quarta-feira, abril 09, 2014
Parapolítica: o Umbral 70 anos depois
quarta-feira, abril 09, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Pretos velhos,
índios tupinambás e caboclos falando em mecânica quântica, nanotecnologia
espiritual, clonagens astrais e denunciando a manipulação dessas tecnologias
em sofisticados laboratórios comandados por cientistas emigrados da Terra desde
a Segunda Guerra Mundial, com sombrios propósitos de influência nos bastidores
da política terrestre. Esse é o Umbral (região espiritual limítrofe ao planeta) 70 anos depois das descrições feitas por
André Luiz na série clássica espírita “Nosso Lar”. Quem revela
isso é o espírito Ângelo Inácio através da obra do médium mineiro Robson
Pinheiro. Lá como cá, tecnologias eletrônicas e digitais são usadas como recursos de engenharia para manipular climas de opinião e atingir “endereços vibratórios” (ou “receptores” como
fala a Teoria da Comunicação). É a “parapolítica”, nova abordagem
interdisciplinar (ou interdimensional) dos fenômenos da Política e Comunicação.
A certa altura do
programa Roda Viva da TV Cultura/SP a jornalista da Folha de São Paulo Eliane
Cantanhêde interpelou o entrevistado Almino Afonso (ministro da pasta do
trabalho no governo João Goulart – 1962-64) a dar os nomes daqueles que traíram
Jango dentro da base político-parlamentar, fragilizando-o diante da eminência
do golpe militar. “A maioria deles... eu enfrentaria problemas terríveis em um
plano que não sei absolutamente conviver, um plano de outra dimensão da vida
(ele fala gesticulando as mãos para o alto)... é muito complicado, e eles quase
todos estão mortos... imagina quantos no conjunto já morreram. Sou um dos
raríssimos ministros que ainda está vivo”, responde Almino Afonso recusando a
dar “nomes aos bois” como se referiu a jornalista.
Curiosa resposta
que passou despercebida na entrevista, demonstrando não apenas o caráter moral
(se nega a delatar pessoas que já não estão entre nós) como também um misto de
respeito e temor sobre “a outra dimensão da vida” e “problemas terríveis” que
isso poderia lhe custar – poderíamos especular que o seu temor estaria além da
punição moral, mas o temor de os seus inimigos estarem à espera dele na “outra
dimensão da vida”. Partindo de um político, um tipo de pessoa marcada pela índole
pragmática e com interesses bem terrenos, é uma declaração a princípio
surpreendente. Mas será mesmo?
segunda-feira, abril 07, 2014
A dialética gnóstica do senhor e escravo no filme "Expresso do Amanhã"
segunda-feira, abril 07, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Mais um filme hollywoodiano
de ficção científica distópico e pós-apocalíptico? Com elenco estelar dirigido pelo
coreano Jooh-ho Bong em sua estreia em filmes de língua inglesa, “Expresso do
Amanhã” (Snowpiercer, 2013) narra como
uma espécie de arca ferroviária com sobreviventes da espécie humana após uma
catástrofe climática que fez o planeta entrar em nova Era do Gelo, se
transforma em um microcosmo da Terra. Em um gigantesco trem com centenas de
vagões que circula indefinidamente pelo planeta cria-se um sistema totalitário
com luta de classes, exploração, dominação e manipulação psicológica. Mas as
dificuldades de distribuição e lançamento do filme apontam para uma produção
com narrativa não convencional que foge da dualidade Bem/Mal lembrando a famosa dialética do senhor e escravo tal como descrita pelo filósofo alemão Hegel. Porém,
com desfecho não convencional nem para Hollywood e nem para Hegel. Filme sugerido pelo nosso leitor Joari Carvalho.
Um filme com
diversos problemas de produção e, principalmente, distribuição. A ideia de
associar o ótimo diretor coreano Jooh-ho Bong com atores conhecidos nos EUA
como Chris Evans (Capitão América), John Hurt, Ed Harris e Tilda Swinton era promissora
dentro da atual política de Hollywood em globalizar os aspectos de direção e
produção cinematográficas. Porém, algo não deu certo: mesmo já tendo sido
exibido na Ásia, o filme ainda não estreou no Ocidente (nos EUA até o dia 31/03
não havia estreado e no Brasil e era esperado para esse mês nos cinemas
brasileiros) e sua estreia tem sido adiada diversas vezes: diversas versões do
filme parecem terem sido criadas, com diversos cortes que chegam a totalizar 20
minutos, tentando agradar os estúdios e desagradar o diretor Bong.
sexta-feira, abril 04, 2014
O "Estadão" de 31 de março: bomba semiótica ou sincronicidade?
sexta-feira, abril 04, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Leitores desse blog chamaram atenção para um estranho fenômeno semiótico apresentado pelo jornal “O Estado de São Paulo” na edição de 31 de março, dia
marcado pela lembrança dos 50 anos do golpe militar de 1964. No caderno “Metrópole”
do jornal paulistano uma sequência de duas páginas ímpares criou uma curiosa
associação metonímica entre uma matéria sobre intervenção militar no Complexo
da Maré no Rio de janeiro e um anúncio do HSBC onde um desenho artisticamente
elaborado parece fazer um comentário pontual do que lemos na página anterior: a
cidade do Rio de Janeiro à beira de um abismo e carregada por um tanque
militar. Mais uma bomba semiótica? Delírios conspiratórios? Ou uma “coincidência
significativa”?
Desde as
grandes manifestações de rua de junho do ano passado sabemos que uma guerra
semiótica está sendo travada pelo domínio da opinião pública. Um domínio que
não visa a persuasão política ou disseminação ideológica, mas a explosão de
verdadeiras bombas semióticas para moldar a percepção: criar um clima de
opinião de que o país atravessa um estado de convulsão, caos e pré-insurgência
civil.
Desde a
morte do cinegrafista da Band, Santiago Andrade, em protestos no Rio de Janeiro
em fevereiro percebeu-se um refluxo nas manifestações de rua. Protestos de rua
turbinados por operações semióticas da mídia foram desde então substituídos pela
repercussão de pautas que acabam se tornando supercondutores de manifestações
de intolerância e de fascismo difuso – forma de pensar onde qualquer tema é
pensado a partir de soluções finais, radicais e intervencionistas.
quinta-feira, abril 03, 2014
A vida não tem script no filme "Wrong"
quinta-feira, abril 03, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Após o
inacreditável filme “Rubber” (2010) onde um pneu com poderes telepáticos roda o
deserto em busca de sangue e vingança, o francês Quentin Dupieux nos brindou
com “Wrong” (2012) produção que chega ao ápice da filosofia “no reason” que o
diretor desenvolve para desconstruir não só o cinema como a própria realidade.
Partindo de um plot narrativo surreal (um homem que descobre que seu cão desapareceu
e tenta achá-lo por meio de um método de união telepática homem/cão ensinado
por um guru new age), Dupieux procura fazer um cinema que não
ofereça às pessoas a esperança de que a realidade seja provida de algum sentido.
Para ele, se a vida é caótica e incerta, assim devem ser também as narrativas cinematográficas.
Dupieux acredita que quanto mais surreal e inverossímil forem os argumentos de
um filme, mais “realista” se torna para os espectadores.
Tendemos a pensar
que a vida cotidiana é marcada por papéis sociais, regras e normas às quais
temos que nos encaixar, tornando o dia-a-dia um tédio, sempre à espera de um
feriado prolongado que nos liberte. Vamos ao cinema ou assistimos a um vídeo na
esperança de uma breve escapadela da rotina para procurar nos produtos
audiovisuais algo que dê sentido à nossa rotina desesperançada.
Mas para o diretor
francês Quentin Dupieux é exatamente o inverso: a vida é caótica, incerta, sem
scripts definidos, sempre nos pegando de surpresa. Na verdade a realidade não
faz muito sentido. E vamos ao cinema para assistirmos histórias onde tudo faça
sentido, exatamente como a vida não é. Dupieux procura fazer o contrário: um
cinema que não ofereça às pessoas a esperança de que a existência tenha algum
sentido ou propósito. Em outras palavras, o diretor francês tenta fazer uma
interessante conexão entre a visão gnóstica da existência com uma desconstrução
da linguagem cinematográfica.
domingo, março 30, 2014
Neurogadget que promete sonhos lúcidos é sintoma da cultura dos aplicativos
domingo, março 30, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Um aplicativo que
promete para o usuário sonhos lúcidos. É o “Aurora”, criado por uma start up
californiana e previsto para ser lançado no segundo semestre desse ano, que
promete tornar os sonhos tão produtivos e eficientes que farão a terça parte da
vida que passamos dormindo valer a pena. O neurogadget Aurora é um sintoma
tanto da cultura atual dos aplicativos que cria nos usuários uma falsa ilusão
de racionalidade e planejamento de onde nem os sonhos parecem escapar; e de uma
agenda tecnognóstica que une
neurociências, ciências computacionais e Inteligência Artificial com o
propósito de efetuar a cartografia e topografia da mente com objetivos de
manipulação e controle social.
Em postagem
anterior discutíamos como o cinema parece antecipar uma espécie de agenda
tecnocientífica – sobre isso clique
aqui. Dessa vez, os diversos filmes que abordaram o tema dos sonhos lúcidos
(Vanilla Sky, A Origem, Sonhando Acordado, entre outros) parecem ter se
antecipado ou inspiraram um aplicativo criado pela IWinks, uma start up de San Diego, nos EUA: o “Aurora”,
aplicativo que promete ao usuário criar sonhos lúcidos a partir de um
dispositivo que mede as ondas cerebrais e o movimento dos olhos.
O sonho lúcido
ocorre no momento em que o sonhador começa a ter uma relação de estranheza com
o fluxo dos acontecimentos oníricos e passa a questionar a própria realidade.
Consciente que se encontra num sonho, passa então a interferir na lógica
onírica. O aplicativo “Aurora” supostamente promete criar essa situação para o
usuário a partir do momento em que o dispositivo percebe os movimentos REM e a
alteração das ondas cerebrais, enviando jogos de luzes e sons personalizados
para o usuário que, sem despertar, perceberá que está num sonho - veja abaixo o video promocional do aplicativo.
sábado, março 29, 2014
A filosofia do ressentimento em "Um Homem com Duas Vidas"
sábado, março 29, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Um olhar tragicômico
sobre o ressentimento. Com uma complexa narrativa repleta de flash backs onde
memórias e fantasias se misturam (marca registrada do belga Jaco Van Dormael,
diretor do filme “Sr Ninguém” de 2009), “Um Homem Com Duas Vidas” (Toto Le
Héros, 1991) conta a história de Thomas, um homem que acredita que a sua vida
foi roubada e, com a ajuda de um agente secreto imaginário chamado Toto, pretende
vingar-se. Embora a constelação de afetos que formam o ressentimento (raiva,
inveja, amargura e vingança) seja tratada pelo filme de forma leve e cômica, a
complexidade narrativa que funde o passado com o presente levanta uma questão central:
o esquecimento. Freud e Nietzsche deram respostas diferentes: para o pai da
psicanálise o esquecimento negaria a chance de compreender o passado enquanto
para Nietzsche era a única chance de nos libertarmos das garras do
ressentimento. Além de levantar esse tema “Um Homem Com Duas Vidas” ainda vai
conectar o ressentimento individual com o social ao mostrar como as memórias de
um super-herói midiático se confundem com memórias e fantasias da infância.
O diretor belga
Jaco Van Dormael já é conhecido por esse
blog pelo filme Sr. Ninguém (Mr.
Nobody, 2009) onde o protagonista vê a sua vida como um gigantesco hipertexto
com diversos futuros alternativos e luta contra os eventos aleatórios que podem
interferir no livre-arbítrio das decisões.
Um Homem com Duas Vidas (Toto Le Héros, 1991) marcou a estreia do diretor em longa metragens.
Situada em um futuro próximo, Van Dormael nos conta a história de um homem
idoso chamado Thomas que olha para trás na sua vida através de uma espécie de
fluxo de consciência construído por um complexo mosaico de flash backs intercalado com fantasias de como os acontecimentos
poderiam ter sido diferentes.
quarta-feira, março 26, 2014
Revisitando o documentário "Muito Além do Cidadão Kane"
quarta-feira, março 26, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Aos 50 anos do
golpe militar de 1964 é necessário revisitarmos o documentário “Muito Além do
Cidadão Kane” (Beyond Citizen Kane, 1993), dirigido por Simon Hartog para o
Channel Four da Inglaterra. A Globo venceu na justiça e o filme foi banido do
País, mas acabou assistido e debatido nos meios universitário e acadêmico. Tornou-se
um documento fundamental para conhecermos o Brasil e a nossa TV. Ficou famoso
internacionalmente pelas suas denúncias sobre as manipulações do telejornalismo
da Globo e o favorecimento econômico da emissora de Roberto Marinho desde o
início do regime militar. Mas o documentário de Hartog diz mais, que só o olhar
de um estrangeiro poderia ver: os detalhes que contribuíram para a Globo formar
a primeira rede de TV do país, capaz de criar um conteúdo tão genérico que
passou por cima da diversidade cultural e regional brasileira. “A estranha
combinação” do entretenimento dominical, a TV em cores e o projeto de
modernidade e integração nacional dos militares e o condicionamento da vinheta
do plim-plim e da linguagem do globês que alterou a identidade idiomática do
brasileiro.
Às vésperas dos 50
anos do golpe militar de 1964, é oportuno fazermos uma revisita ao lendário
documentário televisivo britânico Muito
Além do Cidadão Kane. Produzido e distribuído pelo canal privado Channel
Four em 1993 e dirigido por Simon Hartog, o documentário foca as relações entre
a grande mídia e o poder no Brasil e detalha a posição monopolista da rede
Globo que cresceu à sombra do regime militar. Analisa a figura do proprietário
Roberto Marinho, suas relações políticas com o Estado (aproximando-o do
personagem Charles Foster Kane, personagem criado por Orson Welles para o filme
Cidadão Kane de 1941) e o poder da
emissora em formar e manipular a opinião pública.
A ideia da
produção do documentário surgiu quando Hartog visitou o Brasil nos anos 80 e
ficou impressionado com o império midiático da Globo, Roberto Marinho e o seu
pragmatismo político. Hartog fazia parte
de um grupo de cineastas de esquerda da London Coop. Antes de produzir Muito Além do Cidadão Kane ele já havia
realizado Brazil: Cinema, Sex and the
Generals (1985) sobre o papel político das pornochanchadas na época do regime
militar. Para os amigos, Hartog confidenciava a surpresa pelos brasileiros até
então nunca terem feito um documentário sobre o poder da Globo.
domingo, março 23, 2014
"Aurora" supera "A Origem" e inova as representações do inconsciente no cinema
domingo, março 23, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
É inevitável a
comparação entre “Aurora” (Vanishing Waves, 2012) da lituana Kristina Buozyte
com “A Origem” (Inception, 2010) de Christopher Nolan: enquanto a produção
hollywoodiana abordava o mundo onírico pelo viés das neurociências
(jamais a palavra “inconsciente” era citada), a produção lituana aborda o mesmo
tema, mas fiel ao ponto de vista freudiano sobre a dinâmica do psiquismo, inovando as representações do inconsciente no cinema através de
engenhosos efeitos inspirados em MC Escher e expressionismo alemão. Se Freud
considerava o inconsciente como o “Isso” e o “Estranho”, “Aurora” mostra como
uma neurociência atual munida de interfaces digitais e mapas neuronais tenta
ignorar essa origem de toda atividade humana impossível de ser apreendida pela
ciência racionalista.
Em postagem
passada quando discutíamos o filme A Origem (Inception, 2010)
observamos que a grande deficiência do filme de Nolan era abordar o tema dos
estados imersivos de alteração de consciência e o mundo onírico dos sonhos sob
um ponto de vista associado à engenharia do espírito das neurociências: embora
tudo ocorresse no mundo dos sonhos, nunca se tocava na palavra inconsciente e o
psiquismo era abordado pela possibilidade pragmática de manipulação
neurocientífica comandada por interesses corporativos.
O que tornou A Origem num filme estéril e assexuado
onde a presença feminina tornou-se masculinizada ou, então, um objeto abstrato
tal como uma princesa de contos de fadas. Bem diferente é o filme da lituana
Kristina Buozyte Aurora (Vanishing Waves) em que a narrativa
revisita alguns conceitos das viagens no mundo dos sonhos de A Origem. Porém, em Aurora, o psiquismo do mundo dos sonhos é uma mix de surrealismo e
de uma primitiva psicossexualidade que faria Freud ficar corado. Kristina se
aproxima muito mais do funcionamento do psiquismo humano do que Nolan ao
capturar como a experiência real do sonho pode ser assustadora e desagradável,
mesclada com primitivas e incontroláveis fantasias eróticas. O que torna Aurora um filme diferenciado no gênero
de ficção científica: uma erótica e surreal viagem mental.
quinta-feira, março 20, 2014
Documentário "O Abraço Corporativo": o jornalismo está nu
quinta-feira, março 20, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Uma das maiores
barrigas da grande mídia passou despercebida para o grande público e na época
sua repercussão acabou restrita a veículos especializados em jornalismo e
revistas acadêmicas. O documentário “O Abraço Corporativo” (2009) do jornalista
Ricardo Kauffman descreve o passo a passo da criação de uma “pegadinha” sobre
um suposto executivo de Recursos Humanos que estaria introduzindo no Brasil uma
revolucionária terapia motivacional baseada nos poderes curativos de um simples
abraço. Explorando os vícios de uma imprensa baseada no jornalismo declaratório
que está sempre em busca de bons personagens, o suposto representante da
chamada “Confraria Britânica do Abraço Corporativo” expôs as mazelas de um
jornalismo onde a ambição de ascensão na carreira de jornalistas está na
relação direta com a sua precarização profissional.
O filósofo Louis
Althusser dizia que ideologia é quando as respostas precedem as questões. Se
isso for verdade, então a prática jornalística se tornou a maior indústria de
produção ideológica, mais perigosa que o entretenimento porque opera sob a
chancela da informação e da realidade. Raramente o jornalista “descobre”. Na
maioria dos casos ele sempre encontra o que procura: tenta confirmar uma ideia,
uma hipótese ou, então, encaixar acontecimentos a um certo script que já tem em mente.
E para mostrar que
não está enganado, a melhor forma é produzindo um personagem por meio de uma
calculada busca de “desconhecidos”. Seus rostos na tela podem ser
desconhecidos, mas seus personagens são familiares. Um atentado? Procure um
bombeiro heroico e uma pessoa que por um lapso do destino não estava no local
da explosão porque acordou naquela manhã cinco minutos mais tarde. Uma manifestação?
Procure o líder (mesmo que ele não exista) ou aquele manifestante que saiu às
ruas pela primeira vez. Greve de ônibus? Procure uma mulher simples e ofegante,
desesperada porque seu patrão pode despedi-la caso não chegue ao trabalho.
segunda-feira, março 17, 2014
Em Observação: "Olhos de Rinoceronte" (2003)
segunda-feira, março 17, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O filme “Olhos de
Rinoceronte”, estreia de Aaron Woodley, sobrinho do famoso diretor canadense
David Cronenberg, é uma excelente oportunidade para se discutir como os filmes
gnósticos atuais exploram na sua estética a combinação de elementos do gênero
barroco e romântico, resultando naquilo que alguns autores chamam de “neobarroco”:
um protagonista que vive imerso num gigantesco depósito de antiguidades e
relíquias alugadas para produções cinematográficas, onde o amor por uma
cenógrafa tentará arrancá-lo daquele mundo de ilusões. Mas os objetos, em
bizarras animações em stop motion, tentarão mantê-lo prisioneiro naquela alegoria de caverna platônica.
sexta-feira, março 14, 2014
Videocassete, controle remoto e as oportunidades perdidas
sexta-feira, março 14, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O DVD passou e já
estamos na geração do Blu-Ray. Mas parece que no Brasil ninguém entendeu as
potencialidades de antigos dispositivos tecnológicos como o controle remoto e o
finado videocassete. As promessas do controle remoto de “se livrar de
comerciais chatos” graças à “magia negra da eletrônica”, como era divulgado o
novo dispositivo na década de 1950, se equivalem às perspectivas de que o
videocassete era a “libertação do vídeo” e que transformaria o espectador no “senhor
da TV” na década de 1980. Muitas teorias conspiratórias sustentam que foi muito
conveniente para o monopólio televisivo da Rede Globo que tais inventos não
fossem compreendidos na sua plenitude pelo telespectador. Com a possibilidade de gravações programadas que o videocassete oferecia, certamente
a grade de programação da Globo (introjetada tão profundamente no psiquismo do
brasileiro que foi capaz de diminuir a taxa de natalidade) certamente sofreria
grande impacto. Mas essa oportunidade foi perdida.
O ano era 1972.
Após o sucesso editorial do Manual do
Escoteiro Mirim (publicação infantil inspirada na atividade do escotismo dos
sobrinhos do pato Donald, Huguinho, Zezinho e Luizinho), a editora lançava o Manual do Professor Pardal no qual eram
contadas as histórias de muitas invenções, sempre ilustradas pela presença do
simpático personagem da galeria Disney.
Folheando as coloridas páginas com várias
curiosidades do mundo dos inventores e invenções, a certa altura deparamo-nos com
um pequeno texto sobre o videocassete, até então uma invenção recente da Sony e
introduzida no mercado norte-americano um ano antes. O texto sobre o novo
dispositivo tecnológico tinha um tom futurista e revolucionário que prometia
mudar a televisão tal como até então se conhecia:
segunda-feira, março 10, 2014
A nostálgica bomba semiótica do retrofascismo
segunda-feira, março 10, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Depois das
manifestações de rua onde foram produzidas bombas semióticas pontuais (fusca
incendiando, coreografia desafiadora dos black blocs etc.) acompanhamos a mídia
repercutir imagens de racismo, linchamentos, intolerância e crimes cometidos
por menores principalmente por meio de vídeos amadores produzidos por telefones
celulares. Todas as imagens seguidas de comentários alarmistas em telejornais
que incitam soluções ainda mais radicais. Sob a aparência neutra de informação,
as imagens a longo prazo suscitam uma estranha nostalgia que se espalha na
grande mídia e redes sociais. “Marcha da Família”, depreciação da política e
intervenção militar ou o revival de alucinadas conspirações comunistas cubanas e Guerra Fria são sintomas de um complexo psíquico mais profundo e preocupante: o
protofascismo colocado em movimento por meio do mecanismo semiótico do “retrofascismo”
– nostalgia pós-moderna + protofascismo.
· O jogador Arouca, disputando uma partida em Mogi Mirim/SP pelo time do
Santos, assim como o árbitro Márcio Chagas em jogo pelo campeonato gaúcho foram
alvos de insultos racistas por parte de torcedores;
·
Após o episódio de defesa do ato de linchamento contra um garoto negro
que havia cometido furtos em um bairro no Rio de Janeiro, a apresentadora de um
telejornal do canal SBT Rachel Scherazade sai nas redes sociais apoiando a
convocação da “Marcha da Família com Deus Pela Liberdade” para o dia 22 que
defende, entre outras coisas, a destituição da presidenta Dilma e do vice
Michel Temer, dissolução do Congresso Nacional e intervenção militar,
ressuscitando antigos fantasmas como conspirações cubanas e comunistas;
sábado, março 08, 2014
Há um fantasma na máquina no filme "Ela"
sábado, março 08, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
No filme “Ela” (Her, 2013 - Oscar de melhor roteiro original), o diretor Spike Jonze retorna ao tema da
intimidade e incomunicabilidade das relações humanas abordadas pelo filme
“Quero Ser John Malkovich” (1999). Só que dessa vez sem alegorias, mas com a
mediação tecnológica de um sistema operacional que parece adquirir inteligência
e desenvolver emoções autênticas. Será que o software desenvolve uma verdadeira
inteligência ou será que nós estamos rebaixando nossas expectativas sobre a
inteligência para as máquinas parecerem mais espertas? Se isso for verdade,
isso não prejudicaria também nossas expectativas em relação aos relacionamentos
e o amor? Mas para Spike Jonze há um fantasma na máquina que pode subverter as
programações algorítmicas e encontrar uma dimensão espiritual no espaço
quântico entre o “0” e o “1” da codificação binária.
Em meados da
década de 1990 um hacker americano em
Berlin e um colega francês colocaram em prática uma curiosa experiência em
ciber-sexo: criaram um traje especial para o corpo imergir numa
experiência de sexo à distância. Uma perfeita máquina de ciber-sexo que
possibilitaria uma relação sexual virtual entre Paris e Berlin. O experimento foi divulgado e atraiu uma
multidão nas duas cidades. O que se sucedeu foram pessoas vetorizando seus
corpos, supostamente sentindo toques e penetrações de seus parceiros remotos
como fossem experiências presenciais.
Mas algo curioso aconteceu. Ao final do segundo dia um ciber-parceiro de
Paris mandou uma mensagem dizendo que estava tendo um problema com os códigos:
uma falha na programação estava fazendo o programa funcionar em loop, em um feedback fechado. O que significava que em dado momento o usuário
não estava mais fazendo sexo com algum parceiro remoto, mas com suas próprias
sensações digitalizadas em looping. E
os participantes estavam adorando! Em síntese, a experiência europeia de
ciber-sexo converteu-se em um evento autístico, uma ciber-masturbação (leia
KROKER, Arthur. Hacking the Future.
New York: St. Martin Press, 1996).
quarta-feira, março 05, 2014
Futebol e a decadência do entretenimento dominical
quarta-feira, março 05, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Às vésperas de uma
Copa do Mundo no Brasil, fica evidente que existem dois tipos de inimigos do
futebol: os mortais e os morais. Ambos professam uma nova religião em ascensão
graças a ética da penúria favorecida pelo quadro de recessão internacional. Uma
religião que vê a realidade como uma existência dura e triste e que o pecado do
futebol é proporcionar a alienação e fuga dessa verdade. Mas não percebem que na atualidade
o futebol, tanto no estádio como na TV, transformou-se no espelho da decadência
do entretenimento dominical – o futebol não afugenta a realidade, mas, ao
contrário, a reproduz de forma repetida e amontoada. O futebol atual deixou de
ser uma festa de participação popular, um teatro grego ou alguma espécie de
catarse coletiva para ser conectado ao quadro de austeridade global. O futebol
deixou de ser um espaço lúdico de fuga da realidade para ser algo inseparável
do dia-a-dia.
Às vésperas da
realização da Copa do Mundo no Brasil, podemos perceber que existem basicamente
dois inimigos do futebol: os mortais e os morais.
Os inimigos
mortais dizem que o futebol é uma fuga. Para eles nada deve escapar da
realidade. O único tipo de vida reconhecível seria o fardo da vida adulta, o
chumbo da razão. Quem lograr fugir será morto pela inconsistência e
infantilização.
segunda-feira, março 03, 2014
Oscar 2014 apresenta sincronicidades e recorrências
segunda-feira, março 03, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O esperado duelo
entre os filmes "Gravidade" e "12 Anos de Escravidão" na categoria Melhor Filme
acabou se confirmado na 86o Cerimônia do Oscar. O prêmio da
categoria acabou confirmando uma recorrência observada pelo menos desde 2010: além
do fato que a Academia parecer não gostar muito de premiar filmes em 3D,
percebe-se que filmes de História sempre vencem. Como explicar esse padrão?
Talvez começando por uma curiosa sincronicidade que envolve a comediante Ellen
DeGeneres e Hollywood: ela sempre é convidada a apresentar cerimônias um ano
após grandes tragédias nacionais. Talvez aí encontremos uma conexão ideológica
entre os filmes-catástrofe, os chamados filmes históricos e o atual quadro
econômico mundial recessivo.
Desde o primeiro
cinema se estabeleceu a oposição entre ficção e realidade, ilusão versus
documentário: de um lado os irmãos Lumiére que acreditavam que a verdadeira
natureza da câmera era documental; do outro lado o ilusionismo das trucagens,
cortes e sobreposições das imagens do ex-mágico Méliés que acreditava que a
essência do cinema era ficcional. De um lado o realismo documental das imagens da
saída de operários no final de um dia de trabalho captadas pelos Lumiére; e do
outro, os efeitos mágicos da primeira viagem à Lua criados por Méliès.
Não é à toa que os
primeiros gêneros populares no primeiro cinema fossem tão opostos: o fervor
religioso dos filmes sobre a paixão de Cristo versus prazer voyeurístico das
primeiras imagens pornográficas. Ficção e não-ficção, ilusão versus realidade e
formalismo versus realismo foram oposições que a história do cinema acabou
criando, ajudando a construir uma forma de entretenimento não totalmente “irreal”,
mas carregado de verossimilhança e plausibilidade. Uma forma de entretenimento
que divertiria, mas, ao mesmo tempo, seria capaz de dizer “verdades”.
domingo, março 02, 2014
Em Observação: Oscar 2014 - "É a economia, estúpido!"
domingo, março 02, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Ao contrário de 2013, esse ano há poucos filmes entre os indicados ao
Oscar que abordam temas mitológicos, místicos ou religiosos. Se no ano passado
tivemos “Django Livre”, “As Aventuras de Pi”, “O Mestre” entre outros, no Oscar
2014 temos apenas o filme “Gravidade”, “Ela” e a animação japonesa “Vidas ao
Vento” de Hayao Miyazaki (“A Viagem de Chihiro”, 2001). Por que essa mudança
conceitual entre os filmes indicados ao prêmio máximo da indústria do cinema?
Será que a expressão “É a economia, estúpido!” sintetizaria essa guinada de
Hollywood para esse ano?
Comparado com a premiação do Oscar do ano passado, a presença de filmes
indicados com temas mitológicos, religiosos, místicos e esotéricos é
sensivelmente menor. Em 2013 tínhamos filmes como Django Livre (o encontro do spaghetti-western de Tarantino com
temas bíblicos e vingança), Indomável
Sonhadora (a jornada do herói de uma menina lutando contra a ameaça do caos
e das águas), O
Mestre (a história da espiritualidade contemporânea através da ascensão
de uma seita chamada Cientologia) e ainda As
Aventuras de Pi (onde os relatos de diversas religiões nada mais são do
que signos diante de um cosmos hostil e violento que cria no protagonista uma
nova experiência do sagrado).
sábado, março 01, 2014
Por que celebramos a velocidade?
sábado, março 01, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
“Quicklube”, “Quick Cash”, “American Express”, “Federal Express”, “Mach 3”, “Slimfast”, “Speedo”, “Speed Dial”, “Crédito Rápido”. “Entregamos em 20 minutos ou você não precisa pagar por ele”. “Você precisa agir AGORA!”. “Corra! Restam alguns dias. Acabarão muito em breve!” Ser veloz é moralmente bom, como diariamente nos dizem as mensagens publicitárias. Se a velocidade tornou-se uma força psicológica que afeta nossas relações com o mundo, como uma sociedade pode pretender humanizar o trânsito e a vida urbana se ela mesma promove a celebração da velocidade e da aceleração? Através dessa celebração da velocidade e da glamorização da lei do menor esforço, a obsessão pelo "maior é melhor" é substituída pela compulsão do "mais rápido é melhor“. Situações velozes se tornam significantes naturais do desejo, superioridade e eficiência, enquanto a lentidão é sinônimo de frustração e impotência.
Onde Guy Debord via a “sociedade do espetáculo”, Paul Virilio (urbanista
e pensador francês) via uma “sociedade da velocidade”. Nesta abordagem,
velocidade é um meio ambiente e uma força sócio-psicológica que transformam o
que fazemos, como o fazemos, como nós pensamos e sentimos e, assim, como nos
tornamos.
Os estados velozes se tornam o significante do desejo, capacidade,
superioridade, eficiência, energia libidinal, performance e inteligência. Ao
contrário, lentidão torna-se o significante da frustração, falta,
inferioridade, deficiência, impotência, fraqueza, ou ainda – pensando em termos
infantis – retardamento mental.
Velocidade se torna um novo imperativo cultural, disciplina, forma de
dependência e submissão. Virilio também vê a velocidade como uma força
psicológica e social ou uma pressão que altera a visão de mundo,
desorienta-nos, deixa-nos num estado de concussão mental e promove uma profunda
crise que afeta nossas relações com o mundo, sociedade e democracia. Para ele,
a natureza não é apenas destruída por uma poluição química ou térmica mas
também por uma poluição dromosférica – uma invisível poluição através da
velocidade (veja VIRILIO, Paul. “Velocidade e Política”).
terça-feira, fevereiro 25, 2014
Não existe almoço grátis para o remake "RoboCop"
terça-feira, fevereiro 25, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
“Não existe almoço
grátis”, diz uma frase popular americana que sintetiza bem o espírito pragmático
daquele país. E José Padilha, diretor brasileiro de Tropa de Elite (2008), deve
ter comprovado isso ao ser convidado pelos estúdios da MGM para dirigir o
remake do clássico de ficção científica “RoboCop” dirigido pelo holandês Paul
Verhoeven em 1987. Atravessando séria crise financeira, o estúdio não quis se
arriscar em fazer uma refilmagem com o mesmo tom crítico visceral da versão
original: os temas da ganância corporativa, do desmanche e da privatização da
segurança pública estão diluídos em um roteiro onde os vários coadjuvantes se
equivalem em meras opiniões ou pontos de vista. Mais ainda, o filme parece
apresentar um estranho ato falho: ao colocar o papel da mídia como o principal
instrumento de manipulação corporativa, sugere que o próprio filme estaria
mostrando que o seu herói RoboCop poderia ser o instrumento de um lobby bastante
atuante em Hollywood, o da indústria de armas.
Na verdade o filme seria dirigido por Darren Aronofsky ("Cisne Negro" e "Pi"), que abandonou o
projeto no meio do caminho (o roteiro já estava pronto) diante das sérias
dificuldades financeiras do estúdio – segundo a revista Financial Time a MGM possui uma dívida atual de 3,7 bilhões de
dólares e grande parte dos seus lucros são atualmente drenados para o pagamento
dos juros – sobre isso clique aqui. As especulações
sobre o motivo da desistência de Aronofsky foram muitas: resistências fazer um
filme em 3D, recusa da MGM em pagar alto salário a um consagrado diretor e
rejeição do estúdio pelo roteiro apresentado por Aronofsky.
O fato é que José Padilha acabou trabalhando com o roteiro do estreante
Joshua Zetuner e como protagonista escolheu o sueco Joel Kinnaman. As locações
foram feitas fora dos EUA, no Canadá – as más línguas diriam que todas essas
alternativas mais em conta teriam sido escolhas naturais de um estúdio
pendurado sobre um abismo financeiro.
sábado, fevereiro 22, 2014
A miséria da estética e da linguagem do trabalhador precarizado
sábado, fevereiro 22, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
No passado era o
proletariado, os explorados e os excluídos. Hoje temos os precarizados:
trabalhadores terceirizados, estagiários, temporários e todo um conjunto de
profissionais treinados espontaneamente para suas funções através da
manipulação de ícones em telas de celulares e mensageiros instantâneos usados no dia-a-dia, desde o velho ICQ até o atual Skype. Participantes incautos de uma ordem que foi secretamente gestada no interior de gigantescos prédios espelhados, com o apoio de uma estética e linguagem igualmente
precarizadas criadas por planilhas eletrônicas e elegantes gráficos e tabelas
projetadas em reuniões onde orgulhosos gestores professam discursos que
misturam efeitos de ciência, religião, misticismo e fenômenos da natureza.
“Aquele que é duro consigo mesmo também é com os demais” (Theodor
Adorno)
No início foi o gerundismo dos telemarketings e SACs de empresas que
invadiu a fala cotidiana. Ao mesmo tempo, imensos prédios corporativos em concreto
e vidros espelhados tomavam a paisagem urbana como fossem bunkers isolados do
contato com o mundo exterior por meio de seguranças privados e sistemas
centrais de climatização.
E no interior desses prédios foi secretamente gestada uma nova ordem
estética e linguística para dar sentido imaginário a um novo tipo de organização
de trabalho: a precarização – trabalhadores terceirizados, temporários, por
tempo parcial, estagiários, trabalhadores da “economia subterrânea” etc.
quarta-feira, fevereiro 19, 2014
Quando fantasmas aparecem quem você chama: The Ghost Busters ou Ghostbusters?
quarta-feira, fevereiro 19, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Poucos sabem, mas
o filme “Ghostbusters” de 1984 foi inspirado em uma série de TV exibida em 1975
nos EUA e no Brasil, chamada “The Ghost Busters”. Baseado no humor “pastelão” e
“trash” a série contava as aventuras e desventuras de um trio (entre eles um
gorila!) que perseguia fantasmas e seres sobrenaturais com um “desmaterializador
de fantasmas”. O roteiro original do
filme “Ghostbusters” escrito por Dan Aykroyd e Harold Ramis (mais fiel ao
espírito da série de TV de 1975) foi recusado pela Columbia Pictures e recriado
dentro de um tom bem diferente, dessa vez cínico e marcado pelos valores do “cinema
recuperativo” dos anos 1980 – os valores do empreendedorismo, individualismo,
fama, sucesso e ambição misturados com os fantasmas que deveriam ser
exorcizados em um país que tentava se reerguer através do neoliberalismo após a recessão da década de 1970.
Se o historiador francês Marc Ferro estiver certo de que o filme pode
ser considerado um verdadeiro documento primário por expressar por meio de
imagens e movimento o imaginário e sensibilidades de uma determinada época,
então encontraremos uma expressão cinematográfica das diferentes sensibilidades
de cada década em remakes ou
adaptações.
Podemos fazer um exercício dessa análise comparativa com dois filmes, o
original e o remake, dentro do subgênero “caçando fantasmas”: a série original The Ghost Busters (1975) e Ghostbusters (1984).
Esse verdadeiro subgênero tem uma longa tradição no cinema
norte-americano onde fantasmas ou seres sobrenaturais surgem para perturbar a
ordem do mundo dos vivos para depois serem caçados por heróis especializados
nos fenômenos paranormais (ou nem tanto) e despachados para o outro mundo de
onde não deveriam ter saído.
segunda-feira, fevereiro 17, 2014
Por que somos seduzidos pelo virtual?
segunda-feira, fevereiro 17, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
“É a verdade... a digitalização da vida real. Você não vai só a uma festa. Vai a uma festa com uma câmera digital. E seus amigos revivem a festa on line.” Essa afirmação de Sean Parker (criador do Napster, interpretado no filme por Justin Timberlake), que aparece solta nas frenéticas linhas de diálogo no filme “A Rede Social” (The Social Network, 2010), é a síntese do “desejo de virtualidade”, essa motivação individual que sustenta todo o projeto tecnognóstico que domina a atual agenda tecnológica e científica. O desejo pela digitalização da vida seria a recorrência de uma milenar aspiração gnóstica pela transcendência da carne e a imortalidade da espécie. Mas essa aspiração por transcendência transforma-se em má consciência ao ser capturada por sistemas econômicos e políticos. Transforma-se em ideologia, como questiona o pesquisador canadense em ciência política, tecnologia e cultura Arthur Kroker.
sábado, fevereiro 15, 2014
Projeto inédito no Brasil promete imersão real do espectador no cinema
sábado, fevereiro 15, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
3D, 4D, 5D, IMAX. A indústria
cinematográfica atual vem mobilizando toda uma parafernália tecnológica para
capturar o desejo de quebra da rotina e fuga da realidade do espectador.
Imersão e interatividade são as palavras de ordem da indústria do
entretenimento. Nesse mês uma inédita experiência de imersão cinematográfica em
São Paulo pretende ir além dessas estratégias industriais padronizadas,
mostrando que o espectador pode de fato imergir no espaço das sequências de um
filme: é o audacioso e complexo projeto Cine Imersão. Inspirado no conceito de teatro interativo existente
no Canadá, Austrália e Inglaterra, a fusão de cinema, performances, música e
narrativas ao vivo em um só universo propiciaria uma experiência real de
participação. Bem diferente da imersão tecnológica proposta pela indústria
hollywoodiana onde mente e corpo permanecem passivos todo o tempo.
Filmes em tecnologia 3D e IMAX. Salas de projeção onde cadeiras se mexem
e produzem efeitos reais como aromas, vento, fumaça etc. Tudo isso parece
demonstrar uma coisa: o desejo crescente dos espectadores e não apenas assistir
passivo, mas imergir no próprio filme.
Mas ainda assim nessas tecnologias a imersão é simulada: o corpo do
espectador ainda está passivo na poltrona e ele não pode explorar o espaço. A
tecnologia provoca os sentidos visuais, olfativos e táteis, mas o espaço
permanece inalterado e sem interatividade.
quinta-feira, fevereiro 13, 2014
A rua se tornou uma extensão do estúdio de TV?
quinta-feira, fevereiro 13, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A grande mídia coloca a morte
trágica do cinegrafista Santiago Andrade num quadro mais geral de supostos
“ataques arbitrários a jornalistas” que representaria uma “ameaça à liberdade
de informação”. Esse discurso parece cumprir um duplo propósito: esconder o
fato de que essas manifestações apontam para uma profunda mudança nas relações
entre mídia e sociedade e, também, encobrir o aproveitamento oportunista do episódio
com o objetivo de reforçar ainda mais a escalada da percepção do medo e
instabilidade que colocaria em xeque a legitimidade de um governo
democraticamente eleito. A morte do cinegrafista poderia ser o sintoma de uma
tendência mais generalizada onde as ruas se transformam em extensões do estúdio
da TV e a mídia acaba se transformando na própria notícia. Se isso for verdade,
estamos diante de mais uma bomba semiótica que demonstra que a atual guerra
semiológica travada para a conquista da opinião pública passou para a fase da
guerra total.
Certa vez o teórico e estrategista da ditadura militar brasileira,
Golbery do Couto e Silva, disse: “Tudo, menos um cadáver!”. Era o período
tenebroso da repressão política e do desaparecimento de ativistas políticos.
Aparecer um cadáver que se transformasse em mártir era tudo que a ditadura não
queria naquele momento e, por isso, a mídia era duramente controlada e
censurada.
Era uma época em que a informação era perigosa para o Estado militar. A
informação era um bem escasso, alienado e submetido às formas de dissimulação
como a manipulação, mentira, censura etc.
Hoje, esse cenário de dissimulações da informação foi deixado para trás.
Vivemos o momento da simulação ou daquilo que o pensador francês Jean
Baudrillard chamava de “obscenidade” e “êxtase da comunicação”: não só as
imagens de acontecimentos se proliferam e se multiplicam como, principalmente,
começam a surgir relações cada vez mais promíscuas entre os acontecimentos e as
mídias a tal ponto que não sabemos mais quem transmite e o que é transmitido –
é o império da simulação.
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