Foi aceito o resumo expandido de um artigo científico desse
humilde blogueiro submetido à comissão de avaliação do II Congresso Internacional
Comunicação e Consumo - COMUNICON 2012, evento que será realizado nos dias 15 e
16 de outubro na Escola Superior de Propaganda e Marketing em São Paulo com o
tema “Comunicação, Consumo e Ação Reflexiva: caminhos para a educação do
futuro” (clique aqui para ver a programação). O resumo expandido refere-se ao artigo “Ad-gnose: a engenharia do
espírito na publicidade”.
O artigo será apresentado dentro do Grupo de Trabalho"Comunicação, Consumo e Cultura Contemporânea; Imagem, Cidade e Juventude"
“Ad-gnose” foi um conceito criado a partir das pesquisas
nesse blog sobre a linguagem publicitária contemporânea: as estratégias publicitárias atuais
estão para além do comportamental, subliminar ou da captura das fantasias
compulsivas ou impulsivas. Atualmente busca-se um nível mais profundo: o
repertório da simbologia arquetípica da espécie humana. A fase “Este é o
produto, agora compre-o!” foi deixada no passado para, em seu lugar,
consolidar-se a prospecção dos simbolismos mais profundos da alma humana que
procura apresentar o consumo como uma experiência espiritual de
autoconhecimento.
A
Publicidade parece que assimilou todas as críticas feitas a ela ao longo da
história (consumismo, superficialidade, frivolidade, materialismo etc.) e
procura demonstrar que mudou, se espiritualizou e não vê mais o consumo como
mero ato de aquisição, mas de enriquecimento espiritual.
É claro
que esse conceito de “Ad-Gnose” (advertising + "gnosis", iluminação espiritual) é crítico e irônico: buscar a experiência
espiritual (a transcendência) numa troca econômica (imanência) que pressupõe
todo um sistema econômico e político que se impõe como um princípio de
realidade é, na verdade, confinar as aspirações contidas nos arquétipos,
transformando-as em dócil e resignada motivação para o consumo.
Leia
abaixo o resumo expandido do conteúdo a ser discutido na COMUNICON 2012:
Ad-Gnose: a Engenharia do Espírito na Publicidade
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Depois de a Publicidade atingir o comportamento e o subconsciente com as
técnicas behavioristas e subliminares, e o inconsciente com as abordagens
psicanalíticas, temos agora o ápice com uma verdadeira engenharia espiritual: a
“Ad-Gnose” (Advertising + “Gnosis” ou “iluminação espiritual”). Para além do
comportamento e do inconsciente, o próximo alvo é o próprio “espírito” ou
camadas mais profundas do psiquismo com as abordagens arquetípicas cada vez
mais sofisticadas na Publicidade.
Há muito
tempo a Publicidade deixou de ser orientada pelo princípio comportamental do
“aqui está o produto. Agora compre-o!”. Desde o início a Publicidade esteve
envolvida com um aspecto mágico e fetichista. Karl Marx, na obra máxima “O
Capital”, já apresentava o capitalismo como uma fantasmagoria religiosa com a
noção de “fetichismo da mercadoria” (ao invés de Deus, o homem passa a
idolatrar e ser dominado pelo dinheiro, capital e mercadoria, entidades criadas
pelo próprio homem). Toda a tradição da chamada “Teoria Crítica da Sociedade”
vai identificar esse fenômeno na Indústria Cultural e na “Estética da
Mercadoria” na publicidade (velha e nova geração da Escola de Frankfurt –
ADORNO, HORKHEIMER, Dieter PROKOP e Fritz HAUG). Aqui, ainda temos essa
dimensão “mágica” ou “mística” confinada na materialidade do produto. É como se
o produto tivesse vida própria ao ser incorporado nele qualidades humanas ou
mágicas de transformação. Se o homem quer essas qualidades de volta, deve
adquirir o produto. Se o homem não consumir, estará vazio e sem propósito.
Para
disseminar esse verdadeiro simbolismo do consumo, ao longo do século XX a
Publicidade empregou diversas táticas de uma espécie de “engenharia
espiritual”: técnicas comportamentais (behaviorismo e táticas subliminares),
psicológicas (motivação, gratificação, cognição, necessidades psicológicas
etc.) e psicanalíticas (compulsão e dependência oral, narcisismo, voyeurismo,
erotismo etc.). Mas o que há em comum nessas técnicas é que seja o psiquismo ou
o subconsciente, continuam atrelados à existência física do produto.
Assim como
no passado onde o início da publicidade moderna originou-se no esforço em
desconectar o motivo da compra do produto da sua utilidade (obliterar o valor
de uso, fazendo o consumidor comprar o produto pela sua inutilidade), agora a
Publicidade deve dar um novo salto qualitativo: paradoxalmente fazer o produto
desaparecer no anúncio, transformando-o muito menos em algo a ser adquirido do
que ser experimentado como evento, jornada, descoberta ou renovação pessoal.
O primeiro
movimento para esse salto foi o surgimento da técnica de segmentação VALS
(Values, Advertising e Life Style) idealizada pelo futurólogo norte-americano
Arnold Mitchell nos anos 70 e aprimorada nos anos 90. Além da tipologia
psicológica, sua grande inovação foi a expansão do conceito de consumo:
consumir não é apenas comprar mas, sobretudo, desejar. Desejar valores e
estilos de vida. Mas ainda a técnica VALS mantém um laço, ainda que tênue,
entre o desejo e a aquisição produto.
No que
denomino como a estratégia da “Ad-Gnose” temos a imaterialidade plena do
produto. Para além dos valores e estilos de vida, algo mais profundo, no espírito,
deve ser mobilizado: os arquétipos: símbolos do inconsciente coletivo
aglutinadores de anseios, dúvidas e esperanças mais profundas da espécie
humana, tal como sugerido por Jung. Vivenciar um arquétipo seria como
conectar-se a uma rede simbólica do “inconsciente coletivo”.
Carol
Pearson, PhD em Psicologia e professora em Estudos sobre Liderança da Maryland
University nos EUA vai encontrar, a partir dos estudos da simbologia
arquetípica do psicanalista Karl G. Jung, doze modelos de simbologia inconsciente
que,segundo ela, motivariam a espécie humana: Inocente, Explorador, Sábio,
Herói, Fora-da-Lei, Mágico, Normal, Amante, Palhaço, Protetor, Criador,
Poderoso. A princípio voltado para servir de ferramenta para táticas de
engenharia organizacional, chega ao mundo do Marketing e da Publicidade como
conceitos orientadores de roteiros de vídeos publicitários e como estratégia de
criação da imagem de marcas (veja MARTINS, José. Arquétipos em Marketing, 1995).
Na
Ad-Gnose os arquétipos são traduzidas como “motivações”, fonte de energia para
serem aglutinadas e aprisionadas em narrativas e imagens que ponham em
movimento um novo imaginário: o consumo muito menos como um
ato de acúmulo e ostentação e mais uma oportunidade de buscar uma espécie de
atalho para a iluminação espiritual: comprar-consumir-espiritualizar-se.
Serão
feitos dois estudos de casos de vídeos publicitários: “Vida” (Lara/TBWA) da
ração para cães Pedigree e “Baia” (Olgivy & Mather) do chocolate Bis onde
analisaremos a estratégia da “Ad-Gnose” ao percebermos a articulação dinâmica
dos níveis das estruturas-clichê, retórico e arquetípico na linguagem desses produtos publicitários. As análises
procurarão perceber as três técnicas para a captura do arquétipo na linguagem: resignação, inversão e sombra.
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