sábado, janeiro 12, 2013
Em Observação: "Mulher na Lua" (Frau im Mond, 1929)
sábado, janeiro 12, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Como já discutimos em várias oportunidades aqui no blog, há muitas convergências entre as agendas tecnológicas (militares e de controle social) de governos e corporações e a indústria cinematográfica. O filme mudo "Mulher na Lua" de 1929 do diretor Fritz Lang ("Metrópolis" e "Doutor Mabuse") no início da ascensão do nazismo é um desses exemplos. O filme surge na onda de uma verdadeira mania por foguetes e naves espaciais na Alemanha que, mais tarde, resultaria nos foguetes V1 e V2 com bombas que explodiriam na Inglaterra. Outro exemplo foi "2001", Uma Odisséia no Espaço de Kubrick em 1968 com consultoria da NASA. Um ano depois a agência espacial americana chegaria na Lua. O filme promete uma fascinante viagem ao nascimento de dois gêneros que marcariam a história do cinema: o filme noir e a ficção-científica.
sexta-feira, janeiro 11, 2013
A dialética da libertação no filme "O Golpista do Ano"
sexta-feira, janeiro 11, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Todas as interpretações dos críticos sobre “O Golpista do Ano” (I Love
You Phillip Morris, 2009) parecem se esquecer de uma frase dita pelo
protagonista que é o grande mote do filme: “ser gay é realmente muito caro!”. A
ironia social contida nessa frase refletiria uma espécie de “dialética da
libertação” recorrente em cada movimento de contestação:
dominação-rebelião-dominação. Assim como na História cada contestação a um
sistema de dominação traria dentro de si a contra-revolução, da mesma forma o
movimento progressista LGBT ironicamente se transformou no modelo ideal de
consumidores em uma sociedade de consumo globalizada: consumidores perfeitos
porque liquidaram simbolicamente a ordem patriarcal estática e anacrônica para
os propósitos de um novo capitalismo caracterizado pela fluidez generalizada de
valores, corpos e informação.
“A indignação contra a
manipulação é o último scoop patrocinado pela ideologia” (Massimo Canevacci, Antropologia do Cinema)
Steven
Russell (Jim Carrey) sempre foi homossexual. Mas todas as características
desejadas de uma vida familiar bem sucedida ajudaram a encobrir isso:
ex-oficial da polícia, honesto, pai de família exemplar, bem-casado e
religioso. Mas um violento acidente de carro sacode sua vida o suficiente para decidir
não mais sustentar a farsa e joga tudo para o alto para fugir no mundo e
assumir seu verdadeiro Eu, que é ser um homem gay.
Muda-se
para Miami onde conhece seu namorado chamado Jimmy (Rodrigo Santoro) e passa a
viver um luxuoso “gay life style” desfilando com coloridas roupas de grife e
conduzindo dois mini pinchers através de alamedas repletas de bares,
restaurantes e lojas. E qual o único problema dessa nova vida? “Ser gay é
realmente muito caro!”, conclui Steven.
quarta-feira, janeiro 09, 2013
Gnose e viagem no tempo em "Safety Not Guaranteed"
quarta-feira, janeiro 09, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Ao contrário dos filmes tradicionais sobre
viagem no tempo onde a atração principal são sempre os aparatos tecnológicos, no
filme independente “Safety Not Guaranteed” (2012) a máquina do tempo é apenas o
pretexto para a narrativa apresentar insights
reveladores do estranhamento de pessoas em relação ao mundo moderno e nas
maneiras de escapar e expressar seu descontentamento. E também diferente dos clichês
da “segunda chance” nas viagens ao passado, nesse filme a suposta existência de
uma máquina do tempo é a oportunidade de uma espécie de “transcendência
espiritual mundana” baseado na ruptura da prisão existencial de “perdedores” em
uma sociedade vazia de sentido.
Viagem
no tempo é um tema recorrente no cinema. Na concepção clássica encontramos até
os anos 1970 o viajante como uma mera testemunha de eventos do passado e do
futuro que não podem ser alterados. Os protagonistas lutam contra a seta do
tempo e podem até morrer, mas fatos providenciais sempre impedem que a História
seja alterada. A série de TV “O Túnel do Tempo”(1966-67) ou o filme “Um Século
em 43 minutos” (1979) são bons exemplos.
A
partir da trilogia “De Volta para o Futuro” nos anos 1980 temos uma viagem no
tempo paradoxal: podemos voltar ao passado e criarmos futuros alternativos,
novos presentes e até confrontarmos com o “paradoxo dos gêmeos”. O cinema passa
a explorar o tema da “segunda chance”: a viagem no tempo torna-se uma esperança
para alterarmos as causas dos maléficos efeitos que enfrentamos. Dor, culpa,
arrependimento poderiam ser consertados, às vezes com nefastas consequências
como no filme “Efeito Borboleta” (Butterfly Effect, 2004).
Já
o filme independente “Safety Not Guaranteed” (um típico produto do Instituto
Sundance), primeiro longa de Colin Trevorrow, parece criar um contraponto nessa
trajetória do Tempo no cinema: o filme não é sobre viagem no tempo, mas é de
viagem no tempo no sentido mais amplo do termo. A possível existência de uma
máquina do tempo serve apenas de pretexto para os protagonistas revelarem em
relação ao passado nostalgia, experiência de perdas, culpa e remorso. Ao longo
da narrativa vemos ambíguos indícios ou pistas sobre a construção de uma
máquina do tempo, o que parece ser apenas mais uma estória que revela a problemática
relação dos protagonistas com o passado.
segunda-feira, janeiro 07, 2013
Em Observação: "Upside Down" (2012)
segunda-feira, janeiro 07, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Filme sugerido pelo nosso leitor Joari Carvalho através do Facebook, "Upside Down" (2012) com Kirsten Dunst e Jim Sturguess facilmente foi classificado como "Em Observação": um homem procura em um universo alternativo um antigo amor da juventude. O filme parece promissor na nossa busca em mapear elementos gnósticos, místicos e esotéricos na cinematografia atual: universos distópicos, mundos alternativos, amnésia, corporações/demiurgos repressores etc. Parece seguir a linha de "Another Earth" (2011), uma tendência atual onde temas sci fi são mero pano de fundo para o romance, drama ou temas de autoconhecimento como a questão da "segunda chance", questionamentos sobre a noção de "realidade" e o despertar de si mesmo do sono da ignorância. Então, prezados leitores e seguidores desse humilde blog, façam como Joari Carvalho e enviem sugestões de filmes que mereçam ficar "Em Observação" para futuros artigos.
domingo, janeiro 06, 2013
Em Observação: "Safety Not Guaranteed" (2012) e "As Aventuras de Pi" (2012)
domingo, janeiro 06, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
“Em observação” é a
nova rubrica para classificar filmes que podem ser de interesse para o “Cinema
Secreto: Cinegnose”. Filmes “suspeitos” de explorarem elementos gnósticos,
místicos ou esotéricos. Temas ou narrativas que se enquadrem nos enfoques
semióticos, sincromísticos, psicanalíticos ou cinegnósticos das análises desse
blog. Serão assistidos e avaliados. Se aprovados se tornarão tema dos nossos
artigos.
Para nossos leitores e
seguidores será uma sessão para se atualizar sobre lançamentos e filmes clássicos
ou simplesmente esquecidos na história do cinema e que merecem uma análise mais
atenta.
sábado, janeiro 05, 2013
Tudo é humano, demasiado humano em "Cloud Atlas"
sábado, janeiro 05, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Como um produto
hollywoodiano como “Cloud Atlas” (A Viagem) consegue simultaneamente explorar
simbologias de mistérios antigos (órficos, pagãos e gnósticos) e, ao mesmo
tempo, adequar-se às convenções do gênero blockbuster? Como conciliar em uma
mesma narrativa o niilismo do eterno-retorno com a concepção de que a
existência é dotada de um propósito que nos levaria a um final apoteótico? Como
lidar com o desejo de liberdade e transcendência do espectador dentro de um produto
mercadológico da indústria de entretenimento? Os irmãos Wachowski e Tykwer encontraram
a resposta na ideia de que tudo é “humano, demasiado humano”: o Universo
seria uma perfeita sinfonia. O que atrapalha é a humanidade. "Cloud Atlas" faria nas entrelinhas o julgamento religioso das ações humanas.
“O que tentamos foi fazer uma história
sobre uma reviravolta, a mesma reviravolta experimentada pelo personagem Neo
que sai deste mundo oprimido e programado para participar na construção do
sentido da sua vida. E nós pensamos assim: poderemos levar ao público algo
similar a experiência do personagem principal nos três filmes?”, afirmou Lana
Wachowski referindo-se a uma comparação entre o atual “Cloud Atlas” e a
trilogia “Matrix” (Veja “Cloud Atlas Entrevista” In: Scifiworld).
O filme “Cloud Atlas” (com o
infeliz título em português “A Viagem”, que vamos ignorar nessa postagem) dirigido
pelo trio Tom Tykwer (“Corra, Lola, Corra”) e Lana e Andy Wachowski (trilogia
“Matrix”) é um exemplo magistral de como a indústria de entretenimento
equilibra-se em uma corda bamba entre o impulso metafísico em lidar com antigas
simbologias dos antigos mistérios sejam pagãos ou gnósticos (que no final
procuram capturar o desejo por liberdade e transcendência dos espectadores) e a
necessidade de fazer um produto que se adapte às convenções ideológicas do
gênero blockbuster.
Nas quase três horas de duração,
entramos em pânico na primeira meia hora ao não entendermos nada sobre o
propósito de cada uma das seis estórias narradas de forma entrelaçada e aparentemente
aleatória. Aos poucos vamos ligando os pontos e passamos a saborear a brilhante
montagem das sequências. Como o próprio David Mitchell (autor do livro no qual
se baseou o filme) afirmou, a chave é o tema da reencarnação. Um empreendimento
difícil e arriscado ao entrelaçar eventos ao longo de cinco séculos, em
diferentes gêneros (sci fi, drama,
espionagem, policial etc.) com os mesmos atores vivendo papéis, personagens,
sexo e raças diferentes, sugerindo as diversas existências numa espécie de
jornada cósmica de almas imortais.
terça-feira, janeiro 01, 2013
A Gnose de Ano Novo no Filme "A Roda da Fortuna"
terça-feira, janeiro 01, 2013
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Vale a pena assistirmos ao filme “A Roda da Fortuna” (The Hudsucker Proxy, 1994) dos irmãos Coen. Ainda mais nas comemorações de chegada do ano novo, onde todos parecem querer capturar e reter um momento no tempo, que então já será passado. Por isso, “A Roda da Fortuna” é um grande filme para ser visto e refletido nesses últimos momentos de ano velho. Uma fábula sobre os nossos vícios temporais que estão sempre presentes em todo final de ano: ou caímos no tempo linear (as famosas promessas e desígnios para o ano novo) ou no tempo cármico - a ilusão de que tudo depende de nossa vontade para a roda da fortuna girar, sem entendermos que somos prisioneiros da cilada do “eterno retorno”.
Incerteza, sincronicidades, carma, a responsabilidade ética e moral das ações. Todos esses temas que marcam a filmografia dos irmãos Coen estão presentes nesse filme (o próximo seria o premiado “Fargo” de 1996). Mas em a “Roda da Fortuna”os Coen aprofundam no arquétipo que estrutura todos esses temas: o Tempo.
O Tempo é o principal tema do filme. Tudo começa quando vemos o presidente das Indústrias Hudsucker (Norville Barnes), nos últimos minutos de 1958, abrindo a janela do seu escritório no 44o andar para cometer suicídio. Com grande inventividade narrativa, o tempo para e temos um flashback da sua carreira: como ele subiu tanto para cair tão rápido?
Incerteza, sincronicidades, carma, a responsabilidade ética e moral das ações. Todos esses temas que marcam a filmografia dos irmãos Coen estão presentes nesse filme (o próximo seria o premiado “Fargo” de 1996). Mas em a “Roda da Fortuna”os Coen aprofundam no arquétipo que estrutura todos esses temas: o Tempo.
Norville Barnes é um idealista recém-formado estudante de administração que chega à Nova York vindo do interior. Com uma invenção na cabeça que, acredita, fará sua fortuna (um círculo desenhado num papel – “para crianças, claro”, diz) quer começar de baixo para honestamente subir na carreira.
Paralelo a isso, após o bem sucedido presidente das Indústrias Hudsucker (Waring Hudsucker) estranhamente cometer suicídio, o conselho de administração, liderado por Sidney Massburger (Paul Newman) surge com um brilhante plano para enriquecer a todos: nomear um idiota notório para dirigir a companhia, trazendo pânico para os acionistas que se desfariam dos seus papéis. Imediatamente os membros do conselho comprariam de volta as ações desvalorizadas a centavos para, dessa forma, deter o controle e os dividendos da empresa que rapidamente voltaria à lucratividade de antes após a deposição do presidente fantoche.
segunda-feira, dezembro 24, 2012
O conhecimento secreto do Cristo de Nag Hammadi
segunda-feira, dezembro 24, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A
descoberta e as posteriores traduções da chamada “biblioteca de Nag Hammadi” no
Egito trouxeram uma nova luz sobre os ensinamentos de Cristo. O foco comum dado
pelas religiões na morte-ressurreição de Cristo e no plano ético e devocional
da sua passagem pela Terra esconderia a sua principal missão: a de trazer o
conhecimento secreto que nos faça ter a consciência de que estamos perdidos e
longe de casa, e o caminho de volta já está dentro de nós. Cabe a nós
relembrarmos.
"O
pensamento aguarda que, um dia, a lembrança do que foi perdido venha
despertá-lo e o transforme em ensinamento" (Theodor Adorno)
O Gnosticismo em geral, e os evangelhos apócrifos
descobertos em Nag Hammadi no Egito em 1945 (conjunto de antigos pergaminhos
composto pelos evangelhos que revelariam a natureza do antigo cristianismo e as
interpretações místicas de Cristo feitas pelos gnósticos) em particular,
apresentam um espectro de crenças cujo núcleo central filosófico é bem discernível,
aquilo que Kurt Rudolph chama de "mito central": o Gnosticismo nos ensina
que algo está desesperadamente errado com o universo. Dessa forma os escritos
gnósticos tentaram delinear os meios de explicar essa falha cósmica e corrigir
a situação.
O universo, tal como atualmente constituído, não é
bom, nem foi criado por um Deus todo poderoso. Em vez disso, um deus menor, ou “demiurgo”
(como é chamado às vezes), moldou o mundo na ignorância. O Evangelho de Filipe
de Nag Hammadi, diz que "o mundo surgiu através de um erro. Para aquele
que o criou queria criá-lo imperecível e imortal. Ele ficou aquém de alcançar o
seu desejo.” A origem do demiurgo é diversas vezes explicada como resultante de
alguma perturbação pré-cósmica na cadeia de seres que emanam do incognoscível
Deus-Pai. Isso originou a “queda” de uma divindade inferior, com credenciais
bem menores. Tentando recriar nos planos inferiores a Plenitude da qual “decaiu”,
acabou por criar um cosmos material encharcado de dor, ignorância, decadência e
morte - um trabalho malfeito, com certeza.
sábado, dezembro 22, 2012
O fim do mundo não foi televisionado
sábado, dezembro 22, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Conclusão do post "A necrospectiva do fim do mundo" |
Peter Cornelius, The Riders of Apocalypse (1845) |
Abrigos nucleares
são vendidos nos EUA para aqueles que acreditam que o fim do mundo se aproxima.
No interior da França uma comunidade religiosa acredita que apenas a pequena localidade onde vivem será uma das poucas que sobreviverá ao cataclismo global. E se
invertermos a linha de tempo? Em outras palavras, e se o apocalipse já tiver
ocorrido? E se, sem sabermos, já estivermos em um mundo pós-apocalíptico
vivendo as consequências de um cosmos que se legitima por meio da crença
religiosa de que tudo, um dia, terá um fim? Essa é a heresia gnóstica,
esquecida pela hegemonia de um mercado de profecias sobre o fim do mundo que
desempenha um duplo papel: como manipulação ideológica e, também, como sintoma
da condição humana alienada nesse mundo.
O Titanic já afundou. Os cavaleiros do Apocalipse já cavalgaram há muito
tempo pela Terra. O Apocalipse não foi televisionado e nem foi roteirizado por
uma produção hollywoodiana. Já ocorreu há muito tempo atrás com o “Big Bang” da
Criação.
Esse é o princípio da filosofia gnóstica. O Mal já estava na própria
Criação. Por isso o Gnosticismo sempre foi
associado a uma espécie de “escatologia realizada”. Isto significa
que qualquer realidade que vale a pena se desfez antes da Criação, com a queda
mitológica de Sophia. O Big Bang foi o Apocalipse. Os seres humanos
seriam apenas fragmentos da Divindade suprema agarrados a destroços mortos
flutuando em um oceano de matéria escura.
quinta-feira, dezembro 20, 2012
A necrospectiva do fim do mundo
quinta-feira, dezembro 20, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Talvez essa postagem
jamais seja publicada: o mundo poderá acabar antes. Estamos em meio a uma
contagem regressiva para o fim do mundo que, segundo a profecia maia, seria no
dia 21 de dezembro de 2012. Tal como em 1999 (talvez lá fosse muito pior, pois
estávamos às voltas com uma dupla catástrofe: a bomba informática do “bug do
milênio” e as profecias de Nostradamus), agora temos uma nova contagem
regressiva, dessa vez à base de uma interpretação arbitrária do calendário
Maia, turbinada por filmes-catástrofes de Hollywood como “2012”. Por que essa
necessidade das religiões e do imaginário contemporâneo criarem profecias,
apocalipses e contagens regressivas? Por que essa obsessão “necrospectiva”?
Final de ano é um momento de
retrospectivas que dominam quase totalidade dos conteúdos das mídias. Como todo
tipo de olhar que use o prefixo “retro”, é um misto de nostalgia e compulsão de
colecionador em querer catalogar e organizar o passado. Dessa forma, a
necessidade retrospectiva é um subproduto do pensamento racionalista Ocidental
de tentar encontrar nos eventos recorrências, padrões ou sentido. Lá tentamos
achar lições ou conhecimentos que nos orientem em direção ao futuro.
Mas uma obsessão maior parece
sobrepor esse olhar retro: a Necrospectiva, no sentido dado pelo pensador
francês Jean Baudrillard – a liquidação de todo e qualquer futuro em uma
contagem regressiva. O futuro transformado em bomba relógio. O tempo não mais
contado aditivamente como nas retrospectivas, mas como subtração começando do
fim nas proféticas necrospectivas (veja BAUDRILLARD, Jean, Paroxism: the end of the millennium or the countdown).
domingo, dezembro 16, 2012
No Terceiro Aniversário uma questão: o "Cinegnose" é um blog "sobre Gnosticismo" ou "Gnóstico"?
domingo, dezembro 16, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O blog “Cinema Secreto: Cinegnose” chega ao terceiro aniversário com a
notícia de que chegamos ao Top 3 dos finalistas do prêmio Top Blog 2012 na
categoria “Arte e Cultura”. Projeto iniciado com as análises dos filmes gnósticos
na dissertação de mestrado, o “Cinegnose” começou com uma linha editorial “sobre
Gnosticismo”: especializado na análise de filmes gnósticos como ponto de
partida para aprofundar temas filosóficos do Gnosticismo. Chegamos ao terceiro
ano expandindo a discussão, dessa vez optando pelo “olhar gnóstico”, resultando numa abordagem mais abrangente
para o Cinema, Audiovisual e Cultura Pop.
Esse mês o “Cinema Secreto: Cinegnose” faz aniversário. Pela
terceira vez! Esse foi o terceiro ano de um projeto iniciado com a dissertação
de mestrado “Cinegnose: a recorrência de elementos gnósticos na produção
cinematográfica norte-americana – 1995 a 2005”, defendida na Universidade
Anhembi Morumbi. Como sempre, ao final da edição de qualquer produto cultural
(seja um CD, filme, livro ou dissertação) muito material acaba ficando de fora
por absoluta falta de tempo e espaço físico.
Ao final da análise sobre a recorrência de elementos
gnósticos (narrativas, mitologias, símbolos, iconografia etc.) até 2005,
percebi que, na verdade, o objeto da análise estava em constante desdobramento
e evolução: filmes posteriores como “Ilha do Medo” (2010), “A Origem” (2010) e até o brasileiro
“Os Famosos e os Duendes da Morte” (2009) demonstravam que o Gnosticismo era uma
influência cada vez mais presente (explícita ou implícita) em temas e roteiros
fílmicos.
Foi então que ao final de uma das aulas no doutorado da
ECA-USP, a professora Gloria Kreinz sugeriu-me: por que não faz um blog? Seria
uma forma de dar vazão a todo esse material que ficou de fora do inevitável
corte metodológico que todo trabalho científico impõe.
quinta-feira, dezembro 13, 2012
Filme "Capricórnio Um": o pai de todas as conspirações
quinta-feira, dezembro 13, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Um clássico dos filmes sobre conspirações. Talvez, o pai de todas as
teorias conspiratórias sobre o programa espacial norte-americano. O filme
“Capricórnio Um” (1977), escrito e dirigido por Peter Hyams, se insere em uma tendência de filmes dos anos 1970 estranhamente perturbadores. Muitos críticos
reconhecem que essa década foi a era de ouro do Cinema com filmes cujas
narrativas são dominadas por atmosferas paranoicas e esquizofrênicas. Um filme
que inspirou todas as futuras teorias conspiratórias e que tornou crível a
possibilidade de que o pouso na Lua jamais tivesse ocorrido. Além do diretor Peter Hyams oferecer uma ótima oportunidade para se discutir a importância fetichista que damos às imagens na cultura contemporânea.
Embora a indústria do
entretenimento norte-americano alimente essas atmosferas desde o pânico em
massa criado pela transmissão radiofônica de Guerra dos Mundos de 1938, o
gênero fílmico noir nas décadas de 1930-40 e a paranoia anti-comunista
simbolizada por filmes sci fi de marcianos invadindo a Terra e corpos humanos
nos anos 1950, foi na década de 1970 que a paranoia alcançou sua maturidade
crítica: não só apontou que havia algo de errado na sociedade mas começou a sugerir
o que estava por trás dela.
“Capricórnio Um” parte de uma
questão que estará por trás de todas as teorias das conspirações até hoje: e se
o maior evento da história recente jamais tivesse acontecido? Essa era a
pergunta nos anúncios promocionais do filme em 1978 onde víamos uma foto com
astronautas do lado de fora de uma espaçonave em uma paisagem marciana fake, rodeados por câmeras e spots de um
estúdio hollywoodiano.
O filme inicia com os últimos
minutos que antecedem o lançamento do foguete “Capricórnio Um” que conduzirá
três astronautas (performados por James Brolin, Sam Waterson e O. J. Simpson)
para o primeiro pouso tripulado em solo marciano. Faltando poucos minutos para
o final da contagem regressiva, os astronautas são secretamente retirados do
interior da cápsula e levados para longe dali, para um hangar abandonado no
meio de um deserto, enquanto o foguete é lançado em direção à Marte sem a tripulação.
terça-feira, dezembro 11, 2012
Réquiem ao cinema e a identidade em "Holy Motors"
terça-feira, dezembro 11, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Surreal, enigmático e
bizarro. Mais do que uma homenagem ao Cinema, “Holy Motors” (2012) do diretor
francês Leos Carax expressa incertezas e temores diante da ruptura digital que
se impõe a uma mídia cuja essência é mito e magia. O medo da obsolescência do “Motor
Sagrado” (o dispositivo cinematográfico) substituído por mundos virtuais onde
tanto os espectadores como diretores poderão ser qualquer coisa, até esquecerem
o que já foram um dia.
Definitivamente o diretor,
crítico e escritor francês Leos Carax (“Les Amants Du Pont-Neuf”, 1991; “Pola X”, 1999; “Tokyo”, 2008) não mantém uma
boa relação com a produção cinematográfica e o futuro digital do Cinema. Quando
sua última produção, “Holy Motors”, foi exibida este ano no Festival de Cannes
o ator Denis Lavant (que interpreta o protagonista Mr. Oscar) afirmou que o filme era “uma declaração poética do amor sobre a espécie
humana”. Prontamente, Carax se opõe: “Não é nada disso, mas tudo bem!”. “Mas
você não explica suas intenções narrativas aos atores antes de filmar?”,
perguntou um jornalista em Cannes. “Eu nunca trabalho com pessoas que
necessitem disso. Eu não trabalho com pessoas que me façam perguntas. Esse é o
problema de eu estar falando com você”, responde Carax de forma corrosiva ao
jornalista. (veja “Holy
Motors: the weird world of Leos Carax”
in: The Guardian 27/09/2012).
Muitos críticos especulam que o
enigmático “Holy Motors” é uma exuberante homenagem ao Cinema que ele tanto
ama, desde os tempos quando escrevia crítica cinematográfica. De fato, é um filme
sobre cinema, uma grande metalinguagem que faz lembrar “Império dos Sonhos”
(Inland Empire, 2006) de David Lynch. Porém, “Holy Motors” está muito mais para
um réquiem do que uma homenagem ao Cinema. Carax nos fala sobre os destinos do
Cinema na era digital e da Internet, da ameaça da obsolescência do dispositivo
cinematográfico, o “motor sagrado” do título.
sexta-feira, dezembro 07, 2012
Niemeyer e Brubeck: a morte da utopia da "arte total"
sexta-feira, dezembro 07, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Em meio à influência
do cartesianismo de Le Corbusier e Bauhaus no Palácio do Itamarati, Oscar
Niemeyer inseriu a sensualidade e força ascendente de uma escadaria interior
que reinventou a vanguarda. O riff de piano sincopado, quase sinistro, de “Take
a Five” acompanhado por uma misteriosa linha de saxofone que flutuava sobre o
ritmo 5/4 igualmente foi outra reinvenção, dessa vez de Dave Brubeck no Jazz. A
morte desses dois artistas no mesmo dia tem um significado altamente simbólico,
sincromístico: não foi apenas a morte de dois grandes expoentes nas suas
respectivas áreas de atividade – arquitetura e música – mas o desfecho ao mesmo
tempo de uma era e da utopia que sustentou todo o movimento modernista do
século XX: a “obra de arte total”, a utopia romântica de que a arte abandonasse
o estéril esteticismo e fosse capaz de fazer uma síntese entre o artístico e o
social.
Leveza e elegância. Assim pode
ser definida a arte tanto de Niemeyer quanto de Brubeck, menos por uma suposta
“poesia do concreto” ou pelo “jazz branco” como alardeiam os obituários
midiáticos e muito mais pelo excelente paradoxo que eles representaram: diferente
das vanguardas artísticas tradicionalmente agressivas e arrogantes, eles
conseguiram conciliar a invenção dentro da tradição. Niemeyer inseriu a curva,
sensualidade e imaginação no cartesianismo das linhas retas e angulosas de Le
Corbusier e Mies Van Der Rohe, enquanto Brubeck inseriu métricas inspiradas em
músicos de rua da Turquia (quando da excrusão com o seu Quarteto naquele país na década de 1950) no jazz tradicional do tempo 3/4 ou 4/4, métricas características da valsa.
Como típicos artistas
representantes do ideário modernista, viam nas suas artes muito mais do que um
diletante esteticismo, mas buscavam a obra de arte total capaz de integrar arte
e vida, estética e sociedade.
quarta-feira, dezembro 05, 2012
A dialética da família: de "Charlie e Lola" aos "Simpsons"
quarta-feira, dezembro 05, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O irmão mais velho
assume a imagem de mentor outrora ocupada pelos pais; duas meninas demonstram
poder desenvolver valores sem a necessidade de qualquer tipo de influencia de
adultos; e em outro caso um personagem no papel de pai cuja autoridade é
rebaixada pela sua absoluta incapacidade de lidar com as tecnologias que o
cercam. Pesquisa da Universidade Anhembi Morumbi desenvolvida por alunos da
graduação da Escola de Comunicação encontra nas animações infantis, adolescentes
e adultas a recorrência não só do desaparecimento simbólico ou mesmo literal da
figura dos pais como, também, do anacronismo ou deficiência em desempenhar os
papéis que deveriam ocupar na formação social dos filhos. Além disso,
personagens e narrativas expressariam a chamada "dialética da família" contemporânea: a crítica à autoridade patriarcal como anacrônica e autoritária
ao lado de um modelo familiar igualitário e liberal foram historicamente
emancipadores, mas, por outro lado, expôs as novas gerações às insidiosas e
sedutoras novas formas de manipulação.
Em postagem recente intitulada
“Por que os pais desapareceram do imaginário infantil?” discutíamos como o
anacronismo da família como agencia socializadora, suplantada pela indústria
cultural das celebridades e entretenimento ao oferecer novos modelos de
“super-pais”, estava sendo representado por animações infantis onde se verifica
uma significativa recorrência de situações onde os pais desaparecem
simbolicamente e até mesmo fisicamente.
O grupo de estudantes formados
por Ana Lucia Borsari, Eduardo Gomes, Laryssa Valverde, Leonardo Salles e
Nicolas Gomes da graduação da Escola de Comunicação da Universidade Anhembi
Morumbi (UAM/SP) decidiu então aprofundar a discussão do post em um trabalho de
iniciação científica para a disciplina Estudos da Semiótica, procurando matizar
as animações em três tipos de públicos: infantis, adolescentes e adultos.
Respectivamente, o universo da pesquisa foram “Backyardgans”, Charlie e Lola,
Pink, Dink Doo”e “Milly e Molly”; Os Flintstones e os Jetsons; e o último grupo
“Os Simpsons” e “Uma Família da Pesada”.
sábado, dezembro 01, 2012
Um sci fi comunista: "Aelita - A Rainha de Marte"
sábado, dezembro 01, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
“Sigam nosso exemplo camaradas! Unam-se numa família de trabalhadores, numa União Marciana de Repúblicas Socialistas Soviéticas”, brada o herói em um levante de operários nos subterrâneos de Marte contra uma espécie de totalitarismo czarista de outro mundo. Considerado o primeiro filme de ficção científica soviético, “Aelita - Rainha de Marte” (1924) é na verdade um anti-sci fi. Os revolucionários bolcheviques já se consideravam o futuro e a vanguarda, não precisavam de filmes sobre futuros utópicos. Como pretende demonstrar no filme, a utopia sobre viagens espaciais somente poderia ser uma excrescência do individualismo burguês. Mas ironicamente “Aelita” acabou influenciando clássicos do expressionismo alemão como “Metrópolis” e séries das futuras matinês dos cinemas norte-americanos como “Buck Rogers”. Também "Aelita" vai inaugurar o imaginário sobre Marte e a paranoia das invasões no secúlo XX.
domingo, novembro 25, 2012
O homem prisioneiro do tempo em "Matadouro 5"
domingo, novembro 25, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O filme “Matadouro 5” (Slaughterhouse Five, 1972) é um dos mais niilistas e desesperançados
filmes gnósticos: sem saída, o homem é prisioneiro no tempo e condenado por alienígenas a repeti-lo por toda a eternidade. O que torna o filme
“Matadouro 5” um clássico dos filmes com temática gnóstica é que ele inicia uma
crítica metafísica de fatos que tradicionalmente são abordados pelo viés da
crítica política ou social. No filme, a guerra não é mais enquadrada pela
crítica ideológica ou política, mas, agora, como mais um fato dentro de um
absurdo plano cósmico levado a cabo por demiurgos alienígenas.
sexta-feira, novembro 23, 2012
A máfia midiática elimina o Estado em "Generation P"
sexta-feira, novembro 23, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Che Guevara ensina
lições sobre o novo capitalismo e o marketing moderno em meio a viagens
lisérgicas e místicas de um protagonista que tenta se adaptar à Rússia
pós-comunismo. “Generation P” (2011) do russo Victor Ginzburg consegue fazer
uma adaptação de um livro considerado impossível de ser transposto ao cinema: “Babylon”
do escritor Viktor Pelevin. Ginzburg faz uma espécie de revisionismo da recente
história russa pós-comunismo sob o irônico título “Generation P” – o “P” de Pepsi-Cola
referindo-se àqueles que abraçaram o produto como o gosto oficial da nova
liberdade. Na verdade, Ginsburg mostra um verdadeiro circo onde misticismo e
religião se misturam com imagens midiáticas geradas com recursos digitais por
profissionais egressos do mundo da publicidade comandados por uma poderosa
máfia que, secretamente, controla o Estado e define os destinos da Rússia.
Em 1997 o Barry Levinson dirigiu
“Mera Coincidência” (Wag The Dog) onde um presidente norte-americano às
vésperas da reeleição envolve-se em um escândalo sexual na Casa Branca. O staff do presidente contrata um produtor
de Hollywood para criar uma fictícia guerra com a Albânia para, através de
recursos de marketing e edição digitais de vídeos, fazer a mídia morder a isca
e repercutir uma guerra fake que desvie a atenção da opinião pública do
escândalo sexual.
“Generation P” do russo Victor
Ginzburg é mais radical: e se o próprio Estado e todos os seus eventos
políticos (corrupção, atentados e guerras) forem fake? Isto é, e se os eventos políticos ou o próprio Estado não
passarem de imagens midiáticas geradas com recursos digitais por profissionais
egressos do mundo da publicidade comandados por uma poderosa máfia que,
secretamente, define os destinos da Rússia? Presidentes, políticos e ministros
nada mais seriam do que os próprios componentes dessa máfia que foram
escaneados e inseridos digitalmente nos noticiários, propaganda política e
eventos reais produzidos cinematograficamente. E tal escaneamento ocorreria
dentro de um ritual antigo babilônico a Ishtar, deusa do amor!
segunda-feira, novembro 19, 2012
A angústia da existência no filme "eXistenZ"
segunda-feira, novembro 19, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Se Basilides (um dos primeiros professores
gnósticos em Alexandria, Egito, no século II da Era Cristã) fizesse um filme,
certamente teria sido “eXinstenZ” (1999). Um filme onde o canadense David
Cronenberg leva a relação entre o homem e a tecnologia ao limite do niilismo, do
vazio e da angústia. Não tanto pelo fato das fronteiras entre real/virtual e
verdade/ilusão desaparecerem em um sofisticado jogo virtual. Mas pela forma
como um jogo transforma-se em fetiche erótico e religioso pelo marketing de uma
poderosa corporação, impedindo a transcendência espiritual: de que a própria
existência transforme-se em eXistenZ.
Basilides nutria uma radical desconfiança em relação à linguagem porque a verdade sobre Deus estaria além do
conhecimento humano: a linguagem não conseguiria apreender a
plenitude e o eterno porque nela o
homem torna-se obcecado em apreender as qualidades do devir nomeando-as através
de conceitos e palavras estáticas uma realidade que é difusa, fluída, relativa. Preso
nessa intransitividade entre os sistemas simbólicos e Deus, o homem se tornaria
prisioneiro dos próprios conceitos e palavras, não conseguindo ouvir, dentro de
si, a reminiscência do Uno, do Pleroma, da plenitude original que o uniria a
Deus.
Na
modernidade essa angústia gnóstica é secularizada principalmente pela Filosofia
existencialista, por exemplo, em Heidegger: o conceito de “Deus” é transformado
em “Ser” e a angústia humana está na impossibilidade de apreendê-lo em seu
sentido por meio de expressões ou enunciações. A impossibilidade da apreensão
ôntica do Ser joga o ser humano na existência: o “ser-aí”, “o ser-no-mundo” ou
o “ser-para-a-morte”.
“eXistenZ” de Cronenberg transpõe essa angústia tanto
gnóstica como existencialista para a discussão tecnológica: poderá o
desenvolvimento tecnológico em sua interface final (a biotecnologia onde corpos
e máquinas se integram por meio da informação) finalmente resolver essa
angústia de séculos de religião e filosofia? A virtualização tecnológica por
meio de jogos cada vez mais realistas baseados na interatividade e imersão dos
jogadores poderá traduzir a verdadeira natureza do Ser como jogo onde as ações
dos participantes é regida pelo princípio da aleatoriedade?
quinta-feira, novembro 15, 2012
O Mensalão e a agenda setting: a "Matrix" na prática
quinta-feira, novembro 15, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Muito discutida e ainda pouco compreendida, a essência do filme “Matrix”
(a hipótese da virtualidade do real) talvez já esteja presente no nosso
dia-a-dia mais do que imaginamos. A pesquisa “Agenda Setting e a Cobertura dos
Casos Mensalão e Cachoeira” feita por estudantes de jornalismo da Universidade
Anhembi Morumbi São Paulo como conclusão do curso “Estudos da Semiótica”
apresenta a constatação de que a mídia corporativa não tem mais o poder de
eleger presidentes ou forçar impeachments como no passado, mas ela é eficiente em estabelecer pautas e agendas
como a do atual julgamento do chamado “Mensalão”. Se a hipótese da agenda setting for correta, o que chamamos de “realidade”
poderia ser uma construção a partir de
percepções e cognições fornecidos por um ambiente midiático em que vivemos.
Virtuosismo tecnológico, capas
pretas, bullet time e todo o visual
ciberpunk marcaram as representações dos mundos virtuais em filmes como
“Matrix”: humanos enredados nos véus da ilusão criada por
computadores/demiurgos que nos escravizam. Mas descontando todo esse
sensacionalismo hollywoodiano em torno da hipótese da virtualidade do real,
podemos nos surpreender ao descobrir que a essência do tema de Matrix já está
presente em nosso dia-a-dia, tão diluído nos temas das nossas conversas e na
indústria de informação e entretenimento que nem nos damos conta: mais do que
uma figura retórica, já há muito tempo experimentamos a Matrix na prática!
Isso é
o que demonstra a pesquisa “Agenda Setting e a Cobertura dos Casos Mensalão e
Cachoeira”, trabalho de conclusão da disciplina Estudos da Semiótica da Escola
de Comunicação da Universidade Anhembi Morumbi – UAM/São Paulo (veja video abaixo). O grupo formado
pelos estudantes da graduação em Jornalismo Ana Carolina Cassiano, Cainã Ito,
Camila Albino, Gustavo Carratte e Renata Corona analisou as capas e primeiras
páginas dos principais veículos de imprensa de alcance nacional e chegou a uma
constatação empírica: até o início do segundo semestre o foco dos veículos como
jornais “O Globo”, “Folha de São Paulo”, “O Estado de São Paulo” e de revistas
como “Veja”, “Isto É” e “Época” “estava concentrado nas repercussões das
denúncias envolvendo o contraventor Carlinhos Cachoeira. O julgamento do
chamado Mensalão ainda era pouco comentado”.
segunda-feira, novembro 12, 2012
Os idosos nada têm a dizer na mídia
segunda-feira, novembro 12, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Quando o
envelhecimento e a morte deixam de ser simbolicamente incorporados na cultura
por meio de religiões e filosofias, o discurso midiático parece insistentemente
querer demonstrar que a velhice não existe, que é tudo uma questão de atitude
psicológica. Gerontologia, geriatria, engenharia genética e todo um aparato
tecno-científico é atualmente mobilizado para, associado à mídia, apresentar
sensacionais “lições de vida” e “superações”: idosos em praticas e comportamentos
análogos ao dos jovens criando não apenas uma aversão aos processos naturais de
envelhecimento mas, principalmente, a crise da função dos idosos como “elo
geracional”: a transmissão de sabedoria e conhecimento acumulados em uma
existência.
sábado, novembro 10, 2012
Sintoma e verdade nos zumbis
sábado, novembro 10, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Por que pessoas
fingem-se de mortos que se arrastam pelos centros urbanos do mundo, famintas
por cérebros e sangue dos vivos? Como interpretar um flash mob como o “Zombie Walk” onde centenas de
pessoas se transformam em realísticos zumbis, há onze anos espalhando-se por diversas
capitais do mundo? Desde as lendas afro-caribenhas de pessoas que retornam do
mundo dos mortos como assustadoras sombras de si mesmas até a recorrência dos
mortos vivos no cinema, o fascínio pelos zumbis já produziu uma razoável
bibliografia de pesquisadores que chegam a vê-los como um objeto de estudo
etnográfico. Mas é inegável que os mitos e lendas dos zumbis possuem uma dupla
dimensão: de um lado são sintomas de crises sociais e, do outro, possuem um
momento de verdade ao fazer nos lembrar da condição humana nesse mundo.
O flash mob “Zombie Walk” vem nos últimos anos ganhado cada
vez mais espaço na mídia e seus participantes aprimorando cada vez mais no
realismo das maquiagens e máscaras, trôpegos arrastando suas fantasias
lentamente através de centros urbanos pelo mundo. No evento surgido em 2001 na
Califórnia e que rapidamente se espalhou pelo mundo, vemos centenas de humanos
fingindo-se de mortos que apodrecem enquanto lançam olhares e gestos ameaçadores
para os desavisados, como se quisessem comer uns aos outros. Por que queremos
fazer tais coisas? Por que os zumbis ou mortos vivos acabaram se tornando uma
fantasia cinemática tão recorrente a ponto de produzir uma razoável
bibliografia de pesquisadores que chegam a tratá-los como objeto etnográfico?
Se olharmos atentamente a história da lenda dos zumbis, suas
origens e desenvolvimento até chegar no cinema e na mídia, perceberemos que ela
claramente apresenta duas dimensões: como sintoma social (conflitos de raça e
classes) e como arquétipo, isto é, como um simbolismo do inconsciente coletivo
que se filia ao imaginário dos autômatos, fantoches e bonecos como
representação da condição humana nesse planeta.
quinta-feira, novembro 08, 2012
O espelho global no safári africano do Tocantins
quinta-feira, novembro 08, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O projeto de um parque
temático milionário em pleno Tocantins (Out of África Brasil) promete trazer leões, rinocerontes,
antílopes, entre outros, das savanas africanas para um safári no cerrado brasileiro.
Definitivamente o Brasil se insere no imaginário da Globalização onde eventos,
geografias e culturas se desterritorializam para circular pelo mundo ao sabor
dos fluxos financeiros e midiáticos. Nesse imaginário os simulacros do “real” e
do “selvagem” parecem ter uma única função: tal qual uma transfusão de sangue,
injetar hiper-realidade em um real cujo sentido se enfraquece - o “selvagem” se
humaniza como um espelho da nossa própria desumanidade: o parque temático
selvagem torna-se mais “real” quanto mais é centrado no “show” da luta dos
predadores e presas como lição moral para a nossa “realidade”.
"Brasil e África se juntam depois de milhares de anos que uma
fissura nas placas tectônicas transformou o que hoje são dois continentes com
características tão semelhantes. Agora já podemos sentir o coração de África no
Tocantins." Essa é uma frase retirada do vídeo promocional de um projeto
de trazer para o meio do Tocantins um típico safári africano. No projeto orçado
em 350 milhões de dólares, em uma reserva de 100 mil hectares seriam colocados
mais de 400 indivíduos de espécies como leões, leopardos, elefantes e búfalos.
Em pleno cerrado brasileiro teríamos animais vivendo como nas savanas africanas
(clique aqui para ler a notícia).
É muito curiosa essa associação entre o deslocamento das placas
tectônicas que separaram os continentes por forças magnéticas do interior da
Terra e um investimento milionário que pretende reunir novamente África e
América do Sul através de um parque temático. Se no passado a deriva dos
continentes separou, agora a energia eletromagnética e espectral da indústria
do entretenimento vai unir.
Mas será que vai unir mesmo? Ou há uma semelhança irônica desses dois
fatos separados no tempo? Em outras palavras, e se no safári do Tocantins
estivermos experimentando o mesmo fenômeno de descolamento e desconexão do
passado? Continentes foram arrastados pelas forças internas do planeta; hoje
culturas e geografias são transformadas em signos pelas forças midiáticas e do
marketing para se deslocarem para pontos distantes das suas origens.
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