domingo, março 15, 2015

Série "House of Cards" surfa na onda do neoconservadorismo

A Netflix possui atualmente 17 lobistas em ação nos EUA representando seus interesses no Congresso e Governo Federal. Ao mesmo tempo produz uma série chamada "House of Cards" que descreve as relações anti-éticas entre lobistas, políticos do Congresso e imprensa. Narra a trajetória do líder dos Democratas no Congresso, um príncipe maquiavélico que articula ardil, traição e mentiras para chegar ao suposto centro do Poder, o Salão Oval da presidência. Qualquer análise sobre essa série que tornou-se o hit da Netflix deve partir dessa aparente contradição – na verdade a série reforça velhos mitos da Política: o Mito do “Mr. President”, o Mito do “Príncipe Maquiavélico” e o mito do “L’État, c’est moi”. Assim a Netflix esconde a verdadeira natureza do Poder do qual usufrui, e ao mesmo tempo mercadologicamente surfa na atual onda neoconservadora dos EUA e do Brasil: lá, a alienação em relação à Política num país onde o voto não é obrigatório; e aqui, uma trilha ficcional para aqueles que estão seduzidos pela aventura do Impeachment.

Primeira série originalmente produzida para a Web pela plataforma de streaming Netflix, House of Cards mostra através do seu protagonista Frank Underwood (Kevin Spacey) os bastidores do Congresso dos EUA e suas relações promíscuas entre lobistas, imprensa e congressistas.

Frank é uma espécie de Maquiavel com o charme sulista de um político da Carolina do Sul e pitadas da frieza de um assassino, responsável em exercer o papel de Chief Whip do partido (o “chefe do chicote”, o líder que faz tudo para que políticos democratas votem de acordo com os interesses do partido) – mas ele quer mais: pouco importa o dinheiro que jorra dos lobistas corporativos que alimentam o jogo político de Washington.  Frank quer o verdadeiro Poder - ficar cada vez mais próximo da presidência dos EUA, até conquista-la por meio de trapaça, ardil e traições.

terça-feira, março 10, 2015

Cuidado! Os rinocerontes já estão entre nós.

Filmes publicitários são mais do que peças promocionais de produtos e serviços – refletem a sensibilidade de cada época. E o novo comercial do TNT Energy Drink não deixa por menos: em efeito digital 3D um rinoceronte com fone nos ouvidos passeia entre as pessoas nas calçadas para depois entrar numa academia de lutas, parar diante de um espelho e vermos o reflexo de José Aldo, campeão do UFC. A ironia é que se no Teatro do Absurdo de Eugène Ionesco (autor da famosa peça “O Rinoceronte”) a transformação de seres humanos naquele animal era um impactante simbolismo que denunciava o conformismo, frieza e agressividade do homem moderno, agora torna-se um modelo positivo de caráter: o esporte (principalmente os midiáticos) como modelo de educação pela dureza, dor e severidade, chave para o sucesso. Dessa rino-couraça psíquica resultante  emerge um novo tipo-ideal urbano da atual onda de neoconservadorismo: os Rinocerontes.

Durante o século XX, todas as vanguardas artísticas, sejam elas no cinema, literatura, teatro ou pintura, tentaram desafiar o princípio de realidade com simbolismos obscuros, imagens impactantes e narrativas absurdas. Homens que se transformam em baratas em Kafka, relógios que se derretem em telas de Dali, situações teatrais absurdas como pessoas que esperam uma pessoa chamada Godot por horas e que nunca chega na peça de Becket ou chocantes imagens surrealistas como a navalha que vaza um olho em um filme de Buñuel.

Kafka, Dali, Becket e Buñuel tentavam se insurgir contra o mal-estar e desespero do homem contemporâneo na incipiente sociedade de massas que produz alienação, conformismo e fascínio pelo irracionalismo e fanatismo coletivo. Por isso, procuraram a anti-literatura, o anti-teatro, o anti-cinema, o anti-tudo!

sábado, março 07, 2015

Em Observação: "The Man In The High Castle" (2015) - os nazistas ganharam a guerra?

Em uma realidade alternativa, Hitler e o imperador Hiroíto ganharam a II Guerra Mundial, invadiram os EUA e dividiram o país em dois estados totalitários controlados pela Alemanha e Japão. Mas grupos de resistência possuem um filme documentário de origem misteriosa que mostra a História tal qual conhecemos: a vitória dos Aliados, o Dia D e a derrota do Japão na guerra do Pacífico. Qual será a verdadeira realidade? A dos EUA divididos? A do filme documentário? E se as imagens históricas da II Guerra Mundial que conhecemos forem estratégias de propaganda que, na verdade, ocultam que todos nós vivemos em uma outra realidade alternativa? Esse é o jogo gnóstico proposto pelo piloto da série televisiva "The Man In The High Castle", baseada no premiado livro homônimo de 1962 do escritor de ficção científica Philip K. Dick. Assista nesse post o piloto da série.

terça-feira, março 03, 2015

"Novos tradicionalistas" são mão de obra da revista "Veja"

Um repórter da revista “Veja Brasília” invade um condomínio em São Paulo disposto a fabricar provas para uma pauta inventada. Pego com a boca na botija, é levado pela polícia e a família vítima da “reportagem investigativa” faz um BO na delegacia. Além do episódio ser mais uma contribuição à pesada atmosfera política atual (a pauta era sobre uma suposta festa infantil de 200 mil reais pagos em dinheiro vivo pelo ex-presidente Lula), há algo mais: curiosamente o repórter é um dublê de jornalista e DJ de festas privadas no Lago Sul de Brasília e clubes que fervem na noite daquela cidade. Está para ser feita uma pesquisa etnográfica dos novos tipos-ideais do atual neoconservadorismo. Alguns já podem ser detectados: “coxinhas”, “coxinhas 2.0” e “simples descolados”. E o intrépido repórter da “Veja” pertence a um novo tipo-ideal: os “novos tradicionalistas”.

Tudo começou com uma nota da revista Veja Brasília redigida por um repórter chamado Ulisses Campbell sobre festa em buffet infantil na cidade, de um suposto sobrinho do ex-presidente Lula. O custo da festa teria sido de 200 mil reais pagos em dinheiro pelo ex-presidente. Com os desmentidos feitos pelo Instituto Lula e comprovada a mentira, o repórter foi para São Paulo disposto a produzir provas que sustentassem sua bizarra pauta.

Usando nomes falsos passou a assediar a família de “Frei Chico”, como é conhecido o irmão de Lula, através de ligações telefônicas como representante do buffet de Brasília ou como estudante da USP fazendo uma suposta pesquisa. Após ameaças de que “publicaria o que quisesse”, invadiu o condomínio da família passando-se por um entregador de livro para obter de uma babá informações sobre horários de chegada dos moradores, além de obter RG e CPF dela.

sábado, fevereiro 28, 2015

Morsas e ostras mataram John Lennon?

A música mais enigmática dos Beatles aparece no maior fracasso comercial do grupo, o filme “Magical Mystery Tour” de 1967, hoje reavaliado como obra de arte ao nível do humor do grupo Monty Python ou do surrealismo de Buñuel. Inspirado no poema “A Morsa e o Carpinteiro” de Lewis Carroll, a música “I’m The Walrus” composta por John Lennon apresenta uma letra sombria, obscura e misteriosa com referências a genocídios, drogas e jovens que seriam seduzidos por uma “Morsa” que estaria levando-os para a destruição – no poema de Carroll aparecem “jovens ostras” . Será que a música foi alguma espécie de acerto de contas de Lennon com a culpa e o remorso de saber ter feito parte de uma gigantesca estratégia de engenharia social por trás da cultura pop? Em declarações dadas em uma entrevista em 1980, ele indica evidências, falando de “artesãos” que estiveram por trás dos Beatles e a ligação entre CIA e a droga LSD. Alguns meses depois, Lennon seria assassinado.

O grande e misterioso fracasso dos Beatles: o filme Magical Mystery Tour de 1967. “Beatles Mystery Tour desconcerta os espectadores”, estampava em uma manchete na primeira página do jornal Mirror da Inglaterra, dizendo que milhares de espectadores protestaram quando foi exibido na TV pela BBC.

“Bobagem sem sentido”, “lixo flagrante” e “ultrajante” foram as críticas mais leves sobre um filme que não se importava com qualquer sentido narrativo: mostrava um grupo de turistas em um ônibus que iniciava um “misterioso tour” pela Inglaterra em um ônibus panorâmico, onde “coisas estranhas começam a acontecer”, ao capricho de quatro magos performados pelos próprios Beatles que tudo observam, manipulando os acontecimentos.

segunda-feira, fevereiro 23, 2015

Oscar para "Birdman" revela secreta coerência de Hollywood

O blog “Cinegnose” acertou: o favoritismo de “Birdman” confirmou-se com o prêmio de Melhor Filme no Oscar 2015. O prêmio era aguardado pela recorrência temática dos filmes premiados pela Academia de Cinema nos últimos anos: metalinguagem, auto-referência, glamourização da “guerra anti-terror”, conflitos étnicos e liberdade, temas recorrentes desde a explosão da bolha imobiliária dos EUA em 2008 e a crise da Zona do Euro. Hollywood mais uma vez demonstra que é um braço armado do complexo bélico-militar norte-americano. E a indústria do entretenimento sabe premiar os seus: o diretor mexicano Alejandro Iñárritu (e a nacionalidade foi um fator ideológico importante) fez uma verdadeira homenagem à indústria do entretenimento – mostrou uma Broadway que não mais existe, reforçando a mitologia que ainda dá algum verniz “artístico” a Hollywood: atores autopiedosos, divas narcisistas que se entregam ao “Método” e críticos implacáveis que transformam artistas em “gênios incompreendidos”.

Conforme previsto por esse blog, Birdman confirmou o grande favoritismo para o Oscar de melhor filme, batendo outro grande favorito: Boyhood – sobre a análise do Cinegnose sobre Birdman clique aqui.

Em tempos bicudos de crise econômica global pós-explosão da bolha especulativa imobiliária dos EUA em 2008, o “derretimento” da Zona do Euro e escalada da propaganda anti-terror pela mídia internacional, Hollywood mais uma vez se mostra porque é o braço armado da política externa norte-americana. E sua grande arma é glamourização da própria natureza bélico-militar dos EUA e a homenagem metalinguística da sua própria indústria do entretenimento.

sábado, fevereiro 21, 2015

Em "O Destino de Júpiter" os Wachowski esquecem a pílula vermelha do Gnosticismo Pop

Com o filme “O Destino de Júpiter”, mais uma vez os irmãos Wachowski criam uma fábula gnóstica pop. E dessa vez sincronizando um evento astronômico (a ascensão do planeta Júpiter nos céus em fevereiro) com uma releitura do mito gnóstico da Criação, Queda e Ascensão do “Apócrifo de João” escrito em 150 DC. Tal como na “Trilogia Matrix”, a humanidade é prisioneira dos Demiurgos para ter sua energia drenada. Lá em Matrix presos em incubadoras.  Aqui em “O Destino de Júpiter” para serem semeados e colhidos por uma casta real alienígena em uma espécie de gigantesco latifúndio cósmico. Porém, dessa vez os Wachowski fizeram grandes concessões à Hollywood: a pílula vermelha da gnose que despertava para a Verdade da Matrix desapareceu para ser substituída pelo obediente retorno do espectador à ordem.

Originalmente O Destino de Júpiter (Jupiter Ascending, 2015) tinha lançamento previsto para junho do ano passado. Foi adiado e, “coincidentemente”, só entrou em cartaz em fevereiro desse ano, no momento em que o planeta Júpiter ascendeu à posição oposta ao Sol – Júpiter sobe no céu no momento em que o Sol se põe, brilha mais alto à meia-noite e se põe em torno do nascer do Sol. Júpiter nesse momento está mais próximo da Terra, aparecendo maior e mais brilhante.

Em se tratando dos irmãos Wachowski e pelo emaranhado de simbologias gnósticas e esotéricas que o filme explora, tudo NÃO é mera coincidência. Andy e Lana Wachowski sabem o que estão fazendo: com essa sincronia entre os eventos cinematográfico e astronômico, reforçam ainda mais a mitologia por trás do verdadeiro delírio visual de um filme que parece que fundiu Matrix, Star Wars e Flash Gordon dentro de uma gigantesca space opera.

quarta-feira, fevereiro 18, 2015

Vídeos de execuções do Estado Islâmico apontam para a "Hipótese Fox Mulder"

Certa vez o agente especial do FBI Fox Mulder, da série televisiva “Arquivo X”, criou uma instigante hipótese: Hollywood propositalmente encenaria nos plots de seus filmes conspirações políticas para que as críticas contra essas mesmas conspirações, dessa vez na realidade, fossem desmoralizadas como meras “ficções”. A série recente de vídeos do Estado Islâmico sobre supostas decapitações de reféns estaria repetindo como farsa os vídeos fakes mostrados em filmes como “Mera Coincidência” (1997) e Homem de Ferro 3 (2013)? Diferente de antigos vídeos jihadistas de execuções, os atuais apresentam estranhas “anomalias” para vídeos supostamente realistas do estilo de antigos vídeos VHS como “Faces da Morte” – ao contrário, possuem superproduções análogas a blockbusters hollywoodianos com Dolby Digital Surround e suspeitas de uso de Chroma Key 3 D.  

A hipótese Fox Mulder: em um dos episódios da série Arquivo X vemos o agente especial do FBI, Fox William Mulder, participando como convidado de um congresso de ufólogos. A certa altura alguém lhe pergunta o motivo de ao mesmo tempo em que o governo dos EUA tenta esconder o fenômeno UFO, permite que Hollywood produza tantos filmes sobre contatos com aliens. E Mulder responde: “para que todos pensem que os contatos com UFOs e aliens são do mundo da ficção, coisas de cinema. Por isso, quando surgem notícias verdadeiras, ninguém acredita”.

Nas últimas décadas, Cinema e Guerra estão se tornando uma espécie de sala de espelhos que se refletem mutuamente, até não sabermos distinguir o reflexo daquilo que é refletido. No Oscar 2013  Michelle Obama aparece em link ao vivo direto da Casa Branca abrindo o envelope do prêmio de Melhor Filme para Argo, cujo plot narra uma estratégia militar norte-americana de simulação de produção de um filme para libertar reféns do Irã nos anos 70;

domingo, fevereiro 15, 2015

Por que "Birdman" é o favorito ao Oscar?

Não é por acaso que “Birdman” é o grande favorito ao Oscar. O filme promete discussões profundas sobre a importância de se sentir amado nesse mundo. Mas tudo o que o diretor mexicano Alejandro Iñárritu nos entrega é uma agradecida homenagem à indústria de entretenimento dos EUA que lhe abriu as portas: um filme supersaturado de metalinguagem e colagens de auto-referências que acabou resultando em uma produção complacente, auto-indulgente e subserviente. Iñarritu faz homenagem a uma Broadway que não mais existe, reforçando a mitologia que ainda dá algum verniz “artístico” a Hollywood: atores autopiedosos, divas narcisistas que se entregam ao “Método” e críticos implacáveis que transformam artistas em “gênios incompreendidos”. Com isso, o diretor mexicano parece ter um grande futuro na noite do Oscar. 

Alejandro Gonzáles Iñárritu é um diretor mexicano que já conta com uma sólida e bem sucedida carreira em Hollywood (21 Gramas, Babel, Biutiful). Por isso, é chegado o momento de Iñárritu prestar uma homenagem à indústria do entretenimento que lhe abriu às portas para aquele país. E como sempre, a melhor forma é através da metalinguagem, alusões e paráfrases.

Birdman é um filme supersaturado que obriga o espectador a caminhar por um desfile interminável de colagens e referencias que acaba se tornando tão claustrofóbico quanto os corredores dos bastidores de uma peça da Broadway onde a maior parte da trama acontece. O filme engata longos planos-sequências que simulam um filme totalmente sem montagem, mas com sutis cortes que separam os atos.

quinta-feira, fevereiro 12, 2015

Dez filmes arruinados pelas novas tecnologias


Com as novas tecnologias cada vez mais intrusivas e onipresentes, o Cinema vive um paradoxo: os filmes não têm o menor problema para fazer o público acreditar em fantasmas, gremlins, maníacos sobrenaturais, feiticeiros, vampiros, poltergeists ou extraterrestres. Mas está cada vez mais difícil fazê-los aceitarem que o herói de um filme não esteja munido com a tecnologia necessária (smartphones, Ipads, GPS etc.) para frustrar as intenções do Mal. O avanço tecnológico está criando um impasse entre roteiristas e diretores: muitos plots de filmes do passado, hoje seriam impossíveis de serem realizados como “Esqueceram de Mim”, “Psicose” etc. Internet e dispositivos móveis estão cada vez mais inviabilizando os arquétipos clássicos do cinema que tornavam dramática a jornada do herói. Por isso, os roteiristas ou se voltam para filmes ambientados em décadas passadas ou fazem de tudo para anular esses dispositivos – perda de sinal etc., o que pode tornar o roteiro inverossímil. Vamos analisar uma lista de dez filmes cujos plots hoje seriam impossíveis de serem filmados.

terça-feira, fevereiro 10, 2015

Tecnologias de comunicação escondem o isolamento no filme "Bird People"


No meio do caminho entre o realismo documental e o sobrenatural, o filme “Bird People” (2014) do francês Pascale Ferran nos mostra os dilemas dos momentos da vida em que precisamos assumir riscos e dar saltos no vazio. Pessoas que transitam em espaços impessoais como aeroportos e hotéis e que tentam mascarar o isolamento por meio de tecnologias de comunicação como dispositivos móveis e computadores. Ferran nos mostra a contradição de como pessoas cercadas de interfaces de comunicação podem, ao mesmo tempo, sofrerem do mal da incomunicabilidade. Escondem o isolamento, mas sofrem os sintomas da claustrofobia e alienação. E sentem a necessidade de darem um salto nas suas vidas, assim como os pássaros e aviões.

"Garota Exemplar" e a tragédia como delineadora da vida, por Sonielson de Sousa

Grande favorito ao Oscar (provavelmente nas categorias Melhor Filme, Melhor Ator/Atriz, Melhor Roteiro e Melhor Diretor, dentre outros) “Garota Exemplar” (Gone Girl, 2014) é um suspense de aproximadamente duas horas e meia que tem a habilidade de mostrar a tênue linha entre a normalidade e a face nebulosa das pessoas - a “Sombra” de que fala Jung.

"O Homem é o lobo do homem, em guerra de todos contra todos" (Thomas Hobbes)

Baseado no livro homônimo escrito por Gillian Flynn, o filme trata da estória de Amy Dunne (Rosamund Pike), que na infância é tratada pelos pais e por todos à sua volta com extrema excepcionalidade e que, depois de casada, é obrigada a ter uma vida mediana e a morar no interior para acompanhar o marido. Dunne desaparece no dia do seu quinto aniversário de casamento, deixando o esposo Nick (Ben Affleck) em apuros. Neste ínterim, Nick torna-se o principal suspeito do desaparecimento, e conta com a ajuda da irmã para tentar provar sua inocência.

O diretor David Fincher (de Millennium – Os Homens Que Não Amavam as Mulheres) transpôs para as telas, dentre outras coisas, o chamado “fruto tardio do romantismo”, traduzido essencialmente como o que alguns intelectuais chamam de “fracasso afetivo”, tema amplamente debatido pelos filósofos Luiz Felipe Pondé (PUC-SP) e Daniel Omar Perez (Unicamp), e pelo pensador Michael Foley, só para citar alguns. Neste processo, o amante é “incompleto e errante” e, no fundo, procura “um encontro consigo mesmo sem ter a menor ideia do que procura de si no outro” (PEREZ, 2014). No percurso, pode-se descobrir de forma dolorosa que não é nada fácil (re)conhecer o outro (e, de quebra, a si mesmo).

domingo, fevereiro 08, 2015

Ligações perigosas nas séries "Felizes Para Sempre?" e "Questão de Família"

As séries televisivas “Felizes Para Sempre?” e “Questão de Família” (Globo e GNT) apresentam sincronismos e insólitas coincidências envolvendo autor, diretor e o timing dos episódios que parecem espelhar na teledramaturgia notícias e imagens do telejornalismo da grande mídia . Estaria a todo vapor funcionando uma correia de transmissão entre os núcleos de novelas e o jornalismo da emissora? O sincronismo seria favorecido pelo vazamento antecipado de informações das investigações do Judiciário? Por outro lado poderia ser um sintoma do tautismo da TV Globo que, em crise, injeta realismo na teledramaturgia para recuperar a relevância perdida? Ou são apenas eventos sincromísticos?


Em 1982 ia ao ar na TV Globo a minissérie Quem Ama Não Mata, escrita por Euclydes Marinho. Eram épocas de abertura política na ditadura militar. O título fazia alusão a pichações nos muros de Belo Horizonte por conta do julgamento do playboy Doca Street, acusado de ter matado a mulher Ângela Diniz. A minissérie foi polêmica e contribuiu para o debate sobre os direitos da mulher numa sociedade que procurava o caminho para a democracia.

Trinta e três anos depois, Euclydes Marinho escreve a minissérie Felizes Para Sempre?, retornando ao tema dos dramas de relacionamentos de vários casais de uma mesma família da série de 1982. Somente que agora num contexto bem diferente: numa TV Globo que tenta reverter a sua crise de audiência e que simultaneamente assumiu o papel de oposição ao Governo Federal.

sexta-feira, fevereiro 06, 2015

Uma crítica irônica ao racismo europeu em "Charleston Parade"

Estamos em 2028. A Europa foi arrasada por uma guerra mundial e Paris está em ruínas com poucos sobreviventes. Um explorador desce numa esfera voadora e descobre um dos sobreviventes. Ela é uma mulher selvagem que, com seu gorila de estimação, dança nas ruas um ritmo estranho chamado Charleston. Esse explorador é negro e vem da África que se tornou o centro da civilização, enquanto a Europa branca tornou-se arruinada e selvagem. Estamos falando de algum filme distópico atual? Não, esse é um estranho e irônico curta de ficção científica francês de 1927 “Charleston Parade” (Sur Un Air De Charleston) de Jean Renoir, filho do famoso pintor impressionista. O curta é uma engraçada crítica politicamente incorreta ao racismo e colonialismo europeu. A produção tornou-se obscura e esquecida pelas diversas coletâneas do diretor. Mas o “Cinegnose” descobriu e mostra para os leitores.

Filho do pintor impressionista francês Pierre-Auguste Renoir, Jean Renoir foi um dos menos conhecidos pioneiros do cinema. A carreira dele resultaria mais tarde em filmes realistas convencionais como A Grande Ilusão (1935) e Regras do Jogo (1937). Mas a sua primeira fase composta por filmes mudos foi subestimada e incompreendida no seu tempo, obrigando Renoir a vender quadros do pai famoso para financiar seus filmes.

Essa primeira fase composta de nove filmes mudos é marcada pelo experimentalismo e temas engraçados e bizarros. Uma amostra dessa fase é o surpreendente curta de ficção científica Charleston Parade (1927) realizado em uma tacada só em três dias.

quinta-feira, fevereiro 05, 2015

O enigma da calma estoica de Alckmin

Enquanto a crise hídrica é anexada à energética pela grande mídia, nacionalizando a pauta e sobrando as medidas impopulares para a presidenta Dilma, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, passa incólume pela crise.  Alckmin tira vantagem de uma blindagem midiática? A resposta não é assim tão simples, onde a grande mídia supostamente teria poderes para operar uma lavagem cerebral em um Estado inteiro. Uma pista talvez esteja no impagável apelido dado pelo colunista José Simão ao governador em 2001: “picolé de chuchu diet”. O colunista foi profético – pressentiu o papel que Alckmin desempenharia no futuro onde essa imagem “diet” junto à opinião pública seria fundamental: o papel de líder de um Estado que, de locomotiva da Nação, se transformaria em laboratório sócio-econômico de dolorosas experiências neoliberais. Com sua “calma estoica”, Alckmin reflete um novo conservadorismo baseado num mecanismo de defesa psíquico para os tempos difíceis anunciados diariamente pela mídia.

Quando em 2001 o então vice Geraldo Alckmin assumiu interinamente o cargo de governador de São Paulo em decorrência do agravamento de saúde e posterior morte de Mário Covas, o colunista da Folha José Simão o apelidou de “picolé de chuchu diet”.

Mal sabia o colunista que esse apelido seria profético: Simão conseguiu sintetizar nessa impagável analogia a physic du rôle necessária a um político para o papel que desempenharia no futuro – o de líder de um Estado que, de locomotiva da Nação, se transformaria em laboratório social e econômico das experiências neoliberais.

terça-feira, fevereiro 03, 2015

A mecânica quântica nas relações humanas no filme "Coherence"


Em uma noite amigos se reúnem para um jantar regado a vinho. Um cometa cruza o céu. O físico austríaco Schrödinger em 1935 imaginou a famosa experiência do gato preso em uma caixa para ilustrar os paradoxos da mecânica quântica. O filme "indie" “Coherence” (2013) junta esses três elementos para criar um dos mais inventivos roteiros dos últimos anos. Complexos conceitos da física quântica como “sobreposição”, “entrelaçamento” e “decoerência” são transferidos do mundo subatômico para as tensões das relações humanas. E se todos naquele noite estiverem na mesma situação angustiante do gato de Schrödinger? Mas também pode ser a oportunidade de realizar o sonho da segunda chance e corrigir as escolhas erradas de uma vida.

sábado, janeiro 31, 2015

Série "Mundo da Lua" previu crise atual da água em 1991?

Assistir ao episódio “Esquadrão do Sabonete” da série de TV brasileira “Mundo da Lua” apresentado em 1991 é a oportunidade de ter uma desconcertante experiência de "dèjá vu": teria lá no passado o protagonista Lucas previsto a atual crise da água? O episódio reserva estranhas conexões entre passado e futuro – coincidências ou sincronicidades? Essas possíveis conexões trazem a discussão sobre as fronteiras entre ficção e realidade tal como propostas por escritores como Charles Bukowski e Philip K. Dick: para o primeiro, a realidade consegue superar a ficção em bizarrice, por isso a literatura deve ser mais estranha que o real; para o segundo, a realidade é o futuro como profecia auto-realizável. É a hipótese sincromística: haveria um subtexto com linhas sincrônicas que dariam um sentido (natural ou conspiratório) a uma realidade aparentemente caótica? Pauta sugerida pelo nosso leitor Carlos Vinícius.

Certa vez o escritor underground e maldito Charles Bukowski (1920-1994) foi questionado sobre o porquê do seu estilo bizarro e exagerado de escrever, para começar os títulos que costumava a dar aos seus contos (“A Máquina de Foder”, “Kid Foguete no Matadouro, “Doze Macacos Alados não conseguem trepar sossegados” etc.): “em um mundo onde notícias e acontecimentos são tão estranhos, somente uma ficção literária bizarra pode tentar superar a realidade”.

Essa estranha percepção de Bukowsky sobre o limiar entre a ficção e a realidade vai de encontro a atual hipótese do Sincromisticismo: a onipresença do contínuo midiático e a forma como os meios de comunicação exploram verdadeiras egrégoras de formas-pensamento e arquétipos, torna os limites entre ficção e realidade cada vez mais tênues e confusos – a vida imita a ficção ou vice-e-versa?

sexta-feira, janeiro 30, 2015

Conteudismo: a doença infantil da comunicação

As estruturas de comunicação de instituições públicas são lentas para reagir a ambientes midiáticos negativos. Mas no caso atual do Governo Federal o problema não é de “timing”, mas principalmente do paradigma que orienta suas estratégias: o Conteudismo, a doença infantil da Comunicação. Da vulgarização da utilização de filmes em sala de aula para ilustrar de maneira linear conteúdos curriculares à ordem da presidenta Dilma para que os ministros sejam “claros e precisos” e “comuniquem iniciativas e acertos” para enfrentar a “batalha da comunicação”, todos partilham de um mesmo equívoco: de que a questão da Comunicação se trata unicamente de transmissão de conteúdos. O cenário midiático atual não se identifica mais com uma “batalha da comunicação”, mas com verdadeiras “guerrilhas semióticas” – recursos formais de linguagem que visam muito mais corações do que mentes, muito mais construção de percepções do que transmissão de conteúdos. Guerrilhas semióticas têm a ver com batalhas de percepções e não de informações.

Quando o videocassete surgiu no Brasil nos anos 1980, foi recebido com euforia pelos professores. A imediata disponibilidade de filmes que até então somente era possível de serem assistidos no cinema, vislumbrou a imediata aplicação em sala de aula.

Assim como os espectadores comuns, os professores se fixaram no conteúdo temático dos filmes que poderia ser associado linearmente aos conteúdos programáticos de cada disciplina: aula sobre a independência do Brasil? Exiba Independência ou Morte com Tarcísio Meira para os alunos; algo sobre a Idade Média? O Nome da Rosa; Ditadura Militar? O filme O Que é Isso Companheiro? E ainda teve professor que para ilustrar o porquê da queda do Império Romano apresentou o controvertido filme Calígula – com o previsível escândalo do diretores, coordenadores e pais de alunos.

quarta-feira, janeiro 28, 2015

Filme "Borgman" mostra como uma família burguesa se autodestrói


Esqueça a maldade representada pela tradição hollywoodiana: serial killers, monstros, psicopatas, terroristas, russos, árabes e vilões em geral (RAVs). Para assistir ao filme “Borgman” (2013), do diretor holandês Alex Van Warmerdan, o espectador deve ter em mente que está entrando no terreno do Mal surrealista e metafísico. O Mal na tradição gnóstica que, no Ocidente, tem na obra de Marques de Sade um dos seus melhores representantes. Em um mix de thriller, sobrenatural e humor negro, “Borgman” narra como uma típica família burguesa é capaz de se autodestruir até o limite da insanidade – e Camiel Borgman, um presumível sem-teto que um dia bate à porta da família, seria o suposto responsável por tudo – hipótese mais tranquilizadora para nós. Mas Van Warmerdan não pensa assim: e se o Mal não estiver nos espreitando? E se ele já estiver dentro de nós? Filme insistentemente (ainda bem!) sugerido pelo nosso leitor Felipe Resende.

segunda-feira, janeiro 26, 2015

O fantasma da adolescência no filme "Divergente"

O fantasma da adolescência assombra o Capitalismo: como estender o período da vida que conhecemos como “juventude”, com toda a sua ansiedade e revolta, com a finalidade de adiar cada vez mais a entrada do jovem no mercado de trabalho? Filmes como "Divergente" (Divergent, 2014) é um exemplo da solução desse problema e, ao mesmo tempo, a descoberta de uma inesgotável fonte de lucros. Em cada década a indústria do entretenimento explorou essa “adolescência estendida”: rebeldes sem causa, punks, darks, góticos, emos. E agora, rebeldes “teens distópicos” de filmes como “Jogos Vorazes” ou “Ender’s Games”. Baseado em mais um indefectível romance infanto-juvenil, o filme “Divergente” traz a ambígua mensagem desses novos tradicionalistas de início de século: revoltem-se, sejam audaciosos, mas se abstenham de drogas e sexo e na segunda-feira voltem para a escola.

Divergente (Divergent, 2014) é mais um filme que se associa a outras franquias infanto-juvenis de sucesso como Crepúsculo e Jogos Vorazes. Desde Harry Potter (2001) Hollywood vem expandindo essa tendência em adaptar para as telas best sellers para o público jovem. Nesse início de século, a lista já é extensa, só para citar alguns: Eu Sou o Número 4 (2010), Cidade das Sombras (2008), Jogos Vorazes (2012), Instrumentos Mortais (2013), Ender’s Game (2013), Percy Jackson (2010) entre outros.

A procura da própria identidade e a descoberta do sexo e do amor são os temas universais da adolescência presentes nesses filmes, cujo desenvolvimento é amarrado por uma fórmula que parece comum: protagonistas que levavam uma vida aparentemente normal até um dia descobrirem que possuem estranhos poderes e que, por isso, são vigiados por entidades sombrias ou sistemas totalitários distópicos. E no transcorrer dessas sagas cinematográficas descobrirão o sexo e o amor que, em geral, tendem ou para os amores platônicos e impossíveis, ou então simplesmente para a abstinência sexual como um valor positivo.

sexta-feira, janeiro 23, 2015

A Ponte Estaiada é uma bomba sincromística?

Foto: André Nunez

“Estilingão”, “X” da Xuxa”, “X” dos analfabetos foram alguns dos apelidos recebidos pela Ponte Estaiada Otávio Frias de Oliveira quando inaugurada em 2008 na cidade de São Paulo. Certamente sintomas da perplexidade de uma estrutura em “X” equivalente a um prédio de 46 andares de onde saem estais que sustentam pistas sobrepostas em curva. Para além da funcionalidade viária, a ponte nasceu para ser emblemática, midiática e símbolo global. Para atingir essas funções ideológicas do “Soft-capitalismo” (midiático-financeiro), tornou-se um evento sincromístico: além dos feixes de estais, ela representa um feixe de simbolismos herméticos, esotéricos e matemáticos como a espiral de Fibonacci e o Homem Vitruviano de Leonardo da Vinci. Simbolismos que transformam a ponte numa celebração ritual de um Neo-Renascimento onde o mundo do mercado e dos negócios teria descoberto a beleza e simetria em meio ao caos. Seria a ponte uma bomba semiótica sincromística para diariamente fazer a apologia da Nova Ordem?

quarta-feira, janeiro 21, 2015

O estranho clássico cult "The Cars That Ate Paris"

Estranhos carros tunados que correm o Outback australiano provocando acidentes cujas vítimas serão ou assassinadas, ou incorporadas à comunidade de um lugarejo chamado Paris ou se transformarão em cobaias de um estranho experimento psiquiátrico. O clássico cult “The Cars That Ate Paris” (1974), dirigido por Peter Weir (“Show de Truman”, “Sociedade dos Poetas Mortos”) em início de carreira, é um filme estranho e enigmático e que por décadas se mostrou impossível de ser rotulado em um gênero. Apesar da sua estranheza,  a produção acabou influenciando diversos filmes por gerações como “Mad Max”, “Veludo Azul”, “Chumbo Grosso” ou “Velozes e Furiosos”. Como mais tarde faria em “Show de Truman”, em “The Cars” Peter Weir quer encontrar o bizarro e o anormal por baixo da aparente rotina de um lugarejo com doces vovós em cadeiras de balanço e fiéis que não perdem uma missa aos domingos. Mas todos escondem um terrível segredo.

Um filme estranho? Com certeza. Gnóstico? Talvez, ainda mais sabendo que o diretor australiano Peter Weir tem um especial interesse pelas teorias sobre os mitos e sonhos e nos seus filmes sempre demonstra estar atento ao tema de como o senso comum sobre a realidade pode ser frágil e como podemos encontrar o extraordinário dentro da vida ordinária. Seu filme Show de Truman foi a consolidação desses temas que sempre estiveram na cabeça do diretor.

The Cars That Ate Paris (1974, “Os Carros que Comeram Paris”) é um estranho filme do início da carreira de Peter Weir, ainda no cenário cinematográfico australiano.  Uma das primeiras características de um “filme estranho” – sobre esse conceito fílmico clique aqui – é a dificuldade em rotulá-lo em um gênero: nos anos 1970, o filme teve uma difícil comercialização, porque era impossível categorizá-lo: humor negro? Comédia dramática? Ficção Científica? Terror? Na era do VHS nos anos 1980, as locadoras colocavam o filme nas prateleira de “terror”.

domingo, janeiro 18, 2015

O gênio do Chefe Shang inspira dedo-durismo da grande mídia

Há quase 3 mil anos na China, Chefe Shang, dirigente na totalitária Disnastia Ch’in, criou a ardilosa tática de estímulo ao dedo-durismo generalizado entre agricultores: preocupados em vigiar seus vizinhos, esqueciam-se que estavam sob um regime de terror e autoritarismo. Desde então, o dedo-durismo passou a ser a prática recorrente nos regimes totalitários. Pois o gênio do Chefe Shang continua vivo – sob o pretexto de “exercício da cidadania” durante a chamada “crise hídrica” em São Paulo, a grande mídia vem estimulando pessoas a enviar vídeos e fotos de vizinhos que supostamente desperdiçam água. Mais uma vez a grande mídia pisa no pântano do proto-fascismo: uma suposta cruzada cívica que pode se transformar em vingança e violência por motivos oportunistas como racistas, sexistas ou político-ideológicos. Com isso, São Paulo dá mais um passo para o seu futuro distópico – uma cidade transformada em um deserto igual ao filme "Mad Max" com milícias de “fiscais da Sabesp” executando aqueles que escondem não mais gasolina, mas agora água.

Desde a explosão do nazi-fascismo no período entre guerras no século XX, a sociologia tenta entender como é possível a ascensão de regimes ou atmosferas totalitárias em países formalmente democráticos. Mais do que um sistema totalitário centralizado nos moldes de 1984 de George Orwell, o que chama a atenção é o fenômeno do totalitarismo descentralizado e difuso, com o apoio de quase toda a população.

Sociólogos como o norte-americano Barrington Moore Jr. (1903-2005) apontam para similaridades entre o totalitarismo moderno e das sociedades pré-industriais. Práticas totalitárias modernas que se repetem ao longo da História, desde a antiguidade – veja “Totalitarian Elements in Pre-industrial Societies”, In: Political Power and Social Theory, Havard University Press, 1958.

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