Repercutido nas
redes sociais e dando a oportunidade para toda sorte de especulações, na semana
passada o noticioso da Globo “Hora 1” "previu" o mando da partida final da
Copa do Brasil, mais de 24 horas antes do sorteio público realizado na sede da
CBF no Rio de Janeiro. E a Globo “acertou” o resultado – a finalíssima será em
Porto Alegre. De jornalismo “de hipóteses”, a emissora passou para o jornalismo “de previsões”? Parajornalismo? Ou o tautismo
(autismo + tautologia) da Globo, que atualmente contamina o jornalismo,
telenovelas e esporte da emissora, banalizou-se? Ao ponto de ficção e realidade se
confundirem com a própria descrição que a emissora faz de si mesma, levando a
apresentadora Monalisa Perrone a espontaneamente externar o que já era corrente nos bastidores
do jornalismo global. Seria para a Globo (dona do futebol brasileiro) a “previsão” mais conveniente a seus interesses políticos e comerciais?
Principalmente depois do resultado das eleições em Belo Horizonte?
Em postagem
anterior o Cinegnose constatou a
chegada do tautismo (autismo + tautologia) nas telenovelas da Globo: a
teledramaturgia da emissora mandou à favas a verossimilhança e, num gesto
autofágico, escalou Giovana Antonelli e Luís Melo para serem protagonistas no
núcleo “japonês” da novela Sol Nascente – a Globo preferiu o “yellowface”
(apertadinhas de olhos de Luís Melo para tentar minimizar a inadequação ao
papel) e uma acrobacia no roteiro do folhetim: neto de americano que se casou
com japonesa, filha adotada e assim por diante... – clique aqui.
Os primeiros
sintomas do tautismo (fenômeno de fechamento operacional em relação ao mundo
exterior de sistemas que se tornaram grandes e complexos – sobre esse conceito clique aqui) na Globo surgiram no
telejornalismo e no esporte. Fenômeno paradoxal porque teoricamente seriam as
“janelas” do sistema global mais abertas à realidade exterior.
Mas se para o
telejornalismo ainda existe, do lado de lá do muro, uma realidade pulsante e
caótica que algumas vezes sabota a descrição que a Globo faz de si mesma, no
esporte o tautismo parece estar bem seguro: a emissora não se limita a
transmitir eventos – ela é dona do próprio evento. Assim como o BV (bonificação
por volume) garante a fidelização das agências de publicidade, a penúria financeira dos
clubes de futebol e o pagamento antecipado dos direitos de transmissão garante
a obediência canina das federações.
Resultado: as
transmissões esportivas tornam-se eventos autistas
(regras, horários, timing, tabela, etc. de acordo com a logística da emissora)
e tautológicos (a Globo transmite a
si mesma), resultando em um gigantesco “efeito Heisenberg” – sobre esse
conceito clique aqui.
Previsão ou ato falho?
Na semana
passada ocorreu um flagrante ato falho certamente originado no inconsciente
tautismo esportivo da emissora.
O sorteio para
os mandos das partidas da final da Copa do Brasil ocorreu às 9h da manhã de
sexta-feira (4) na sede da CBF, no Rio de Janeiro. Porém, com mais de 24 horas
de antecedência, os mandos de campo da decisão da competição foram anunciados
no telejornal Hora 1, na madrugada de
quinta-feira, horas depois da semifinal que definiu os vitoriosos – transmitida
pela própria Globo no seu tradicional e conveniente horário da noite de
quarta-feira, após a telenovela.
''Estão definidas aí
as datas das finais entre Atlético e Grêmio. A primeira partida vai ser em Belo
Horizonte, dia 23, e no dia 30 tem o jogo decisivo, então, em Porto Alegre'',
ao vivo, às 5h55, a apresentadora, Monalisa Perrone, logo após exibição de VT
com repercussão das semifinais feita por Cleber Machado, narrador do jogo de
volta entre Grêmio e Cruzeiro.
Apesar
da “gafe” acontecer na madrugada, o “mando antecipado” foi repercutido nas
redes sociais, enquanto a assessoria de comunicação da Rede Globo fechou-se em
copas dizendo “não ter resposta confirmada”.
Monalisa
Perrone é conhecida pelo seu jeito “espontâneo” e, por isso, propenso a gafes
como logo na estreia do Hora 1 dizer
que “a corrupção é um problema em todo o Brasil” ao comentar a corrupção no
Iraque; ou a bronca de um telespectador por atropelar a apresentadora da
previsão do tempo (“é só um tricô para não perdermos a interação, justificou
Monalisa); ou quando confundiu uma passista, grávida de sete meses, no
Sambódromo com uma ex-BBB e, depois, alisou a barriga dela com empolgação...
Sintomas tautistas nas madrugadas globais
Os
horários da madrugada no telejornalismo da emissora parecem ser muito interessantes
em flagrantes de sintomas tautistas. Lembre-se leitor que a condução coercitiva
de Lula pela Polícia Federal até o aeroporto de Congonhas ocorreu às seis horas
da manhã. E já estavam repórteres da Globo e o helicóptero Globocop com tomadas
aéreas do bairro onde Lula mora, em São Bernardo do Campo/SP, demonstrando terem "previsto" ou obtido
informações antecipadas sobre mais uma operação da Lava Jato.
Após
a “premonitória” revelação e Monalisa Perrone, o mal estar na emissora foi
generalizado. A informação não mais foi repetida nas várias edições do
jornalismo da emissora durante o dia.
Enquanto
a assessoria de comunicação global nada declarava, solertes cães cérberos
(“cérbero”, aquele famoso cão que guardava as portas do Inferno na Divina
Comédia de Dante Aligheri) saíram imediatamente em defesa. E os argumentos de
primeira hora em defesa da emissora nada mais fizeram do que confirmar o ato falho
tautista da Globo.
Entre
tuitadas agressivas e educadas que recebeu, o atleticano e apresentador do
noticioso Bom Dia Brasil da Globo,
Chico Pinheiro, respondeu: “foi falha nossa. Ela deu a notícia na madrugada de
ontem, 6 horas depois de Galo e Inter. Tinha 50% de chance de acerto”. Uma
resposta, no mínimo sintomática para o tipo de jornalismo tautista da emissora,
desde que o diretor Ali Kamel falou em jornalismo “que testa hipóteses”.
Monalisa Perrone apenas “testava hipóteses” ao vivo? Com 50% de chances?
E
ainda acionado por milhares de atleticanos revoltados, Lásaro Cândido, diretor
jurídico do Atlético mineiro respondeu: “Há limites p teorias conspiratórias.
Alguém antecipar resultado do sorteio tem chance de 50% de acerto/em 2014 decidimos no 1 jogo em casa”.
Confirmando
o “rabo preso” dos clubes com a Globo, um diretor do Atlético não só
diligentemente chamou tudo de “teoria da
conspiração”, como ainda defendeu a estranha prática de “antecipar resultado de
sorteio” na emissora de maior audiência do País. Depois do jornalismo “de
hipóteses”, a Globo cria o jornalismo “de previsões”.
Antecipação e sincronismo com eleições em BH
Teria
a “espontaneidade” da apresentadora do Hora
1 lhe pregado uma peça? Durante um “tricô para não perder a interação” com
o locutor Cleber Machado, Monalisa Perrone inadvertidamente externou o que já
era corrente nos bastidores do jornalismo da emissora?
O
fato é que a antecipação do mandato da final da Copa do Brasil, mais de 24 horas
antes do sorteio público na CBF, foi marcado por um flagrante sincronismo: a
vitória de Alexandre Kalil (PHS) nas eleições à prefeitura de Belo Horizonte,
derrotando João Leite, candidato do PSDB.
Até
os patos da lagoa da Pampulha sabem que João Leite, cujo padrinho político é
Aécio Neves (que sempre mereceu o obsequioso silêncio da grande mídia diante
dos seus escândalos) era o candidato da TV Globo na sua cruzada contra a pièce de résistance do PT em Minas, o
governador Fernando Pimentel.
Kalil,
ex-dirigente do Clube Atlético Mineiro, é um reconhecido desafeto da CBF como ex-executivo-chefe
da Liga Sul-Minas-Rio. No início desse ano a CBF não deu aval à formação da
Liga. Kalil saiu da reunião com o presidente Marco Polo Del Nero decidido a
realizar o torneio com ou sem aval da entidade máxima do futebol brasileiro.
Logo depois, abandonou a Liga disparando ser “vítima de complô daqueles que
dominam o futebol brasileiro”.
E
para os bons entendedores, “aqueles que dominam o futebol brasileiro” é a dupla
CBF/Globo.
A vingança da Globo é impiedosa
Antecedentes
tautistas da emissora já são conhecidos. Por exemplo, quando o então prefeito
da cidade de São Paulo, Celso Pitta, entrou em 1999 com ação cautelar na
Justiça pedindo a mudança de horário da decisão do campeonato brasileiro, Atlético
Mineiro versus Corinthians, a vingança da Globo foi impiedosa.
Para
não atrapalhar a programação de final de ano (o indefectível Roberto Carlos Especial), a Globo
planejava o jogo final às 16 horas em pleno meio da semana, o que criaria um
caos no trânsito com a possível comemoração do time paulistano na avenida
Paulista. O jogo acabou transferido para a noite.
Em
represália, em março de 2.000 uma edição especial do programa Globo Repórter
deu espaço total a denúncias da esposa Nicéia Pitta sobre suposta corrupção na
administração da cidade e compra de vereadores pelo seu marido – o chamado
“escândalo dos precatórios da prefeitura”.
Por
isso, a “falha” de Monalisa Perrone “antecipando” resultado de sorteio, o
sincronismo da vitória eleitoral do desafeto Alexandra Kalil e a finalíssima da
Copa do Brasil “sorteada” para Porto Alegre conferem imediatos elementos para,
no mínimo, uma boa teoria da conspiração.
Que
acaba tornando-se ainda mais crível quando sabemos que, ao lado das
telenovelas, o futebol é um dos pilares de sustentação do notável tautismo da
Globo: a realidade modelada a partir da descrição que a própria emissora faz de
si mesma.
Postagens Relacionadas |