quinta-feira, dezembro 21, 2017

Globo faz mais três "Contos Maravilhosos" para Natal do mérito-empreendedor


“Olhe sempre para o lado brilhante da vida”, cantava um condenado à morte pelos romanos, na cruz, no filme “A Vida de Brian” do grupo inglês de humor Monty Python. Diante de uma realidade birrenta e teimosa que insiste em contradizer a pauta da “retomada do crescimento econômico”, a mídia corporativa faz como Eric Idle cantando naquele filme: tenta transformar más notícias em positivos “Contos Maravilhosos”, conceito dos estudos de narratologia do pesquisador Vladimir Propp – contos mágicos de perda e recompensa. Para tentar elevar o astral da patuleia, agora convertida em mérito-empreendedores, a Globo criou mais três edificantes contos para as festas de fim de ano: os contos maravilhosos sobre o botijão de gás, o Conto Maravilhoso do resgate dos valores natalinos e uma novidade – o Meta Conto Maravilhoso da jornalista demitida.

terça-feira, dezembro 19, 2017

Bebês, repolhos e Papai Noel no cruel mundo adulto de "Patch Town"



Bebês, pés de repolhos e Papai Noel numa fábula sobre um mundo adulto que prepara crianças para o futuro cruel que as espera – a exploração física e psíquica pelo trabalho e sociedade de consumo. Um filme que combina a iconografia da era soviética, folclore europeu oriental, a mitologia gnóstica do demiurgo, Papai Noel e elfos. Um mundo no qual bebês são recolhidos em campos de repolhos para serem vendidos como bonecas para crianças de todo o mundo. Para depois serem recolhidas pelo “Coletor de Crianças”, a memória delas apagada e em seguida exploradas em uma fábrica que produzirá mais bonecas com bebês presos em seu interior. Tudo com pitadas de cenas musicais e dança. Este é o estranho filme canadense “Patch Town” (2014): um cruzamento da estética “dark” de Tim Burton com as atmosferas opressivas de Terry Gilliam. 

sábado, dezembro 16, 2017

Nossas vidas são estradas e escadarias infinitas no filme "El Incidente"


Será que na realidade somos como pobres hamsters prisioneiros de uma roda que gira eternamente sem nos darmos conta da nossa terrível situação?  Será que repetimos sempre os mesmos gestos, em um mesmo cenário, sempre com os mesmos efeitos e as mesmas consequências? Poderia ser essa a definição de loucura: tentar resultados diferentes repetindo a mesma rotina? Duas estórias paralelas com personagens presos em loops espaço-tempo eternos – um grupo em uma escadaria e uma família prisioneira em uma estrada infinita na qual o sol nunca se põe. Esse é o filme mexicano “El Incidente” (2014) do jovem diretor Isaac Ezban. Uma ambiciosa ficção científica metafísica que aproxima as geometrias impossíveis de M.C. Escher com o universo conspiratória de Philip K. Dick, procurando aproximar a hipótese da existência dos mundos paralelos da cosmogonia dos diversos “céus” dos antigos gnósticos.

Três "Contos Maravilhosos" para novos mérito-empreendedores


Hoje a grande mídia esforça-se para demonstrar imparcialidade para não se desmoralizar de vez diante de telespectadores e leitores. Diante da crise econômica crônica e da tragédia social brasileira, a mídia é obrigada a abandonar o confortável campo semiótico da dissimulação (simplesmente mentir, omitir ou censurar) para aplicar a estratégia mais trabalhosa da simulação: tem que mostrar as mazelas brasileiras. Mas o desafio é transformá-las em “contos maravilhosos” no sentido dado pelo pesquisador de narratologia, Vladimir Propp – o estudo da estrutura narrativa recorrente em todos contos de fadas. Agora o jornalismo corporativo tenta transformar personagens anônimos da tragédia brasileira em protagonistas de contos de fadas pós-modernos. O “Cinegnose” analisa três contos maravilhosos midiáticos: o conto “a economia alquímica para as massas”, o conto do “presépio vivo de uma moradora de rua” e o conto “a virada maravilhosa de um homem em um economia que cresceu 0,1%”.

quinta-feira, dezembro 14, 2017

Trump inventou a "Meta-False Flag" em explosão de Nova York?


À primeira vista a explosão de uma bomba caseira atada ao corpo de um homem em estação de ônibus e metrô em Nova York parece ser mais do mesmo: um não-acontecimento (aqueles fatos que são relações públicas de si mesmos) com timing, ambiguidades, anomalias, a indefectível narrativa do “lobo solitário” etc. E um homem que se explode “acidentalmente” e sobrevive apresentando um aspecto de um personagem de desenho animado chamuscado. Mas Donald Trump deu o toque de novidade: imediatamente após o suposto atentado, um tweet no qual o próprio presidente sugere que o episódio foi uma “fake news”, atacando os canais CNN e MSNBC. Uma curiosa “Meta-False Flag”? Por que Trump acusa de “fake news” um episódio no qual saiu ganhando? Para a grande mídia, o “atentado” foi retaliação contra o anúncio da transferência da embaixada dos EUA para cidade santa de Jerusalém. Ou mais um “não-acontecimento”, desta vez com objetivo de desviar a atenção da opinião pública da derrota norte-americana diante da tática de dissuasão nuclear da Coréia do Norte?

domingo, dezembro 10, 2017

Curta da Semana: "Where Are They Now?" - uma cilada destruiu Roger e Jessica Rabbit


Onde estão os ícones da animação dos anos 1980 como He-Man, Roger e Jéssica Rabbit (do filme "Uma Cilada Para Roger Rabbit"), o Esqueleto, Garfield, Popeye, Mumm-Rá, muito tempo depois do auge? Como seria a realidade das suas vidas atuais? O animador inglês Steve Cutts (conhecido por narrativas críticas sobre a vida moderna) os imagina viciados, obesos, compulsivos, desempregados ou subempregados em call-centers e caixas de supermercados. Esse é o argumento do pequeno curta “Where Are They Now?” (2014): heróis que perderam a batalha final contra inimigos mais poderosos do que vilões desse ou do outro mundo: o mundo corporativo, o trabalho precarizado e o desemprego crônico. E terminaram esquecidos porque acabaram ficando parecidos demais com os espectadores.

sábado, dezembro 09, 2017

A batalha humana de lembrar e esquecer em "Marjorie Prime"



O que é a memória? Um poço profundo no qual resgatamos lembranças? Ou apenas lembramos da últimas vez que lembramos? Cópias de cópias de lembranças cada vez mais inexatas. E se uma Inteligência Artificial fosse programada com nossas memórias? Seria um poço de lembranças ou uma máquina que cobre a lacuna das nossas memórias apenas com simulacros? Esse é o tema de “Marjorie Prime (2017) – num futuro indeterminado foi introduzido um serviço que permite “ressuscitar” a pessoa amada de forma holográfica, “primes” programados pelas memórias do usuário e familiares. Mas essas próteses de memórias não serão nem humanizadas e muito menos pretenderão nos subjugar. Serão apenas testemunhas passivas da nossa desumanização. Filme sugerido pelo nosso infalível leitor Felipe Resende.

quinta-feira, dezembro 07, 2017

Mídia dilui significado da descoberta de papiro com "ensinamentos secretos" de Jesus


As notícias foram dadas como alguma coisa entre Indiana Jones, conspirações do “Código da Vinci” de Dan Brown ou sobre Jesus convenientemente próximo do Natal. As notícias sobre a descoberta do manuscrito em grego do “Primeiro Apocalipse de Tiago” (manuscrito apócrifo gnóstico até então conhecido em linguagem copta da chamada “Biblioteca de Nag Hammadi”), perdido no acervo da Universidade de Oxford, foram cercadas por uma mitologia midiática que sempre é acionada para diluir aquilo que é de mais virulento e revolucionário no Gnosticismo (razão pela qual foi tão perseguido por toda a História): os conflitos políticos e econômicos como parte do drama de uma luta cósmica entre o Bem e o Mal, sem superação dialética ou solução evolutiva. A grande mídia cobriu a descoberta como “religiosa”, diluindo a potencial ameaça às instituições desse mundo: de que Jesus não veio para nos “salvar”, mas para nos revelar algo que já existe dentro de nós – apenas nos fazem esquecer através de ilusões. E a mídia que “noticia” a descoberta do manuscrito é uma delas.

terça-feira, dezembro 05, 2017

Para a Globo, vingança é um prato que se come... quente!


Diz o ditado, imortalizado no livro “O Chefão”, de Mário Puzzo, na fala de Dom Corleone: “A vingança é um prato que se come frio”. Mas para a Globo não é bem assim: deve-se servir bem quente. Ataque e contra-ataque, retaliatório e vingativo. O candidato à presidência Jair Bolsonaro (criatura que emergiu da lama psíquica que a Globo remexeu para engrossar o caldo do impeachment) acusou a emissora de “emplacar o Lula” e ameaçou, “quando chegar lá”, reduzir pela metade a verba publicitária da emissora. Foi o bastante para de imediato o jornal “O Globo” denunciar, em letras garrafais, o nepotismo do deputado no Congresso. Mais um episódio que comprova como o jornalismo global nunca esteve no campo da informação – se isolou num fechado sistema tautista de autopreservação. Quando vê ameaçado seus interesses logísticos e econômicos (da política ao futebol), escala seus apresentadores e colunistas para colocar suas “grifes” como ventríloquos dos “furos” que rapidamente descem da cúpula para o piso da redação. Chamam isso de “jornalismo investigativo”.

domingo, dezembro 03, 2017

Em "Cosmodrama" Ciência, Religião e Filosofia travam duelo sem rumo


Sete astronautas, acompanhados por um cachorro e um chipanzé, acordam em uma espaçonave depois de saírem do estado de criogênico. Nenhum deles sabe o que está fazendo ali ou qual o destino final da viagem. Aparentemente a nave (um mix vintage da “Discovery” de “2001” e a “Enterprise” da série de TV “Star Trek”) está programada para funcionar automaticamente. Eles apenas terão que confiar na própria capacidade de observação para especular o propósito de tudo aquilo. Logo descobrirão que cada um é especialista em um área do conhecimento: Psicologia, Astronomia, Semiótica, Jornalismo, Filosofia, Biologia e Genética. Esse é o filme francês “Cosmodrama” (2015) de Phillipe Fernandez. Com delicadeza e humor, através de gags e situações absurdas, introduz o espectador às grandes especulações cosmológicas sobre o início e o fim do Universo: o Big Bang, a Eternidade, o design inteligente e o universo holográfico. Ciência, Religião e Filosofia duelam entre si para entender o propósito da existência. Porém, o mistério maior permanece: mas afinal, o quê é aquela espaçonave? Com a colaboração do nosso infalível leitor Felipe Resende.

quinta-feira, novembro 30, 2017

O jogo da simulação de censura Globo/Gabriel Bá


Nas redes sociais indignação. O desenhista Gabriel Bá apareceu no talk show da Globo “Conversa com Bial” com seu indefectível boné verde – marca registrada do artista. Só que dessa vez com a estrela vermelha coberta de forma improvisada com duas fitas isolantes preta. “Evite números ou símbolos para que não haja associação a marcas ou partidos políticos”, teriam dito os figurinistas nos camarins. “Censura!”, gritaram internautas. Se foi mesmo censura, como pode a Globo fazê-la de forma tão tosca e improvisada? O episódio apresenta algumas dissonâncias que sugerem mais uma estratégia de manipulação. Mas dessa vez não mais no campo semiótico da “dissimulação” – esconder, mentir, censurar. Mas agora no campo da “simulação”: propositalmente tornar o evento visível (a suposta “censura”). Para quê? Para a Globo tentar se livrar de mais um dos seus dilemas: depois de anos de oposição política explícita explorando símbolos e números de forma até subliminar, agora, candidamente, tenta demonstrar que possui uma linha editorial “imparcial”. E o artista, assim como os indignados críticos, participaram inconscientes desse blefe.

quarta-feira, novembro 29, 2017

"Crumbs": o primeiro sci-fi da Etiópia é sobre o apocalipse ocidental


Em um mundo pós-apocalíptico, um homem fará uma jornada espiritual em busca do... Papai Noel, para que realize seu sonho de leva-lo para uma espaçonave que está parada no céu. Enquanto isso, sua esposa reza num altar com a foto de Michael Jordan para que divindades como “Justin Bieber IV” e “Paul MacCartney XI” os proteja nessa difícil missão. Esse é o primeiro filme de ficção científica da Etiópia: “Crumbs” (2015) de Miguel Llansó sobre um futuro em que tudo o que restou da antiga civilização foram brinquedos, objetos e detritos de plástico e vinil da extinta cultura pop. Sem terem a memória do mundo anterior ao apocalipse, criaram uma nova mitologia transformando todos esses restos do passado em símbolos místico-religiosos e amuletos de sorte. Toda a bizarrice e surrealismo de “Crumbs” nos faz pensar: assim como eles, será que também mitologizamos símbolos e objetos antigos, criando novas religiões tão loucas quanto as do filme “Crumbs”?

segunda-feira, novembro 27, 2017

Curta da Semana: "Happiness" - quando a felicidade vira ideologia


Como pode ser prometida a felicidade numa sociedade de competição generalizada? Uma competição tão naturalizada e entranhada cuja narrativa teria seu início na seminal corrida dos espermatozoides na reprodução humana. A felicidade somente seria possível no plano da ideologia: a felicidade individual às custas da infelicidade da maioria. Esse é o tema do curta de animação “Happiness” (2017) do britânico Steve Cutts: ratazanas antropomorfizadas correm frenéticas em metrôs, ruas, calçadas e shoppings lotados, lutando entre si pela posse de mercadorias em uma Black Friday selvagem. E todos cercados por centenas de peças publicitárias que prometem felicidade com a compra de qualquer coisa. Quanto maior a infelicidade que a competição provoca, mais valorizada é a mercadoria “felicidade” no mercado. A sátira social do curta “Happiness” questiona o modelo de felicidade prometido, com ácida ironia.

domingo, novembro 26, 2017

Filme "Solaris" de Tarkovsky é o anti-"2001" de Kubrick


Andrei Tarkovsky considerava “2001: Uma Odisseia no Espaço” de Kubrick um filme “estéril”. Por isso, “Solaris” (1972), produção do cineasta soviético, foi considerado pela crítica o filme “anti-2001”: se os EUA ganharam a corrida espacial colocando o primeiro homem na Lua, no cinema a URSS ganharia a Guerra Fria fílmica ao desconstruir o gênero ficção científica que legitimava a conquista do espaço. De certa forma, Solaris foi o primeiro filme PsicoGnóstico: há uma planeta, uma estação espacial e astronautas. Mas tudo não passa de um álibi para discutir como o tema das viagens espaciais são um mito que esconde a verdadeira viagem: lá em cima, ao descobrirmos que estamos só em um Universo vazio e sem propósito, faremos uma viagem no interior do nosso próprio psiquismo. Um planeta com um misterioso oceano que prova aos cientistas de uma estação espacial de que não precisamos de outros mundos. Precisamos de espelhos.

sábado, novembro 25, 2017

Grande mídia transforma Black Friday em Teleton da Era Temer


Um repórter cobrindo ao vivo um congestionamento de empilhadeiras em um depósito central de produtos vendidos pela Internet. Enquanto isso, uma outra repórter foi destacada para ficar o dia inteiro numa espécie de “sala de guerra” na qual, através de um telão, as vendas e os números acumulados dos valores dos descontos eram acompanhados em tempo real . Agora o viés da grande mídia para a Black Friday virou uma espécie de Teleton comercial. Só que ao invés de um evento em prol de crianças que necessitam de cuidados especiais, agora virou uma espécie de contagem progressiva de um País que estaria saindo da crise. Basta um simples exercício de jornalismo comparado para perceber a radical mudança de viés, principalmente da Globo: se de 2010 a 2015 (período do jornalismo de guerra e de esgoto) era “Black Fraude” e “Black Friday da crise”, agora tornou-se indicador de um País que lentamente estaria saindo do buraco depois da “irresponsabilidade fiscal” do passado. Além de revelar mais uma contradição em que a Globo se mete: ao mesmo tempo que pede a cabeça de Temer para aparentar imparcialidade, tem que defender as reformas daquele que supostamente quer derrubar.

quarta-feira, novembro 22, 2017

O niilismo gnóstico de Tarkovsky contra Ciência, Religião e Arte em "Stalker"


“Stalker” (1979), segundo filme de ficção científica do soviético Andrei Tarkovsky após “Solaris” (1972), está conectado tanto com o passado quanto futuro: com a misteriosa explosão em Tunguska, Sibéria, em 1908 e com o acidente nuclear de Chernobyl em 1986, cujo argumento do filme foi estranhamente profético. Um stalker (guia ilegal) conduz um cientista e um escritor para “A Zona” – região misteriosa desértica e em ruínas (lá teria caído um asteroide ou nave alienígena) cercada por forte aparato policial. Nessa zona proibida existiriam estranhos poderes capazes de realizar os desejos mais recônditos de quem sobrevivesse a suas armadilhas mortais. Para Tarkovsky, “A Zona” seria o microcosmo da própria vida: Ciência, Arte e Religião se confrontam em uma batalha niilista para ver quem herdará o que restou da sociedade moderna – mesmo depois do fim, a ilusão, a fé vulgarizada e oportunismo lutam entre si.

domingo, novembro 19, 2017

Hollywood abriu as portas para ocultismo e maldições com o filme "Incubus"


Os críticos consideram o filme “mais amaldiçoado da história do cinema”. Um filme que abriu as portas para o ocultismo e hermetismo em Hollywood numa década de “despertar místico e religioso” através das viagens alucinógenas do psicodelismo e estados alterados de consciência. O Filme “Incubus” (1966) foi dirigido e escrito por Leslie Stevens (criador da série de TV “Quinta Dimensão”) e protagonizado por William Shatner, um ano antes de viver o capitão Kirk da série “Star Trek”. Desde sua estreia, “Incubus” foi marcado por suicídios, assassinatos, falências, divórcio e incêndio. Tão amaldiçoado que o diretor tirou o filme de circulação e os negativos foram destruídos. Para em 1996 uma cópia ser encontrada na França e recuperada para relançamentos em VHS e DVD. E logo em seguida reiniciaram as “coincidências” fatais. Muitos pesquisadores em Sincromisticismo consideram Hollywood um “centro de recrutamento de médiuns”, manipulando voláteis e perigosas formas-pensamento e arquétipos do inconsciente coletivo. “Incubus” seria um caso exemplar.

sexta-feira, novembro 17, 2017

FBI, FIFA e a nota oficial "tautista" da Globo



Nem a Patafísica (a “ciência das soluções imaginárias”) de Alfred Jarry ou o teatro do Absurdo de Backett conseguiriam imaginar um texto tão tautológico, circular, auto-referencial e metalinguístico como a nota oficial da Globo diante do escândalo das denúncias na Justiça dos EUA do pagamento de suborno pela emissora para a FIFA para ter a exclusividade nas transmissões do futebol: “após dois anos de investigações internas, a Globo apurou que jamais realizou pagamentos não previstos em contratos...”, leu a nota um constrangido jogral de apresentadores do JN. Desde que o ex-apresentador do Globo Esporte, Tiago Leifert, transformou a inauguração de um ônibus-estúdio em notícia mais relevante do que o próprio treino da seleção brasileira que deveria cobrir, a emissora vive um processo de negação “tautista” (tautologia + autismo) no qual transforma “eventos” em produtos próprios, criando uma atmosfera de amoralidade e blindagem. Assim como as telenovelas. Mas isso pode lhe custar caro: não perceber que a investida do FBI contra a FIFA (atingindo diretamente a Globo) é mais uma estratégia de lawfare na geopolítica dos EUA. Dessa vez, para reconfigurar o cenário da grande mídia mundial.

quarta-feira, novembro 15, 2017

A fé em um mundo sem Deus no filme "Entre o Bem e o Mal"




“Entre o Bem e o Mal” (“Adams Æbler”, 2005), comprova a tese de que os melhores filmes religiosos no cinema foram feitos por ateus. Escrito e dirigido pelo dinamarquês Anders Thomas Jensen, é uma tragicomédia de humor negro sobre um neonazista condenado a prestar serviços comunitários em uma remota igreja no campo. Lá encontra um padre cuja fé é baseada em um patológico otimismo de negação da realidade, e dois ex-presidiários: um muçulmano que continua roubando postos de gasolina à noite e um ex-jogador dinamarquês de tênis profissional, alcoólatra e cleptomaníaco. Mas o sacerdote acredita na bondade humana, mesmo em um neonazista que esmurra sua cara. O filme baseia-se em um argumento paradoxal: pouco importa sabermos se Deus existe, se continuaremos sofrendo do mesmo modo. Portanto, só nos restaria a solução introspectiva pessoal: a fé em um mundo sem Deus. Filme sugerido pelo nosso leitor... você sabe quem: Felipe Resende.

segunda-feira, novembro 13, 2017

Hans Donner mostra nova bandeira no "Fórum do Amanhã" olhando para o ontem


As leis trabalhistas foram “modernizadas”, assim como o próprio trabalho com os ventos “modernizadores” do empreendedorismo e agora luta-se para que toda essa “modernização” alcance também a Previdência Social. Mas falta algo, alguma coisa que sinalize essa nova visão de país e inspire o povo. Para o designer gráfico Hans Donner, isso somente será possível com uma bandeira nacional também “modernizada” – com degradês, efeitos 3D, e a palavra “Amor” antes do lema “Ordem e Progresso” com a faixa apontando para cima, para dar “poder” ao povo... O designer austríaco apresentou o projeto em um evento chamado “Fórum do Amanhã” em MG, e pretende levá-lo ao Congresso para implementação. Ironicamente, em um evento sobre o “amanhã”, Donner apresenta uma bandeira retro-futurista igual a marca visual da Globo das décadas passadas, que hoje nem a própria emissora adota mais, privilegiando um visual “orgânico” e menos artificial. A “nova” bandeira nacional de Hans Donner certamente está menos na estética, e muito mais no campo dos sintomas: sinais expressados por uma elite que fala em futuro, mas com os olhos sempre mantidos no passado. Para deixar o presente igual o ontem: o futuro do pretérito.

domingo, novembro 12, 2017

Curta da Semana: "Working With Jigsaw" - Como se vingar do chefe com jogos mortais


A franquia “Jogos Mortais” acabou e o pequeno fantoche Jigsaw teve que se virar e arrumou um emprego em um escritório como qualquer mortal. Mas velhos hábitos são difíceis de esquecer. E Jigsaw inferniza os seus colegas de trabalho com mais jogos “mortais”, dessa vez com ameaçadores post-its, fitas adesivas, pop ups pornográficos saltando em telas de computadores e mouses com alfinetes... Esse é o impagável argumento do curta “Working With Jigsaw”(2016) no qual o sádico fantoche vinga-se dos seus chefes que acusam seus jogos de diminuir a “produtividade” e “sinergia” da empresa. Um curta que suscita uma interessante analogia: como os jogos das relações humanas corporativas muitas vezes podem ser tão sádicos e arbitrários quanto os do filme “Jogos Mortais”.

sábado, novembro 11, 2017

A cobertura midiática do Enem: muito além do "fact-checking"


Até 2015, o Enem era noticiado pela grande mídia como “eleiçoeiro” e “populista”, uma “fogueira” (a “fogueira do Enem”) na qual os alunos viviam assustados e lesados com sucessivas denúncias de fraude e desorganização. A partir do ano passado, tudo mudou como num passe de mágica: agora é o “Enem nota 1.000” para aqueles alunos mais “focados e determinados” no qual fraudes são problemas pontuais tecnicamente resolvidas, sem mais o protagonismo do Judiciário. Depois de anos do jornalismo de guerra no esgoto, a grande mídia tenta recuperar o seu produto tão vilipendiado: a notícia. Enquanto joga ao mar antigos líderes como o jornalista William Waack para recuperar uma suposta isenção, apoia agências de “fact-checking” para se prevenir das “fake news” que ela própria inventou. Mas pela sua missão de salvar as aparências, o “fact-checking” ignora as mudanças do viés atribuídos aos fatos ao longo do tempo, de acordo com a mudança do contexto. A mudança da cobertura midiática dada ao Enem de 2009 a 2017 é um caso exemplar: a mentira não está apenas no ocultamento ou na invenção – está na angulação, seleção e edição.

sexta-feira, novembro 10, 2017

Globo despacha William Waack para tirar a lama das próprias mãos


Assim como no episódio do assédio sexual do ator José Mayer (naquele momento a Globo fez o cast feminino da casa vestir uma camiseta estampada “Mexeu com uma mexeu com todas”), da mesma maneira prontamente a emissora despachou William Waack depois da repercussão de um antigo vídeo no qual o jornalista fazia afirmações racistas em tom de galhofa enquanto aguardava para entrar ao vivo. Fosse em outros tempos, episódios como esses entrariam para o folclore da história dos bastidores televisivos.  Quem armou essa cilada contra William Waack levou em conta o atual contexto delicado da Globo: depois de seu jornalismo de guerra nos últimos anos ter dado visibilidade e repercussão à direita raivosa (aquela que vê o “politicamente correto” como “conspiração comunista”) para acirrar a crise política que culminaria no impeachment, agora a emissora tenta limpar suas mãos da lama que estrategicamente revolveu por anos. Disse em nota que é “visceralmente contra o racismo”. A Globo tenta ignorar de forma tautista a patologia psíquica que ajudou a incitar, da mesma maneira como até hoje tenta provar que nada teve a ver com a lama da ditadura militar que ajudou a esconder. 

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