quarta-feira, setembro 11, 2019

Ao invés de conquistar corações e mentes, Esquerda prefere ser o cão de Pavlov


O “cão de Pavlov” foi o protagonista de uma experiência que revolucionou a propaganda política e a publicidade do século XX. Há 100 anos o médico russo Ivan Pavlov descobriu o reflexo condicionado: apenas o som de uma sineta fazia o cão salivar de fome, mesmo sem ter na sua frente um prato de comida. Diante da repetição de estímulos diários através de bravatas, provocações escatológicas, chulas e autoritárias do Governo, a guerra semiótica criptografada tem jogado a esquerda e oposições num labirinto de informações desconexas, transformando-as em um cão de Pavlov pós-moderno que reage de forma reflexa aos estímulos. Saliva de ódio e reage com o fígado, ficando apenas nas trincheiras da “guerra cultural”. Enquanto o patrimônio nacional é rapidamente vendido na xepa do mercado. Em sua guerra particular, esqueceu das massas silenciosas, supostamente anestesiadas. Anestesiadas porque não conseguem ver as relações causa-efeito entre a xepa e a sobrevivência cotidiana uberizada. Sem nenhuma iniciativa de comunicação didática para esclarecer ao brasileiro comum essa relação causal e conquistar corações e mentes, prefere assumir o confortável papel de cão de Pavlov. 
Há 100 anos o célebre médico russo Ivan Pavlov realizou um experimento que iria mudar para sempre a natureza da propaganda política, além de criar o motor psicológico da sociedade de consumo e transformar a forma como o seu humano vê a si mesmo.
Pavlov descobriu o condicionamento das funções fisiológicas: treinou cachorros a ficarem com água na boca mesmo sem ter um prato de comida por perto.
Reflexo fisiológico diante da presença do alimento, Pavlov conseguiu que os animais salivassem mesmo sem a presença da comida com o simples som de uma sineta – toda vez que Pavlov os alimentava, tocava a sineta. Até o momento em que percebeu que mesmo com o prato vazio, a sineta fazia os cães babarem famintos. Pavlov descobria o reflexo condicionado.
Dos estímulos de propaganda (medo, provocação etc.) aos estímulos publicitários fazendo o papel da sineta de Pavlov que nos faz desejar coisas mesmo sem necessidade fisiológicas (fome, sede etc.), certamente foi o experimento mais influente do século XX. A partir daquela descoberta do médico russo, estava disponível mais uma ferramenta do imenso kit semiótico de manipulação das massas - sobre esse kit semiótico clique aqui.
Aqui no Brasil, como era esperado, a proximidade da simbólica data do sete de setembro fez as estratégias criptográficas para embaralhamento e confusão da opinião pública se intensificarem.
                       Principalmente quando a sineta pavloviana soa para produzir reflexos condicionados – no caso, não a saliva, mas a reação com o fígado, bem ao gosto da extrema-direita que precisa do ambiente de contínua conflagração e tensão. Como observou em cheio Romulus Maya do blog “Duplo Expresso” – clique aqui.



Presos num labirinto

Uma conflagração estratégica: deixar a esquerda perdida dentro de uma espécie de labirinto de informações, cheia de raiva e indignação. Enquanto lá fora do labirinto, o Estado, patrimônio e soberania nacional vão sendo fatiados, queimados, pulverizados ou simplesmente vendidos na xepa do mercado.
Confusa e sempre reagindo de forma reflexa ao som das sinetas (as provocações diárias de Bolsonaro elogiando torturadores, falando mal dos dotes estéticos de esposas de presidentes; ou a censura do prefeito Crivella mandando apreender livros LGBT na Bienal do Rio etc.), a esquerda está paralisada e sonhando com algum tipo de intervenção, um “Deus ex-machina” – velho truque em roteiros malconduzidos para designar soluções arbitrárias ou sem nexo na narrativa para solucionar becos sem saída.
A possibilidade de um impeachment... seja através da CPMI da fake news funcionando no Congresso... ou pelas atitudes chulas de Bolsonaro... ou pela fúria dos caminhoneiros que se sentem traídos ... ou, quem sabe, pelo Tribunal Internacional de Haia que puna Bolsonaro por “ecocídio... ou que, de repente, o STF caia em si e reconstitua o Estado de Direito libertando Lula.


Um laudo médico, pelo amor de Deus!

Um exemplo flagrante dessa ausência total de foco como cães de Pavlov que salivam sem ver o prato de comida é o artigo do veterano jornalista Ricardo Kotscho “Um ano após facada, quem está na UTI é o Brasil”.
De início, acertadamente, Kotscho faz o diagnóstico do sucesso da guerra criptografa de Bolsonaro: 
Já pensei mil vezes em mudar de assunto e deixar de falar no inominável, mas é impossível. Basta abrir o computador ou o jornal, ligar a televisão ou o celular, lá está ele falando merda, anunciando decisões malucas, contrariando a lógica e a ciência, desafiando repórteres e adversários, ofendendo e agredindo pessoas com seu vocabulário escatológico, defendendo torturadores - clique aqui.
O linguista e ativista Noam Chomsky também observa essa mesma estratégia alt-rigth de Donald Trump na qual a grande mídia, supostamente de oposição, cai feito patinho nas provocações diárias do presidente:
Olhe a televisão e as primeiras páginas dos jornais. Não há nada mais que Trump, Trump, Trump. A mídia caiu na estratégia traçada por Trump. Todo dia ele lhes dá um estímulo ou uma mentira para se manter sob os holofotes e ser o centro da atenção. Enquanto isso, o flanco selvagem dos republicanos vai desenvolvendo sua política de extrema direita, cortando direitos dos trabalhadores e abandonando a luta contra a mudança climática, que é precisamente aquilo que pode acabar com todos nós” - clique aqui.
“O que fazer?”, indaga Kotscho. Logo apresenta a solução, indicada pelo médico Vitor Buaiz, ex-prefeito de Vitória e ex-governador do Espírito Santo: sugerir à Sociedade Brasileira um laudo médico sobre o estado de saúde mental do presidente como fundamento para sua interdição.
Kotscho acaba invocando o mesmo modus operandi “Deus ex-machina”: suplicando algum tipo de intervenção externa à atual narrativa de um governo que, intencional e provocativamente, repercute tosquices, autoritarismo, escatologias e intolerância.
Soma-se a esse suposto laudo psiquiátrico que interditaria Bolsonaro, vídeo postado em perfis progressista de Macron confessando para um interlocutor na reunião do G7 sua vergonha alheia de Bolsonaro. Graças a reações como essas do presidente francês, a esquerda nutre a esperança que, de algum lugar do planeta, surja uma corrente de juristas, advogados ou pensadores “do Bem” que façam algum tipo de abaixo assinado que ajude a barrar Bolsonaro. Ou que a vergonha alheia do mundo, por si, enfraqueça o autoritarismo do mandatário.
Se nos EUA é a grande mídia liberal que cai na estratégia traçada por Trump, aqui é a esquerda e oposição que salivam como o cão de Pavlov a cada provocação. Qual a consequência? Reage com o fígado, se enche de ódio e indignação e tenta, de qualquer forma, revidar à altura “lacrando” com vídeos ou “textões” em redes sociais. 


Guerras culturais, o "libelo da Folha" e Bárbara Paz

O episódio da tentativa de censura do prefeito do Rio Marcelo Crivella de querer recolher na Bienal do Livro do Rio o gibi da Marvel “Os Vingadores: A Cruzada das Crianças”, na qual aparecia um beijo gay, é emblemático. Rendeu protestos, “beijaços” entre casais LGBT, além de impulsionar a própria venda do livro.
E mais: a esquerda saudou como “edição histórica” a primeira página do Jornal Folha de São Paulo na qual a imagem do beijo da HQ ocupa grande parte do espaço. Um “libelo da luta contra a censura e autoritarismo que tomam conta do País”, exultaram. Por participar das apurações da “Vaza Jato de Glen Greeenwald, de repente a Folha parece que se tornou uma aliada, supostamente “arrependida” em ter feito parte, no passado, da câmara de eco da Lava Jato e da guerra híbrida.
Mas diligentemente a Folha participa da guerra criptografada do governo atual publicando essa primeira página. Estrategicamente reforça a cegueira da esquerda e a bipolaridade da qual vive o clã Bolsonaro. Ajudando a estender o véu que esconde do brasileiro médio a bomba-relógio da agenda neoliberal. 
Pior ainda: blogs progressistas destacaram vídeo com discurso da atriz Bárbara Paz ao ser premiada no Festival de Veneza pelo documentário sobre a vida de Héctor Babenco. “Esse prêmio é importante para o meu país. Precisamos dizer não à censura: vida longa à liberdade de expressão", exaltou emocionada. 

“Um coro pela liberdade de expressão!”, sauda entusiasmada a esquerda.
                       Certamente um gesto tão heroico quanto o protesto da atriz Maitê Proença em manifestação no Rio em defesa da Amazônia ao lado de artistas progressista e de esquerda – logo ela que apoiava Bolsonaro afirmando que ele era “autêntico”.


Em 2013 Bárbara Paz ajudou a glamourizar a Guerra Híbrida brasileira

Com Bárbara Paz não é para menos: no auge da “revolução colorida” das manifestações de rua patrocinadas pela guerra híbrida (2013-16), estratégicas para a derrubada do governo Dilma, a atriz deu uma força ao protagonismo dos black blocs ao participar de ensaios fotográficos de moda que glamourizavam o ativismo dos “mascarados” que supostamente lutavam contra a “bandalheira nacional” e um governo “autoritário e policial” – veja fotos acima.  
Aliás, onde foram parar os black blocs com sua fibra patriótica?
Crivella e o governador do Rio Witzel (aquele que saltou do helicóptero com a pança balançando, dando pulinhos e socos no ar, comemorando o tiro mortal do sniper contra o sequestrador do ônibus da ponte Rio-Niterói) são exemplares dessa nova cepa da direita alternativa: eles sabem que só chegaram ao poder porque são hábeis em esconder sua verdadeira agenda - a neoliberal (cortar, acabar, destruir etc.). Afinal, essa agenda nunca rendeu votos no Brasil.


A declaração críptica de Tabata Amaral

Em sintonia com o clã Bolsonaro, produzem seus factoides diários (e assassinatos de inocentes por policiais no Rio) para atiçar ainda mais a “guerra cultural” diversionista. 
A chave de guerra semiótica criptografada está na declaração críptica da diáfana deputada federal Tabata Amaral: “[Governo Bolsonaro] tem acertos em infraestrutura e economia. Erros em Educação, Meio Ambiente e mulheres...”, afirmou candidamente. 
Em outras palavras, a bolsista da Fundação Estudar de Paulo Lemann (o milionário  suíço-brasileiro que financiou e deu apoio operacional ao Movimento Vem Pra Rua na “Revolução Popular Híbrida” brasileira) expôs o álibi da Guerra Criptografada: transformar Bolsonaro em pára-raios do ódio e indignação das esquerdas nas questões culturais, ambientais e identitárias, enquanto calmamente faz o “corta luz” para Paulo Guedes arregaçar o futuro social e econômico da Nação. 
E para embaralhar ainda mais a percepção política das esquerdas, Bolsonaro posa no palanque no desfile de sete de setembro em Brasília ao lado do Bispo Edir Macedo (TV Record) e Sílvio Santos (SBT). Mais uma vez a sineta pavloviana soa: atiçada, a esquerda comemora a ironia de Bolsonaro ser supostamente inimigo da poderosa TV Globo...
Mais um embaralhamento das peças do quebra-cabeças: outra vez Bolsonaro faz o “corta-luz”, dessa vez para a própria Globo continuar a desempenhar calmamente seu papel estratégico. Cria-se uma suposta imagem “imparcialidade” da emissora, já que Bolsonaro é seu “inimigo” ao apoiar o jornalismo chapa branca do SBT e Record.


Esquerda esqueceu das maiorias silenciosas

Como até aqui o STF não teve coragem em restabelecer o Estado de Direito, o “Deus Ex-machina” não acontece e Bolsonaro com sua trupe continuam com a verborragia desbocadamente estudada, a oposição e a esquerda entram em desespero. E passam então a reclamar da passividade dos brasileiros e jogam a culpa na população: “Há uma espécie de anestesia”, reclama o líder da oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ).
Como abordamos em postagem anterior na verdade há, por assim dizer, uma “sabedoria” nessas maiorias silenciosas. Desde que Lula foi condenado e preso, acreditava-se em lutas monumentais, resistências em trincheiras. Esperava-se um país paralisado e mobilizado, tornando a nação ingovernável para os usurpadores – clique aqui.
Mas tudo o que vimos até aqui foi silêncio das ruas, das favelas e periferias, enquanto os cidadãos se uberizam, perdem direitos e garantias trabalhistas e sociais, e o Governo celeremente vende tudo na bacia das almas.
E que sabedoria há nesse silêncio? Até aqui, absorvida pelas guerras culturais impulsionadas pelas bravatas, provocações e escatologias de Bolsonaro e seus indefectíveis ministros, a esquerda não teve até aqui a menor intenção de conquistar corações e mentes dessa maioria silenciosa.
Em nenhum momento teve a iniciativa de explicar didática e pedagogicamente para o brasileiro comum das ruas no que as reformas, privatizações e fatiamento do pré-sal prejudicam e prejudicarão ainda mais o seu dia-a-dia no presente e no futuro.
 Seja através de formas físicas como folders, cartilhas ou a construção de sites, newsletters ou quaisquer formas de mídias alternativas à superficialidade das redes sociais. Aproveitar a estrutura partidária ou a máquina sindical para produzir veículos de comunicação que não falem somente para os convertidos.
Para a maioria silenciosa, falar em reformas ou privatizações é falar apenas sobre “política” e, por isso, uma coisa que parece muito distante da luta pela sobrevivência do cotidiano.
Agora a esquerda brada uma pesquisa realizada pelo Datafolha de que 70% dos brasileiros são contrários às privatizações – clique aqui. Mas, infelizmente, o cidadão comum não consegue ligar “lé com cré” – para ele, tudo não passa de uma discussão “política” ou “politicagem”. Números de uma pesquisa que não refletem o quanto os pesquisados não conseguem estabelecer uma ligação direta entre as dificuldades na sobrevivência cotidiana e a entrega do patrimônio público.
Fosse clara essa ligação, as ruas poderiam estar ocupadas por protestos.
Podem até se colocar teoricamente contra as privatizações. Mas isso não é uma “opinião” mas “racionalização” (como apontava o sociólogo Pierre Bourdieu, essa é a falácia principal das pesquisas de opinião no texto “A Opinião Pública Não Existe” – clique aqui) para esconder o desconhecimento das relações causais e o impacto das políticas neoliberais com a suas próprias vidas.
A sabedoria dessa apatia das maiorias silenciosas reflete a própria desistência da esquerda pela conquista dos corações e mentes das massas. Esse “silêncio” ou “apatia” das massas deveria servir de denúncia para como a esquerda desistiu da comunicação (busca de formas didáticas e pedagógicas que expliquem nexos e relações de causa e efeito para o cidadão) para se tornar uma espécie de cão de Pavlov que saliva de ódio toda vez que ouve a sineta soar através da grande mídia.

Postagens Relacionadas



Tecnologia do Blogger.

 
Design by Free WordPress Themes | Bloggerized by Lasantha - Premium Blogger Themes | Bluehost Review