O jornal abandona o
termo “eleições” ou “corrida presidencial” para usar uma expressão que sugere o
desejo de mudança de ocupante do Palácio do Planalto.
“Eleição
imprevisível”, “acirrar a eleição”, “reviravolta se Marina enfrentar a disputa”:
uma hora depois da confirmação da morte de Eduardo Campos o clima midiático era
radicalmente diferente, com sofresse um choque de adrenalina e otimismo.
O
curioso é que as análises de conjuntura política instantânea dos analistas veio
acompanhada de expressões etéreas como “o imponderável”, “rasteira do destino”,
“o impacto do acaso” etc. Nessas análises de conjuntura política e econômica
tão instantâneas (analistas econômicos já falam em “cenário-base com Marina
Silva”), somente uma causa tão imaterial para explicar um efeito tão poderoso e
a decisão uníssona da grande mídia e mercados financeiros: Marina Silva precisa
substituir Eduardo Campos.
A bomba semiótica sincromística
Portanto,
estamos acompanhando nesse momento o início da montagem de uma nova bomba
semiótica, dessa vez mais poderosa que a das não-notícias. Uma bomba baseada
num processo de semiotização a partir de um forte signo-arquétipo: o arquétipo
do Mágico. Assim como as cartas de Tarot onde cada figura corresponde a um
aspecto arquetípico do psiquismo humano, a figura de Marina Silva começa a ser construída
pela grande mídia associada ao “destino”, “acaso”, “coincidências” (ela deveria
estar naquele voo, mas preferiu na última hora viajar em outro avião) etc.,
conceitos tão etéreos quanto a causalidade da súbita mudança de humores
midiáticos.
Tomando
o conceito de arquétipo da psicologia profunda de Jung (arquétipo como símbolo
do inconsciente coletivo), Carol Pearson, PhD
em Psicologia e professora em Estudos sobre Liderança da Maryland University
nos EUA vai encontrar, a partir dos estudos da simbologia arquetípica, doze
modelos de simbologia inconsciente que, segundo ela, motivariam a espécie
humana: Inocente, Explorador, Sábio, Herói, Fora-da-Lei, Mágico, Normal, Amante,
Palhaço, Protetor, Criador, Poderoso. A princípio voltado para servir de
ferramenta para táticas de engenharia organizacional, chega ao mundo do
Marketing e da Publicidade como estratégia de criação da imagem de marcas,
produtos e serviços - leia PEARSON,
Carol. Awakening the Heroes Within: Twelve Archetypes That Help Us
Find Ourselves and Transform our World,
Harper SanFrancisco, 1991; e The Hero and the Outlaw: Building Extraordinary Brands Through The Power
of Archetypes, McGraw-Hill, 2001.
O
Mágico no Tarot é o arcano da Mística, do concentrado, do impulso criado. Está
associado a experiências extra-sensoriais, coincidências e sincronicidades –
momentos mágicos de experiências de transformação.
Uma semiótica de Marina Silva
A
grande mídia não só pressiona para que Marina Silva assuma a candidatura do PSB
como já está construindo uma imagem mística e mágica da personagem,
encaixando-a no personagem arquetípico do Mágico. E a imagem atual de Marina
favorece isso: enquanto Dilma possui uma imagem “dura”(tecnocrática e gestora)
e Aécio é “soft” (playboy e bon vivant), Marina Silva é “orgânica” –
amiga pessoal do mito trágico Chico Mendes, ambientalista e evangélica.
Marina
foi salva pelo destino por uma coincidência. Esse é o primeiro passo para a
construção do signo-arquétipo do mágico para depois ser construída a mitologia:
o destino manifesto, experiências de transformação a partir de imprevistos,
milagres e o desenvolvimento de uma “visão”.
Por
isso Marina Silva, com a sua Rede Sustentabilidade, é a queridinha do meio
corporativo e financeiro, que também constrói a sua própria mitologia com o
mesmo signo-arquétipo do mágico – como, por exemplo, nos discursos da “visão” e
“missão” que as organizações criam no seu próprio endomarketing.
Em
si mesmo o conceito de sustentabilidade é tão mágico e etéreo como uma pedra filosofal,
mas uma ideia motivadora para a linguagem corporativa cheia de eufemismos e
linguagem indireta que esconde intenções mais pragmáticas e concretas.
Projeto Pipoca da TV Globo: reprodução de bagres é mais importante do que o crescimento econômico? |
Quando
vemos coisas como o Projeto Pipoca da TV Globo (levar cinema gratuito para
comunidades periféricas) programando filmes como Tainá e Xingu, pressente-se
uma estratégia abrangente de condicionamento de uma nova sensibilidade que ache
mais importante a proteção da reprodução dos bagres do que a construção de uma
usina hidrelétrica que impulsione o desenvolvimento econômico nacional.
O discurso místico-ecológico-sustentável
Essa
é a origem de toda a atual mórbida excitação midiática e corporativa com a
morte de Eduardo Campos: o discurso místico-ecológico-sustentável é o Plano B
do neoliberalismo dos mercados financeiros.
E
por que os mercados financeiros caem de amores por esse discurso mágico? Por
que Marina Silva reacende as esperanças da oposição e dos mercados financeiros?
Ódio de classe contra o chamado “lulopetismo”? A oposição política certamente,
mas os mercados são muito pragmáticos para alimentar rixas ideológicas: o
discurso ecológico é a piece de
resistance do neoliberalismo por ser
o instrumento para frear o crescimento econômico e manter a hegemonia da agenda
da financeirização global.
A
assessoria de Marina Silva é formada por economistas que pregam a austeridade e
baixo crescimento econômico como um fim em si mesmo sob o álibi do discurso
ambientalista. Para o mercado financeiro, todas as fontes naturais ou humanas
devem ser escassas para se transformarem em comodities e serem especuladas - sobre esse tema clique aqui. O
discurso ambientalista somado ao neo-pentecostalismo pré-luterano de Marina
Silva são a combinação perfeita entre as expectativas da banca e a moralidade
da penúria como um valor em si mesmo de virtude e salvação.
Por
isso, o acidente aéreo de Santos é a preparação de uma bomba semiótica
sincromística: detonar na opinião público uma espécie de destino manifesto de
uma candidata, envolta por uma aura de magia e misticismo – uma estranho mix de
sincronismo e coincidências com neopentecostalismo e ambientalismo. É o
signo-arquétipo do Mágico, a matéria-prima da mais nova bomba simbólica
disparada contra a opinião pública.
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