Comer não é apenas para o estômago. Junto com o alimento também ingerimos mitologias - conotações, simbolismos, narrativas, retórica etc. Como um sismógrafo, as mitologias dos alimentos mudam ao sabor dos contextos sociais e políticos de cada época. Dos velhos programas culinários da Ofélia e Etty Fraser que celebravam a mulher como o esteio da família, passando pelas receitas combinadas com fofocas de celebridades, até chegarmos na complexa mitologia atual: o raio gourmetizador da “simplicidade descolada” na TV fechada (o ingrediente “sustentável”, restaurantes “despretensiosos”, a religião do Food Truck e o requinte da “comida de rua”) e os programas culinários que viraram reality shows gastronômicos na TV aberta com chibatadas de meritocracia anestesiadas pelo sonho do empreendedorismo para as massas. Uma mitologia que se tornou engrenagem importante na atual guerra híbrida que resulta em golpes políticos e “reformas” socadas goela abaixo. Dois irradiadores dessa “nouvelle mythologie”: Rodrigo Hilbert e MasterChef.