Se no passado falar que o homem jamais pousou
na Lua era coisa de velhos e iletrados incapazes de acompanhar a marcha do
Progresso, hoje acabou se transformando em um verdadeiro subgênero audiovisual
com filmes, documentários e minisséries para TV e cinema. Dessas dezenas de
produções, uma se destaca: A Funny Thing Happened on the Way to the Moon (Algo
Engraçado Aconteceu a Caminho da Lua, 2001) do jornalista investigativo Bart
Sibrel – ele até chegou a levar um soco de Buzz Aldrin ao tentar fazê-lo jurar
sobre a Bíblia que havia caminhado na Lua. O documentário foge dos temas clichês - anomalias nas fotos da Nasa e o “hoax” do diretor Stanley Kubrick
envolvido na conspiração. Sibrel destaca o contexto da corrida espacial nos
anos 1960, a flagrante vantagem tecnológica da URSS sobre os EUA naquele
momento e algumas questões: como, depois de uma década de fracassos
envolvendo explosões, incêndios e astronautas carbonizados na plataforma de
lançamento, de repente a NASA empreende uma ousada e bilionária missão que, de
cara, consegue colocar homens caminhando na Lua? Por que acreditamos? Só porque
vimos na TV? Mas, e se tudo foi encenado sem a TV saber? Siebrel supostamente
comprova a farsa com imagens de um vídeo da Nasa não editado no qual vemos
astronautas da Apollo 11 simulando, na órbita da Terra, estarem a meio caminho
da Lua enquanto ouvem a transmissão da direção da filmagem.
Na autobiografia publicada em 2004
intitulada My Life, o ex-presidente Bill
Clinton lembrava da época do pouso da Apolo 11 na Lua em 1969:
Apenas um mês depois de os astronautas Buzz Aldrin e Neil Armstrong deixarem seu colega Michael Collins a bordo do módulo de comando Columbia e caminharem na Lua, um velho carpinteiro perguntou-me se acreditava em tudo aquilo. Eu disse: “claro, eu vi na TV!”. Ele discordou. Disse que não acreditava um minuto naquilo, que os “caras da TV” poderiam fazer tudo parecer real. Na época pensei que era um velho idiota. Durante meus oito anos em Washington eu vi algumas coisas na TV que me fizeram pensar se aquele carpinteiro não estava à frente do seu tempo. (CLINTON, Bill, My Life, 1st edition, p.156).
Quando o homem pousou na Lua esse humilde
blogueiro tinha seus sete anos. Lembro-me que por toda uma década apenas as
gerações mais velhas questionavam a realidade daquelas imagens borradas que
assistíamos na TV. Os mais jovens ridicularizavam: coisas de velhos
tecnofóbicos incapazes de aceitar os progressos da Ciência ou de analfabetos.
Mas os anos se passaram e as teorias
conspiratórias em torno do Projeto Apollo e da NASA só cresceram. Deixaram de
ser monopólio de velhos alérgicos ao progresso ou sub-letrados para se tornar
praticamente um subgênero audiovisual na jovem cultura pop.
James Bond e a rover lunar
Tudo começou já em 1971 quando no filme de
James Bond Os Diamantes São Eternos
há uma breve cena onde 007 rouba uma rover lunar de um estúdio, no qual
astronautas encenam um pouso na Lua, para fugir de seus inimigos.
James Bond (Sean Connery) em "Os Diamantes são Eternos" (1971) |
Naquela mesma década foi produzido o filme
que é o pai de todas as conspirações espaciais: Capricorn One (1978), sobre um pouso ficcional em Marte e a perseguição
aos astronautas que pretendem revelar toda a verdade para a imprensa – clique aqui.
A partir disso temos uma profusão de
documentários, mockumentaries e filmes ficcionais como Dark Side of The Moon (2002), Man
On The Moon (2004), Room 237
(2012), Moonwalkers (2015), Operation Avalanche (2016), para ficar apenas
em algumas produções desse século.
Anomalias nas fotografias oficias da NASA, a
suposta participação do diretor Stanley Kubrick na produção dos falsos pousos
lunares e a necessidade dos EUA politizarem a corrida espacial par enfrentarem
a ameaça comunista da União Soviética são temas recorrentes nesses filmes.
Porém, da safra atual de produções desse
subgênero uma se destaca: A Funny Thing
Happened on the Way to the Moon (Algo
Engraçado Aconteceu a Caminho da Lua, 2001) produzido pelo diretor e
jornalista investigativo Bart Sibrel. Como ele diz, “capaz de apostar a própria
vida para provar que o homem nunca foi na Lua”.
Sibrel é insistente e chega a aborrecer os astronautas
da missão Apollo com practical jokes
(“pegadinhas”) como no famoso episódio envolvendo Buzz Aldrin: fingindo que
queria entrevistá-lo em um hotel para um programa infantil da TV japonesa,
Sibrel estava à espera com uma Bíblia, pedindo para que ele jurasse sobre ela
que havia caminhado sobre a Lua. Recebeu um soco de Aldrin direto na sua cara.
Bart Sibrel |
Como é de se esperar, Sibrel é uma figura
ridicularizada no meio científico, espacial e mainstream jornalístico. Mas o
documentário de 2001 está acima da média dentro desse subgênero das teorias das
conspirações.
Sibrel foge dos lugares comuns como as
supostas anomalias nas fotos da NASA e o indefectível hoax sobre Kubrick. O documentário faz uma abordagem histórica,
política e econômica, destacando o contexto da corrida espacial nos anos 1960,
a flagrante vantagem tecnológica da URSS sobre os EUA naquele momento e uma
questão simples: como, depois de uma década de fracassos envolvendo explosões,
incêndios e astronautas carbonizados na plataforma de lançamento, de repente a
NASA empreende uma ousada e bilionária missão que, de primeira, consegue
colocar homens caminhando na Lua?
Como o Projeto Apollo conseguiu colocar
homens na Lua ignorando o cinturão de radiações Van Allen que envolve a Terra,
mortal para a vida humana? Só recentemente a NASA enviou sondas para medir o
nível de radiação dessa região do espaço. Mas por que, se o homem já esteve lá?
Vamos elencar os principais argumentos desse
documentário. São no mínimo interessantes e alguns deles historicamente
fundamentados. Pelos menos fogem da média das produções desse subgênero atual.
(a) Tanques de guerra infláveis
Ao longo da História de rivalidades e
guerras, generais astutos têm demonstrado o poder estratégico da ilusão e
informações falsas como método para alcançar a vitória. O documentário cita a
experiência das Forças Armadas dos EUA em fabricar ilusões como forma de criar
vantagem sobre o inimigo.
Dá o exemplo do insólito episódio do Ghost
Army na Segunda Guerra Mundial: no norte
da Normandia uma unidade do exército norte-americano com pouco mais de mil
homens desembarcou para por em movimento um verdadeiro road show em
plena Segunda Guerra mundial usando tanques e caminhões infláveis,
amplificadores com sons pré-gravados de movimentação de tropas e caminhões e
diversas ações cênico-teatrais, incluindo efeitos especiais cenográficos.
Munidos de compressores de ar e alguns soldados-atores eram capazes de criar em
uma hora falsos comboios militares que aparentavam ter 30.000 homens. O
objetivo era criar impacto psicológico nas tropas nazistas.
Iniciado com a colocação em órbita de um
primeiro satélite artificial (o Sputnik), a corrida espacial para os EUA era
uma forma de enganar a União Soviética sobre a reposta militar dos EUA na
Guerra Fria, em especial o sistema de defesa antimísseis. O problema é que em
meados das décadas de 1960 já não era mais possível enganar os russos.
Os sucessivos sucessos soviéticos no espaço
( o primeiro satélite, o primeiro homem, o primeiro animal, a primeira sonda na
Lua), conflitos raciais internos, milhares de vidas perdidas na guerra do
Vietnã e bilhões de dólares dos contribuintes gastos no Projeto Apollo era um
cenário amargo demais para o Governo. Era necessário mais uma vez lançar mão da
ilusão: chegar à Lua era uma questão muito mais de credibilidade do que de
verdade.
(b) Primeira transmissão de TV não independente
Foi verdade! Eu vi na TV! É a resposta
imediata às teorias conspiratórias sobre o Projeto Apollo. Sibrel chama a
atenção que naquele momento, pela primeira vez, a televisão não fazia uma
cobertura independente de um evento. Todos os sons, imagens e fotos foram
estritamente controlados e previamente examinados pelo Governo Federal.
É estranho que passadas tantas décadas, o
que se tem de um evento de tamanha magnitude histórica são as mesmas fotos e
imagens que circulam ano após ano. Estranha-se a escassez de fotos do pioneiro
chefe da missão, Neil Armstrong: há apenas uma foto de corpo inteiro na Lua e o
seu reflexo em um capacete. Excetuando-se conferências de imprensa da Nasa e
aparecimentos ocasionais em aniversários e comemorações, ele nunca deu entrevista
diante de uma câmera.
O documentário sustenta que não só as
imagens de TV (na época objeto de reclamação das emissoras por apenas poderem transmitir
as imagens borradas de segunda mão a partir do telão de da sala de controle)
como os próprios dados recebidos pelos operadores em Houston foram simulados um
ano antes, com o lançamento do satélite Tetra, especialmente projetado para
reconstituir dados procedentes de uma suposta viagem a Lua e aterrissagem.
Esses dados foram reemitidos para Houston,
enquanto a missão Apollo circulava a órbita terrestre. Mesmo se os russos
quisessem localizar a nave norte-americana em algum ponto entre a Terra e a Lua
seria tão impossível quanto achar uma agulha no Oceano Pacífico.
O mais irônico em tudo isso é que em 2009 a
Nasa admitiu que teria apagado as gravações originais da viagem da Apollo 11 e
outras 200 mil fitas “para economizar dinheiro”. A ironia: a Nasa restaurou as
cópias da viagem espacial usando imagens de outras fontes, como as da CBS News.
As mesmas imagens de segunda mão feitas a partir das imagens controladas no
telão de Houston...
(c) O estranho sucesso do Projeto Apollo através do Cinturão Van Allen
Na corrida espacial dos anos 1960, os
soviéticos sempre estiveram muito à frente. Seus astronautas tinham, com folga,
500% mais de horas no espaço que os EUA. Apenas um mês antes da Apollo 11, os
soviéticos lançaram uma nave não tripulada para a Lua para obter as primeiras
amostras de solo. Em dado momento nos anos 1960 o programa espacial soviético
estava desenvolvendo cerca de 30 projetos diferentes de lançadores e
espaçonaves.
Porém, na primeira tentativa de um voo
tripulado à Lua pelos EUA, tudo deu certo. Mesmo atravessando o fatal cinturão
de radiação Van Allen – região situada entre 15.000 e 20.00 km do planeta com
partículas eletricamente carregadas letais ao homem, de origem tanto solar
quanto do campo magnético terrestre.
Desde 1961 (e até hoje, com as únicas
exceções das Apollo 11 a 17) todas as viagens tripuladas ficaram muito abaixo
desse campo de radiação. Para os astronautas terem sobrevivido seria necessário
um revestimento de chumbo tão denso que impediria a decolagem do foguete
Saturno 5.
Em 1998 a Space Shuttle fez o voo mais alto
desde as naves da Apollo, chegando perto do cinturão, provando que as radiações
eram mais perigosas do que os cientistas tinham pensado – nos anos 1960 a Nasa
havia declarado que o Cinturão Van Allen não era assim tão perigoso a ponto de
impedir uma viagem à Lua.
A proximidade com a região do Cinturão foi
o suficiente para os astronautas do ônibus espacial começarem a sentir
estranhos efeitos: mesmo com os olhos fechados na cabine pressurizada e em seus
pesados trajes, viram fortes reflexos de luzes, como disparos, da radiação que
entrava no interior da nave, dos trajes e dos seus crânios. Na época o
noticiário da CNN mostrou cientistas da Nasa surpresos com um fato até então
desconhecido por eles. Mas a Nasa já não esteve lá, a caminho da Lua, décadas
atrás?
(d) O mágico não repete o mesmo truque
Na época as emissoras de TV reclamaram por serem
forçadas a usar imagens de segunda mão nas transmissões ao vivo, sem permissão
de conexão direta o que degradou dramaticamente a qualidade das imagens - talvez
esse fosse o efeito pretendido.
Os próprios telespectadores reclamaram e a
partir da Apollo 12, a opinião pública de desinteressou da repetição daquelas mesmas
imagens borradas e com muitos cortes. O mágico estava cometendo o erro de
repetir o mesmo truque - as viagens bem sucedidas e precisas como um relógio
suíço estavam ficando muito overacting
e aborrecidas. Era necessário injetar mais drama ao roteiro.
Então veio o acidente da Apolo 13 e o risco
de morte dos astronautas – agora o público levaria mais a sério a exploração da
Lua e seria reconectado com o drama.
(e) Astronautas simulam estar distantes da Terra
No documentário, Bart Sibrel alega ter
acidentalmente encontrado a peça que comprovaria toda a farsa: após solicitar
por cinco anos imagens e relatórios dos arquivos da Nasa para a produção do
documentário, uma “pedra preciosa” foi descoberta pouco antes de concluir o
filme – uma fita da Apollo 11, crua e sem edição, com os astronautas no
interior da nave em órbita da Terra encenando parte da missão. A agência
espacial teria enviado a fita “por engano”, junto com outros materiais do
acervo.
O documentário mostra as sequências dessa
fita. Além dos diálogos duplicados com Houston (um dos canais de transmissão
era exclusivo para transmitir as ordens do “diretor” da filmagem), há um
momento em que engenhosamente simulam observar a Terra bem distante: uma bola
azul na vastidão do Universo. O truque foi apagar todas as luzes do interior da
cabine, fechar as janelas para evitar a luz do Sol e filmar apenas uma
escotilha, à distância do fundo da nave, com a Terra ao fundo pegando parte da
sua superfície. Fingiam estar no meio do
caminho para a Lua quando, na verdade, orbitavam a Terra.
E por que mesmo com o desinteresse
crescente do público e a desconfiança das emissoras, a farsa continuou até
1972?
Para Sibrel, para que toda a operação fosse
realizada a Nasa se cercou de contratantes em uma cadeia produtiva extremamente
especializada e fragmentada para garantir que apenas poucos tivessem
conhecimento do Todo – e da verdade. Os contratos tiveram que ser
obrigatoriamente cumpridos, mantendo a simulação em funcionamento (e
aprimoramento) por três anos e bilhões de dólares gastos dos contribuintes com
cada suposto retorno à Lua.
Desde então, a agência espacial dos EUA
está refém dessa história. Tanto que, num ato de provocação, a Rússia abriu em
2015 uma investigação sobre a veracidade da viagem dos EUA à Lua. O representante do governo no
Comitê de Investigações Vladimir Markin afirma que foi também requerido um
inquérito sobre o desaparecimento das imagens originais da primeira exploração
lunar.
Ficha Técnica |
Título:
A Funny Thing Happened on the Way to the Moon
|
Direção:
Bart Sibrel
|
Roteiro:
Bart Sibrel
|
Elenco:
Anne Tonelson (narração), Buzz Aldrin, Neil
Armstrong, Michael Collins, Wernher Von Braun
|
Produção: independente
|
Distribuição:
AFTH, LLC
|
Ano:
2001
|
País:
EUA
|
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