domingo, maio 05, 2013
A Semiótica de Che Guevara
domingo, maio 05, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Quando o fotógrafo
Alberto Korda selecionou o fotograma de número 40 do rolo Kodak com uma série de
fotos de um evento em Havana, Cuba, em 1960 e deu o nome para ele de “Guerrilheiro
Heroico”, jamais imaginava o destino do personagem Ernesto Che Guevara na
mitologia contemporânea. O ícone atual em alto contraste em carros, baús de
motoqueiros ou bandeiras de torcida de futebol é o resultado de sucessivos
sistemas linguísticos parasitários que foram se sobrepondo e se sedimentando na
cultura de massas, até o simbolismo ideológico se converter em mensagem
motivacional e autoajuda.
Pedalava pela rodovia Raposo
Tavares voltando de mais uma manhã de aulas na Universidade Anhembi Morumbi/São Paulo quando passou por mim um desses carros estilo off road esportivo importado com o pneu estepe na traseira do
veículo. Não pude deixar de perceber na capa protetora que envolvia o pneu
estampada a clássica fotografia de Che Guevara como “Guerrilheiro Heroico”,
estilizada em alto contraste. A subida era acentuada, mas a fadiga pelas
pedaladas mais pesadas não diminuiu a minha perplexidade: o que está fazendo um
ícone político-ideológico revolucionário no estepe de um carro destinado para
motoristas de alto poder aquisitivo? Será que o motorista era algum “burguês
esclarecido”? Alguma coisa estava fora do lugar.
Nessa mesma semana passei,
então, a prestar mais atenção às versões e outros lugares inusitados onde
apareceria a foto do “Guerrilheiro Heroico”. Vi em um baú de entregas de um
motoqueiro, na camisa de um aluno na versão “Chê Madruga” (Seu Madruga da série
cult “Chaves” travestido de boina e o mesmo olhar compenetrado) e na TV em
bandeiras de uma torcida organizada de futebol do time Internacional de Porto
Alegre.
terça-feira, abril 30, 2013
O Grau Zero da Política
terça-feira, abril 30, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Por que o PT é tão
assertivo nas questões sociais e reticente quando se trata da Lei dos Meios e
monopólios midiáticos? O verdadeiro ato falho do ministro da Educação Aloízio
Mercadante ao sair em defesa ao “seu” Frias frente às denúncias da Comissão da
Verdade representa aquilo que o pensador francês Jean Baudrillard chamava de
“grau zero da política”: as esquerdas nunca quiseram chegar ao Poder
e, dizia Baudrillard, se um dia chegassem não haveria perigo porque o poder, de
fato, não existe. Ele estava sendo profético.
******
À primeira vista, talvez o tema dessa postagem (política
partidária) cause estranheza ao leitor em um blog especializado na discussão
sobre cinema e gnosticismo. As últimas discussões sobre a Lei dos Meios e os
monopólios de mídia e a reticência do governo atual em debatê-la lembram um
conceito de influência gnóstica do pensador francês Jean Baudrillard: a
reversibilidade simbólica, o gênio maligno presente em todos os sistemas –
todos os sistemas chegam a um ponto de desenvolvimento e complexidade que
acabam inviabilizando sua própria finalidade, voltando-se contra si mesmo. É o
caso do sistema político que chegaria ao chamado “grau zero”, onde a finalidade
social foi substituída pela simulação e sedução. É a “transparência do Mal”.
******
Em carta ao jornal Folha de São
Paulo o ministro da educação Aloízio Mercadante saiu em defesa da memória de
Octávio Frias de Oliveira, falecido dono da “Folha”, após um delegado dos
tempos da ditadura militar dizer, na Comissão da Verdade, que ele colaborou
ativamente na repressão e tortura aos “terroristas” e “subversivos”. Esse
episódio parece que foi a gota d’água para muitos que ainda, pacientemente,
esperavam que após 10 anos de governos de esquerda a questão do monopólio
midiático no país já tivesse sido, pelo menos, confrontada.
sábado, abril 27, 2013
E o Verbo se fez carne de celebridade no filme "Antiviral"
sábado, abril 27, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Em um futuro próximo, a
relação com as celebridades será tão obsessiva que todos desejarão entrar em
"comunhão biológica" comprando vírus e enfermidades exclusivas dos
famosos e comendo carne processada com células de seus ídolos. Assistindo
ao filme canadense “Antiviral” (2012) percebemos que o diretor Branon Cronenberg sugere o
elemento religioso por trás da nossa civilização das imagens e das celebridades.
Mais precisamente, o mistério do “dogma revelado” (a misteriosa união entre o
Verbo e a carne representada por Jesus Cristo) estaria motivando todo o culto
fetichista pelas imagens na atual indústria do entretenimento, mas dessa vez
não mais por meio de uma comunhão simbólica através da hóstia e vinho, mas
agora por meios tecnológicos e mortais.
Na Bíblia o Evangelho Segundo
João nos oferece dois versículos que são fundamentais para entendermos os
mecanismos arquetípicos presentes na atual cultura das celebridades repercutida
pela civilização das imagens: “E o Verbo se fez carne”, diz o versículo 14 do
capítulo primeiro; “Eu sou o pão vivo que desceu do
céu; se alguém dele comer, viverá eternamente; e o pão que eu darei pela vida
do mundo é a minha carne. Disputavam, pois, os judeus entre si, dizendo: Como
pode este dar-nos a comer a sua própria carne? Respondeu-lhes Jesus: Em
verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a carne do Filho do Homem e não
beberdes o seu sangue, não tendes vida em vós mesmos”, versículos 51-71 do
capítulo 6.
Se o
pesquisador em Midiologia, o francês Regis Debray, estiver certo de que há uma
linha de continuidade entre a civilização das imagens atual e os Concílio de
Nicéia no ano 787 que estabeleceu o mistério da Encarnação de Cristo (o Eterno
que se tornou carne, o Infinito que se tornou finito) e a representação do
Invisível por meio de imagens, então Hollywood deveria erguer uma estátua em
homenagem a São João.
quarta-feira, abril 24, 2013
A ficção midiática contamina o atentado de Boston
quarta-feira, abril 24, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Para quem lida com análise
fílmica e estrutura de roteiro como esse autor, é impossível não perceber um
estranho mix entre ficção e realidade no incidente das bombas detonadas junto à
linha de chegada na Maratona de Boston: o timing de todos os acontecimentos
subsequentes até a captura dos “suspeitos” (estranha expressão porque desde já
estão condenados à morte), os fatos encadeados como em um clássico roteiro com
a narrativa dividida em três atos (atentado/perseguição/captura) com timing de
filme de ação hollywoodiano, a facilidade de captação de imagens de toda a ação
pelas mídias, e, por fim, as clássicas e emotivas imagens de velas sendo
erguidas em homenagem à vítimas e pessoas histéricas gritando “USA! USA!”
enquanto o “suspeito” sobrevivente era levado preso.
Impressiona como a ambiguidade
dessas imagens (jornalísticas e, ao mesmo tempo, com forte carga retórica como
o detalhe em close de uma sacola com a bandeira dos EUA em uma calçada manchada
de sangue) acaba produzindo uma espiral de interpretações tanto conspiratórias
(a “operação false flag” ou autoterrorismo) quanto um atentado arquitetado por “facções
radicais”.
domingo, abril 21, 2013
Deus está nos números no filme "Número 9"
domingo, abril 21, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Três personagens em
três episódios. Cada um em uma espécie diferente de prisão: o primeiro em uma
prisão domiciliar; o segundo em um reality show; e o último preso ao vício por games
de computador. Em sua estreia como diretor no filme “Número 9” (The Nines, 2007), John August faz uma reflexão metalinguística sobre o trabalho do
diretor/roteirista no cinema usando uma poderosa metáfora gnóstica do
protagonista como o próprio ser humano prisioneiro na Terra, cujo planeta é
visto como uma realidade mal produzida e roteirizada por um “deus ex machina”: toda
vez que o protagonista começa a compreender o simbolismo místico da recorrência
do número nove na sua vida, o mundo é desmanchado para recomeçar em um próximo
episódio, do zero, levando o personagem principal ao esquecimento da sua
verdadeira identidade.
Chris Carter, criador da série
“Arquivo X”, em um comentário sobre o episódio chamado “Improbable” da nona
temporada fez a seguinte detalhamento do argumento da estória: “tudo é sobre a
compreensão da natureza de Deus através do uso da numerologia, sincronicidade,
probabilidade, reconhecimento de padrões, física teórica ou algo parecido”.
Nesse episódio de Arquivo X a
personagem Agente Scully trava um interessante diálogo com a Agente Reys:
“Scully: veja, Agente Reys, você não pode reduzir tudo na vida, toda criação, toda obra de arte, arquitetura, música, literatura... num jogo de vencedores e perdedores.Reys: Por que não? Talvez os vencedores sejam aqueles que jogaram melhor o jogo. Eles conseguiram ver padrões e conexões, assim como nós estamos tentando fazer nesse momento.”
Pois o filme “Número 9” dirigido
e escrito por John August (em seu primeiro filme como diretor depois de fazer o
roteiro de diversos filmes de Tim Burton) lida diretamente com esse tema ao
propor que a compreensão do simbolismo místico das coincidências e
sincronicidades permitiria um ser divino escapar da sua prisão corporal. A
compreensão dos significados das sincronicidades como ferramenta para a
libertação.
sexta-feira, abril 19, 2013
Em Observação: "Número 9" (2007) e "Antiviral" (2012)
sexta-feira, abril 19, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Paranoia pela onipresença do número 9 e um protagonista ao mesmo tempo prisioneiro e criador de mundos como um arquiteto de videogames e diretor de programas de TV. Para o pesquisador em sincromisticismo Christopher Knowles o filme "Número 9" explicitaria variantes do Gnosticismo Cristão. E no filme "Antiviral", em um futuro próximo, a relação com as celebridades será tão obsessiva que todos desejarão entrar em "comunhão biológica" comprando virus e enfermidades exclusivas dos famosos e comendo carne processada com células de seus ídolos. Dirigido por Brandon Cronenberg, filho do conhecido diretor David Cronenberg, parece seguir os passos do pai: uma crítica social ao desenvolvimento tecnológico mesclado com situações bizarras e perversas. Esses são os filmes na mira do blog nessa semana.
segunda-feira, abril 15, 2013
Somos todos aliens no filme "Earthling"
segunda-feira, abril 15, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O tema “alienígenas”
encontra a sua maturidade no cinema no filme indie “Earthling” (2010). Nesse
filme abandonamos os temas da invasão, dominação e submissão para entrarmos em
um campo mais metafísico e gnóstico: será que todos nós seríamos aliens
aprisionados nesse mundo? Alienígenas aos poucos vão despertando nesse planeta
e descobrem que na verdade não são quem pensavam ser. Um acidente de carro e um
incidente em uma estação espacial são os acontecimentos que despertarão nos
aliens humanos o desejo de retornar à suas origens. Seríamos todos nós
estrangeiros nesse planeta e a nossa condição de estranhamento e alienação sintomas
dessa verdade? Esse é o tema central de um subgênero que podemos nomear como
filmes AstroGnósticos.
O Gnosticismo clássico nos
ensinou que os seres humanos são criaturas celestes prisioneiras de um Demiurgo
sádico e louco. Somos prisioneiros nesse planeta apenas para acalmar seu ego ferido.
Todos nós, incluindo o Demiurgo, seriamos emanações do Pleroma ou da Plenitude
e de lá fomos expulsos devido a uma espécie de terrível aborto cósmico: a
Criação.
Por sua vez, o Gnosticismo
Cristão nos ensina que Cristo era um ser puramente espiritual, um “aeon” que
foi enviado a nós diretamente do Pleroma com o objetivo de nos despertar para a
realidade de que somos prisioneiros de um Deus cego auxiliado pelos seus
Arcontes. Despertarmos através do conhecimento trazido por Ele sobre a nossa
verdadeira natureza e identidade.
sábado, abril 13, 2013
O "bug" da Microsoft e o mal
sábado, abril 13, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Como interpretar o "bug" fatal da atualização do Windows 7 que fez inúmeros computadores entrarem em looping sem conseguir iniciar o sistema operacional? Como explicar um erro em proporções exponenciais partindo de uma corporação como a Microsoft? Conspiração mercadológica para forçar a atualização para o até aqui fracasso de vendas do Windows 8? Simples erro de sintaxe algorítmica de alguma linha de comando? Talvez o "bug" revele algo que nos escapa, apesar de sentirmos os seus efeitos no dia-a-dia: o desenvolvimento tecnológico estaria se aproximando a um estágio tal de complexidade que criaria uma reversibilidade fatal e maléfica e, ao mesmo tempo, irônica: a "hipertelia".
Fui mais um dos usuários vítimas
da verdadeira bomba informática que foi a atualização "2823324" do Windows 7. Sem
perceber, o Windows fez uma atualização automática que criou um “fatal system
error” como sinistramente diagnosticou o próprio computador para mim. O sistema
operacional não mais iniciava entrando em um looping, deixando-me em xeque
diante dos prazos de entrega de artigos e modelos de provas para a Universidade
onde leciono.
Segundo a própria Microsoft, a
atualização combateria a uma vulnerabilidade na segurança do sistema que
permitiria a um atacante ter acesso físico ao computador para explorá-lo. Mas,
ironicamente, a atualização feita em nome da segurança realizou o sonho de
qualquer hacker: produzir um efeito viral ou sistêmico e derrubar redes e
computadores.
Para aprofundar ainda mais a
ironia, de fato a atualização realmente deixou o computador mais seguro,
mantendo-o incomunicável não só com a Internet (a fonte da ameaça) mas com o
próprio usuário que não saberia que estaria sendo invadido. Cortou o mal pela
raiz!
sexta-feira, abril 12, 2013
A trivialização da catástrofe no filme "Sound Of My Voice"
sexta-feira, abril 12, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Filmes cuja premissa parece ser de ficção científica como viagens no tempo ou universos alternativos. Mas esses temas são apenas o pretexto para discutir questões existenciais e relacionamentos. "Sound Of My Voice"(2011), sugerido pelo nosso leitor Fábio Hofnik, segue essa tendência que os críticos definem como "psicodramas alt.sci-fi". Aqui a narrativa sobre uma estranha seita cuja líder teria vindo do futuro põe em discussão a chamada "mentalidade da sobrevivência", forte traço da mentalidade atual: a nossa difusa sensação de abandono e insegurança em relação ao futuro que alimentaria a frenética busca contemporânea por seitas, religiões e técnicas de autoajuda e autoconhecimento alardeadas pela cultura midiática.
Uma mulher é encontrada vagando pelas ruas de Los Angeles apenas trajando um lençol enrolado pelo corpo, sem memória e apenas trazendo como marca visível do passado uma tatuagem de uma âncora com o número 54 ao lado.
Um jovem casal decide fazer um
documentário sobre uma estranha seita, cuja líder é aquela mulher que foi
encontrada vagando pelas ruas. Agora ela afirma vir do futuro, mais
precisamente do ano 2054 – ela teria chegado a essa conclusão depois de
estranhos flahs de memória e o número 54 tatuado.
Uma menina com traços de autismo
brinca sempre solitária em seu quarto, fazendo estranhas figuras com blocos de
montar.
terça-feira, abril 09, 2013
O programa "CQC" e a correia de transmissão
terça-feira, abril 09, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Iscas mirins,
repórteres dublês de humorista e câmeras escondidas são hoje as principais
armas de uma onda de moralismo seletivo que domina as telas de TV, como no caso
exemplar que envolveu o deputado José Genoino e o programa “CQC”. Mas há algo
de mais profundo nessa onda moralizante do que o atual jogo de cena
político-midiático. Por trás da onda de programas televisivos representado pelo
“CQC” (programas, por assim dizer, “sensacionalisticamente corretos”)
esconderia a própria natureza do funcionamento da indústria cultural que no
passado pesquisadores como Adorno e Horkheimer tematizaram: a ritualização de
uma espécie de correia de transmissão na sociedade onde “aquele que é duro
contra si mesmo adquire o direito de sê-lo com os demais e se vinga da própria
dor”. O sensacionalismo seletivo que prefere despejar toda indignação nos
“pequenos” que desde o início já estão derrotados e condenados do que nos
poderosos seria a ritualização de um prazer voyeurista e sádico do espectador.
O episódio que protagonizou o
“repórter” mirim usado como isca para que o programa "CQC" (Custe O Que Custar da
TV Band) arrancasse de José Genoino algumas palavras (ele se recusa a conversar
com os dublês de repórter/humorista do programa) esconde algo de mais profundo.
Condenado pelo julgamento do chamado “mensalão” e exposto extensivamente ao
linchamento midiático como um caso exemplar da onda de defesa da moralidade que
varre o país, há algo de simbólico na figura de um político acuado em sua sala
no Congresso, a portas fechadas deixando entrar uma criança oferecida como isca
a alguém isolado e, talvez, carente por simpatia – a criança se dizia filho de
militante do PT.
O CQC pareceu querer requentar
uma notícia já passada, “chutar cachorro morto”, tentar tripudiar em cima de
uma figura já julgada e condenada por chicanas jurídicas e pelo veredito
midiático. Em outras palavras, ofereceu para os espectadores alguém
supostamente fraco e derrotado para o deleite público da humilhação.
domingo, abril 07, 2013
A necessidade do ritual de sacrifício humano no filme "O Segredo da Cabana"
domingo, abril 07, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O que acontece quando
o filme clássico “A Morte do Demônio” (Evil Dead) de 1981 se encontra com “Matrix” e "Show de Truman"?
Temos o surpreendente filme “O Segredo da Cabana” (The Cabin in the Woods, 2011),
um instigante jogo metalinguístico em múltiplos níveis que vai da sátira ao
gênero “slasher movies” às origens míticas da necessidade de antigos arquétipos
e mitos serem revividos e renovados em diversos formatos, da antiguidade à
indústria de entretenimento contemporânea. Por que ritos antiquíssimos de
sacrifícios humanos precisam ser repetidos a cada filme? Por que jovens que
fazem sexo sempre morrem com requintes sadísticos em cada roteiro hollywoodiano?
É o que pretende responder o diretor Drew Goddard em “O Segredo da Cabana”.
Quando Sam Reimi escreveu e
dirigiu “A Morte do Demônio” (Evil Dead, 1981) certamente não imaginava que a
situação de cinco jovens em uma remota cabana tomada por demônios em uma
floresta se tornaria um plot prototípico de todos os chamados “slash” ou “exploited”
movies - onde sempre um assassino surge do nada para atacar um grupo com
requintes de tortura, sadismo e perversão sexual.
Mais do que isso, talvez não
imaginasse que nesse meio tempo o mainstream
hollywoodiano embarcaria em uma fase “metafísica” de auto-desconstrução como em
“Show de Truman” ou de desconstrução gnóstica da própria realidade como em
“Matrix” e “Vanilla Sky”. O resultado foi o surgimento de toda uma geração de
roteiristas e diretores (Charlie Kaufman, Christopher Nolan, irmãos Wachowsky,
Tarantino etc) com uma visão metalinguística, desconstrucionista ou de
distanciamento irônico em relação aos gêneros, fórmulas ou clichês do cinema
comercial.
Somente é possível compreender
integralmente o filme “O Segredo da Cabana” (The Cabin in the Woods, 2011)
colocando-o dentro desse contexto de produções cinematográficas cada
vez mais auto-referenciais e que, por isso, permitem muitas vezes a possibilidade de expressar agudas visões
críticas no meio do mainstream
hollywoodiano, como no caso desse filme.
sexta-feira, abril 05, 2013
A arquitetura subliminar de Victor Gruen no documentário "Gruen Effect"
sexta-feira, abril 05, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Ele criou um conceito
que mudaria radicalmente a sociabilidade e a percepção humana contemporânea.
Inspirado em planejamento socialista e nas memórias dos espaços de convivência
europeus com seus cafés e comércio de rua, um imigrante vienense foragido do
nazismo cria nos EUA os primeiros Shopping Malls na década de 1940. Ele
acreditava que seria a solução para a democracia americana em meio à alienação
e solidão criadas pela expansão econômica pós-guerra. O arquiteto Victor Gruen
mais tarde renegaria publicamente sua invenção ao vê-la convertida em “máquinas
subliminares de venda”. Mas o seu nome acabou sendo associado ao principal
efeito psicológico que o design arquitetônico dos centros comerciais criaria na
mente dos consumidores: o chamado “Efeito Gruen Transfer”. Esse é o tema do
documentário alemão “Gruen Effect: Victor Gruen and the Shopping Mall” (2012).
Ele definitivamente associou o
automóvel ao consumo e alterou drasticamente o horizonte urbano das grandes
cidades do mundo. Inventou o conceito de Shopping Mall (centros comerciais) cuja
arquitetura acabou involuntariamente produzindo um efeito que os pesquisadores
em comunicação subliminar chamam de “Gruen Transfer”: no momento em que os
consumidores entram em um shopping são envolvidos por um layout arquitetônico
intencionalmente confuso, fazendo-os esquecerem das suas intenções iniciais
e tornando-os vulneráveis ao bombardeio sensoriais de sons, aromas e luzes –
veja RUSHKOFF, Douglas. Coerction, N.
York: 2000 e HOWARD, Martin. We Know What
You Want. N. YorK: Desinformation, 2005.
O termo “Gruen Transfer”
refere-se ao arquiteto austríaco Victor Gruen que, sem perceber, criou
conceitos que mudariam radicalmente o desenvolvimento urbano do planeta. Um
imigrante europeu que de forma dramática fugiu de uma Viena controlada pelos
nazistas em 1938 e que, nos EUA em plena expansão da sociedade de consumo
pós-guerra e paradoxalmente inspirado no planejamento socialista e de suas
memórias sobre os espaços comunais dos cafés e lojas de ruas europeias, criou
os primeiros shopping centers na década de 1940.
segunda-feira, abril 01, 2013
Em Observação: "The Cabin In The Woods" (2011)
segunda-feira, abril 01, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Sugerido pelo nosso
leitor Marcelo Sousa, o filme “The Cabin In The Woods” é definido pela crítica
como um mix de “Eu Sei o que Vocês Fizeram no Verão Passado” com “Matrix”. Ele
não se limita a fazer exercício de desconstrução do gênero terror, mas quer
oferecer respostas: por que os assassinatos são tão ritualísticos? Por que o
Mal pune os desobedientes e os bons sempre sobrevivem? O filme interessou ao
Blog, pois promete questionar a própria representação do Mal nesse gênero
cinematográfico: o chamado clichê da “quebra-da-ordem-e-retorno-a-ordem”.
sexta-feira, março 29, 2013
Geografias Interiores: cartografias e topografias da mente
sexta-feira, março 29, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A
cinematografia desse início de século parece expressar nas suas narrativas
fílmicas uma agenda tecnológica contemporânea onde não apenas generaliza o
modelo computacional como fosse o próprio modelo cognitivo de funcionamento da
mente, mas também pretende criar modelos simulados de funcionamento cerebral a
partir de verdadeiras cartografias e topografias da mente. O esforço multidisciplinar envolvendo as neurociências,
ciências cognitivas, Cibernética, Inteligência Artificial e Teoria da
Informação para não só desvendar o funcionamento da mente como também procurar
um modelo de simulação que permita não só compreender a dinâmica dos processos
mentais e da consciência, mas, principalmente, manipulá-la e controlá-la.
Filmes que parecem expressar essa agenda tecnocientífica ao empreenderem uma verdadeira geografia alegórica dos processos mentais.
Tal agenda culmina hoje no reforço de um novo tipo de sujeito das novas redes
tecnológicas digitais: o sujeito fractal e a sua compulsão em representar
cartograficamente seus pensamentos, hábitos, relacionamentos e projetos
pessoais por meio de verdadeiras “geografias interiores”.
O filme pode ser considerado um verdadeiro
documento primário por expressar através de imagens e movimento o imaginário e
sensibilidades de uma determinada época. O historiador Marc Ferro, um dos
principais nomes da chamada “Escola dos Annales”, acredita que a relação
cinema-história tem um importante papel no campo historiográfico: "o imaginário
é tanto história quanto História, mas o cinema,
especialmente o cinema de
ficção, abre um excelente caminho em direção aos campos da história
psicossocial nunca atingidos pela análise dos documentos" (FERRO, 1992,
p.12). Não importa se o filme refere-se a um passado remoto ou imediato, pois
sempre vai além do seu conteúdo:
domingo, março 24, 2013
A canastrice dos sete dispositivos da propaganda
domingo, março 24, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
"Mera coincidência" (Wag The Dog, 1997) |
Em 1940 um artigo denunciava
os chamados “sete dispositivos da Propaganda” e exortava os leitores a detectá-los por ser uma necessidade absolutamente vital para não serem enganados. Setenta e três anos
depois esses dispositivos continuam ativos apesar da absoluta obviedade,
exagero, “overacting” e, principalmente, canastrice dos intérpretes desses
verdadeiros scripts que são reeditados sob uma roupagem moderna e descolada por
marqueteiros e publicitários. Como é possível que depois de tanto tempo esses
dispositivos continuem na linguagem da mídia, da Política, do Marketing e da
Publicidade? E, apesar da explícita natureza fake e não-espontânea desses
dispositivos, continuam a pautar a sociedade e conquistar corações e mentes. Qual
a causa dessa invasão da canastrice na política e na esfera pública?
Nesse final de semana um amigo
mostrou-me um antigo exemplar de uma revista de artes gráficas norte-americana
chamada “Print - A Quartely Journal of the Graphic Arts” de setembro de 1940. É
muito mais do que uma revista, pois combina delícias visuais e belíssimas
fotografias com textos pesados e com foco sério.
A revista abre com um ensaio
intitulado “Propaganda e Artes Gráficas – a influência na opinião pública para
a Unidade Nacional” de William E. Rudge. O texto nos oferece diversos exemplos
de “mensagens positivas”, abordando como o design gráfico pode ser uma
ferramenta para “condicionar o comportamento humano”. Rudge escreve: “é
absolutamente vital distinguir, através da compreensão e análise, a boa e a má
propaganda. Não se deixe enganar!”.
sexta-feira, março 22, 2013
Em Observação: "Disconnect" (2012)
sexta-feira, março 22, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Nosso leitor “!3runo”
sugeriu o filme “Disconnect” que imediatamente passou a interessar o blog: sua tese central é a de que o massivo acesso às
redes sociais e a natureza viciante das comunicações instantâneas estão nos
tornando desconectados em relação às pessoas em torno de nós. As três inter-relacionadas
histórias do filme que envolvem exploração pornográfica na internet,
cyberbullying e fraudes com cartões de créditos revelam não só o potencial
criminógeno das novas tecnologias. Seriam a face mais sensacionalista do
fenômeno subterrâneo da incomunicabilidade em plena era da informação.
segunda-feira, março 18, 2013
A contradição secreta da Publicidade em "The Greatest Movie Ever Sold"
segunda-feira, março 18, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Depois de apresentar as batas
fritas transgênicas do McDonald’s (“Super Size me”, 2004) que jamais deterioram
e denunciar a procedência suspeita da carne dos hambúrgueres da rede de fast food
forçando-a a fazer uma massiva campanha mostrando como seus sanduíches estão
mais “verdes”, o diretor Morgan Spurlock escolhe outro alvo: o marketing
subliminar. Mais precisamente o chamado “product placement”, como a publicidade
insere produtos nas cenas de filmes e produtos audiovisuais. Em uma sequência
de “Homem de Ferro” (Iron Man, 2008) vemos o personagem Tony Stark dirigindo
velozmente um Audi conversível; ou em “Homen Aranha” vemos o protagonista Peter
Parker cruzando uma avenida de Nova York tendo ao fundo letreiros e outdoors de
diversos produtos.
“The Greatest Movie Ever Sold”
faz ao mesmo tempo um documentário e uma sátira de como os filmes
hollywoodianos deixaram de ser patrocinados para serem, agora, vendidos a
investidores para que se tornem vitrines de produtos e marcas. É o Santo Graal
do marketing: a co-promoção. A produção de “Homem de Ferro”, por exemplo, foi
associada a 14 marcas. Elas tornam-se co-produtoras e última palavra na
aprovação até em questões artísticas como roteiro e narrativa que, aliás, têm
que inventar sequências para a exposição das marcas parceiras.
sexta-feira, março 15, 2013
Mas afinal, quem é o dono do hardware?
sexta-feira, março 15, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Após resultados positivos nas investigações sobre a interface
cérebro/máquina, o cientista Miguel Nicolélis vai além: em artigo publicado na “Cientific
Reports” anuncia o sucesso na conexão entre cérebro/cérebro. O arco de benefícios
iria desde aplicações médicas como reparos eletrônicos em tecidos cerebrais até
o surgimento do primeiro “computador orgânico”, uma Internet formada por
cérebros conectados em tempo real. Essas promessas tecnocientíficas adquirem um
aspecto messiânico ao serem divulgadas pela mídia de forma descontextualizada e
solta em uma espécie de vácuo das boas intenções. Mas quem financia a pesquisa?
Qual o destino dessas descobertas ao transformarem-se em comodities em uma sociedade de mercado? Para além das
aplicações pontuais, que tipo de paradigma ou modelo de individualidade as
neurociências repercutem na cultura? E o principal: mas afinal, quem é o dono do hardware?
Nicolélis tem nobres intenções:
ele quer fazer tetraplégicos andarem através da interface cérebro/máquina e tecidos
cerebrais lesionados se reconstituírem através da tecnologia e plasticidade inerente
às redes neuronais. Nicolélis se deixa fotografar com camisas discretamente
abertas para que possamos perceber uma camisa verde e amarela por baixo. Ele
faz questão de declarar que todo o know
how tecnológico dos laboratórios da Universidade de Duke nos EUA foi
trazido para o Instituto de Neurociência de Natal, Rio Grande do Norte.
Nicolélis é um nacionalista, sinal do crescente protagonismo do Brasil no
cenário internacional após anos de governo Lula e Dilma.
Os avanços tecnocientíficos
parecem estar acima de qualquer juízo de valor ou crítica por serem o resultado
prático do esforço coletivo do intelecto humano. Esses avanços fascinam pela
potencial utilidade e benefícios que podem trazer ao gênero humano: quem poderá
ser contra a possibilidade de paralíticos voltarem a andar e cérebros
lesionados recuperarem suas funções?
segunda-feira, março 11, 2013
Em Observação: "Black Mirror" (2011-2013)
segunda-feira, março 11, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Nosso leitor Nelson
Job indicou a série inglesa exibida no Channel 4 “Black Mirror”. Com duas
temporadas compostas por três episódios cada, nos apresenta as potencialidades
sombrias de tecnologias já existentes como biochips, Internet e mídias sociais.
Criada pelo jornalista e roteirista Charlie Brooker (notável pela sua crítica
ácida aos formatos televisivos como em “Dead Set” onde zumbis invadem um
reality show) “Black Mirror” está “Em Observação” pelo Blog por dois motivos:
primeiro: por fazer uma crítica midiática-política-social de tecnologias
portáteis atuais (aplicativos, widgets, apps etc.) que querem fazer nossa
identidade e, segundo, a irônica condição dessa série: feita por uma produtora
que pertence ao grupo Endemol, notória pela criação de games televisivos e
reality shows como o “Big Brother”, formatos criticados pela própria série.
sexta-feira, março 08, 2013
Quem você vai encontrar depois de morrer?
sexta-feira, março 08, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
As representações da
vida pós-morte no cinema são um verdadeiro sismógrafo do que se passa entre os
vivos aqui na Terra. As sucessivas mudanças das representações cinematográficas
do céu e da morte ao longo das décadas parecem refletir ansiedades culturais,
avanços tecnológicos e importantes fatos históricos. Ao fazer um cruzamento do
conto “Os Fantasmas de Scrooge” de Charles Dickens com a chamada “Teoria dos
Seis Graus de Separação” o filme “As Cinco Pessoas Que Você Encontra no Céu” (Five
People You Meet In Heaven, 2004) comprova essa tese ao nos apresentar um
cenário pós-morte onde pessoas criam seus próprios “céus”, como fossem anjos
decaídos imersos em si mesmos. Seria o reflexo da virtualização atual do eu no
ciberespaço onde avatares se transformam em espécies de divindades criadoras?
As representações do cinema
sobre a existência pós-morte revelam muitas mais as mazelas da vida terrena do
que qualquer verdade extra-corpórea. Como nenhum cineasta conseguiu voltar da
morte com takes para um documentário sobre a vida após a morte, o tema acabou
tornando-se um espelho das ansiedades culturais, avanços tecnológicos e crises
religiosas e espirituais de cada época.
Apesar das representações do
céu, da morte, e da existência pós-vida se alterarem de acordo com o imaginário
de cada época, uma fórmula básica se mantém, a partir da qual se criam diversas
narrativas e variações: personagem principal morre, chega no “céu” (algum
espaço intermediário entre a Terra e o céu, limbo, ante-sala celestial ou a
própria plenitude celeste etc.) e é
submetido a algum tipo de julgamento (revê sua própria vida, mentores ou
entidades superioras o julgam, retorna para a vida para uma “segunda chance”
etc.).
segunda-feira, março 04, 2013
Blog "Cinegnose" foi tema do Terceiro "Hangout Gnóstico" da Sociedade Gnóstica Internacional
segunda-feira, março 04, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Neste último domingo (03/03) tive a honra de ser
entrevistado no “Terceiro Hangout Gnóstico” dentro do tema “Cinema Gnóstico” e
as contribuições que esse blog tem oferecido ao campo das discussões sobre o gnosticismo. O evento é uma iniciativa da
Sociedade Gnóstica Internacional de Curitiba (PR) que aproveita a ferramenta
Hangout do Google + (sistema que permite videoconferências) para aproximar as
pessoas objetivando construir uma comunidade em torno da espiritualidade
gnóstica.
Seu presidente, Giordano
Cimadon, define essa iniciativa como “uma forma de promover um contato entre
gnósticos de diferentes partes do mundo e estabelecer um formato mais
atualizado de apresentação da cultura gnóstica”.
Na entrevista acompanhada de
debates e questionamentos, pude descrever a trajetória do blog “Cinema Secreto:
Cinegnose” como uma resultante do projeto de mestrado sobre o Cinema Gnóstico,
a evolução desse gênero cinematográfico até a atualidade e a possibilidade de a
mídia cinematográfica possibilitar a experiência da gnosis, projeto atual de doutorado onde procuro relacionar esta
experiência transcendente com o “acontecimento comunicacional” e suas
potencialidades políticas no sentido de quebra de uma ordem do cotidiano do
espectador - assista ao hangout completo no vídeo abaixo.
domingo, março 03, 2013
Drogas, discoteca e 3D: o atalho pop para o Sagrado
domingo, março 03, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Dos primeiros espaços sensoriais multimídia das discotecas dos anos 70 ao cinema 3D da atualidade, acompanhamos diante dos nossos sentidos a materialização tecnológica de toda uma dimensão mística e sagrada: a materialização dos simbolismos arquetípicos da espécie diante dos nossos sentidos por meio da convergência das mídias através das tecnologias digitais. Se no passado era necessário a ascese e disciplina espiritual para vivenciar essa dimensão metafísica, hoje as tecnologias sensorias prometem um atalho. Qual o destino da milenar aspiração mística e religiosa por transcendência num ambiente altamente tecnologizado sob o controle de grandes corporações?
Em uma aula da
disciplina Comunicação Visual na Universidade Anhembi Morumbi discutia com meus
alunos as referências visuais de cada década. Em relação aos anos 70,
apresentava as referências visuais da Disco Music: moda, comportamento e,
principalmente, os espaços multi-sensorias que eram as discotecas. Luzes
estroboscópicas, pistas de dança com luzes em movimento criando formas
geométricas randômicas, gelo seco etc. Em termos de comportamento, sabemos que,
ao longo das décadas as drogas acompanham cada tendência dentro da cultura pop.
Na era da Disco Music acompanhamos a decadência das drogas lisérgicas e a
ascensão das drogas "speed" como a cocaína. Diante de tanto estímulo
sensorial, o importante era ficar ligado e dançar a noite inteira.
sexta-feira, março 01, 2013
A urgência da destruição no cinema norte-americano
sexta-feira, março 01, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O poder financeiro e tecnológico
da indústria cinematográfica norte-americana parece ter uma relação direta com
a escala de destruição exibida em seus filmes: de catástrofes em proporções
planetárias a micro-desastres cotidianos como perseguições seguidas de
explosões e choques de automóveis, destruição de bens e descartabilidade de
objetos. Em um pequeno insight solto em uma frase do livro clássico “Monopoly
Capital” de 1966 os economistas Paul A. Baran e Paul M. Sweezy sugerem uma conexão
entre essa verdadeira cultura da destruição fílmica e a chamada obsolescência
planejada, estratégia dos oligopólios e monopólios de propositalmente fabricar
e distribuir produtos que em pouco tempo ficarão obsoletos ou não-funcionais,
forçando o consumidor a adquirir uma nova geração de produtos evitando, assim,
a estagnação dos mercados. Poderiam as destruições em série no cinema ser a
proto-narrativa que naturaliza e torna aceitável essa descartabilidade
generalizada de bens? Ou seria apenas a expressão de um “espírito de época”?
Em uma curtíssima passagem que
mais parece um insight inserido no final de uma frase, os economistas Paul
Baran e Paul Sweezy no livro “O Capitalismo Monopolista” fazem uma surpreendente
conexão entre a necessidade de o capital criar obsolescência e descartabilidade
dos produtos nos seus esforços por vendas e a obsessão do cinema
norte-americano em explorar o tema da destruição generalizada em muito dos seus
filmes. Os autores jogam no ar a sugestão de um interessante sincronismo entre
um fato econômico e a verdadeira cultura da destruição que marca os filmes
norte-americanos: filmes-catástrofes, perseguições que terminam em colisões e
explosões, incêndios, desmoronamentos, monstros ou aliens que destroem cidades,
sinistros de todas as espécies que levam a destruição de bens e propriedades em
larga escala etc.
Cenas de destruição ou
descartabilidade generalizada de bens como roupas e automóveis são inseridas em
narrativas dos mais diversos gêneros cinematográficos desde formas explícitas
(os filmes-catástrofes sobre o fim do mundo) ou formas mais sutis: para onde
vão as roupas “civis” do homem-aranha e do super-homem após as suas
transformações em becos e cabinas telefônicas? Não importa o gênero de filme:
sempre estará lá uma cena de colisão de automóveis, um incêndio, a
descartabilidade ou perda de objetos ou bens como automóveis, roupas e casas
que parecem não incomodar muito os personagens. Tudo parece que poderá ser
reposto ou reconstruído rapidamente.
Tecnologia do Blogger.