Dia
16 de junho deste ano estreou nos cinemas o filme "As Tartarugas Ninjas: Fora das Sombras" (Teenage Mutant
Ninja Turtles: Out of the Shadows). Após sua primeira edição
em maio de 1984 pela editora Mirage
Studios, os quatro esdrúxulos personagens tiveram diversas obras midiáticas
envolvendo seu universo, de desenhos animados a videogames. Mas, desde o novo
filme de 2014, é apresentada uma versão mais diferenciada entre os personagens.
E com razão, já que os quatro diferem bastante não apenas em sua personalidade,
mas nos elementos alquímicos que representam.
Quando criaram esse quarteto
fantástico, Kevin Eastman e Peter Laird não
imaginavam as proporções que seu pastiche iria tomar. A ideia inicial era fazer
uma sátira do Demolidor "Frankmilleriano" (A fase do personagem escrita por Frank Miller), a começar
pelo clã ninja responsável pelas atividades criminosas, o Foot Clan (Clã do Pé), claramente uma paródia com O Tentáculo (The Hand). Mas, a despeito
dos elementos cômicos, são os elementos alquímicos que nos chamam a atenção no
todo da obra. As Tartarugas Ninjas
representam tanto os Quatro Elementos
Alquímicos ocidentais, quanto os Cinco
Elementos presentes na Alquimia
e na Medicina Tradicional Chinesa.
Os Quatro Temperamentos
Quase cinco séculos antes de
Cristo, Empédocles (490 a.C. a 430
a.C.) postulou os Quatro Elementos e Hipócrates
(460 a.C. a 370 a.C.) desenvolveu a Teoria
dos Quatro Temperamentos. Para o segundo, cada temperamento estaria
correlacionado a um dos quatro elementos, sendo o Fogo, o temperamento Colérico,
a Terra, o Melancólico, o Ar, Sanguíneo e a Água, o Fleumático.
Como a própria nomenclatura
indica, o Fogo é facilmente tomado pela cólera (raiva), a Terra é mais
melancólica, o Ar é elétrico, hiperativo e a Água mais preguiçosa, divertida e
fanfarrona.
As Tartarugas Ninjas e os Quatro Temperamentos
Para começo de conversa, vamos falar das máscaras-bandanas que
vestem.
Raphael
dispensa maiores apresentações, mas mesmo assim podemos traçar algumas
considerações a seu respeito: sua bandana é vermelha e seu temperamento
colérico condiz perfeitamente com sua representação.
A inicial de seu nome, a letra R,
deriva do hebraico Resh, que, entre as 22 cartas do Tarô, equivale à carta do Sol.
Outra letra do mesmo alfabeto, a vigésima primeira, Shin, possui diversos
significados e várias atribuições (entre elas, o Fogo) e tem a forma semelhante a um tridente, o que fica explícito
na arma que porta, um par de adagas Sai.
Zhang Fu, os Cinco Elementos Chineses
Diferente dos ocidentais e seus
tradicionais Quatro Elementos, os chineses postularam a existência de cinco
elementos, acrescentando mais dois – a Madeira
e o Metal – e excluindo o Ar. A
partir daí, criaram o Zhang Fu, ou Teoria dos Cinco Elementos, onde cada elemento é responsável pela
geração e destruição de outros dois elementos enquanto é gerado por um e passível
de ser destruído por outro.
No ciclo de geração, o Fogo (que
queima pra cima), gera a Terra (que sedimenta, equilibra e serve de base). Esta
gera o Metal (duro e inflexível), que gera a Água (que molha pra baixo), que
por sua vez gera a Madeira (que se entorta e se endireita). O Fogo, entretanto,
derrete o Metal, que corta a Madeira, que esgota a Terra,
que obstrui a Água, que apaga o Fogo.
As Tartarugas Ninjas e os Cinco Elementos Chineses
Como as Tartarugas são ninjas
(que são, originalmente, orientais), vamos aludi-las também aos cinco elementos
chineses. Tudo bem, ninjas são japoneses, mas a China (assim como a Índia) é a
base da cultura oriental assim como a Grécia é da ocidental.
Leonardo tipifica o elemento
Água, não só por sua bandana azul como pelo seu comportamento fluido,
caracterizado pelo modo como luta com as Katanas.
Resiliente, adapta-se a todo o tipo de batalha, adversário e situação, numa
dramatização bem caracterizada da Arte
da Guerra, de Sun Tzu, onde a máxima “(...) quando
não puder contar com nenhum recurso, contará com todos.” se aplica
perfeitamente ao personagem, o que faz dele o líder. Não fosse Bruce Lee imortalizar a máxima
“Torne-se água.”
Raphael é o Fogo, pelos motivos
supracitados. Michelangelo é a Madeira,
que “se entorta e se endireita”, já que se trata de um galhofeiro de primeira,
o mais irresponsável e fanfarrão do grupo. Donatello é o Metal, pois lança mão de tecnologia de ponta.
Mestre
Splinter é um caso curioso, pois representa o elemento Terra,
aquele que equilibra os outros quatro. Sendo o tutor e mentor do grupo, seu
papel é o de equilibrar seus pupilos. Na astrologia chinesa, o Rato é o único signo regido pelo
elemento Terra. Do ponto de vista dramatúrgico, no entanto, tanto Splinter como
Shredder (Destruidor, no Brasil), zênite do grupo, personificam o mesmo
personagem histórico: Hattori Hanzô, o Retalhador.
Hattori Hanzô, (o Retalhador), Shredder e Mestre Splinter
Hattori Hanzô, chefe de um clã da
região de Iga, no Japão, foi um
samurai conhecido por sua ferocidade em batalhas. Para distingui-lo de um
samurai homônimo, foi-lhe dada a alcunha de Oni-Hanzô. Oni é um tipo
de demônio importado do budismo chinês e é exatamente essa nomenclatura,
posteriormente atribuída ao personagem histórico, que dá a tônica dos dois
personagens.
Splinter significa “lasca”,
enquanto o termo Shredder seria algo próximo de retalhador, numa tradução
livre. Sendo cada um uma faceta do personagem histórico, um representa seu
aspecto apolíneo e o outro, seu
aspecto dionisíaco, como postulado
por Nietzsche em A Origem da Tragédia.
O fato de Splinter significar
“lasca” (e sua caracterização ser a de um rato humano, algo próximo a um
mendigo), representa mais uma vez a máxima da Arte da Guerra, onde “(...)
quando não puder contar com nenhum recurso, contará com todos.”. Também o
aparente desleixo é um elemento dionisíaco, contrastando com a aparência viril
e a postura egocêntrica e vaidosa de Destruidor, um traço apolíneo,
posto que Apolo era o deus do Sol,
sendo este, o representante alquímico do Ego nas escrituras antigas.
No entanto, a aparência
desleixada de Splinter mascara sua real sabedoria, que o coloca numa potestade
apolínea, visto que é um modelo de virtude a ser seguido, enquanto Destruidor
possui uma postura autodestrutiva, entrópica mesmo; um traço dionisíaco,
revelando o yin-yang
apolíneo-dionisíaco dos dois personagens.
Claudio Siqueira
é Estudante de Jornalismo, escritor, poeta,
pesquisador de Etimologia, Astrologia e Religião Comparada. Considera os
personagens de quadrinhos, games e cartoons como os panteões atuais; ou ao
menos arquétipos repaginados.
Postagens Relacionadas |