domingo, setembro 29, 2013
De Hitler aos Hippies: a Kombi no cinema em dez filmes
domingo, setembro 29, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A Volkswagen anunciou o encerramento da
produção da Kombi no Brasil, o último país que ainda produzia esse veículo.
Junto com o fusca, a Kombi transformou-se em um arquétipo moderno e o significante cultural
de uma constelação de conceitos que vão da esfera política às noções
espirituais de jornada e liberdade. A presença da Kombi no cinema vai refletir
esse imaginário irônico onde, apesar de nascido de um projeto nacionalista de
Hitler e depois sintonizado com o lazer e o consumo individualista de
pós-guerra, transformou-se em ícone da contracultura e representante de um
estilo de vida antimaterialista e solidário. Abaixo, uma lista de dez filmes
onde a Kombi é um personagem cinematográfico com seus múltiplos simbolismos.
Ao lado do fusca, foi o veículo
que fez parte do imaginário de uma geração. A Kombi (abreviação da expressão
alemã “kombinationsfahrzeug” – traduzindo, “van cargo-passageiro”), nos EUA
chamada de VW Bus, acabou tornando-se
mais do que um veículo de transporte: deu colorido e ressonância à cultura
moderna, transformando-se em um arquétipo cultural, significante de uma
constelação de conceitos que vai da esfera política (contracultura e a ética
anticonsumista) à espiritual (viagem e liberdade).
O
Brasil era o único país que ainda produzia esse veículo. Mas, segundo a
Volkswagen, a produção será encerrada dia 31 de dezembro desse ano com a
produção de uma última série limitada e comemorativa unindo todas as
características de design das várias versões da Kombi nesses 63 anos.
sexta-feira, setembro 27, 2013
Hollywood produz mais filmes-catástrofe em épocas de crise global
sexta-feira, setembro 27, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Pesquisando o banco de
dados das produções cinematográficas por gênero do IMDB (Internet Movie Data
Base) descobrimos uma curiosa recorrência: os filmes-catástrofe, gênero fílmico
surgido na década de 1970, encontra seu pico de produção a cada contexto de
crises econômicas globais. Vivemos atualmente a terceira grande onda de filmes
desse gênero que coincide com a crise da Zona do Euro. Será apenas
coincidência? Historicamente Hollywood moldou o imaginário social por meio de uma
tática de deslocamento: a transformação em “objeto fóbico” de tudo aquilo que
nos causa medo e repulsa. Com os filmes-catástrofe temos a confirmação disso: a
naturalização das crises por meio dos cataclismos geológicos ou cósmicos
ficcionais e a criação de uma fobia ou medo coletivo por qualquer aspiração por
mudança.
O cinema sempre teve uma íntima
ligação com os momentos históricos de crise, sejam elas econômicas, políticas
ou sociais. Podemos considerar o cinema um perfeito sismógrafo das tendências
implícitas da sociedade que o produz, como solução imaginária de tensões
sociais ou ainda como sintoma coletivo. A análise dos filmes, principalmente no
que se refere à evolução dos seus gêneros (terror, sci-fi, drama etc.), são excepcionais por revelar verdadeiros
sintomas sociais. Como veremos, é o caso do gênero disaster movies, ou “filmes-catástrofe”.
Desde o início, nos dois lados
do oceano Atlântico, o cinema mostrava essa excepcional característica
sismográfica. Filmes expressionistas alemães como “O Gabinete do Dr. Caligari”
de Robert Wiener (1920), “Nosferatu” de F.W. Murnau (1922), “Dr. Mabuse, O
Jogador” (1922), “Metrópolis” (1926) e
“O Vampiro de Dusseldorf” de Fritz Lang com suas atmosferas de pesadelo
dominadas por linhas e planos tortuosos coincidiam com a turbulenta fase da República
de Weimar na Alemanha e anunciavam a chegada iminente do nazismo.
quarta-feira, setembro 25, 2013
A condição humana entre a loucura e transcendência no filme "K-Pax"
quarta-feira, setembro 25, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Filme precursor de um subgênero chamado “psicodrama alt. Sci-fi” (filmes
que usam argumentos sci-fi para, na verdade, discutir temas bem terrestres com
baixos orçamentos e nenhum efeito especial), “K-Pax - O Caminho da Luz” (K-Pax, 2001) foi injustamente
esquecido pela crítica e público. Um homem é internado em hospital psiquiátrico
afirmando ser um visitante de um planeta distante. Astrônomos e psiquiatras
tentam encaixá-lo em algum script racionalizante que tente explicar seus
conhecimentos, mas os paradoxos colocados pelo seu comportamento colocam em
xeque todos ao redor: será que uma vida inteira dedicada à ciência terá sido
para nada?
Um filme que acabou esquecido
pelos críticos e público, principalmente por ter sido lançado a pouco mais de
um mês depois dos atentados de 11 de setembro em Nova York. Talvez poucas
pessoas estivessem interessadas em discussões filosóficas em torno de um potencial
visitante de outro planeta que nos visita sob a forma humana, chamado Prot
(Kevin Spacey) e que se encontra preso em um hospital psiquiátrico em
Manhattan. Se ele é de fato um visitante do planeta K-Pax ou apenas um louco
“com a história mais convincente que eu já vi”, como confessa o psiquiatra que
tenta “curá-lo”, é a dúvida que acompanhará o espectador até a última cena,
cabendo a ele fazer uma contabilização das pistas deixadas ao longo da
narrativa.
Provavelmente o filme “K-Pax”
pode ser considerado o precursor de uma espécie de subgênero que sob o pretexto
de abordar temas caros da ficção científica (visitantes extraterrestres, viagem
no tempo, eventos cósmicos etc.), através de filmes com baixo orçamento e
praticamente sem nenhum efeito especial discute temas bem terrestres e
familiares: dilemas dos relacionamentos, a alteridade, conhecimento, hierarquia
e autoridade. O nosso leitor Ricardo Afonso percebeu a essência desse novo
subgênero: “A cena em que ele [Prot] simula uma viagem no tempo simplesmente nos faz
rir de nossa própria limitação, quando acreditamos que para tal empreitada
seriam necessárias luzes, cenas e cenários dignos de ficção cientifica de
Hollywood”.
domingo, setembro 22, 2013
Conheça as dez maiores conspirações no cinema
domingo, setembro 22, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Estariam as estrelas de Hollywood sendo assassinadas em série por um sinistro grupo oculto? Alguns filmes foram de fato
amaldiçoados por forças malignas de outro mundo? Ou trazem mensagens cifradas
sobre comandos de controle da mente ou desafios diretos ao Illuminatis? Kubrick
teria dirigido o filme “O Iluminado” para espalhar pistas sobre o falso pouso da Apolo 11
na Lua que ele próprio teria ajudado a produzir? Esse é o estranho mundo das
mais bem elaboradas e paranoicas teorias da conspiração envolvendo o cinema.
Para seus autores, ir ao cinema é uma perigosa aventura onde o espectador
desatento poderá ser programado por mensagens ocultas. Por que tantas
conspirações cinemáticas? Talvez porque um produto cultural que atinge tão
diretamente nossos corações e mentes seja, afinal, produzido por uma indústria
de entretenimento anônima e corporativa.
quarta-feira, setembro 18, 2013
As imagens seduzem e iludem no filme "Cópia Fiel"
quarta-feira, setembro 18, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
“Cópia Fiel” (Copie Conforme, 2010) é um curioso olhar etnográfico de um
diretor iraniano para a cultura das imagens ocidental: Abbas Kiarostami vai ao polo
irradiador do cânone da ilusão figurativa das imagens (a Itália dos museus,
igrejas e arte sacra) para mostrar, paradoxalmente por meio do artifício (um
escritor que promove um livro sobre o valor das cópias em relação a obra
artística original e que voluntariamente participa de um “role-playing”
proposto por sua admiradora), que as imagens são intransitivas, não remetem a
nada fora delas mesmas, seja uma suposta natureza divina ou real. Elas sempre
foram meros simulacros.
Artifício, ilusão, simulação,
mentira. Essas são algumas críticas feitas à civilização ocidental das imagens
feitas por autores como Guy Debord (Sociedade do Espetáculo), Jean Baudrillard
(Simulacros e Simulações) chegando a filmes como “Matrix” onde a imagem
tecnológica alcança o paroxismo ao criar mundos virtuais onde o homem torna-se
prisioneiro.
O aclamado
diretor iraniano Abbas Kiarostami vai ao centro irradiador dessa cultura da
imagem no Ocidente (a Itália, repleta de arte sacra, afrescos religiosos
renascentistas e ícones cristãos por todos os lados em pequenas capelas,
Igrejas e lojas de antiguidades) para fazer uma reflexão dos problemas
filosóficos que envolvem as imagens que nos cercam e a nossa percepção delas. E
talvez mais do que isso: mostrar como fomos seduzidos pela ilusão.
domingo, setembro 15, 2013
O cacoete jornalístico e a agenda invisível
domingo, setembro 15, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Continuando nossa incansável e perigosa busca de “bombas semióticas” na
mídia, encontramos outra de uma nova espécie, dessa vez involuntária, produzida por uma
espécie de cacoete jornalístico: o furor em estabelecer conexões, religações ou
cadeias de causa-efeito entre notícias distantes. O que o Jornal “Hoje” da TV
Globo quis nos dizer ao aproximar a notícia de um incêndio em uma fábrica no
interior de São Paulo com a sessão do tempo prevendo altas temperaturas e
baixíssima umidade? De tanto forçar a barra na interpretação do noticiário político
e econômico a partir de uma espécie de agenda nacional e global invisível que reina nas redações das grandes mídias, acabou criando um "modus operandi",
um cacoete em que mesmo os "fatos diversos" acabam sendo involuntariamente tratados da
mesma forma pelos jornalistas - como a materialização de um script
político-ideológico pré-estabelecido.
Quinta-feira, 12 de setembro de
2013. O telejornal “Hoje” da TV Globo já havia apresentado os primeiros blocos
noticiosos das chamadas hard news
(política e economia) e entrava na sua parte final com o que se chama em
jornalismo faits divers (fatos
diversos – notícias locais, curiosidades, cultura, tempo etc.). De repente,
entra um link ao vivo: incêndio de grandes proporções em uma fábrica de
bebedouros na cidade de Itu, interior de São Paulo. Atrás do repórter vemos
grossos rolos de fumaça negra subindo a dezenas de metros de altura contra um
profundo céu azul. Corta para o estúdio. Sandra Annenberg imediatamente convoca
a jornalista do tempo Michelle Loreto e pergunta: “vai cair alguma gota de
chuva naquela região?”. Michelle responde negativamente e explica apresentando
em um mapa as zonas de alta pressão e temperaturas elevadas esperadas para
grande parte do país. Após a rápida previsão do tempo, Sandra Annenberg
finaliza com uma expressão grave: “é... e não chove há uma semana naquela
região...”
sexta-feira, setembro 13, 2013
A Internet demasiado humana no filme "Disconnect"
sexta-feira, setembro 13, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Um soco emocional. Assim pode ser definido o filme independente
“Disconnect” (2012): três histórias baseadas em fatos reais tendo como cenário
Facebook, Twitter, smartphones, tablets e laptops. Cyberbullyings, crimes
cibernéticos e sites eróticos que exploram menores encontram pessoas
fragilizadas emocionalmente cujas relações com parentes e amigos são
superficiais e vazias enquanto toda a atenção se volta aos gadgets tecnológicos.
O filme “Disconnect” representa a destruição do segundo mito
da Internet: depois do fim da utopia das empresas “ponto com” em 2000, agora a
diluição do mito do novo mundo trazido pela “inteligência coletiva” digital. A tecnologia apenas
ampliaria as velhas mazelas da condição humana. A Internet ainda continua
humana, demasiado humana.
Quando a televisão surgiu era
rotineiramente acusada por devorar a atenção das pessoas e destruir a
comunicação. Produtora de solidão, emburrecedora e responsável por distúrbios
oculares eram o mínimo de que se acusava a TV. Com a Internet alarmes
semelhantes retornam, porém com um outro viés: os caminhos dessa terra de
ninguém são potencialmente perigosos – alguns são predadores, outros são
viajantes ingênuos que se aventuram por territórios dominados por tribos e
cibercriminosos. O risco de ser emboscado, espoliado e humilhado é
considerável. Muitas vezes a aplicação da lei é incapaz de apanhar os
trapaceiros, que se mantêm sempre à frente do jogo.
Esse é o tema do filme “Disconnect”
do documentarista Henry Rubin (do documentário “Murderball”) em sua estreia em
um filme com narrativa ficcional. A partir de um roteiro escrito por Andrew
Stern, Rubin apresenta um verdadeiro soco emocional para aqueles que convivem
diariamente com Facebook, Twitter, Skype, webcams e smartphones: um retrato da
crueldade desencadeada por ladrões que alegremente se escondem por trás de
falsas identidades virtuais, desenterram informações pessoais e com algumas
teclas pode ser capaz de destruir a vida de uma pessoa.
quarta-feira, setembro 11, 2013
A bomba semiótica das pegadinhas do "Fantástico" e "CQC"
quarta-feira, setembro 11, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Ensinar lições de moral e cidadania através de simulações. Mais
precisamente através de “pegadinhas”, dessa vez “do bem” e na TV. Cuidado! Sob
o pretexto de nobres propósitos programas como o “Fantástico” da Globo e “CQC”
da Band estão detonando mais uma “bomba semiótica”, dessa vez sob a forma do “infotenimento”
(informação + entretenimento), com situações do cotidiano simuladas para
flagrar contraventores da ordem, da moral e dos princípios de cidadania para
nos ensinar que o bem sempre compensa. Ambos os programas alinham-se à pauta
atual imposta pela mídia: a pauta da moralidade e do combate à corrupção, o
último papel de protagonismo que lhe resta no cenário político atual.
Vamos desmontar mais uma “bomba
semiótica”. Porém esta é de um tipo sofisticado e difícil de lidar
semioticamente, pois envolve um elemento “meta”: a simulação, e não
simplesmente uma simples manipulação ou encobrimento de fatos como
habitualmente estamos acostumados a ver em telejornais ou revistas impressas.
O “Fantástico” estreou
recentemente um quadro chamado “Vai Fazer o Quê?” no qual o repórter Ernesto
Paglia conduz uma série de “experiências” para descobrir como reagem as pessoas
diante de situações polêmicas como pit
boys que ofendem um mendigo e tentam expulsá-lo de uma praça pública ou uma
cuidadora que maltrata seu paciente idoso. O repórter privilegia mostrar
aqueles que atuaram corretamente, pede desculpas ao estresse que os atores
criaram na simulação, constrange os cidadãos menos valorosos que nada fizeram
com perguntas do tipo “você ficou ali olhando, mas não reagiu...” e discorre
como os espectadores devem agir em uma situação dessas.
domingo, setembro 08, 2013
Dez sinais de que você participa de uma seita.
domingo, setembro 08, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Acreditamos que só loucos e estúpidos fazem parte de cultos ou seitas. Mas não se engane: esse é um estereótipo midiático mostrado pelas notícias sensacionalistas que nos apresentam fanáticos fazendo parte de cultos comandados por gurus enlouquecidos. Desde a década de 1930 quando a literatura de autoajuda começou a abandonar o campo da psicologia e flertar com o misticismo e esoterismo até transformar-se em técnicas motivacionais, os dispositivos de controle mental dos cultos começaram a se espalhar por empresas, movimentos políticos, grupos de autoajuda e outros tipos de organizações. Fique atento aos dez dispositivos de controle mental das seitas, sejam elas de culto a líderes, metas ou missões. Você pode estar dentro de uma delas e não sabe...
Quando ouvimos a palavra “culto”
lembramos de religiões neopentecostais, manipulações religiosas de estranhas
seitas ou obscuros cultos de grupos místicos cujos símbolos somente os
iniciados podem compreender. Vêm-nos à mente fanáticos desequilibrados, líderes
carismáticos manipuladores e suicídios grupais por causas bizarras.
No entanto essa é apenas a
aparência sensacionalista e midiática que parece encobrir uma realidade de
natureza bem diversa: ao lado das técnicas de manipulação de massas por meio da
propaganda e do marketing político, de marcas e de consumo, uma outra forma de
manipulação cresceu e vem se expandindo por todos os setores da sociedade – a
manipulação das relações humanas por intermédio do controle das relações
pessoais por lideranças e pequenos grupos.
sábado, setembro 07, 2013
Monty Python contra o cinismo contemporâneo
sábado, setembro 07, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Há quarenta e quatro
anos ia ao ar pela TV BBC o primeiro “Monty Python’s Flying Circus” com
uma trupe de comediantes ingleses cujo humor era marcado pelo absoluto cinismo
e non sense. Suas experiências formais (programa estruturado como “fluxo de
consciência”) e sketches demolidores influenciam há décadas gerações de
comediantes e redatores. Recuperando a melhor tradição do humor físico de
Chaplin e Jacques Tati, mesclou tudo isso com um estilo de comédia que
desconstruía ilusões e mentiras dos papéis sociais, mostrando de forma
engraçada como nossa existência parece ser baseada em mentiras e ilusões.
Diante do “cinismo esclarecido” contemporâneo a que se refere o filósofo alemão
Peter Sloterdijk, o grupo inglês criou uma técnica de humor que remontava às
próprias origens filosóficas radicais da escola dos cínicos: o "kynismo" grego da
antiguidade helenística de Diógenes e Pirro.
Quando pensamos em filmes
gnósticos, logo imaginamos ficções científicas dramáticas como “Cidade das
Sombras” ou “Matrix” com protagonistas procurando saídas de um universo
conspiratório em narrativas tensas e repletas de simbolismos enigmáticos.
Terror, drama, thriller, suspense ou ficção científica parecem ser os gêneros
propícios para questionamento gnósticos sobre a condição humana. Mas e a
comédia? É claro que nesses últimos
quatro anos em que esse blog procurou mapear a presença de elementos gnósticos,
esotéricos, ocultistas e míticos na produção cinematográfica popular recente,
encontramos tais elementos em produções que primam pelo humor negro como no
filme “Como Fazer Carreira em Publicidade” (How to Get Ahead in Advertising, 1989) ou em animações como a
trilogia “Toy Stories”.
Mas se pensarmos a comédia muito
mais do que um gênero, isto é, como técnica de humor (onde elementos como o
cinismo, a ironia, a parodia e o sarcasmo podem se transformar em instrumentos
de crítica social tão poderosos como a Filosofia e a Psicanálise) podemos
encontrar a presença do espírito gnóstico da desmistificação da irrealidade do mundo.
quarta-feira, setembro 04, 2013
Em Observação: "Sapphire & Steel" (1979-1982)
quarta-feira, setembro 04, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Imagine uma série como "Dr. Who" misturada com alquimia e ocultismo. Foi a antiga série televisiva britânica chamada "Sapphire & Steel". Com baixo orçamento e filmado quase totalmente em cenários interiores, criou uma abordagem totalmente diferente sobre os problemas metafísicos que envolvem o Tempo. Ao contrário da abordagem tradicional que o cinema faz baseada nos paradigmas da Física (relatividade, continuum tempo-espaço, universos alternativos etc.), essa antiga série cult abordava o tema a partir de referenciais alquímicos e ocultistas. Telecinese e Psicometria convivem com transmutações e seres elementais que são, na verdade, guardiões do Tempo que assumem formas humanas. Elementais que parecem ter saído de uma Tabela Periódica de química e que lutam contra entidades malignas que querem explorar os pontos fracos dos corredores do Tempo.
sábado, agosto 31, 2013
Guia prático de destruição do capitalismo
sábado, agosto 31, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Vamos dar uma pequena contribuição à
escalada de manifestações no Brasil no mundo com um pequeno “Guia Prático de
Destruição do Capitalismo” mostrando que o verdadeiro inimigo não está nas
vidraças de agências bancárias ou nas lanchonetes símbolos da globalização, sempre alvos de depredações. Está
na financeirização e liquidez do capital, símbolos da força e, paradoxalmente,
também da fraqueza de um sistema baseado apenas na credibilidade através da
nossa participação a cada compra a prazo ou quando pagamos através da
socialização dos prejuízos das explosões das bolhas financeiras. E a única
forma de libertação existente é através daquilo que o filósofo francês Jean Baudrillard chamava de "aprofundamento irônico e proposital
das condições negativas".
And when we kiss we speak as one
With a single breath this world is gone
(Everyone Everywhere, New Order)
With a single breath this world is gone
(Everyone Everywhere, New Order)
Desde
o crash da Bolsa de Nova York em 1929 quando quase tudo derreteu e foi para o
ralo, o capitalismo aprendeu que a força do capital não estava na exploração
local da força de trabalho, mas na industrialização e mercantilização como
modelo de vida social para ser expandido de forma sistêmica e planetária. Isso
foi conseguido por meio da publicidade, mídia e financeirização do capital.
Isso não evitou as crises, que se tornaram cada vez mais periódicas (longos
ciclos de prosperidade acompanhados por crises e explosões de bolhas
especulativas).
quarta-feira, agosto 28, 2013
O demônio é um anjo caído em "O Advogado do Diabo"
quarta-feira, agosto 28, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Apesar
de flertar com temas místicos e espirituais não ortodoxos, Hollywood ainda precisa
manter as convenções dos gêneros cinematográficos. Um dos exemplos dessa
dualidade vivida pelo cinema comercial é o filme “O Advogado do Diabo” (Devil’s
Advocate, 1997) onde o diretor Taylor Hackford tenta inserir uma visão mais
matizada e ambígua da figura do Diabo em meio aos tradicionais clichês
satânicos reforçados por efeitos de computação gráfica. Através da inesquecível
performance de Al Pacino, o filme nos apresenta uma sutil visão do Diabo como uma figura prometeica, um anjo caído e condenado pelo
Criador por ter apresentado ao homem o fruto do conhecimento.
O ano é 1997. Na segunda metade dessa década Hollywood
vive uma espécie de guinada metafísica. Desde “Dead Man” (1995) do diretor Jim
Jarmusch, um western místico onde as religiões institucionalizadas são ridicularizadas,
roteiristas e produtores começam a flertar com temas e abordagens místicas ou
espirituais não ortodoxas, tal como o gnosticismo. Nesse ano estão em produção
“Show de Truman” e “Cidade das Sombras” (que serão lançados no ano seguinte) e o
filme “Matrix” está sendo gestado pelos irmãos Waschowski. Esses filmes
fazem parte de uma tendência cinematográfica da época repletas de temas,
arquétipos e simbolismos religiosos, mas com uma abordagem mística e gnóstica.
Também, nesse ano é lançado o filme “O Advogado do
Diabo” dirigido por Taylor Hackford, adaptação do livro de Andrew Neiderman. Se
no livro há uma ambiguidade fundamental em relação ao personagem principal (não
sabemos se ele é um louco ou a própria encarnação do Diabo, ambiguidade resolvida
no monólogo final), no filme percebe-se uma ambiguidade de outra natureza: o
conflito entre as convenções do gênero terror/suspense imposta pelos produtores
em apresentar o Diabo na tradicional visão judaico-cristã e a adaptação ao
livro que procura apresentar esse personagem de uma forma mais matizada –
uma visão alternativa
do Diabo, própria da literatura do Romantismo que o via como uma figura
prometeica, um anjo caído e condenado pelo Criador por ter apresentado ao homem
o fruto do conhecimento.
domingo, agosto 25, 2013
O gnosticismo cult de "Donnie Darko"
domingo, agosto 25, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Desde o seu lançamento
em 2001, o filme “Donnie Darko” do diretor Richard Kelly tornou-se um fenômeno cult:
é um dos filmes mais pesquisados e acessados na Internet (atualmente ocupa a 185°
do Top 250 do IMDB), em geral espectadores que buscam uma explicação para
enigmática narrativa sobre um adolescente problemático com misteriosas visões
de um coelho de dois metros de altura chamado Frank que faz uma espécie de
contagem regressiva para o fim do mundo. “Donnie Darko” é um exemplo de filme
que se tornou atemporal por amarrar em um inteligente roteiro arquétipos
contemporâneos e milenares sobre o tempo, destino e redenção.
As primeiras cenas parecem ter
todos os ícones dos filmes convencionais sobre adolescentes que moram em
subúrbios com problemas existenciais na high school envolvendo namoradas e
jovens valentões. Mas aos poucos vamos descobrindo que estamos diante de um
filme incomum: uma parábola em humor negro da angústia da Geração X? Um drama
sobre um adolescente psicopata? Um filme de ficção científica e fantasia ao
estilo da série “Além da Imaginação”? Alguma coisa entre David Lynch e Arquivo
X? Nenhuma dessas alternativas consegue dar o tom exato à estranha narrativa.
Mas uma coisa é certa: “Donnie Darko” é um desses filmes com inteligentes
linhas de diálogo e personagens realistas imersos em uma narrativa com uma
atmosfera fantástica que nos compele a ver o filme mais de uma vez.
sexta-feira, agosto 23, 2013
Dez patentes sobre controle subliminar da mente
sexta-feira, agosto 23, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Embora questionada por
estudos em neurociências e psicologia cognitiva e proibida por leis e códigos
de comunicação e consumo, as formas subliminares de controle da mente e do
comportamento se expandem. Pelo menos é o que demonstram o crescimento do
número de patentes registradas no The United States Patent and Trademark Office
sobre técnicas, sistemas e dispositivos subliminares de indução e monitoramento
da mente. Isso sem falar da expansão do “neuromarketing” onde novas empresas
surgem para explorar as potencialidades subliminares e comerciais de músicas,
sons e aromas, como uma nova e ainda imprecisa ciência. O crescimento das
patentes confidenciam a ascensão de uma nova forma de controle social, cada vez
mais abusiva e invasiva.
Na maioria dos países o uso de
mensagens ou publicidade subliminar é proibido por lei e por códigos
deontológicos dos profissionais de comunicação. Embora estudos recentes da
psicologia cognitiva demonstrem que a possível influência e poder de
manipulação dessas estratégias subliminares sejam muito inferiores à
expectativa criada, o fato é que na atualidade vendem-se técnicas que são agora
nomeadas como “neuromarketing”: “arquitetura de áudio” para estimular vendas em
lojas, aromas subliminares vendidos por empresas para criar estados emocionais
em consumidores, vídeos subliminares com programas terapêuticos do gênero como
emagrecer ou como parar de fumar etc.
Existe pouca literatura
confiável sobre o tema, onde se misturam teorias conspiratórias com repetitivos
exercícios de psicologia gestalt, como o caso de Wilson Bryan Key que teria
descoberto inúmeras mensagens ocultas em anúncios publicitários de uísque
associados a sexo e morte em cubos de gelo (CHEN, Adam. Expert discusses
the effects of subliminal advertising In: The Tech – on line edition).
Na Internet, sites e blogs
sobre o assunto mostram intermináveis exemplos de imagens ocultas em anúncios e
desenhos animados que mais se assemelham ao teste projetivo de Rorschach –
pranchas com manchas de tinta cuja interpretação revelaria projeções de
aspectos da personalidade.
quarta-feira, agosto 21, 2013
A morte é uma mercadoria na animação "A Pequena Loja de Suicídios"
quarta-feira, agosto 21, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
De forma despretensiosa através de muito humor negro e cinismo, a animação francesa “A Pequena Loja de Suicídio” (Le Magasin des Suicides, 2012) de Patrice Laconte nos faz pensar em uma questão fundamental para a História da Cultura: por que o suicídio foi sempre objeto de tabus religiosos e repressão ao longo da História? Talvez porque nesse momento derradeiro da vida do indivíduo se exponha de forma dramática as mazelas da sociedade. Na animação de Laconte é a crise europeia e a forma como a ideologia dos negócios consegue ver a infelicidade e o desespero como mais uma oportunidade de mercado.
sábado, agosto 17, 2013
As 10 técnicas do kit semiótico de manipulação das multidões
sábado, agosto 17, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Chamado de “século das
multidões”, o século XX nos deixou como legado um verdadeiro kit semiótico completo
de ferramentas de gestão do comportamento de grupos e multidões. Esse kit composto por 10 ferramentas é
aplicado na sua totalidade ou em fragmentos por políticos, agências
governamentais, líderes de seitas, jornalistas e publicitários. Desde as
manifestações de rua anti-globalização de Seattle em 1999, observa-se uma
crescente importância na manipulação das multidões. A sequência atual de
manifestações em diversos países como Brasil, Egito e Turquia nos faria
questionar se estariam sendo aplicados nestes eventos ferramentas desse kit.
Por isso, vamos entender cada uma dessas dez ferramentas para que possamos
reconhecê-las nas ruas ou nas mídias.
O poder das multidões para
determinar mudanças políticas é um dos temas mais significativos da História.
Mas certamente as manifestações anti-globalização em Seattle em 1999 e em
Londres em 2001 foram o ponto de viragem na maneira como os poderes
estabelecidos viam os protestos. Os manifestantes utilizaram novas tecnologias
de comunicação como laptops, Internet e mensagens em SMS por dispositivos
móveis. A partir de então as agências governamentais responderam com suas
próprias tecnologia invasivas: redes de monitoramento através de câmeras e
sistemas de gestão das multidões.
Quando vemos a sequências de
manifestações como na Turquia, Egito e Brasil, passamos a discutir sobre a
espontaneidade ou não desses eventos, principalmente quando nos deparamos com o
livro Killing Hope: U.S. Military and CIA
Intervention Since World War II de William Blum (ex-funcionário do
Departamento de Estado dos EUA) onde faz um relato das intervenções
norte-americanas em diversos países através de ações de agências governamentais
por meio de ONGs como National Endowment for Democracy (NED) ou Freedom House. Segundo
Blum (mais um da já longa lista de dissidentes como Snowden, o ex-agente Philip
Agee e o soldado Bradley Manning), há uma verdadeira estratégia “cavalo de
troia” ao não só financiar instituições civis com fundos, computadores, carros,
mas também treinamentos para passar o know-how de manipulação de multidões.
terça-feira, agosto 13, 2013
A distopia AstroGnóstica da animação "Planeta Fantástico"
terça-feira, agosto 13, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Ao contrário de muitos filmes anti-autoritários da década de 1970 que
com o passar do tempo se tornaram datados e ingênuos, a estranheza da animação
francesa “Planeta Fantástico” (La Planèt Sauvage, 1973) garantiu a ela um caráter
a-temporal. A estranha, e muitas vezes cruel, história da animação sugere uma
atmosfera resultante do cruzamento do surrealismo de Salvador Dali com a
narrativa de Gulliver de Jonathan Swift. “Planeta Fantástico” se insere em um
subgênero que cresceu nessa década desde o sucesso do filme “Planeta dos
Macacos” (1968), o filme AstroGnóstico - narrativas onde aliens caem na Terra e
se tornam prisioneiros da crueldade humana, ou o inverso: o homem dominado por
aliens cujo conhecimento superior tecnológico e espiritual não é garantia de
que sejam bondosos e tolerantes .
Um pai e sua filha passeiam pelo
campo até se depararem com uma minúscula criatura órfã. A mãe da pequena
criatura morreu pelas mãos de um cruel grupo de crianças. Após ouvir uma prelação
do pai sobre a importância da responsabilidade, a menina convence-o a deixá-la
levar a pequena criatura para casa. Lá brinca com o novo animal de estimação.
Ela escolhe roupas para ele, como fosse uma boneca, embora a pequena criatura
demonstre não gostar muito disso. Esse parece ser uma narrativa familiar sobre
filmes de animais de estimação, mas não se engane. No estranho universo criado
pelo francês René Laloux na clássica e cult animação “Planeta Fantástico”
(1973), a pequena criatura é um bebê humano (chamados de Oms) e a menina e seus
familiares enormes membros de pele azul da espécie Draag em um estranho
planeta.
Essa
bizarra e muitas vezes cruel história parece o resultado do cruzamento do
surrealismo de Salvador Dali e a história de Gulliver de Jonathan Swift, usando
a técnica de animação cutout, comum na atualidade em series como South Park.
Mas para a época não era muito habitual, a não ser em vinhetas da série de
humor do grupo Monty Python na TV inglesa.
domingo, agosto 11, 2013
Em "Revólver" o homem encontra seu pior inimigo: o Ego
domingo, agosto 11, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Um dos filmes recentes
mais subestimados, desprezado pela crítica e pouco visto pelo público. “Revólver”
(2005) de Guy Ritchie é uma espécie de cavalo de troia: sob uma embalagem que
comercialmente lembra seus sucessos passados como “Snatch” (2000), na verdade o
diretor nos oferece uma complexa e instigante jornada interior de um protagonista
imerso em um jogo de trapaças e violência. Ele terá que descobrir que o maior
inimigo se esconderá no último lugar que você procuraria: no interior do próprio
Ego. Por isso a narrativa será sempre pontuada com a famosa exortação gnóstica - "Acorde!".
Depois de filmes como “Jogos,
Trapaças e Dois Canos Fumegantes” (1998) e “Snatch – Porcos e Diamantes”
(2000), o diretor Guy Ritchie teve uma ascensão meteórica: de cineasta
independente a um dos queridinhos de Hollywood. Passou a ser rotulado como o
“Tarantino britânico”. Mas depois do fracasso com “Destino Insólito” (2002), a
mesma indústria que o celebrou passou a esquecê-lo, principalmente depois que
ganhou o “prêmio” Framboesa de Ouro de Pior Diretor. Durante seu autoexílio em
se país natal planejou por três anos uma resposta. E não poderia ter sido mais
brilhante com o filme “Revolver”.
domingo, agosto 04, 2013
Filme "Laranja Mecânica" é explicado pela "Trilogia Star Child"
domingo, agosto 04, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Quarenta e dois anos
depois, “Laranja Mecânica” (1971) do diretor Stanley Kubrick continua urgente e
moderno. Como todos os filmes do diretor, “Laranja Mecânica” que transmitir
muito mais do que conta a narrativa: uma história sobre uma sociedade
distópica aterrorizada por gangues
juvenis sob um Estado que planeja resolver seus problemas políticos através de
uma técnica de lavagem cerebral. O verdadeiro núcleo simbólico do filme somente
poderia ser compreendido através da chamada “Trilogia Star Child” sugerida pelo
cineasta e escritor canadense J. F. Martel, composta por “Dr Fantástico”, “2001:
Uma Odisséia no Espaço” e “Laranja Mecânica”. Esse núcleo espiritual e místico
da trilogia é que manteria esses filmes atemporais como verdadeiros arquétipos
contemporâneos.
Certa vez Kubrick disse para o
ator Jack Nicholson: “Nós não estamos interessados em fotografar a realidade.
Nós estamos interessados em fotografar a fotografia da realidade”. Talvez isso
explique porque, quarenta e dois anos depois, o filme “Laranja Mecânica” continue
atual e com um mesmo caráter de urgência: o filme possui uma estranha atmosfera
atemporal como se a sua narrativa ocorresse em um mundo alternativo, análogo ao
nosso. A cenografia sugere um futuro ao mesmo tempo familiar e estranho, onde
os detalhes banais do cotidiano são distorcidos.
Foi lançado em 1971, com linhas
de diálogos que seguem à risca a linguagem do livro original de Burguess de
1962 (mistura de gírias, inglês shakespeariano e expressões comuns), mas com um
visual que parece de 2013. A pontuação musical é variada, indo da Nona Sinfonia
de Beethoven à canção “Singin’ in the Rain”. Em outras palavras, a
atemporalidade de “Laranja Mecânica” vem da sua deliberada hiper-realidade. Seu
centro parece ser místico, como se Kubrick quisesse capturar algo de
arquetípico, gnóstico, que transcende o tempo e o espaço: a própria
configuração psíquica.
sexta-feira, agosto 02, 2013
Em Observação: "Planeta Fantástico" (1973)
sexta-feira, agosto 02, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Os anos 1970 foram uma década onde a indústria do entrenimento ainda permitia estranhas experimentações temáticas e visuais. Nessa época temos o crescimento de filmes com temática gnóstica com um tratamento "cult" ou "de arte", bem antes do atual gnosticismo pop cujo filme "Matrix" é o paradigma. A animação francesa "Planeta Fantástico" se insere nessa tendência dos anos 70 onde aliens e misticismo estavam em alta, porém com um tratamento bem mais sombrio e gnóstico que o fez ser comparado ao filme "Planeta dos Macacos" de 1968.
domingo, julho 28, 2013
Jornal Nacional e o sorriso do gato de Alice
domingo, julho 28, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Dando prosseguimento à
nossa perigosa aventura de localização e desmontagem de bombas semióticas, nos
defrontamos com um novo e mais letal tipo porque detentor de um efeito tóxico e
de longo prazo: a comunicação não verbal do Jornal Nacional da TV Globo. A
melhor analogia para entender essa bomba é o sorriso do gato de “Alice no País
das Maravilhas” – o seu sorriso permanecia no ar, mesmo quando o gato
desaparecia lentamente. O principal telejornal da emissora possui um complexo
sistema semiológico para simular espontaneidade de gestos, sobrancelhas
levantadas, mãos agitadas, locuções carregadas de vogais e pausas etc. Uma
estratégia linguística para, assim como o sorriso do gato de Alice, os signos
verbais permanecerem na memória mesmo depois que a notícia for esquecida ou, talvez, nem
assimilada. O propósito? Disseminar signos não verbais que sinalizem uma difusa
atmosfera de caos, anomia e instabilidade.
No capítulo 6 do livro Alice no País das Maravilhas de Lewis Carroll, Alice
encontra o gato de Chershire e pergunta para ele se há algum lugar onde não
exista gente louca e como chegar lá. O sorridente gato responde que todos são
loucos, inclusive ele e Alice e desaparece lentamente deixando apenas o seu
sorriso. O gato é o único personagem na fábula que Alice se refere como
“amigo”: o seu sorriso se destaca e se autonomiza da cabeça felina. Muitos
significados e simbolismos foram atribuídos a esse personagem (sorriso lunar,
autoconsciência de Alice de que tudo se tratava de um sonho etc.), mas uma
coisa fica evidente: o poder da comunicação não verbal do gato – pouco importa
o que ele dizia, seu sorriso enigmático que permanecia no ar era o mais
importante.
Pois todas as noites, em rede
nacional pela TV, repete-se essa cena surrealista narrada por Carroll: sobrancelhas,
olhos, testas franzidas e mãos sobre uma bancada ganham tanta poder que
se tornam mais importantes que a própria notícia – são índices de um “contínuo
midiático atmosférico”, de um clima do estado da Nação. Por isso, enquadram-se em
uma metódica e recorrente “bomba semiótica” que, principalmente desde as
manifestações de rua de junho, vem sendo detonada de segunda a sábado no Jornal
Nacional da TV Globo.
terça-feira, julho 23, 2013
Monstros e crianças se encontram em uma exposição
terça-feira, julho 23, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Por que o imaginário
infantil sempre esteve às voltas com monstros? Por que esses seres fantásticos
presentes em todas as culturas, mitologias e lendas ao mesmo tempo assustam e fascinam
crianças há gerações? A exposição “Monstros” do artista multimídia Térsio
Greguol ajuda a responder essas questões porque expressam o passado e presente
desses assustadores seres: a importância do arquétipo do monstro para a criança
enfrentar psicologicamente esse mundo e a nova sensibilidade infantil com esses
seres, dessas vez paródica e metalinguística.
Desde que Sigmund Freud descobriu
que as crianças não eram exatamente anjinhos barrocos, mas detentoras de uma
vida psíquica tão ou mais complexa que os adultos, a maneira como encaramos o
imaginário infantil com suas fábulas, lendas e cantigas de ninar mudou. Desde a
mais tenra idade as crianças estão familiarizadas com emoções perturbadoras
como o medo e a angústia. São experiências que fazem parte do cotidiano. Elas
têm que lidar constantemente com frustrações, angústia de perda e abandono, o
medo da escuridão e do isolamento.
Diferente dos outros animais, a
Natureza nos colocou nesse mundo, totalmente desprotegidos e dependentes – nascemos
carecas, sem pelos e sem dentes, desajeitados e sem coordenação motora. E como
a criança lida com essa situação? Através da imaginação e da fantasia, a melhor
maneira de lidar com os monstros, arquétipos de seres fantásticos que
simbolizam as ameaças dessa deplorável condição que viemos ao mundo.
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