terça-feira, janeiro 17, 2017

Algo engraçado aconteceu a caminho da Lua


Se no passado falar que o homem jamais pousou na Lua era coisa de velhos e iletrados incapazes de acompanhar a marcha do Progresso, hoje acabou se transformando em um verdadeiro subgênero audiovisual com filmes, documentários e minisséries para TV e cinema. Dessas dezenas de produções, uma se destaca: A Funny Thing Happened on the Way to the Moon (Algo Engraçado Aconteceu a Caminho da Lua, 2001) do jornalista investigativo Bart Sibrel – ele até chegou a levar um soco de Buzz Aldrin ao tentar fazê-lo jurar sobre a Bíblia que havia caminhado na Lua. O documentário foge dos temas clichês - anomalias nas fotos da Nasa e o “hoax” do diretor Stanley Kubrick envolvido na conspiração. Sibrel destaca o contexto da corrida espacial nos anos 1960, a flagrante vantagem tecnológica da URSS sobre os EUA naquele momento e algumas questões: como, depois de uma década de fracassos envolvendo explosões, incêndios e astronautas carbonizados na plataforma de lançamento, de repente a NASA empreende uma ousada e bilionária missão que, de cara, consegue colocar homens caminhando na Lua? Por que acreditamos? Só porque vimos na TV? Mas, e se tudo foi encenado sem a TV saber? Siebrel supostamente comprova a farsa com imagens de um vídeo da Nasa não editado no qual vemos astronautas da Apollo 11 simulando, na órbita da Terra, estarem a meio caminho da Lua enquanto ouvem a transmissão da direção da filmagem.

Na autobiografia publicada em 2004 intitulada My Life, o ex-presidente Bill Clinton lembrava da época do pouso da Apolo 11 na Lua em 1969:
Apenas um mês depois de os astronautas Buzz Aldrin e Neil Armstrong deixarem seu colega Michael Collins a bordo do módulo de comando Columbia e caminharem na Lua, um velho carpinteiro perguntou-me se acreditava em tudo aquilo. Eu disse: “claro, eu vi na TV!”. Ele discordou. Disse que não acreditava um minuto naquilo, que os “caras da TV” poderiam fazer tudo parecer real. Na época pensei que era um velho idiota. Durante meus oito anos em Washington eu vi algumas coisas na TV que me fizeram pensar se aquele carpinteiro não estava à frente do seu tempo. (CLINTON, Bill, My Life, 1st edition, p.156).
Quando o homem pousou na Lua esse humilde blogueiro tinha seus sete anos. Lembro-me que por toda uma década apenas as gerações mais velhas questionavam a realidade daquelas imagens borradas que assistíamos na TV. Os mais jovens ridicularizavam: coisas de velhos tecnofóbicos incapazes de aceitar os progressos da Ciência ou de analfabetos.

Mas os anos se passaram e as teorias conspiratórias em torno do Projeto Apollo e da NASA só cresceram. Deixaram de ser monopólio de velhos alérgicos ao progresso ou sub-letrados para se tornar praticamente um subgênero audiovisual na jovem cultura pop.

James Bond e a rover lunar


Tudo começou já em 1971 quando no filme de James Bond Os Diamantes São Eternos há uma breve cena onde 007 rouba uma rover lunar de um estúdio, no qual astronautas encenam um pouso na Lua, para fugir de seus inimigos.

James Bond (Sean Connery) em "Os Diamantes são Eternos" (1971)

Naquela mesma década foi produzido o filme que é o pai de todas as conspirações espaciais: Capricorn One (1978), sobre um pouso ficcional em Marte e a perseguição aos astronautas que pretendem revelar toda a verdade para a imprensa – clique aqui.

A partir disso temos uma profusão de documentários, mockumentaries e filmes ficcionais como Dark Side of The Moon (2002), Man On The Moon (2004), Room 237 (2012), Moonwalkers (2015), Operation Avalanche (2016), para ficar apenas em algumas produções desse século.

Anomalias nas fotografias oficias da NASA, a suposta participação do diretor Stanley Kubrick na produção dos falsos pousos lunares e a necessidade dos EUA politizarem a corrida espacial par enfrentarem a ameaça comunista da União Soviética são temas recorrentes nesses filmes.

Porém, da safra atual de produções desse subgênero uma se destaca: A Funny Thing Happened on the Way to the Moon (Algo Engraçado Aconteceu a Caminho da Lua, 2001) produzido pelo diretor e jornalista investigativo Bart Sibrel. Como ele diz, “capaz de apostar a própria vida para provar que o homem nunca foi na Lua”.

Sibrel é insistente e chega a aborrecer os astronautas da missão Apollo com practical jokes (“pegadinhas”) como no famoso episódio envolvendo Buzz Aldrin: fingindo que queria entrevistá-lo em um hotel para um programa infantil da TV japonesa, Sibrel estava à espera com uma Bíblia, pedindo para que ele jurasse sobre ela que havia caminhado sobre a Lua. Recebeu um soco de Aldrin direto na sua cara.

Bart Sibrel

Como é de se esperar, Sibrel é uma figura ridicularizada no meio científico, espacial e mainstream jornalístico. Mas o documentário de 2001 está acima da média dentro desse subgênero das teorias das conspirações.

Sibrel foge dos lugares comuns como as supostas anomalias nas fotos da NASA e o indefectível hoax sobre Kubrick. O documentário faz uma abordagem histórica, política e econômica, destacando o contexto da corrida espacial nos anos 1960, a flagrante vantagem tecnológica da URSS sobre os EUA naquele momento e uma questão simples: como, depois de uma década de fracassos envolvendo explosões, incêndios e astronautas carbonizados na plataforma de lançamento, de repente a NASA empreende uma ousada e bilionária missão que, de primeira, consegue colocar homens caminhando na Lua?

Como o Projeto Apollo conseguiu colocar homens na Lua ignorando o cinturão de radiações Van Allen que envolve a Terra, mortal para a vida humana? Só recentemente a NASA enviou sondas para medir o nível de radiação dessa região do espaço. Mas por que, se o homem já esteve lá?

Vamos elencar os principais argumentos desse documentário. São no mínimo interessantes e alguns deles historicamente fundamentados. Pelos menos fogem da média das produções desse subgênero atual.


(a) Tanques de guerra infláveis


Ao longo da História de rivalidades e guerras, generais astutos têm demonstrado o poder estratégico da ilusão e informações falsas como método para alcançar a vitória. O documentário cita a experiência das Forças Armadas dos EUA em fabricar ilusões como forma de criar vantagem sobre o inimigo.

Dá o exemplo do insólito episódio do Ghost Army na Segunda Guerra Mundial: no norte da Normandia uma unidade do exército norte-americano com pouco mais de mil homens desembarcou para por em movimento um verdadeiro road show em plena Segunda Guerra mundial usando tanques e caminhões infláveis, amplificadores com sons pré-gravados de movimentação de tropas e caminhões e diversas ações cênico-teatrais, incluindo efeitos especiais cenográficos. Munidos de compressores de ar e alguns soldados-atores eram capazes de criar em uma hora falsos comboios militares que aparentavam ter 30.000 homens. O objetivo era criar impacto psicológico nas tropas nazistas.

Iniciado com a colocação em órbita de um primeiro satélite artificial (o Sputnik), a corrida espacial para os EUA era uma forma de enganar a União Soviética sobre a reposta militar dos EUA na Guerra Fria, em especial o sistema de defesa antimísseis. O problema é que em meados das décadas de 1960 já não era mais possível enganar os russos.

Os sucessivos sucessos soviéticos no espaço ( o primeiro satélite, o primeiro homem, o primeiro animal, a primeira sonda na Lua), conflitos raciais internos, milhares de vidas perdidas na guerra do Vietnã e bilhões de dólares dos contribuintes gastos no Projeto Apollo era um cenário amargo demais para o Governo. Era necessário mais uma vez lançar mão da ilusão: chegar à Lua era uma questão muito mais de credibilidade do que de verdade.


(b) Primeira transmissão de TV não independente


Foi verdade! Eu vi na TV! É a resposta imediata às teorias conspiratórias sobre o Projeto Apollo. Sibrel chama a atenção que naquele momento, pela primeira vez, a televisão não fazia uma cobertura independente de um evento. Todos os sons, imagens e fotos foram estritamente controlados e previamente examinados pelo Governo Federal.

É estranho que passadas tantas décadas, o que se tem de um evento de tamanha magnitude histórica são as mesmas fotos e imagens que circulam ano após ano. Estranha-se a escassez de fotos do pioneiro chefe da missão, Neil Armstrong: há apenas uma foto de corpo inteiro na Lua e o seu reflexo em um capacete. Excetuando-se conferências de imprensa da Nasa e aparecimentos ocasionais em aniversários e comemorações, ele nunca deu entrevista diante de uma câmera.

O documentário sustenta que não só as imagens de TV (na época objeto de reclamação das emissoras por apenas poderem transmitir as imagens borradas de segunda mão a partir do telão de da sala de controle) como os próprios dados recebidos pelos operadores em Houston foram simulados um ano antes, com o lançamento do satélite Tetra, especialmente projetado para reconstituir dados procedentes de uma suposta viagem a Lua e aterrissagem.

Esses dados foram reemitidos para Houston, enquanto a missão Apollo circulava a órbita terrestre. Mesmo se os russos quisessem localizar a nave norte-americana em algum ponto entre a Terra e a Lua seria tão impossível quanto achar uma agulha no Oceano Pacífico.

O mais irônico em tudo isso é que em 2009 a Nasa admitiu que teria apagado as gravações originais da viagem da Apollo 11 e outras 200 mil fitas “para economizar dinheiro”. A ironia: a Nasa restaurou as cópias da viagem espacial usando imagens de outras fontes, como as da CBS News. As mesmas imagens de segunda mão feitas a partir das imagens controladas no telão de Houston...


(c) O estranho sucesso do Projeto Apollo através do Cinturão Van Allen


Na corrida espacial dos anos 1960, os soviéticos sempre estiveram muito à frente. Seus astronautas tinham, com folga, 500% mais de horas no espaço que os EUA. Apenas um mês antes da Apollo 11, os soviéticos lançaram uma nave não tripulada para a Lua para obter as primeiras amostras de solo. Em dado momento nos anos 1960 o programa espacial soviético estava desenvolvendo cerca de 30 projetos diferentes de lançadores e espaçonaves.

Porém, na primeira tentativa de um voo tripulado à Lua pelos EUA, tudo deu certo. Mesmo atravessando o fatal cinturão de radiação Van Allen – região situada entre 15.000 e 20.00 km do planeta com partículas eletricamente carregadas letais ao homem, de origem tanto solar quanto do campo magnético terrestre.

Desde 1961 (e até hoje, com as únicas exceções das Apollo 11 a 17) todas as viagens tripuladas ficaram muito abaixo desse campo de radiação. Para os astronautas terem sobrevivido seria necessário um revestimento de chumbo tão denso que impediria a decolagem do foguete Saturno 5.

Em 1998 a Space Shuttle fez o voo mais alto desde as naves da Apollo, chegando perto do cinturão, provando que as radiações eram mais perigosas do que os cientistas tinham pensado – nos anos 1960 a Nasa havia declarado que o Cinturão Van Allen não era assim tão perigoso a ponto de impedir uma viagem à Lua.

A proximidade com a região do Cinturão foi o suficiente para os astronautas do ônibus espacial começarem a sentir estranhos efeitos: mesmo com os olhos fechados na cabine pressurizada e em seus pesados trajes, viram fortes reflexos de luzes, como disparos, da radiação que entrava no interior da nave, dos trajes e dos seus crânios. Na época o noticiário da CNN mostrou cientistas da Nasa surpresos com um fato até então desconhecido por eles. Mas a Nasa já não esteve lá, a caminho da Lua, décadas atrás?


(d) O mágico não repete o mesmo truque


Na época as emissoras de TV reclamaram por serem forçadas a usar imagens de segunda mão nas transmissões ao vivo, sem permissão de conexão direta o que degradou dramaticamente a qualidade das imagens - talvez esse fosse o efeito pretendido.

Os próprios telespectadores reclamaram e a partir da Apollo 12, a opinião pública de desinteressou da repetição daquelas mesmas imagens borradas e com muitos cortes. O mágico estava cometendo o erro de repetir o mesmo truque - as viagens bem sucedidas e precisas como um relógio suíço estavam ficando muito overacting e aborrecidas. Era necessário injetar mais drama ao roteiro.

Então veio o acidente da Apolo 13 e o risco de morte dos astronautas – agora o público levaria mais a sério a exploração da Lua e seria reconectado com o drama.


(e) Astronautas simulam estar distantes da Terra


No documentário, Bart Sibrel alega ter acidentalmente encontrado a peça que comprovaria toda a farsa: após solicitar por cinco anos imagens e relatórios dos arquivos da Nasa para a produção do documentário, uma “pedra preciosa” foi descoberta pouco antes de concluir o filme – uma fita da Apollo 11, crua e sem edição, com os astronautas no interior da nave em órbita da Terra encenando parte da missão. A agência espacial teria enviado a fita “por engano”, junto com outros materiais do acervo.

O documentário mostra as sequências dessa fita. Além dos diálogos duplicados com Houston (um dos canais de transmissão era exclusivo para transmitir as ordens do “diretor” da filmagem), há um momento em que engenhosamente simulam observar a Terra bem distante: uma bola azul na vastidão do Universo. O truque foi apagar todas as luzes do interior da cabine, fechar as janelas para evitar a luz do Sol e filmar apenas uma escotilha, à distância do fundo da nave, com a Terra ao fundo pegando parte da sua superfície.  Fingiam estar no meio do caminho para a Lua quando, na verdade, orbitavam a Terra.

E por que mesmo com o desinteresse crescente do público e a desconfiança das emissoras, a farsa continuou até 1972?

Para Sibrel, para que toda a operação fosse realizada a Nasa se cercou de contratantes em uma cadeia produtiva extremamente especializada e fragmentada para garantir que apenas poucos tivessem conhecimento do Todo – e da verdade. Os contratos tiveram que ser obrigatoriamente cumpridos, mantendo a simulação em funcionamento (e aprimoramento) por três anos e bilhões de dólares gastos dos contribuintes com cada suposto retorno à Lua.

Desde então, a agência espacial dos EUA está refém dessa história. Tanto que, num ato de provocação, a Rússia abriu em 2015 uma investigação sobre a veracidade da viagem dos EUA à Lua. O representante do governo no Comitê de Investigações Vladimir Markin afirma que foi também requerido um inquérito sobre o desaparecimento das imagens originais da primeira exploração lunar.


Ficha Técnica

Título: A Funny Thing Happened on the Way to the Moon
Direção: Bart Sibrel
Roteiro:  Bart Sibrel
Elenco:  Anne Tonelson (narração), Buzz Aldrin, Neil Armstrong, Michael Collins, Wernher Von Braun
Produção: independente
Distribuição: AFTH, LLC
Ano: 2001
País: EUA

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