“Os pensamentos são coisas”
(antigo aforismo oriental)
Desde que o ator Jack Nicholson falou “Eu o avisei!” após a morte do
ator Heath Ledger pouco depois de interpretar o Coringa no filme “Batman: o
Cavaleiro das Trevas”, estranhas “coincidências” passaram a cercar esse
personagem. Nicholson havia interpretado o Coringa em versão anterior do Batman
do diretor Tim Burton. Parecia que ele já havia experimentado a estranha força
desse personagem, espécie de alter ego invertido do protagonista Batman. O
massacre provocado por um atirador na estreia do novo filme do Batman em um
cinema em Aurora, Colorado (EUA), reabre essa discussão: será que esse episódio
é um eco de uma realidade mais profunda que se tenta esconder?
James Holmes foi preso pouco
depois dos disparos e afirmou ser o Coringa para os policiais. O fato de que
muitos fãs foram fantasiados à estreia de “Batman: O Cavaleiro das Trevas
Ressurge”, permitiu ao agressor passar despercebido com máscara de gás e uma
escopeta AR-15.
O próprio pai de Heath Ledger, Kim
Ledger, apressou-se a dizer que “não devemos culpar Heath Ledger ou o
personagem”. A pressa com que Kim Ledger fez essa declaração e o próprio
interesse imediato dos jornalistas em saber o que ele pensava sobre tudo isso revelam
um ato falho: há algo de mais profundo nesse episódio, para além do controle de
armas e munições. Ainda estamos em uma discussão sobre as relações de
causa-efeito. A “loucura” de Holmes encontrou farta disponibilidade de armas e
bombas para se materializar. Mas fica em suspenso a questão: que espécie de “loucura”
é essa?
Dentro do histórico de
atiradores e serial killers na cultura norte-americana, dois elementos chamam a
atenção: primeiro, o atirador não se matou (ou pelo menos não houve tempo para
isso); segundo, faltou o elemento narcísico: o atirador não deixou nenhum vídeo
destinado à divulgação pelas mídias sobre “explicações” do porquê do seu ato.
Parece que o caso do massacre do Colorado não se enquadra no script de casos
anteriores como Columbine. Podemos formular uma hipótese: e se esse caso do
Colorado for a expressão mais dramática e mortal de um fato que é mais
corriqueiro do que imaginamos? Explicando melhor, será que Holmes levou a sua
performance ao extremo em uma sala de cinema onde muitos estavam fantasiados
com os personagens do filme Batman? Ele levou à sério demais seu personagem?
O Coringa e a hipótese sincromística
Hollywood é um vasto sistema de controle psicológico |
“Quando um “alter” – um fragmentado aspecto da psique que foi compartimentalizado e tornou-se independente – é criado, ele efetivamente torna-se independente de qualquer controle da inteligência do psiquismo. Como a natureza odeia o vácuo, algo é inevitavelmente direcionado para preencher o espaço vazio, para tomar posse do fragmento renegado, para orientá-lo e dirigi-lo, e talvez até para habitá-lo. Assim, em tal modificação comportamental, um fragmento "alter" é programado e treinado como um espião, assassino ou escravo sexual, tornando-se toda a sua identidade e função. Essencialmente, começa a agir como fosse a encarnação de algum agente externo. O mesmo pode ser dito, em termos religiosos, quando os demônios possuem um corpo e "derrubam" a sua alma: a pessoa fica dividida em duas ou mais personalidades, uma das quais permanece inconsciente da outra, e assim começam a agir fora de suas "Sombras" de maneiras aberrantes. Nós dizemos que uma pessoa que está "possuída", ou "não é ela própria". Xamanicamente falando, as entidades (que poderão ser formas-pensamento criada pela pessoa, ou por outros ligados a eles, como "fantasmas", "ancestrais", e afins) aguardam essa oportunidade para assumir o controle da psique de uma pessoa e habitam seu corpo. Isso pode ocorrer em formas dramáticas de crimes de paixão, colapso mental, etc. ou em formas mais sutis, mas muito mais prevalentes, tais como comportamento compulsivo, toxicomania, abuso sexual, e afins.” ("O Coringa e o Sincromisticismo")
Para Horsley, embora Hollywood seja um vasto sistema de
controle psicológico, produtores e roteiristas não podem simplesmente inventar
narrativas para terem um efeito determinado. É necessário que sejam autênticas.
Por mais que a narrativa seja moldada e dirigida para fins
sócio-políticos de controle das massas, os elementos da narrativa ainda
pertencem ao reino dos arquétipos e do divino que confere aos produtos
cinematográficos autenticidade e espontaneidade. Em outras palavras, mesmo
quando as narrativas falsas estão sendo criadas para nos cegar para o que está
por trás delas, um eco reflete a mesma realidade profunda que tentam esconder.
A hipótese sincromística não quer apenas dizer que espectadores
são “possuídos” por personagens ficcionais e saem por aí dando tiro e matando
pessoas.
O Sincromisticismo
O pensamento atuante teria a capacidade gerar formas em um campo etérico |
No século XIX a Teosofia de Blavatsky e Leadbeater elabora a noção de
formas-pensamento: o pensamento atuante seria capaz de gerar uma forma em um campo
etérico ou astral. Quando combinadas com emoções interiores elas tenderiam a se
potencializar. A combinação da projeção do
pensamento com os desejos fortalece e vivifica a forma pensamento ativa.
Paixão e desejo dariam tanta força que determinadas formas-pensamento poderiam
se autonomizar, criando vida própria, porém não senciente.
Leadbaeter sugere que essa matéria fluídica ou astral
que formam os pensamentos criaria um verdadeiro “oceano de pensamento” em torno
de nós. Deixamos atrás de nós formas-pensamentos por onde passamos. Algumas formas-pensamento
autônomas teriam o poder de “assaltar” o vácuo mental de indivíduos que acham
serem suas determinadas ideias ou sequências de pensamentos.
Certamente influenciado pelo misticismo da Teosofia do
século anterior o psicanalista Jung vai formular o conceito de arquétipos como
imagens apriorísticas que estão incrustadas profundamente no inconsciente
coletivo – para irritação de Freud que condenava o discípulo Jung de “místico”.
A existência de um inconsciente coletivo habitado por arquétipos vai
produzir a possibilidade de que muitos eventos sociais ou produções artísticas
e culturais serem manifestações externas de arquétipos e a dinâmica desse inconsciente.
Eventos sincrônicos cuja matriz estaria nesse inconsciente coletivo: é a
hipótese da sincronicidade. É como se tudo que ocorre no Universo na verdade
ocorreria em uma só mente, que por momentos e sempre na superfície, padece de
uma esquizofrenia onipotente. Uma unidade subjacente, do
todo em cada parte, do holograma que se projeta no mundo, em fractais.
Arquétipos e indústria do entretenimento
O Massacre de Colorado: um episódio mortal de um fato rotineiro dentro do contínuo midiático |
Na cultura pop o Coringa não é um mero personagem
psicopata do mundo ficcional, mas um poderoso arquétipo. Se no filme Batman – O
Cavaleiro das Trevas, o Coringa fala que “é na hora da morte que conhecemos o
verdadeiro caráter das pessoas” temos que considerar que por trás dessa
afirmação esconde-se uma mistura ímpar de mito, lenda e fatos históricos.
Como uma espécie de “psy-op”, James Holmes levou às
últimas consequências essa afirmação ficcional do Coringa, assim como
testemunhas dos choques dos aviões nas torres gêmeas em Nova York em 2001
achavam o fato real uma produção ficcional cinematográfica. Potencializado pela
indústria do entretenimento, temos em muitos momentos ponto de contato entre ficção e realidade no interior dessa espécie de contínuo midiático atmosférico.
Explicando melhor, a potencialização das
formas-pensamento pela indústria do entretenimento aproxima cada vez mais
ficção e realidade, arquétipos e ação humana, Divino e cotidiano. Em certos
momentos sob determinadas circunstâncias políticas e sociais, essa formas
autônomas transformadas em arquétipos entram em contato com a realidade, assim
como a realidade (ações e pensamentos humanos) dão força a essas
formas-pensamento.
O massacre no Colorado foi um episódio dramático e
mortal de um fato rotineiro dentro do contínuo midiático que envolve a todos
nós: a potencialização e irradiação das formas-pensamento pela indústria do
entretenimento.
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