terça-feira, outubro 03, 2017

"Fact-Checking" é o jornalismo "hipster" que a mídia corporativa adora

Depois que foi imputada a culpa do surgimento das fake News à campanha eleitoral de Donald Trump e à expansão das redes sociais e mídias alternativas, agora a grande mídia se assanha com o “hip” das chamadas “agências de verificação ou checagem de notícias” – “fact-checking”. Além de estratégia de salvaguardar a notícia como produto que promete a objetividade e isenção e encobrir o fato de que as fake news surgiram no jornalismo de guerra da mídia corporativa, a ferramenta “fact-checking” acirra o processo tautista do próprio Jornalismo atual: metalinguístico, auto-referencial, tautológico e auto-indulgente. Se a notícia é mais um commoditie, as fake News são resultantes da própria contradição da notícias como mercadoria no seu ciclo natural, dentro do Capitalismo, de precarização e busca de diferencial ou "selo de qualidade" que promova a mercadoria jornalística. O frisson em torno da ferramenta “fact-checking” é o sintoma de um jornalismo “hipster”, análogo ao “yuppismo cultural” do jornalismo modelo Folha dos anos 80-90.

segunda-feira, outubro 02, 2017

A capilaridade do Poder em um boteco no filme "O Bar"


Por meio da violência, excesso e humor negro, “O Bar” (“El Bar”, 2017) do diretor espanhol Álex de la Iglesia (conhecido como o “Tarantino espanhol”), é o reflexo dos tempos atuais onde temos a sensação de que a qualquer hora tudo pode vir abaixo. O que poderia acontecer em mais uma manhã rotineira e aborrecida em um bar de Madrid? Repentinamente, um grupo fica preso em um boteco, olhando pela vitrine um cenário semi-apocalíptico. Aos poucos, as pessoas aparentemente normais desse grupo vão se tornando cruéis, misóginas, violentas e fascistoides. Mas o filme evita cair no clichê de uma suposta fatalidade da “natureza humana” – na verdade o bar é um microcosmo no qual os indivíduos, quando confrontados com uma situação de crise com seus medos e reações, simplesmente replicam o discurso que o Estado e a mídia descrevem a própria sociedade. Foucault chamava isso de "capilaridade" ou "microfísica do Poder". Filme disponível no Netflix.  

sábado, setembro 30, 2017

Wokesploitation é a fronteira final do reality show em "Esta é a Sua Morte"


Depois de explorar as mazelas do sexo e da vida, a última fronteira da TV é a morte. Mas não a das vítimas, mas daqueles que querem dar cabo das suas próprias vidas. Depois de décadas de críticas e sátiras cinematográficas ao gênero televisivo do reality show, “Essa é a Sua Morte” (2017) evoca a tendência atual do “Wokesploitation” – chamar a atenção das injustiças da mídia e sociedade por meio da hiper-violência e muito sangue, como na franquia “Uma Noite de Crime”. Mas é um reality show sobre suicidas endividados através do viés “camp”, “trash” como fosse uma típica “soap opera” norte-americana. Um filme que vai além da crítica ao reality show: mostra a fase terminal da TV, agora obcecada em procurar de forma tautista “a realidade do real” numa sociedade na qual a morte se tornou mais lucrativa do que a vida, seja no sistema econômico quanto no político.

quinta-feira, setembro 28, 2017

Globo vive da crise com sósias de "Os Trapalhões" e "Escolinha do Professor Raimundo"


Parece que o tempo parou ou estamos presos em algum infernal eterno retorno. É essa a sensação ao vermos o canal fechado “Viva” da Globosat: ao assistirmos às reapresentações de novelas e programas de humor dos anos 1980 e 1990 temos uma estranha sensação de atualidade nos personagens, gags e bordões do passado inspirados na crise política e econômica daqueles tempos: desemprego, preconceito, desesperança, corrupção, violência de classes. Tudo continua o mesmo! E para aumentar essa atmosfera de realismo fantástico, agora o canal "Viva" exibe remakes de “Os Trapalhões” e “Escolinha do Professor Raimundo” com atores sósias dos personagens originais revelando uma bizarra dialética: o presente que repete o passado, também recorre aos mesmos bordões e gags anteriormente trágicas, mas que agora ecoam como farsa, fazendo-nos dar amargas risadas pela sensação de que o tempo parece não andar para frente, pelo menos por essas plagas. Mas também revela o “tautismo” da Globo: os Marinhos sabem que o monopólio da emissora está fundamentado na forçada recorrência brasileira da crise e inércia política e econômica.

terça-feira, setembro 26, 2017

O estranho que se esconde no cotidiano em "Survivor Style 5+"


Cinco modos de sobrevivência. Um marido que não consegue matar a esposa; uma dupla de ladrões gays enrustidos; uma criativa que produz vídeos publicitários que só ela consegue gostar; um pai de família que pensa ser uma pomba depois de um show de hipnose mal sucedido; e um assassino de aluguel que faz a mesma pergunta a todos que querem contratá-lo: “qual a sua função na vida?”. Mas sobreviver a quê? Ao cumprimento obrigatório dos papéis familiares, de gênero, profissionais, familiares etc. Esse é o estranho e bizarro filme japonês “Survivor Style 5+” (2004) uma avalanche de alusões, referencias e metalinguagens de “O Iluminado”, “Laranja Mecânica”, Kubrick, Tarantino e Guy Ritchie. Onde, em questão de segundos, a narrativa vai dos extremos do assustador e da comédia. “Survivor Style 5+” revela não só como a cultura pop japonesa liquefaz toda a cultura Ocidental como também, através da estética do chamado “filme estranho” ("Weird Movies"), chama a atenção para o mal estar que coexiste no cotidiano não só japonês, mas da sociedade em geral. 

domingo, setembro 24, 2017

A gnose de um fantasma em "A Ghost Story"


Muitas religiões falam de um ponto entre a vida e a morte no qual vagam, entre os vivos, fantasmas daqueles que por algum motivo não conseguem deixar esse mundo. Mas “A Ghost Story” (2017) nos apresenta um fantasma diferente: um jovem morto prematuramente coberto por um lençol como um fantasma de Halloween. Um observador silencioso preso a uma casa que vê moradores chegando e mudando-se. Um filme sobre a percepção do tempo e a permanência. O que o prende naquela casa, silenciosamente observando os vivos? Talvez, os mesmos motivos que fazem os vivos serem prisioneiros dessa vida, sem jamais alcançarem a gnose. E como as questões nietzschianas como a morte de Deus e o eterno retorno permeiam a angústia existente tanto nos vivos como nos mortos. Outro filme sugerido pelo nosso intrépido leitor Felipe Resende.

sábado, setembro 23, 2017

Resposta ao post "Sexo e Luto: Nietzsche, Wagner e as músicas mais tocadas nas rádios brasileiras", por Elvis Silva


Publicamos  o comentário do nosso leitor Elvis de Almeida Silva sobre a recente postagem desse Cinegnose de 17/09/2017 “Sexo e Luto: Nietzsche, Wagner e as músicas mais tocadas nas rádios brasileiras” como um artigo, pela sua riqueza de informações e argumentos que ajudam a detalhar aspectos polêmicos da postagem anterior. Principalmente a afirmação de Nietzsche de que “Wagner é uma neurose” e sua implicações com o nazismo. Uma discussão importante para entendermos como a moderna indústria do entretenimento consegue absorver tudo aquilo que em dado momento na arte e na cultura foi vanguardista, inovador e arrojado. Para depois ser padronizado e estereotipado.

quinta-feira, setembro 21, 2017

Curta da Semana: "State of Emergency Motherfucker!" - distraídos venceremos!


Um fantasma ronda o Poder e o Estado. O fantasma da apatia e indiferença das massas para o quê quer eles façam ou planejem. Não por serem “alienadas”. Mas simplesmente porque as pessoas estão absorvidas pela absoluta banalidade da vida. Dois jovens muçulmanos comem kebab em uma lanchonete, concentrados num hilariante relato de uma aventura amorosa do Dia dos Namorados. Absolutamente distraídos e indiferentes à chegada de policiais que os abordam como os suspeitos de sempre, com ações cada vez mais invasivas e violentas. O que se segue é uma narrativa de humor surreal e absurdo: a contradição entre uma animada conversa sobre façanhas amorosas e a violência policial que não consegue quebrar a atenção daqueles jovens adolescentes. Esse é o curta State of Emergency Motherfucker! (Etat D’Alert Sa Mere!, 2017) do belga Sebastién Petretti.

terça-feira, setembro 19, 2017

Atacante corintiano Jô foi vítima da "Pan Lava Jato" da Globo


Pobre Jô!, atacante corintiano que fez um gol com o braço e determinou a vitória do Corinthians sobre o Vasco no último domingo. A Globo, com a sua tradicional máquina de moer reputações para confirmar a pauta do jornalismo, elegeu o atacante como caso exemplar de todas as mazelas que o País precisa sanar na sua cruzada moralizadora anticorrupção. Lava Jato no futebol, pela honestidade no esporte! Implantado na Alemanha e Portugal, lá o árbitro de vídeo é uma decorrência da evolução natural da tecnologia no esporte. Mas aqui, é resultado da narrativa global da "Pan Lava Jato" na qual todas as editorias do jornalismo da emissora precisam ser encaixadas. Imolado em praça pública, Jô foi mais uma vítima do “modus operandi” da TV Globo: escândalo moral de uma suposta vitória injusta, o bate-bumbo dos seus apresentadores e comentaristas, o pronto julgamento moral e sentença do atacante corintiano e, no final, a "delação premiada" do Jô para tentar se safar da condenação.

Mídia contamina fronteira entre sanidade e loucura em "O Sinal"


Desde “A Noite dos Mortos Vivos” (1968), filmes sobre pragas zumbis e contaminações virais se consolidaram como um subgênero do terror com uma característica recorrente: o foco narrativo sempre está nos sobreviventes ou cientistas que tentam salvar o mundo através da racionalidade ou da coragem. “O Sinal” (The Signal, 2007) subverte esse cânone do terror: o que aconteceria se um filme se concentrasse no ponto de vista dos zumbis? Como eles veem a si mesmos? Para eles quais seriam as fronteiras entre normalidade e loucura? O resultado é um filme sem heróis: apenas pessoas normais que não possuem a menor consciência de que foram contaminados por um misterioso sinal transmitido pela TV e dispositivos de áudio como CD players e de comunicação como telefones e rádios. “O Sinal” apaga a fronteira entre a normalidade e a loucura. Mas não espere zumbis canibais se arrastando pelas ruas – apenas pessoas aparentemente normais e até com intenções altruístas. Mas de repente podem matar impiedosamente aqueles que supostamente estejam no caminho da sua felicidade. Outro filme sugerido pelo nosso implacável leitor Felipe Resende.

domingo, setembro 17, 2017

Sexo e luto: Nietzsche, Wagner e as músicas mais tocadas nas rádios brasileiras

Se até a explosão do sertanejo e forró eletrônicos as músicas vivam no trinômio Festa, Sexo e Amor, hoje a parada de sucesso parece viver uma atmosfera mais sombria: de um lado, nas letras, processos de lutificação (perdas, separações etc.); e do outro acumulação de uma tensão sexual neurótico-compulsiva. Se revisitarmos as críticas que Nietzsche fez ao seu ex-amigo, o compositor Richard Wagner, veremos que guardam uma similaridade com os tempos atuais. Nietzsche via na música de Wagner uma arte feita para o “homem doente de si mesmo”, que necessita de três estimulantes psíquicos para sobreviver numa cultura decadente: “a brutalidade, o artifício e a candura idiotizante”. A estrutura musical da música de Wagner (leitmotiv, cromatismo extremo etc.) foi precursora da moderna música de sucesso da indústria cultural. Portanto, na atual trilha musical da crise brasileira podemos encontrar os elementos Wagnerianos denunciados por Nietzsche – fragmentação, a sedução, a memória sobreposta a expressão das emoções, repetição e previsibilidade, o artifício, a brutalidade. Seriam os sinais de uma caminhada para a “décadence” e niilismo similares a de uma Alemanha que Nietzsche via caminhando a passos rápidos para o abismo nazi-fascista? 

quinta-feira, setembro 14, 2017

A controvérsia da "Queermuseu", o software que detecta gays e a animação "Divertida Mente"


O cancelamento unilateral da exposição “Queermuseu” em Porto Alegre após protestos de grupos neoconservadores; o desenvolvimento de um software por pesquisadores da Universidade de Stanford cujo algoritmo reconhece a orientação sexual e até a tendência política através das feições faciais de uma foto; e a animação da Pixar “Divertida Mente” (2015) cujo argumento foi inspirado em pesquisas psicológicas da CIA. O atual “revival” do bestiário pseudocientífico do século XIX (antropologia criminal de Lombroso, Eugenia de Galton etc.) favorecido pela escalada planetária do neoconservadorismo está criando bizarras ligações perigosas entre eventos aparentemente distantes no tempo e no espaço. O cancelamento do “Queermuseu” é mais uma amostra do “zeitgeist” do século XXI: como um zumbi que retorna dos mortos , o bestiário pseudocientífico anterior ao século XX retorna com roupagem high tech (algoritmos e Inteligência Artificial) ou sob o discurso da “nova política” das chamadas “revoluções coloridas”.

terça-feira, setembro 12, 2017

"Onde Está Segunda?" faz elogio subliminar do controle populacional


Em sua época, filmes distópicos como “Farenheit 451” (1966) e “Planeta dos Macacos” (1968) foram denúncias de como a sociedade estaria próxima de futuros sistemas totalitários. Hoje, esse subgênero sci-fi entregou-se à crítica moralista, ao maniqueísmo e a pura propaganda subliminar da agenda científica dominante. A produção Netflix “Onde Está Segunda?” (What Happened to Monday, 2017) é o exemplo mais flagrante: em um futuro próximo no qual a explosão populacional levou ao esgotamento dos recursos do planeta e os alimentos transgênicos salvaram a humanidade da fome, a Natureza veio cobrar seu preço – o efeito colateral dos alimentos geneticamente modificados foi o explosivo nascimento de gêmeos, agravando o problema populacional. É criada a “Lei de Alocação Infantil”: cada casal pode ter apenas um filho. Os irmãos excedentes são confinados em ambiente criogênico. E os cidadãos são submetidos a vigilância implacável de uma agência. O filme deixa a tese do controle populacional fora de qualquer crítica. A Ciência chega ao Poder numa política de terra arrasada, sem qualquer discussão ou questionamento. Congelar crianças (pobres) excedentes? OK! O problema é apenas a cientista vilã que gerencia o processo: corrupta, má e ambiciosa. Filme sugerido pelo nosso leitor Dudu Guerreiro.

domingo, setembro 10, 2017

Santos à espera do tsunami no feriado de sete de setembro


Cidade de Santos/SP. Feriado nacional de sete de setembro. Esse humilde blogueiro em mais uma caminhada pela cidade natal juntando lembranças da infância e juventude se confronta com uma sucessão de sintomas de um País psiquicamente doente. Ao redor do tradicional desfile cívico-militar na orla da praia, de singelas selfies de famílias com filhos e cachorros tiradas com soldados em trajes de ações de choques civis (talvez antevendo futuros distópicos) com reluzentes espadas a pessoas transtornadas gritando xingamentos contra Lula, Dilma etc.. Tudo isso ao lado de sem tetos e catadores de latas de alumínio nos jardins da praia replicando o mesmo ódio, dessa vez contra um escultor de areia acusado de fazer uma estátua da Dilma... A ex-presidenta falou em “calmaria que antecede o tsunami”. Mas talvez esse tsunami seja uma explosão de ressentimento sem direção ou sentido, apenas à espera de um gatilho sócio-econômico. Um tsunami bem longe da tradicional narrativa de “luta e resistência” tão apreciada pela esquerda. 

sexta-feira, setembro 08, 2017

Cinco evidências de que Bitcoin é uma religião


Criada em 2009, Bitcoin é uma moeda digital controlada por uma rede peer-to-peer sem depender de bancos centrais e com um mercado de bilhões de dólares. Bitcoin parece ser movido por um ímpeto anarquista porque seus seguidores odeiam governos e autoridades financeiras. Mas suas ações são espirituais, lembrando uma religião com um Criador, messias profetas, confirmando a tendência humana de perceber no dinheiro e valor atributos inerentemente mágicos e místicos. E como toda religião, tem a cortina que esconde o Mágico de Oz: o “fetichismo da mercadoria”, tal como diagnosticou Karl Marx no século XIX sobre o velho Capitalismo, a cortina que esconde a reprodução da desigualdade. O “Cinegnose” lista cinco evidências de que o Bitcoin é mais uma religião, porém mais “cool” do que a Teologia da Prosperidade das igrejas neopentecostais. Porque Deus desceu ao mundo não mais sob a forma de dinheiro, mas agora como Criptografia e Matemática.

terça-feira, setembro 05, 2017

Poder, Nietzsche e fast food no filme "Obediência"



O telefone toca e uma estressada gerente de uma lanchonete fast food ouve a voz de um policial avisando que uma atendente da loja roubou dinheiro de uma cliente que veio prestar queixa. Nas próximas horas ela cegamente obedecerá as ordens de um suposto policial ao telefone para além dos limites dos seus valores e consciência. Baseado num caso real absurdo e bizarro em uma lanchonete McDonald’s nos EUA, o filme “Obediência” (“Compliance”, 2012) narra como a tendência humana de ceder à autoridade leva a atitudes tão irracionais como os maiores crimes da História: nós apenas sempre “obedecemos ordens”. Se para Nietzsche a consciência é a principal fonte de enganos como o medo e o espírito gregário, “Obediência” politiza esse insight do pensador alemão: as organizações sociais e corporativas verticalizadas nos tornam ainda mais vulneráveis. Mais uma sugestão do nosso indefectível leitor Felipe Resende.  

segunda-feira, setembro 04, 2017

Curta da Semana: "Epic Fail" - quando o deserto do real implode os algoritmos das redes sociais


Greg Barth é um cineasta que em seus curtas e vídeo clips musicais combina, em estilo único, minimalismo com surrealismo. Premiado em 2014 no Festival de Cannes, no recente trabalho chamado “Epic Fail” (2017), Barth apresenta um honesto insight sobre como a atual tecnologia da informação distorce a realidade política e social por meio de verdadeiras realidades alternativas criadas pelos algoritmos das redes sociais. Lugares falsamente tranquilizadores porque filtram apenas aquilo que fortalece o que já pensamos. Em “Epic Fail” faz uma sátira disso ao imaginar um cenário no qual a paz mundial foi colocada em votação. Enquanto os comentaristas da TV têm um discurso pouco confiável como fake news, nas redes sociais reina a indiferença, aversão à política e a busca por mais “likes” e “seguidores”. Até o momento em que ocorre uma “Falha Épica”.

domingo, setembro 03, 2017

"Comunistas Fazem Sexo Melhor?": sexo em um país dividido


A oposição entre Capitalismo e Comunismo durante a Guerra Fria não significou somente a divisão entre diferentes modelos econômicos e políticos. Mas também diferentes vidas sexuais em cada lado do muro que dividia a Alemanha. O documentário “Comunistas fazem Sexo Melhor? – Sexo na Alemanha Dividida” (2006) confirmaria décadas depois as teses da chamada Nova Esquerda alemã nos anos 1970 a respeito da exploração da sexualidade pela “indústria da consciência”: enquanto na Alemanha Oriental o sexo era francamente discutido nas escolas e na TV, no Ocidente a chamada “revolução sexual” teria sido apenas uma “revolução de vendas” com a expansão da indústria pornográfica e publicitária.

sábado, setembro 02, 2017

Em "Herostratus" a subversão vira mais um produto à venda


Um filme esquecido por quase 50 anos e só recentemente lançado em DVD. E certamente o filme desconhecido mais influente na história do cinema. Só para começar, inspirou Kubrick a criar o atormentado personagem Alex do filme “Laranja Mecânica” de 1971. “Herostratus” (1967), o primeiro e único longa metragem do diretor Don Levy, conta estória de Max, um jovem poeta rebelde que num gesto para ele subversivo, vende seu próprio suicídio para uma empresa de marketing como um espetáculo midiático para as massas. Um retrato da revolta jovem na Grã-Bretanha do Pós-Guerra: jovens presos entre os extremos de riqueza e pobreza, enquanto eram bombardeados por efeitos psicológicos eroticamente carregados da publicidade e sociedade de consumo. E como o marketing e a publicidade são capazes de diluir qualquer rebelião e transformá-la em tendência de moda. Filme sugerido pelo nosso leitor Higor Camargo.

quinta-feira, agosto 31, 2017

O Pequeno e Irônico Dicionário para Aspirantes ao Mérito-empreendedorismo


Ok, vocês venceram! Por isso, o “Cinegnose” vai dar uma ajuda aos aspirantes e adeptos da nova religião do mérito-empreendedorismo (meritocratas + empreendedores) desse admirável mundo novo, no qual maquininhas de crédito e débito substituíram da Carteira de Trabalho por meio da inabalável fé de que, um dia, a força de trabalho se transubstanciará em Capital. Para entender esse Mistério da transubstanciação de uma categoria econômica em outra (que se equivale ao da Santíssima Trindade ou da própria redenção de Cristo) é urgente dominar o jargão hermético dessa seita – “foco”, “nicho”, “aplicativo”, “sustentabilidade”, “agregar”, “gestão”, “inteligência” entre outros termos aparentemente inescrutáveis. Bem vindo à Metafísica da Teologia desses novos tempos, através do “Pequeno e Irônico Dicionário para Aspirantes ao Mérito-Empreendedorismo”.

terça-feira, agosto 29, 2017

Quando a família vira uma seita mística para o sucesso em "Der Bunker"


Esse filme está na lista dos filmes mais estranhos de 2016 do Cinegnose. Como fosse um bizarro conto de fadas contemporâneo (no qual a casa da floresta é substituída por um bunker da Segunda Guerra Mundial e a bruxa uma mãe possuída alguma entidade alienígena), o filme alemão “Der Bunker” (2016) acompanha um físico quântico que aluga um quarto em um velho bunker num lugar remoto, em busca da paz e silêncio para suas pesquisas. Lá conhece uma família que é regida por uma estranha força. Pai e mãe educam o filho com seus 30 anos que se veste com penteado e roupas infantis e o tratam como tal – a família o educa de forma implacável sonhando com o dia em que ele se tornará presidente dos EUA. Uma estranha combinação entre a velha educação burguesa através da repetição e punição, a moderna meritocracia globalizada e uma família atual que se transforma em seita bizarra voltada para o modelos irreais de sucesso.

domingo, agosto 27, 2017

Na web série "The Vault" reality show é o rito de passagem pós-moderno


O tema reality show já foi virado pelo avesso em filmes e séries, quase se transformando num sub-gênero. Quando pensávamos que o tema já estava esgotado, eis que surgiu a web série “The Vault” (2011-2014) demonstrando que o tema ainda tem múltiplas facetas para serem abordadas. No início “The Vault” parece uma espécie de "spin off" do clássico “The Cube” (1997): jovens universitários estão na segunda fase de um inédito reality show na qual cada participante está preso em uma sala totalmente branca com objetos aparentemente arbitrários (relógios, bicicletas ergométricas, aquários de peixes etc.). Todas as salas estão no interior de um imenso cofre, totalmente isolado do mundo exterior. Os participantes devem resolver juntos o enigma em torno do propósito de todos aqueles objetos. “The Vault” suscita uma reflexão sobre a função social dos atuais reality shows, híbridos de processos seletivos corporativos: um mix de rito de passagem e circo romano pós-moderno no qual cristãos agora são jogados contra leões do próprio psiquismo humano. Série mais uma vez sugerida pelo nosso incansável leitor Felipe Resende.

sexta-feira, agosto 25, 2017

Publicidade brasileira convocada para educar as massas no "Brave New World"


Sempre criticamos a Publicidade por esconder suas secretas pretensões sob camadas de retórica, mitologias, tons pastéis, cores suaves e a atmosfera de um eterno comercial de produtos matinais. Esqueça tudo isso! Em tempos atuais de crise econômica e milhões de desempregados para os quais a solução inevitável apontada são o empreendedorismo, “pejotização”, precarização profissional e trabalho intermitente, a Publicidade brasileira foi convocada para educar as massas através de comerciais francos, duros e agressivos. Ivete Sangalo flerta com “losers” em pontos de ônibus para promover ensino à distância; Luciano Huck e Rodrigo Faro em peças publicitárias de universidades explicitamente afirmam que a profissão de professor é um bico para “aumentar a sua renda”; campanhas do Uber defendem a “uberização” para você ter mais tempo de “fazer o que gosta”; e o banco Santander assertivamente diz que a carteira de trabalho já era e que no lugar ficou uma maquininha de pagamentos com cartões. Bem vindo ao “Brave New World” da publicidade atual.

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