sábado, maio 03, 2014

Em Observação: "The Machine" (2013) - a ciência entre a humanidade e as sombras

Filme sugerido pelo nosso leitor Felipe Resende. A crítica destaca que a produção britânica “The Machine” combina temas do filme premiado pelo Oscar “Ela” e o clássico “Blade Runner” de Ridley Scott (1982). Em meio a uma nova Guerra Fria, dessa vez entre o Ocidente e a China, programadores de computador fazem pesquisas em Inteligência Artificial e neurociência até desenvolverem um androide com alma e consciência em um laboratório militar subterrâneo. O filme apresenta a ambiguidade atual das tecnociências que enquanto mantém esperanças altruístas nos benefícios humanos das descobertas científicas, convivem com a sombra de aplicações muito mais sombrias pelos poderes que as mantêm.


The Machine (2013)

Diretor: Caradog W. James

Plot: Dois programadores de computador se apaixonam pela primeira peça de inteligência artificial autoconsciente, projetada para ajudar a humanidade . Mas as coisas dão terrivelmente erradas quando o governo britânico rouba sua descoberta para ensina-la a tornar-se uma arma robótica.

Por que está “Em Observação”? - o filme se passa em um futuro próximo, onde Reino Unido e China estão envolvidos em uma nova Guerra Fria onde a corrida armamentista não mais envolve mísseis nucleares, mas agora o desenvolvimento de armas neurocientíficas e Inteligência Artificial. O cientista chefe Vincent McCarthy (Toby Stephens) está liderando um programa que implanta em soldados feridos interfaces neurais cibernéticas para tentar curar cérebros danificados. Mas suas ambições são mais humanistas: desenvolver uma verdadeira inteligência artificial capaz de empatia e aprendizagem. Um robô autoconsciente capaz não apenas de lutar, mas de negociar e manter a paz.

Após Vincent contratar uma brilhante programadora chamada Ava (Caity Lotz), são atacados por agentes inimigos e ela morre. Vincent tem então a ideia de pegar os dados fisiológicos e psicológicos de Ava anteriormente armazenados para criar a primeira androide em laboratório com uma “consciência”. Mas as emoções humanas que ele procura alimentar o protótipo são opostas aos que seus superiores militares planejam: pretendem transformar o androide numa máquina perfeita de morte e destruição.

O blog se interessou por esse filme inicialmente pelo fato de que os críticos vêm apontando que a narrativa faz um cruzamento entre Ela e o clássico Blade Runner: a conectividade afetiva entre homem/máquina incorporando aspectos distópicos e de thriller de ação como no filme clássico de Ridley Scott.

Mas o filme The Machine parece oferecer mais temas para discussão: primeiro, o tema da busca da última interface que resta na história da tecnologia; depois de o homem ter desenvolvido próteses e servomecanismos como extensões do corpo humano (interfaces mecânicas, termomecânicas, eletroeletrônicas e eletromecânicas) agora o homem busca a interface bioeletrônica através da qual a consciência migre para as redes eletrônico-neurais e abandone o corpo mortal. Denominamos essa motivação mística por trás das tecnologias de tecnognose em várias oportunidades – sobre esse conceito clique aqui.

Outro tema que o filme parece sugerir é a conexão entre as neurociências e os interesses político-militares. Sabemos que o discurso atual das neurociências é o mais altruísta possível: fazer deficientes físicos andarem por meio de exoesqueletos neuronalmente conectados, recuperar a qualidade de vida de acidentados, recuperação de danos neurológicos etc. Todos os esforços de cruzar Inteligência Artificial, neurociências, teoria da informação, psicologia cognitiva e tecnologias computacionais são divulgados através das mídias como pesquisas puramente médicas com objetivos terapêuticos.

Como já discutimos em outra oportunidade, o problema é: quem é o dono do hardware? Quais governos ou corporações financiam essas pesquisas e quais seus objetivos de médio a longo prazo? – sobre essa discussão clique aqui. Pesquisadores como o francês Paul Virilio argumentam que se olharmos por toda história da tecnologia, todos os avanços tecnológicos foram inicialmente aplicados militarmente para, mais tarde, seus subprodutos se tornarem gadgets para utilização civil. Foi assim com a corrida à Lua dentro da Guerra Fria EUA/URSS: produziu transistores, calculadoras de bolso, sistema GPS etc.

Mas hoje com as pesquisas neurocientíficas que pretendem fazer a cartografia e topografia da mente para desvendar o mistério da consciência e produzir máquinas militares e de exploração autônomas, vemos o inverso: primeiro as mídias divulgam os benefícios humanistas e altruístas dessas pesquisas como vitrina de opinião pública, enquanto secretamente se redesenha a corrida armamentista mundial. Esse é mais um tema do filme The Machine – a reconfiguração de uma nova Guerra Fria, não mais nuclear, mas agora neurocientífica.

O que esperar do filme? – A crítica aponta a ótima performance dos atores e que o roteiro do filme oscila entre satisfazer os fãs de produções de ficção científica “cabeças” e satisfazer os fãs dos thriller de ação. Parece que os dois objetivos estão limitados por uma produção de baixo orçamento. Visualmente muito bonito com a imagem em widescreen e uma fotografia que, mais uma vez, lembra Blade Runner com imagens noir em azul e negro.

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