Dentro da nossa sessão “Opinião” uma contribuição do nosso leitor “Anônimo”
à postagem crítica sobre um texto de Paulo Coelho sobre os Cátaros: a história
de Jules Doinel, arquivista francês e criador da primeira igreja gnóstica
neocátara dos tempos modernos, a partir de uma carta encontrada de um chanceler
epicospial chamado Etienne, que fora queimado por heresia em 1022. Essa carta
mudou a vida de Doinel. E também um comentário sobre a conexão entre drogas
lisérgicase a experiência mística da vivência da “teologia negativa”.
Os Cátaros, Paulo Coelho e o turismo esotérico
Postagem de 12/10/2012
Escalar uma
"montanha mágica" nos Pirineus para encontrar a fortaleza dos
heréticos Cátaros do século XII. O problema é que, para eles, toda a suposta
beleza dos céus e da Terra era “obra de um demônio”. Mas para um turista
esotérico isso não importa: a jornada descrita pelo famoso escritor de best
sellers esotéricos Paulo Coelho confirma os principais mitos dessa agenda “new
age” cujo imaginário criou um subgênero na indústria do turismo. Os mitos dessa
jornada: Os “Sinais”, O “Todo”, Os “Lugares Especiais” e O “Antigo”.
Por “Anônimo” em
10/07/2013
Igreja Gnóstica
Jules-Stanislas Doinel nasceu em 1842 em Moulins, no Allier.
Doinel surge ligado a este assunto por ter sido um personagem essencial de um
movimento neocátaro que surgiu no final do século passado em França. A sua
carreira de arquivista e paleógrafo iniciou-se nos Archives du Cantal, e
posteriormente na Biblioteca de Loiret. Foi nesta última que ele encontrou uma
carta - com a assinatura de um chanceler episcopal, de nome Etienne, que fora
queimado em 1022, por heresia - algo que aparentemente mudou a sua vida.
Na busca de respostas
Doinel havia encontrado uma carta, na Biblioteca de Loiret,
assinada por Etienne, um chanceler episcopal que fora queimado em 1022 por
heresia. Foi através desta carta que Doinel tomou conhecimento
Jules Doinel |
As reuniões da seita tinham lugar em Orleães. Doinel
descobriu que uma mulher eslava tinha vindo da península itálica para
participar nos encontros, o que indica se tratar de alguém com importância para
os membros da seita. Possivelmente, a mulher seria uma bogomil, o nome pelo qual
são conhecidos os cátaros eslavos. Doinel conseguiu obter várias informações
sobre o que se passava nas reuniões dos popelicanos, possivelmente lendo os
documentos relativos ao processo do herético Etienne. As reuniões principiavam
com todos os participantes entoando litanias com uma vela acesa na mão.
Doinel filiou-se a diversas Ordens ocultistas no intuito de
obter informações e respostas as suas perguntas e percebeu que as pessoas que
tinham uma espiritualidade mais avançada participavam secretamente de sessões
do espiritismo kardecista. Começou então a freqüentar o kardecismo e ficou
muito surpreso, quando viu figuras conhecidas do ocultismo participando das
chamadas "mesas falantes". Começa então a se dedicar em seu
desenvolvimento mediúnico, sempre com o objetivo de obter respostas para o seu
intrigante manuscrito.
Foi então que, numa determinada sessão, na presença de
vários espíritas conhecidíssimos sete entidades espirituais manifestaram-se na
seção. Um deles incorporou em Jules Doinel e os demais seis se materializaram
na presença de todos os presentes. Era a resposta que Doinel procurava!
Tratava-se dos mártires cátaros que foram queimados na fogueira da inquisição,
e que teriam manifestado naquele dia para consagrar Jules Doinel como Bispo
Gnóstico e outorgar-lhe a missão de restaurar a Igreja Gnóstica no mundo.
Doinel, sentindo-se extremamente realizado, voltou aos
grupos ocultistas que participava, e com o aval dos altos dignitários das
Ordens mais respeitadas da França, e que outrora presenciaram secretamente o
fenômeno, instituiu a Igreja Gnóstica.
Nasce a Igreja Gnóstica
Deste evento, Doinel faz uma aliança com Papus, Grão Mestre,
e um dos membros fundadores da Ordem Martinista, consagrando-o Bispo. Papus em
retribuição, e sentindo a força da Iniciação recebida de Doinel, decretou que a
Igreja Gnóstica seria a Igreja oficial dos Martinistas.
Não demorou muito para a Igreja crescer. Pessoas de várias
partes do mundo vinham ver o que era aquilo que todos chamavam de "a nova
revelação".
Anos seguintes
Doinel percebia-se extremamente instável e assustado com o
crescimento da Igreja, e que tinha formação católica, viu-se num dilema entre a
fé e a razão, e guiado pela fé, arrependeu-se de sua obra, renunciando ao
patriarcado da Igreja e nomeando o Bispo Jean Bricaud como novo patriarca.
Jean Bricaud, agora patriarca, transformou a Igreja Gnóstica
em uma organização sólida, tão sólida que recebeu a sucessão apostólica
original de um Bispo ortodoxo (da Igreja Sirio-Jacobita), que tinha se
convertido ao gnosticismo.
Assim, a Igreja Gnóstica, além de sua sucessão cátara, agora
possuía a sucessão apostólica, o que a colocaria numa posição confortável
perante Roma.
A grandeza da Igreja Gnóstica, agora reconhecida por Roma
provocou um enorme arrependimento em Jules Doinel, que se sentiu traidor de sua
missão. Pediu um encontro com Jean Bricaud para voltar a Igreja. Nesse
encontro, Jean Bricaud fez questão de reunir todo o Sínodo para testemunhar a
conversa, onde Doinel, após explicar sua situação para Bricaud, insistiu em ser
recebido de volta à Igreja Gnóstica como Patriarca.
Bricaud, explicou a Doinel as razões legais e espirituais
para recusar a oferta. Então, por decisão do Sínodo da Igreja, Doinel voltou,
não como patriarca, mas sim como Bispo. Era a primeira vez na história que um
patriarca vivo voltava a condição de Bispo.
Em seu leito de morte havia um crucifixo e uma medalha de
Abraxas (divindade Gnóstica). Sua vida, cercada de excentricidade, foi marcada
pela solidão e pelo arrependimento. Suas últimas palavras foram de
agradecimento aos mártires cátaros. Testemunhas documentaram que ao último
suspiro de Doinel, uma névoa branca tomou conta do aposento e, na presença de
todos, Doinel aparece em pé, em forma etérea acima de seu corpo que estava
deitado na cama, com uma coroa e um cetro patriarcal, e ao seu lado, três
anciãos o escoltavam em direção aos céus.
Conclusão
Originalmente, a Igreja Gnóstica recebeu uma doutrina
essencialmente cátara, dando ênfase à pureza e a castidade. Tinha apenas 4
graus: Acólito, Diácono, Sacerdote e Bispo. Este foi o modelo original, criado
por Jules Doinel e que ainda existe em algumas organizações.
Posteriormente, o Patriarca Jean Bricaud acrescenta mais 4
graus: Tonsurado (ou Clérigo), Leitor, Exorcista e sub-Diácono, totalizando 8
graus. Assim iniciava dentro da Igreja Gnóstica um caminho operativo,
tornando-a uma Ordem Iniciática, diferente da proposta de Doinel, que seguia a
via da contemplação.
A doutrina pregada por Jean Bricaud tinha por base o
catarismo, mas com fortes influências maçônicas e ocultistas.
Essa doutrina durou alguns anos, até que Jean Bricaud
introduziu
elementos do cristianismo ortodoxo na Igreja, chegando até a
consagrar alguns Arquimandritas, que caracterizava os cleros branco (sem
celibato) e negro (celibatário) da Igreja Ortodoxa.
A doutrina ortodoxa foi logo retirada da Igreja, pois Jean
Bricaud sentiu que estava fugindo das origens de Doinel, ficando somente as
influências Maçônicas e ocultistas.
Com a rápida expansão da Igreja e, devido a autoridade e
independência dos Bispos, a Igreja Gnóstica ganha cada vez mais ramificações.
Assim, existem várias ramificações da Igreja Gnóstica, que
recebem os nomes de seus idealizadores:
- O ramo de Jules Doinel
- O ramo de Jean Bricaud;
- O ramo de Aleister Crowley
- O ramo de Krum Heller
- O ramo de Samael Aum Weor
- O ramo de Lucien Jean Maine
Estes ramos citados são os mais antigos e conhecidos, mas
existem dezenas de outras linhagens.
Algumas destas Escolas praticam uma Gnose mais pura, baseada
nas culturas pré-cristãs, com forte influência oriental. Outras Escolas
praticam uma Gnose com fortes influências judaico-cristã-islâmica.
Mas ainda existe uma terceira manifestação da Gnose, baseada
nos ensinamentos de Carl Gustav Jung. Esta Escola baseia sua Gnose na
psicologia, dando ênfase na interpretação das reações psicológicas do homem e
sua relação com o universo. Nesse ramo não existe clero nem sistema de graus,
sendo apenas uma metodologia de trabalho interior.
Um ponto em comum a todas estas Escolas é a Grande Virgem da
Gnose, Sofia, que é de fato a grande manifestação egregórica da Gnose.
Representa a base da doutrina e mãe de todas as organizações gnósticas,
inspirando a Igreja do invisível. Abaixo dela está São Miguel Arcanjo (ou
Mikael), que é o guardião da Igreja, agindo de forma disciplinadora. Sua
influência estende-se tanto a clérigos quanto a fiéis da Igreja Gnóstica. E
completando a Trindade de comando espiritual da Igreja está o Mestre.
Desconhecido, um Ser Espiritual que comanda a Igreja como um Patriarca
invisível, sendo o responsável pela administração e transmissão da Gnose no
mundo.
Drogas, discoteca e 3D: a materialização pop do místico e do sagrado
Postagem de 03/05/2013
Dos primeiros espaços sensoriais multimídia das discotecas dos anos 70 ao cinema 3D da atualidade, acompanhamos diante dos nossos sentidos a materialização tecnológica de toda uma dimensão mística e sagrada: a materialização dos simbolismos arquetípicos da espécie diante dos nossos sentidos por meio da convergência das mídias através das tecnologias digitais. Se no passado era necessário a ascese e disciplina espiritual para vivenciar essa dimensão metafísica, hoje as tecnologias sensorias prometem um atalho. Qual o destino da milenar aspiração mística e religiosa por transcendência num ambiente altamente tecnologizado sob o controle de grandes corporações?
Por “Anônimo”
em 05/04/2011
Ótimo post, me fez abrir os olhos para pontos que nunca havia
observado nessa industria cinematográfica atual. A tecnologia parece mesmo
estar de alguma maneira tentando suplantar a necessidade humana de experiências
numinosas.
Só discordo da conclusão sintetizada no último parágrafo. Você
fez uma comparação infeliz e mal fundamentada usando uma imagem já superada a
respeito das drogas ditas "lisérgicas".
As drogas "lisérgicas" ou psicodélicas não são viciantes
e nem destrutivas (isto é fato, basta pesquisar). O problema com essas
substâncias reside na incompatibilidade com esse modelo humano pós-moderno,
neurótico e hedonista, sem a mínima noção de ascese. Pode também, é bem
verdade, desencadear psicoses e outros estados mentais estranhos em pessoas
pré-dispostas a doenças mentais. Mas não há relação direta entre problemas
mentais e drogas psicodélicas. Veja o culto do Santo Daime, por exemplo, a
despeito dos problemas veiculados na mídia, foi totalmente sancionado por
especialistas médicos como segura a saúde. Não que seja partidário da filosofia
/ dogmatização desse culto (há perigos fascistas aí também), porém serve a
título de exemplo.
Na minha opinião, é sim um atalho para a verdadeira vivência da
teologia negativa, mencionada por você aqui no blog, com algumas resalvas.
A psilocibina (cogumelos), por exemplo, pode proporcionar
experiências de total rompimento com a totalidade, e digo por experiência
própria.