terça-feira, janeiro 30, 2018

Em "Um Ponto Zero" a paranoia é a falha na matrix da realidade


Cisão esquizofrênica? Falha da racionalidade? Em geral o cinema figura a paranoia dentro dessas representações. Mas é no filme “Um Ponto Zero” (“One Point 0” aka “Paranoia 1.0”, 2004) que a paranoia evolui de simples transtorno mental para uma percepção especial: se em “Matrix” o déjà-vu era uma falha na realidade codificada, em “Um Ponto Zero” essa falha chama-se “paranoia” -  aproximando-se do insight do pensador gnóstico Valentim, lá no distante século II DC. A paranoia não só como uma “falha na racionalidade”, mas como a percepção da falha na própria sintaxe que estrutura a realidade. Um solitário programador de computador começa a receber misteriosas caixas vazias que o farão mergulhar em um universo cercado de câmeras de vigilância em um edifício residencial em ruínas, nano tecnologia, redes de computadores, e-mails infectados, um estranho vírus bio-cibernético, obscuros interesses corporativos e um estranho experimento em Neuromarketing.

sábado, janeiro 27, 2018

O destino de Lula e a "Síndrome de Brian" da esquerda


No momento que o destino de Lula era selado pelo TRF-4, sincronismos e coincidências cercavam o evento: o “Dia D” da vacinação contra a febre amarela, o “beijo incestuoso” do BBB da Globo e o estranho jornalismo paranormal da grande mídia, capaz de antecipar resultados de votação (assim como a Globo “previu” o sorteio do mando de campo da final da Copa do Brasil em 2016) e detalhes da prisão de Lula. Enquanto isso, embargos declaratórios, infringentes e recursos povoam as estratégias da executiva do PT, que vive uma crônica “Síndrome de Brian” – relativo ao filme “A Vida de Brian” (1979) da trupe inglesa de humor Monty Python: a estratégia paralisante da “Frente Popular da Judéia” contra o imperialismo romano, mais preocupada em fazer propaganda auto-indulgente do que enfrentar o oponente em seu próprio território: a psicologia de massas. Por incrível que pareça, Kim Kataguiri e a cena em que o porta-voz da indústria de tabaco, Nick Naylor, convence seu filho de que o sorvete de baunilha é melhor que o de chocolate no filme “Obrigado Por Fumar”(2005) têm mais lições a ensinar do que o discurso sobre “resistência”, “indignação” e “esperança” da esquerda. E parece que a filósofa Marcia Tiburi foi a primeira a perceber a armadilha na qual a esquerda está metida. Pauta sugerida pelo nosso leitor José Carlos Lima.

quinta-feira, janeiro 25, 2018

Morre Mark E. Smith, a Dialética Negativa do rock


Para muitos foi um compositor e vocalista que mudou tudo o que se pensava sobre palavras e linguagens. Capaz de produzir um efeito sísmico sobre o poder da música e as possibilidades do som, demonstrando que o rock poderia vir de algum lugar mais profundo e escuro. Muito além do entretenimento. Morreu aos 60 anos Mark E. Smith, líder do “The Fall”, banda que por 40 anos resistiu a todos os tipos de rótulos da indústria do entretenimento. Embora solidamente enraizado no punk das cidades industriais inglesas dos anos 1970, o prolífico compositor de 32 álbuns Mark E. Smith conseguiu produzir uma música atemporal, cujas composições referenciam nomes como Camus, Philip K. Dick, HP Lovercraft e Edgard Alan Poe, criando uma atmosfera de pesadelo sci-fi. Assim como B.B. King esteve para o blues, Mark Smith também esteve para o rock: criar na música aquilo que Theodor Adorno chamava de “dialética negativa” – a recusa de conciliação com esse mundo. Ao invés de síntese, criar o antagonismo radical: manter para sempre na música a memória da rudeza da vida nas notas atonais, nas composições obscuras e cheias de hipérboles ao estilo da escrita de Charles Bukowski.

terça-feira, janeiro 23, 2018

Em ano eleitoral Globo aciona a "Máquina de Narciso"


Uma doutora e professora da Pós-graduação em Ciência Política da UFMG no BBB 2018. Enquanto isso, pacientemente repórteres da Globo ensinam telespectadores a gravarem vídeos com celulares para enviar depoimentos que respondam a pergunta: “Que Brasil você quer para o futuro?” em exíguos 15 segundos. São dois lados de um mesmo processo brasileiro detectado nos anos 1980, quando um jovem engraxate da favela da Rocinha respondeu à pergunta “O que você quer ver na TV?”. “EU!”, respondeu o jovem diante de um pesquisador perplexo. Nesse momento, a Globo coloca em funcionamento a chamada “máquina de Narciso”: no momento em que o ano eleitoral aponta para o acirramento da crise social e econômica, anomia e caos, a mínima forma de uma coesão social é através das imagens. O final do projeto midiático de substituir todas as formas políticas de mediação (a representação, o voto, o partido, o sindicato etc.) pelos próprios meios de comunicação – Berlusconi, Trump, Doria Jr. e o aspirante Luciano Huck seriam o aspecto mais visível disso. Sem esperanças na Política e na Economia, restaria a última boia salva-vidas oferecida pela mídia no mar da crise: a do ego mínimo promovido a Narciso. 

quinta-feira, janeiro 18, 2018

Em "La Casa de Papel" ladrões roubam o bem mais importante: o Tempo


Diante de toda uma geração que vive sob o impacto do desemprego e da perda de direitos sociais desde o crash financeiro internacional de 2008,  a Espanha vem produzindo uma série de filmes que pensa essa condição. O mais recente é a série para TV “La Casa de Papel” (2017-), disponível no Netflix, que reflete a perplexidade de todos diante da natureza dessa crise: como conformar-se com bancos, agentes financeiros e especuladores capazes de fabricar, sem limites, o próprio dinheiro enquanto o restante da sociedade sofre as consequências? Um grupo de ladrões trajando macacões vermelhos e com máscaras do Salvador Dalí invade a Casa da Moeda da Espanha, liderado por alguém cujo codinome é “Professor”. Eles não vieram roubar, mas fabricar seu próprio dinheiro com a ajuda dos próprios reféns. Mas o “Professor” terá que roubar um bem menos tangível e muito mais importante: roubar o tempo do Governo, da Polícia e da grande mídia. Quais as conexões entre um sistema monetário-financeiro sem lastro e o controle do Tempo?

domingo, janeiro 14, 2018

Após 200 anos, "Frankenstein" continua o Prometeu acorrentado


Nesse mês comemoram-se os 200 anos da primeira edição impressa em janeiro de 1818 do romance de Mary Shelley “Frankenstein ou o Prometeu Moderno”, cujo impacto na cultura moderna começou com as primeiras adaptações ao teatro. Mas o filme “Frankenstein” de 1931, com as correntes galvânicas, trovões, um cientista louco gritando “Está vivo!” e a icônica maquiagem de Boris Karloff, definitivamente consolidaram o personagem e suas variações (zumbis, autômatos, replicantes etc.) na cultura popular.  Porém, nesses dois séculos as adaptações do livro clássico invariavelmente giraram em torno da crítica à arrogância humana e científica do homem querer se equiparar a Deus. E a punição e sofrimento, assim como no mito de Prometeu acorrentado e punido pelos deuses. Por isso, ainda o cinema deve uma adaptação fiel ao imaginário romântico de “Frankenstein”: a criatura como um Prometeu desacorrentado que sintetizou o espírito revolucionário do Romantismo: a rejeição tanto do cristianismo quanto do materialismo iluminista através do sincretismo da ciência com o terreno espiritual - Alquimia, Cabala e Gnosticismo. Pauta sugerida pelo nosso leitor Eduardo G.

quarta-feira, janeiro 10, 2018

Luciano Huck: da vulgaridade regada a funk e pagode à "grande esperança branca"


O ex-cineasta e jornalista Arnaldo Jabor chamava-o de “fazendeiro de bundas” no final dos anos 1990. Naquele momento, a elite bem-pensante de um país cujo presidente era um sociólogo e doutor pela Sorbonne via-o como um personagem do nível de apresentadores como Gugu ou Ratinho. Produto da “revolução da vulgaridade regada a funk e pagode”. Mas os tempos mudaram. Agora Luciano Huck é a “grande esperança branca” depois de muitas idas e vindas – subliminarmente lançou sua candidatura no “Domingão do Faustão” ao negar ser “o salvador da pátria” e acrescentar: “não sei o que vai ser a minha vida”, ao lado da candidata a primeira-dama Angélica. Como sempre, o “wishful thinking” das esquerdas considera tudo uma “manobra desesperada dos golpistas”. Mas o golpe não chegou até aqui, com um tic-tac milimetricamente calculado e eficiente com o apoio logístico da Guerra Híbrida e do Lawfare do Departamento de Estado dos EUA, para ver todas as “reformas” perdidas numa eleição democrática. A ocupação midiática do Estado já superou a antiga visão da “Sociedade do Espetáculo” de Guy Debord. Agora a grande mídia quer dispensar intermediários para alinhar de uma vez o Estado ao tempo real midiático-financeiro.  

segunda-feira, janeiro 08, 2018

"Paul Virilio - Pensar a Velocidade": o Acidente Integral é o nosso futuro?


Por décadas o urbanista e pensador francês Paul Virilio, através de inúmeros ensaios sobre estratégia, tecnologia e estética, nos alerta para o risco do “Acidente Integral”: o momento em que a velocidade dos sistemas computacionais automáticos, cujas decisões estão à cargo dos algoritmos, se precipitará catastroficamente sobre o Tempo, a Sociedade e a História. A ameaça do Bug de 2000 foi o preâmbulo; e o risco probabilístico de que o acelerador de partículas do CERN produza um buraco negro que trague todo o planeta o seu principal simbolismo. O documentário “Paul Virilio: Pensar a Velocidade” (2009), no momento exibido no Brasil pelo canal fechado “Curta!”, narra o pensamento original do pesquisador francês cuja especialização que criou (a “Dromologia”) parte de dois pressupostos: primeiro, toda tecnologia surgiu da guerra e, por isso, irradia o princípio da velocidade como modo de vida. E segundo, toda tecnologia produz o seu acidente: o trem, o descarrilamento; o avião, o acidente aéreo; o navio, o naufrágio. Paul Virilio questiona: portanto, qual será o acidente produzido pela “bomba informática”?

sábado, janeiro 06, 2018

"After Life": após a morte, cinema, memória e esquecimento nos esperam


O filme japonês “After Life” (Wandafuru Raifu, 1998), de Hirokazu Koreeda, é um ponto fora da curva das representações do pós-vida no cinema. O filme combina duas representações que sempre se opuseram: de um lado, a representação do céu como uma organização hierárquica com porteiros, anjos e tribunais; e do outro o céu solipsista, como projeção dos nossos sonhos, memórias e desejos. Um grupo de recém-falecidos chega a um velho prédio, no qual são recebidos por funcionários que explicam que morreram. Os funcionários são roteiristas e produtores de cinema. A missão: escolher uma memória a partir da vida de cada um. Para ser roteirizada e transformada em um filme que reconstitua a cena mais feliz que cada um levará para toda a Eternidade. Enquanto todo o restante da vida será esquecido. Uma fábula sobre o tempo, morte e memória. Mas também suscita uma reflexão sobre um tipo de memória criada a partir dos simulacros da imagem.

sexta-feira, janeiro 05, 2018

Guia para rastrear Fake News cria nova mitologia no Jornalismo


A Abraji (aquela associação de jornalistas que confunde “jornalismo investigativo” com “checagem de informação”) divulgou o “Guia para Consumidores de Notícias” do jornalista norte-americano Bob Garfield com “11 dicas simples para separar o joio do trigo”. E, claro, o joio são aqueles sites e blogs suspeitos de Fake News com “muita publicidade, banners e pop-ups”. Bem vindo ao mundo das “plataformas de fact-checking” que, assim como fazem as próprias notícias falsas, requentam o prato frio das Fake News, tão velhas quanto a história do jornalismo. Mas para os "checadores", as notícias falsas surgiram só depois de cinco séculos de jornalismo, com a Internet, para profanar a inocência das vestais da grande imprensa. Fake News é a nova mitologia publicitária para valorizar o produto notícia mediante a produção da “escassez” informativa e também um novo selo de controle de qualidade para "separar o joio do trigo” e manter o monopólio informativo da grande imprensa. Além de ser mais uma arma da guerra híbrida: uma “plataforma de fact-checking” para cada país com “eleições, corrupção e crise política”.

quarta-feira, janeiro 03, 2018

Curta da Semana: "5 Films About Technology" - cinco acidentes em nossas bolhas virtuais


Cinco contos sobre a nossa obsessão pelos smartphones. Cinco pequenas vinhetas sobre acidentes (físicos, mal entendidos, incontroláveis efeitos virais etc.). Pequenos momentos que retratam a vida de pessoas normais através de gags sobre efeitos inesperados das nossas relações com os celulares nos quais cada efeito é rapidamente interligado com o personagem da próxima vinheta. É o curta de Peter Huang chamado “5 Films About Technology” (2016) que nos permite fazer uma reflexão sobre dois fundamentos da nossa experiência na modernidade: a tecnologia e o acidente. Mas principalmente o irônico destino dos dispositivos móveis: ao invés da comunicação, a incomunicabilidade – bolhas solipsistas que tornam a realidade um conjunto de impressões sem existência própria. Mas o acidente está sempre à nossa espera: sempre as bolhas estouram.  

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