quarta-feira, março 21, 2012
A Metástase do Mal no Filme "REC 2 - Possuídos"
quarta-feira, março 21, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A crítica
especializada é unânime em afirmar que “REC 2 - Possuídos” ([REC]2, 2009) decepciona
em relação ao primeiro filme. Por outro lado, sua virtude parece ser a de
confirmar as teses do sociólogo polonês Zygmunt Bauman a respeito da era da
“modernidade líquida” onde as noções de “saúde” e “doença” tornaram-se
instáveis e imprecisas. O resultado é uma cultura obcecada pela saúde cujo horror à
contaminação viral é a sua melhor metáfora, explorada nas últimas décadas por
uma galeria de filmes onde “REC 2” torna-se o mais novo integrante. O vírus
como o “outro lado” da saúde, aquilo que está adormecido como uma bomba relógio
pronta para entrar em metástase a qualquer momento. Assim como os zumbis
possuídos pelo Mal que, de repente, pululam por todos os lados no prédio em
quarentena de “REC”. O Mal como metástase, dessa vez demoníaca.
Quando o filme espanhol “REC” estreou em 2007 todos se
surpreenderam com a proposta da dupla de diretores Jaune Balagueró e Paco
Plaza. Um filme que fugia dos pastiches dos filmes de zumbis atuais, fazendo
juz à saga iniciada com “A Noite dos Mortos Vivos” de George Romero em 1968: os
zumbis agora vistos pelo ponto de vista da epidemiologia e vigilância
sanitária. Repórter, cinegrafista e bombeiros
presos em um prédio posto em quarentena enquanto uma espécie de vírus se
propaga e zumbis pululam por todos os lados. A narrativa fazia realmente a
câmera existir na realidade do filme com imensos planos sequência e forte sensação
de realismo documental.
Três anos depois, e com mais
dinheiro para a produção, a dupla de diretores retorna para o mesmo prédio
momentos depois do término do primeiro filme. Agora vemos as imagens da própria
SWAT espanhola que vai entrar no prédio posto em quarentena com a função de
proteger o Dr. Owen, um suposto sanitarista que vai procurar uma resposta para
a estranha contaminação.
Como avisa o título, Dr. Owen
vai descobrir que as pessoas que se transformaram em raivosos e violentos
zumbis não estão meramente infectados: elas podem estar possuídas por uma
entidade demoníaca que se propaga viralmente.
domingo, março 18, 2012
A controvérsia sobre a definição do termo "Gnosticismo"
domingo, março 18, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Mestrando pela Universidade de Lisboa, o nosso leitor Douglas Remonatto nos envia uma contribuição para a discussão em torno de termos tão fugidios como Gnosticismo e Gnose. De heresia cristã, hoje reconhece-se o Gnosticismo como um sistema autônomo e paralelo às grandes religiões, embora composto por diversas correntes. Portanto, é necessário compreender como cada corrente interpreta concepções associadas ao Gnosticismo como dualismo, centelha divina presente no homem, entre outros.
ATUALIDADES DO GNOSTICISMO
ATUALIDADES DO GNOSTICISMO
Por Douglas A. Remonatto
Hoje, mais que nunca, sabe-se que muitos problemas circundam uma possível definição do termo “Gnosticismo”. É necessário, para bem compreender a complexidade conferida a esse termo, possuir uma visão ampla do fenómeno, observando-o em cada momento de sua especificidade histórica.
A tentativa de uma análise mais profunda, no campo
filosófico, do fenómeno que hoje denominamos “gnosticismo” é algo relativamente
novo. No entanto, mesmo em meio a sua contemporaneidade, muitas das abordagens
académicas disseminadas já encontram-se ultrapassadas. Isso por que os
critérios metodológicos utilizados por alguns pesquisadores[1] há três décadas atrás, já não se enquadram dentro da perspectiva critica
histórico-filosófica actual.
Nos primeiros séculos cristãos era possível
encontrar um número muito grande de correntes ditas gnósticas (Ásia Menor,
Síria, Palestina, Egito…). Esta diversidade esteve presente de tal maneira ao
longo da história que hoje, os pesquisadores, já não se propõem a encontrar uma
única definição para o termo “gnosticismo” e passaram a assumir a sua
pluralidade. Logo, o mais correto seria falar de gnosticismos.
sexta-feira, março 16, 2012
Uma Estranha Distopia no Filme "O Homem Que Incomoda"
sexta-feira, março 16, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
É uma alegoria religiosa? Uma declaração
política? Um filme de horror e fantástico? Ou uma sátira surrealista sobre a superficialidade da sociedade de consumo? Certamente é tudo isso, o que torna o
filme norueguês “O Homem Que Incomoda” (Den Brysomme Mannen, 2006) uma estranha distopia: um homem sem memórias
preso em uma espécie de mundo alternativo que, de tão perfeito e correto, a
comida não tem sabor ou cheiro e o álcool não embriaga. Não temos o tom de
crítica política explícita sobre estados totalitários como em livros ou filmes
como “1984” ou “THX 1138”. Mas presenciamos o esgarçamento da noção de
realidade ao representá-la como algo fabricado, artificial e essencialmente
corrompido (um simulacro), como uma armadilha cósmica criada por alguém que não
nos ama. O resultado do ardil de alguma divindade maquiavélica.
Com seu terno
amarrotado, despenteado barba e boné de beisebol puxado para baixo sobre os
olhos, Andreas Ramsfjellf (Trond Fausa Aurvaag) desembarca de um ônibus em um
posto de gasolina em ruínas no meio do nada. Ele
não lembra como veio parar ali e quem ele é. Ao chegar é saudado
por um estranho sob uma faixa estendida escrito "Bem Vindo". O estranho
leva Andreas em um carro, passando por arredores rochosos e áridos até chegar a
uma cidade nas cercanias de um verde luxuriante, onde os casais felizes jogam
badminton e todos sorriem e passam o tempo discutindo sobre consumo e decoração. O estranho entrega
para Andreas as chaves do seu novo apartamento e o endereço do seu novo emprego.
Tudo sobre a
vida nova Andreas parece perfeito, mas durante a sua hora de almoço, ele começa
a sentir que algo não está certo. Ninguém
parece notar um homem morto, brutalmente empalado pelas grades da cerca de um
prédio. Os transeuntes passam indiferentes diante do sangrento cenário,
enquanto calmamente o corpo é removido por estranhos agentes que nunca
demonstram emoções.
Naquela noite
em um bar, Andreas percebe que não importa o quanto ele consuma bebidas alcoólicas:
ele permanece sempre sóbrio. Alimentos não
têm qualquer gosto ou cheiro. No dia
seguinte no trabalho, Andreas submete-se a um impulso perverso de enfiar o dedo
em uma máquina trituradora de papéis. Seus colegas
de trabalho reagem com uma estranha calma. Quando volta a si, Andreas percebe
que o dedo de alguma forma foi recolocado no lugar e está completamente curado.
sábado, março 10, 2012
O filme "REC" e a Natureza dos Monstros Contemporâneos
sábado, março 10, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Longe dos pastiches dos atuais filmes sobre zumbis, o espanhol “REC”
(2007) faz jus à saga iniciada por George Romero em 1968 com “A Noite dos
Mortos Vivos”: os zumbis são vistos por um ângulo diferente como um problema de
epidemiologia e vigilância sanitária (repórter, cinegrafista e bombeiros presos
em um prédio posto em quarentena enquanto o vírus se propaga e zumbis pululam
por todos os lados). Por isso, “REC” faz parte de imensa galeria de novos
monstros que vão dos zumbis de Romero à criatura de “Cloverfield – Monstro” (2008)
que romperam com o paradigma clássico da monstruosidade (“o disforme, o feio e
o mau”). O que há por trás dessa mudança da representação dos monstros no
cinema contemporâneo?
De um momento para o outro a situação se converte em um infernal pesadelo: quando tentam sair do prédio descobrem que a polícia fechou todas as saídas, agentes sanitários estão lacrando o prédio sob um inédito “protocolo NBC” que se usa frente a ameaças de armas nucleares, biológicas e químicas. Todos caem em si. O prédio está infectado por uma bizarra doença que enlouquece tornando-as espécie de zumbis raivosos que atacam as vítimas para comê-las ou apenas mordê-las, transmitindo a doença por meio de sangue e saliva.
O filme inicia com uma jovem e
telegênica apresentadora (Angela Vidal) do programa “Enquanto Você Dorme” que
apresenta a vida daqueles que trabalham nas madrugadas. Nessa noite Angela,
junto com o seu cinegrafista Pablo, vai passar a noite em um agrupamento de
bombeiros para mostrar sua rotina. Percebemos que a narrativa transcorrerá por
meio da tensa estética de ponto de vista de uma câmera de mão, pontuada pelo
liga-desliga da câmera, trepidações, e longos plano-sequência tal como a
estética dos já clássicos filmes como “A Bruxa de Blair” e
“Cloverfield-Monstro”.
Tudo transcorre em amenidades
sobre a vida dos bombeiros até o agrupamento receber um chamado sobre uma
senhora que supostamente estaria presa em um apartamento, gritando
histericamente e deixando os vizinhos assustados. Angela, Pablo e mais dois
bombeiros entram no prédio e são recebidos por um apavorado grupo de moradores
e dois policiais diante de uma sinistra escada em espiral que conduzirá ao
apartamento onde se iniciará o pesadelo: lá encontram uma senhora idosa, em pé,
transtornada e enraivecida com a pele repleta de espécie de feridas e pústulas.
Ela investe contra um deles e morde violentamente o pescoço provocando uma
hemorragia fatal.
De um momento para o outro a situação se converte em um infernal pesadelo: quando tentam sair do prédio descobrem que a polícia fechou todas as saídas, agentes sanitários estão lacrando o prédio sob um inédito “protocolo NBC” que se usa frente a ameaças de armas nucleares, biológicas e químicas. Todos caem em si. O prédio está infectado por uma bizarra doença que enlouquece tornando-as espécie de zumbis raivosos que atacam as vítimas para comê-las ou apenas mordê-las, transmitindo a doença por meio de sangue e saliva.
sexta-feira, março 09, 2012
Resposta ao Post "A Dialética Negativa: Theodor Adorno Gnóstico"
sexta-feira, março 09, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Por Douglas A. Remonatto
Uma resposta de Douglas Remonatto (mestrando em Filosofia pela Universidade de Lisboa) à postagem anterior "Dialética Negativa Theodor Adorno Gnóstico": Se Adorno revela-se gnóstico em sua Negative Dialektik (1966), mais gnóstico ainda é Hegel. Este esquema especulativo apresentado por Hegel é de origem claramente gnóstica, análoga à peregrinação pela qual a centelha alienada (pneuma) dos gnósticos regressa de seu exílio no cosmo à plenitude original (pleroma) via a um autoconhecimento essencialista e absoluto (gnosis)
Uma resposta de Douglas Remonatto (mestrando em Filosofia pela Universidade de Lisboa) à postagem anterior "Dialética Negativa Theodor Adorno Gnóstico": Se Adorno revela-se gnóstico em sua Negative Dialektik (1966), mais gnóstico ainda é Hegel. Este esquema especulativo apresentado por Hegel é de origem claramente gnóstica, análoga à peregrinação pela qual a centelha alienada (pneuma) dos gnósticos regressa de seu exílio no cosmo à plenitude original (pleroma) via a um autoconhecimento essencialista e absoluto (gnosis)
Se para Adorno a dialética positiva de Hegel erra ao abandonar a realidade concreta, ignorando a experiência do particular em prol de uma busca por transcendência através da “síntese do Espírito Absoluto”, para Hegel não buscar nada além da experiência pessoal é iludir-se com fragmentos do processo teleológico, sem nunca ter a possibilidade de contemplar o processo como um todo, nos privando assim de autodescobrirmos nossa essencialidade.
E se Adorno revela-se gnóstico em sua Negative Dialektik (1966), mais gnóstico ainda é Hegel cujo pensamento filosófico tem por base o processo pelo qual, de uma situação alienada, o espirito passa a se encontrar em si mesmo através do conhecimento de sua verdadeira natureza absoluta. Este esquema especulativo apresentado por Hegel é de origem claramente gnóstica, análoga à peregrinação pela qual a centelha alienada (pneuma) dos gnósticos regressa de seu exílio no cosmo à plenitude original (pleroma) via a um autoconhecimento essencialista e absoluto (gnosis).
quinta-feira, março 08, 2012
"A Dialética Negativa": Theodor Adorno Gnóstico (atualizado)
quinta-feira, março 08, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Ao ler dois tópicos do livro “Dialética Negativa” de Theodor
Adorno ("Experiência Metafísica e Felicidade"e "Niilismo")
encontramos uma crítica à religiosidade vulgar, aquela que iguala o impulso por
transcendência à busca do chamado "sentido para a vida". Para Adorno,
se manifestamos a dúvida se a vida poderia ser dotada de sentido é porque a
existência não tem sentido mesmo: através dessa “via negativa” ele identifica
nessa religiosidade vulgar um movimento que apenas reforça a Totalidade que
cria em nós o mal estar e o desespero que nos faz em vão buscar um sentido para
a dor. Mas Adorno surpreendentemente busca uma alternativa de libertação: o
niilismo gnóstico e elege Marcel Proust como o exemplo para o seu projeto da "Dialética Negativa".
"O
Todo é a Verdade" (Hegel)
"O Todo é o Falso" (Adorno)
Considerada a obra de maior envergadura do filósofo e expoente da chamada
Escola de Frankfurt, Theodor Adorno, “A Dialética Negativa” (1966) é não
somente um acerto de contas com o hegelianismo no último livro da sua vida. É
também uma supreendente busca de esperança de saída após obras apocalíticas
como “A Dialética do Esclarecimento” e todos os estudos em torno do conceito de
Indústria Cultural que apontavam para cenários monolíticos de dominação do
Capitalismo Tardio.
Através da “via negativa” Adorno vai buscar a alternativa na “metafísica
em queda”, ou seja, ao invés de buscar a transcendência no Absoluto, ele vai encontrar
a Verdade no particular, no precário, no singular, na experiência
irreprodutível. Isto é, em tudo aquilo que a filosofia Ocidental liquidou em
nome das abstrações (Logos, Deus, Mercadoria e Capital) e dos conceitos.
sábado, março 03, 2012
As Feridas da Civilização do Automóvel no Filme "Crash - Estranhos Prazeres"
sábado, março 03, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Ao mostrar pessoas que constroem uma estreita relação entre acidentes automobilísticos,
prazer sexual e morte o filme “Crash –
Estranhos Prazeres” (Crash, 1996) do cineasta David Cronenberg torna-se
perturbador não somente por explorar os limites entre a pornografia e a
violência. O que há de inquietante nesse filme é a possibilidade de estarmos não
apenas diante de perversões e obsessões de personagens perdidos em um submundo,
mas diante do fato de que a tecnologia atual torna-se um atraente fetiche e
objeto de fantasias de fusão entre metal e carne, despertando forças do
inconsciente que estavam adormecidas.
Desde a Revolução Industrial e a invenção de máquinas cada
vez mais poderosas e fascinantes, críticos, teóricos, artistas plásticos e
cineastas têm explorado os efeitos das tecnologias. Fundador do movimento
futurista, Marinetti defendia os efeitos da tecnologia: velocidade, mudança,
limpeza e purificação. Os surrealistas foram rápidos em explorar as conexões
entre tecnologia e desejo. Buñuel em seu escandaloso filme “Um Cão Andaluz” (Un
Chien Andalou, 1929) retrata um homem sexualmente excitado pela visão de uma
jovem mulher atropelada por um automóvel em alta velocidade.
Três décadas antes, Emile Zola fazia uma conexão similar no livro “A
Besta Humana” onde escrevia: “Ela adorava acidentes: qualquer menção de um
animal atropelado, um homem cortado em pedaços por um trem, obrigava-a a correr
para o local”.
Épicos envolvendo desastres produzidos por máquinas fascinaram
o cinema desde o início: “Titanic” (versões 1953 e 1997), “Inferno na Torre”
(1994), Aeroporto (1970), sem falar os filmes sci fi que exploram as relações
entre homem e robô (“Metrópolis”- 1927), homem e ciborgue (“Exterminador do
Futuro”, 1984), carne e metal (“Tetsuo, The Iron Man”, 1989) e o amor entre
homem e uma replicante (“Blade Runner”, 1982)
Baseado no livro homônimo de J.G. Ballard, o filme “Crash –
Estranhos prazeres” do diretor canadense David Cronenberg vai associar-se a
esse rico patrimônio, porém de uma forma radicalmente diferente ao erotizar os
dois principais fundamentos da modernidade: a tecnologia e o acidente. Se o
pesquisador francês Paul Virilio estiver correto, esses dois fundamentos
estruturam a experiência da modernidade: “toda tecnologia que é inventada, toda
nova energia que é aproveitada, todo novo produto que é fabricado, também
inventa uma nova negatividade, um novo tipo de acidente” (Veja VIRILIO, Paul. “Velocidade
e Informação - Cyberspace Alarm!”)
quarta-feira, fevereiro 29, 2012
Em "Mais Estranho Que a Ficção" Deus é um Mau Escritor
quarta-feira, fevereiro 29, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Mais Estranho que a Ficção (Stranger
Than Fiction, 2006) propõe uma interessante ironia: e se nossas vidas
não passarem de plots de uma narrativa literária? Tramas da obra de um mal
escritor, uma divindade, um "Deus Ex-Machina" (termo para
designar soluções arbitrárias, sem nexo ou plausibilidade na narrativa, para
solucionar becos sem saída encontrados em roteiros mal conduzidos). É o
velho tema da batalha do ser humano contra um Demiurgo que quer impor uma
narrativa fatalista e luta pelo despertar do livre-arbítrio dentro do
reino da fatalidade. Um irônico paralelo entre Teologia e Literatura: Deus é uma má escritora que tenta matar o protagonista da sua obra.
Harold Crick (Will Ferrell) é um auditor da Receita Federal que leva uma
vida solitária e rígida, governada por números (ele sempre conta o número de
vezes que escova os dentes verticalmente e horizontalmente), pelo seu relógio
de pulso e pela rotina. Seu apartamento é impessoal como um quarto de hotel,
sem objetos pessoais, fotografias, memórias ou desordem.
Mas, em uma manhã, Harold começa a ouvir uma voz narrando suas ações:
“um modesto elemento da sua vida considerada normal poderá ser o catalisador para
uma nova vida”, diz a estranha voz vinda aparentemente do céu. Imerso num
cotidiano de números e cálculos, pela primeira vez cria uma nível meta (ou
consciência de transcendência espiritual?) na sua vida: quem é esse narrador
onisciente? De que plano provém? Harold passa a ser perseguido por essa voz em
off, até descobrir seu propósito: narrar a iminente morte de Harold.
sábado, fevereiro 25, 2012
Uma Jornada Espiritual Vira Pesadelo no Filme "Beyond The Black Rainbow"
sábado, fevereiro 25, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Uma das mais estranhas
sci fi dos últimos tempos, o filme canadense “Beyond The Black Rainbow” (2010) do
estreante Panos Cosmatos explora dois paradoxos: primeiro de ser uma ficção
científica que não é ambientada nem no futuro ou passado, mas em uma espécie de
“futuro do passado” envolta em uma atmosfera kubrickiana de “2001” e nos
mistérios metafísicos dos filmes do russo de Tarkovsky; e segundo ao mostrar
como uma jornada espiritual pode se converter em um pesadelo autoritário. Com
isso Cosmatos faz um acerto de contas com a chamada geração “baby boomer” que
teria fracassado em buscar a espiritualidade em “ocultas e sombrias regiões”.
“Ela abriu estranhas
portas que nunca mais se fecharam”
(David Bowie, “Scary
Monsters” - 1980)
Lançado em 2010 “Beyond The Black Rainbow” (passou por
alguns festivais na Europa e no ano passado teve sua premier no Tribeca Film
Festival nos EUA) é um sci fi paradoxal: retro e ao mesmo tempo futurista, uma
espécie de “futuro do passado”. Grande parte da narrativa se passa em um “futurista”
ano de 1983 e em uma estranha e opressiva clínica onde um estranho homem
realiza estranhas experiências com uma garota.
A narrativa procura desvendar os mistérios do Instituto
Arboria onde uma bela jovem chamada Elena (Eva Allan) com poderes psíquicos é
mantida prisioneira por um cientista chamado Barry Nyle (Michael Rogers)
envolvido em uma complexa experiência psicológica. Nyle tem um objetivo
místico-espiritual: a busca da “paz interior” por meio de uma delirante e
alucinógena jornada em estilo LSD controlada por uma sinistra tecnologia à base
de drogas.
O filme é a estreia do diretor e roteirista Panos Cosmatos
(filho de George P. Cosmatos, diretor de filmes na década de 1980 como “Rambo:
First Blood”, “Stallone Cobra” e “Tombstone”), onde cuidadosamente reproduz a atmosfera
futurista de Kubrick em “2001” com salas e corredores sinistramente brancos e
assépticos, o design clean e geométrico de clássicos futuristas como “THX 1138”
e referência aos enigmas metafísicos dos filmes sci fi do russo Tarkovsky
(“Solaris” e “Stalker”). Isso sem falar nas referências do lado terror do
filme: Cronenberg, Argento e John Carpenter.
segunda-feira, fevereiro 20, 2012
As Nuvens Atônitas: Temas Gnósticos no Cinema Popular
segunda-feira, fevereiro 20, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
As sequências em "bullet time" do filme "Matrix" ("The Matrix", 1999) teriam se inspirado em trechos dos Evangelhos Apócrifos Gnósticos do início da Era Cristã? As narrativas do cinema hollywoodiano atual parecem se estruturar em dois mitos: o "monomito" da jornada do herói (Queda,Martírio, Morte e Ressurreição) e o "insight" místico de que a realidade é uma ilusão.
Em
minhas pesquisas iniciais sobre Cinema e Gnosticismo no Mestrado, o texto “The
Clouds Astonished – Gnostic Themes in Popular Cinema” (As Nuvens Atônitas –
Temas Gnósticos no Cinema Popular) foi um dos primeiros subsídios encontrados
na Internet. O problema é que o texto parece ser apócrifo, apenas assinado por
iniciais ou pseudônimo. Há tempos esse texto circula por fóruns de discussão
sobre cinema, sem se saber exatamente a fonte.
A
despeito da sua natureza não-científica, o texto oferece um interessante
paralelismo entre as visões criadas em trechos dos evangelhos apócrifos
gnósticos e sequências de filmes, como no filme “Matrix”: os efeitos em “bullet
time” e o congelamento de ações e objetos enquanto a câmera gira comparado com
a imagem descrita no Evangelho “Atos de João” que descreve o momento do
nascimento de Cristo onde as “nuvens ficaram atônitas” e os “pássaros pararam”
em pleno voo.
Além
disso, o texto sugere uma estrutura mítica a partir da qual os filmes gnósticos
são construídos: em primeiro lugar esses filmes partilhariam de um “monomito”
comum a todos os filmes, a narrativa do “herói de mil faces” tal como descrita
pelo historiador e mitólogo Joseph Campel (veja CAMPBEL, Joseph. “O Herói de
Mil Faces”, Pensamento, 1995) – o drama da jornada de queda, martírio, morte e
ressurreição do herói. Sobre essa narrativa comum o filme gnóstico construiria
outra narrativa arquetípica: o súbito “insight” do herói de que a realidade
seria uma ilusão.
O
texto ainda lança uma hipótese para o súbito aparecimento de temas míticos
gnósticos no cinema popular contemporâneo: esses filmes expressariam uma nova
sensibilidade a partir do surgimento das interfaces virtuais e os efeitos com
imagens geradas em computador: o crescimento dessas tecnologias no horizonte
cultural que sugere uma noção plástica da realidade, como uma estrutura
ilusória que poderia ser construída e manipulada.
Confira
abaixo esse texto:
quinta-feira, fevereiro 16, 2012
O Sono da Ciência no filme "Ladrão de Sonhos"
quinta-feira, fevereiro 16, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
“Ladrão de Sonhos” (La Cité dês Enfants Perdus, 1995) é um dos poucos filmes a representar o cientista longe dos clichês do “louco” ou do “diabólico”, condenado à punição por tentar se equiparar a Deus. A dupla de diretores Marc Caro e Jean-Pierre Jeunet ("O Fabuloso Destino de Amelie Poulain", 2001) cria uma estranha comédia de humor negro onde o cientista é retratado como um Demiurgo: através de uma Ciência prometéica, cria um cosmos corrompido onde o sono não tem sonhos. Por isso, ele terá que raptar crianças para extrair delas as imagens dos sonhos e trazer algum élan para um mundo sem vida.
Na história do cinema há uma longa tradição em representar “cientistas” (sábios, gênios, magos, alquimistas, mágicos ou o cientista propriamente dito) como personagens enlouquecidos, estranhos, sociopatas, manipuladores ou simplesmente amorais e anti-éticos. De qualquer forma, todos eles são punidos ou por ultrapassarem os limites estabelecidos pela moral da civilização ou por tentarem se equiparar a Deus. Exemplos não faltam através dos mais diversos gêneros: “Frankenstein”(1931), “O Cérebro Que Não Queria Morrer” (The Brain That Wouldn’t Die, 1962), “O Parque dos Dinossauros (Jurassic Park, 1993), “A Ilha do Dr. Moreau” (The Island of Dr. Moreau, 1996) etc.
Mas poucos filmes apresentam estes personagens como “Demiurgo” (para Platão era aquele que modela a matéria caótica e para o Gnosticismo o criador do Mundo Inferior onde o homem está aprisionado ), isto é, não mais como personagens puníveis moralmente por tentarem se equiparar a Deus, mas como artífices que fracassam pela presença do Mal nas suas criações.
Essa elaboração do personagem do cientista no cinema como um Demiurgo tem suas origens em narrativas míticas das escrituras gnósticas: o Demiurgo como uma forma híbrida de consciência emanada dos planos superiores, criadora do cosmos como uma cópia imperfeita de Planos Superiores e essencialmente corrompida. Inebriado pelo Poder, julga ser a única divindade do Universo porque esqueceu as suas origens. Sabendo que o seu cosmos é uma criação física imperfeita, necessita da fagulha de Luz humana para pô-lo em funcionamento. Por isso, mantém a humanidade prisioneira através do sono.
Cristoff, o poderoso diretor de um gigantesco reality show que aprisiona o protagonista no filme “Show de Truman” (The Truman Show, 1998) é um exemplo de filme que apresenta uma experiência televisiva por uma perspectiva simbólica do Demiurgo.
O filme “Ladrão de Sonhos” (La Cité dês Enfants Perdus, 1995) da dupla Marc Caro e Jean-Pierre Jeunet (“O Fabuloso Destino de Amelie Poulain”, 2001) é um outro exemplo. Como veremos, o filme praticamente segue a descrição que fizemos acima sobre o personagem gnóstico do Demiurgo.
domingo, fevereiro 12, 2012
O Anti-nostálgico "A Vida em Preto e Branco"
domingo, fevereiro 12, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
As décadas de 70 e 80 foram marcadas pela nostalgia em filmes como "Star Wars" ou "De Volta Para o Futuro". Ao contrário, "A Vida em Preto e Branco" (Pleasantville, 1998) desmistifica a nostalgia em uma década onde ela não era mais necessária por motivos ideológicos para Hollywood. Em um intrigante roteiro metalinguístico (repleto de analogias religiosas e bíblicas), um seriado em preto e branco da década de 1950 vai se tornando colorido na medida em que os personagens descobrem a sexualidade e o acaso.
Todo filme é um documento histórico sobre o imaginário,
sensibilidade ou ideologia de uma determinada época, uma expressão cultural de
tendências e acontecimentos econômicos ou políticos que acabam criando uma
agenda de temas considerados como pertinentes para a opinião pública. E sabemos
que a indústria hollywoodiana é a principal produtora desses documentos, verdadeiros sintomas do espírito de cada
época.
Dessa maneira, na década de 1980 do governo Ronald Reagan
quando as políticas neoliberais estavam sendo implantadas a fórceps, era
necessária uma produção cultural que elevasse o orgulho e autoestima
nacionalistas feridos pelas derrotas militares no Vietnã e crise do petróleo da
década de 1970.
Vemos nesse momento um conjunto de filmes nostálgicos (“De
Volta Para o Futuro” ou “Peg Sue: Seu Passado a Espera” são exemplos) onde os
valores e cultura da década de 1950 são resgatados como as verdadeiras raízes
que foram dolorosamente perdidas; ou ainda os filmes de retro-fantasia (“Star
Wars” ou a trilogia “Indiana Jones”) que resgatavam aventuras esquemáticas dos
quadrinhos e seriados das décadas de 1940-50.
Na década de 1990 vimos o triunfo das políticas neoliberais
e a Globalização sob o impulso da financeirização e microinformática comandados
pelos EUA do presidente democrata Bill Clinton. “A Vida em Preto e Branco”
(Pleasantville, 1998), dirigido e escrito por Gary Ross, é talvez o filme
representativo dessa década. Embora a narrativa retrate os anos 90 como tempos marcados pela ameaça de catástrofes climáticas, AIDS, fome e crise de valores
éticos e morais, o filme é anti-nostálgico. Não havia naquele momento qualquer
necessidade por nostalgia já que a Globalização e a revolução digital eram
discursos messiânicos que prometiam o melhor dos futuros.
quarta-feira, fevereiro 08, 2012
Uma Mercadoria Chamada Cometa Halley
quarta-feira, fevereiro 08, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Vinte e seis anos depois do último grande fenômeno astronômico (a passagem do cometa Halley pela imediações da Terra cercado mensagens "new age" de paz, boas novas e otimismo), agora as notícias sobre a suposta visita de um misterioso corpo celeste com diversos nomes para as mais variadas crenças (Nibiru, Planeta X, Hercólobus, Marduk, planeta “Chupão” etc.) vem acompanhado de previsões apocalípticas. Por que essa mudança de sensibillidade e simbolismos em relação a fenômenos celestes? Talvez a resposta esteja na mercantilização dos fenômenos celestes pela indústria do entretenimento.
Após o último post sobre o filme “Another Earth” (veja links abaixo), lembrei-me de um artigo de minha autoria de priscas eras, do tempo em que era repórter de Economia no
Jornal “A Tribuna de Santos”, lá pelos idos de 1986.
Apesar de trabalhar na época em uma
editoria de assuntos tão áridos, meu verdadeiro interesse era mesmo pela área
cultural. Numa dessas puladas de cerca dos limites da editoria, consegui
emplacar um artigo no suplemento de cultura do jornal, um texto que refletia
sobre a histeria mercadológica que envolvia um fenômeno astronômico de
importância naquele ano: a passagem do cometa Halley que de tão próximo da
Terra seria visível a olho nu.
O que chamou a atenção naquele ano foi a onda de produtos e
mensagens das mais diversas áreas (desde Astrologia e Espiritualismo até Moda,
Turismo e HQs) que, em linhas gerais, associavam ao fenômeno astronômico prenúncios de
boas novas, otimismo, renovação e saúde para a espécie humana. O que tornou o
cometa Halley um fenômeno de “New Age” (movimento espiritual buscando
a fusão Oriente/Ocidente ao mesclar autoajuda, psicologia motivacional,
parapsicologia, esoterismo e física quântica).
Curioso, pois se em toda a História a passagem de corpos
celestes era interpretado como prenúncio de guerras, pestes e cataclismos (e na
última passagem do Halley em 1910 não foi diferente – chegou-se a falar que o
gás da calda do cometa envenenaria a atmosfera da Terra, criando um onda de
pânico), em 1986 o cometa se transfigurou em arauto de novas e promissoras
eras.
Mas por que 26 anos depois as notícias sobre a passagem de
um misterioso corpo celeste com diversas nomeações (Nibiru, Planeta X,
Hercólobus, Marduk, planeta “Chupão” etc.) é marcada por profecias apocalípticas?
Lendo aquele artigo de 1986 pode-se arriscar uma tese:
naquela época em que o movimento ecumênico da New Age crescia, o cometa Halley
foi investido de um simbolismo que ajudou a expandir a consciência da “Nova
Era” que seria um dos pilares ideológicos da Globalização pós-queda do Muro de
Berlin em 1989.
sábado, fevereiro 04, 2012
O Encontro Através de um Espelho Cósmico em "Another Earth"
sábado, fevereiro 04, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Nibiru, Planeta X, Calendário Maia, Hercólobus, Marduk, planeta “Chupão” etc. Em uma época de filmes que vão na esteira dessa onda dos mais variados cenários apocalípticos para esse ano, o premiado filme independente "Another Earth" (2011) é um contraponto e ao mesmo tempo um sopro de renovação dentro do gênero sci fi: a proximidade de um estranho corpo celeste na órbita da Terra não promete catástrofes que representem punições morais e nem universos paralelos onde encontraremos mundos alternativos. O mergulho no cosmos não significa encontrar novos mundos ou civilizações, mas um problemático encontro com nós mesmos através de um espelho.
Nibiru, Planeta X, Calendário Maia, Hercólobus, Marduk,
planeta “Chupão” etc. Toda essa série de profecias do fim do mundo tem muito
mais a dizer sobre o sintoma da sensibilidade coletiva atual do que sobre um
fato astronômico concreto. O filme independente “Another Earth” (conquistou
dois prêmios no festival de Sundance), ao lado do “Melancolia” de Lars Von
Trier, é o que mais expressa esse significado por trás dessa onda de apocalipses
previstos para esse ano.
Há uma característica comum na série de filmes-catástrofe
sobre o fim do mundo que nos vem preparando para o apocalipse final (“2012”, “Armagedon”,
“O Dia Depois de Amanhã”, “Impacto Profundo”, “Presságio” etc.): todos eles
recorrem ao recurso metonímico de deslocar o foco das catástrofes para um drama
pessoal familiar ou afetivo para arrancar identificação do espectador. Mostrar
cataclismas em escala global não tem graça se deixar de mostrar também
protagonistas que tentam juntar os cacos emocionais e afetivos enquanto se
esforçam para salvar o planeta.
Mas o filme “Another Earth” não vai por esse roteiro clichê.
A proximidade de outro planeta da Terra não produz catástrofes, ameaças ou
desespero, mas mistérios, questionamentos científicos, metafísicos e íntimos.
quarta-feira, fevereiro 01, 2012
Chaplin: "Os Ricos Compram o Barulho"
quarta-feira, fevereiro 01, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Ao contar a história da transição do cinema mudo para o falado, ironicamente por meio da estética em preto e brancob e sem som, o filme "The Artist" (indicado ao Oscar de melhor filme) faz diversas referências ao mais famoso resistente à sonorização: Charlie Chaplin. Ele acreditava que tal inovação destruiria a "abstração cômica" forma que, segundo ele, universalizaria o cinema. Mas havia uma dimensão política por trás dessa resistência: atacado pelas elites culturais na década de 1920 pelo "baixo nível" dos seus filmes voltados para trabalhadores, imigrantes e desempregados via na sonorização o enquadramento político e moral decisivo dos cinema pelos grandes estúdios: "os ricos compram o barulho", denunciava.
Ao assistir ao filme "The Artist" (que concorrerá ao Oscar de Melhor Filme, Ator, Roteiro, entre outras indicações) não há como não deixar de lembrar de Charlie Chaplin pelas diversas referências que a narrativa faz, principalmente as sequências do protagonista empobrecido vagando pelas ruas com o fiel terrier Uggie o acompanhando. As referências a Chaplin são propositais já que, assim como ele, o protagonista George Valentim resiste o quanto pode à tecnologia da sonorização dos filmes. Mas se em "The Artist" a resistência de Valentim é por narcisismo e orgulho (quintessência do galã dos filmes mudos), na História real a resistência de Chaplin foi principalmente por motivos estéticos e políticos.
Isso ficou claro nas informações expostas ao público em uma mostra chamada "Chaplin e sua Imagem" no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, no ano passado. Com 200 fotografias, cartazes, documentos inéditos a Mostra apresentava a trajetória dos 54 anos de carreira do cineasta inglês Charlie Chaplin, desde os primeiros filmes pela Keystone de Nova York em 1914. Caminhando pelas quatro salas cedidas pelo Instituto para a Mostra, logo de cara fomos surpreendidos com a gênese do personagem Carlitos nos estúdios da Keystone: mais rude, agressivo e amargo, bem diferente da imagem do “adorável vagabundo”, idealista, romântico e nobre dos filmes da fase da United Artists (1919 a 1939).
No meio do trajeto, encontramos todo um painel dedicado ao filme “Luzes da Cidade”, um filme ainda mudo realizado quatro anos após o primeiro filme sonorizado da história (“The Jazz Singer”, 1927). Chaplin era um grande resistente à introdução do som no cinema e “Luzes da Cidade” foi uma resposta com uma produção de interessantes aperfeiçoamentos técnicos, tornando-o um dos dez melhores filmes na história do cinema para diretores como Orson Welles e Stanley Kubrick.
domingo, janeiro 29, 2012
Filme "The Man From Earth" Desconstrói a Religião e a Ciência
domingo, janeiro 29, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Um filme indispensável tanto para ateus, religiosos, gnósticos, agnósticos ou cientistas. O filme "The Man From Earth" é composto por uma narrativa de 90 minutos de puro ceticismo e desconstrução tanto da Religião quanto da Ciência. Um homem revela ter 14 mil anos de idade, mas tudo o que um grupo de cientistas e professores descobre é um ser com a mesma consciência de um homem comum que luta pela sobrevivência, sem qualquer lição metafísica ou teológica a oferecer.
quinta-feira, janeiro 26, 2012
Pink Floyd: A "Bad Trip" da Cultura Psicodélica
quinta-feira, janeiro 26, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Comparando os dois momentos da banda Pink Floyd representados pelo filme "Pink Floyd The Wall" de Alan Parker e o documentário “The Pink Floyd and Syd Barrett Story” é flagrante o contraste entre o imaginário pulsante, enérgico e desafiador das origens da banda na era psicodélica e a narrativa amarga e pessimista da trilogia final ("Animals", "The Wall" e "Final Cut"). A perda da dimensão épica do rock psicodélico, cujas armas eram o surrealismo e o “non sense”, derrotada pelo princípio de realidade: o indivíduo que, impotente, só lhe resta a vitimização, auto-indulgência e pena de si mesmo.
O filme “Pink Floyd The Wall” de Alan Parker está fazendo 30 anos. Embora o baixista e líder do Pink Floyd Roger Waters tenha ficado insatisfeito com essa adaptação cinematográfica do álbum duplo “The Wall” de 1979, o filme tornou-se um Cult, consenso de crítica entre os fãs da banda e críticos. A música “Another Brick in the Wall” virou um hino libertário e o solo de guitarra de Guilmour na lindamente triste “Confortably Numb” é até hoje arrepiante.
Mas depois de três décadas é necessário um olhar em
perspectiva tanto para o filme como para o álbum. Principalmente depois de se
assistir ao documentário inglês “The Pink Floyd and Syd Barrett Story” (2003),
onde é contada a história de Syd Barrett, membro fundador da banda e
protagonista indiscutível da cultura psicodélica. É interessante compreender as
origens do Pink Floyd dentro do experimentalismo underground da cultura
psicodélica na década de 1960 e como se tornou como banda de frente do rock
progressivo e rotulado como “dinossauro” pela emergente cultura punk/new wave
à época do lançamento tanto do álbum quanto do filme de Allan Parker.
sexta-feira, janeiro 20, 2012
Deus Está Morto no Filme "Zardoz"
sexta-feira, janeiro 20, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
“Esquisito”, “pretensioso”, incompreensível”, “kitsch”.
Mesmo após 38 anos muitos que assistem ao clássico de ficção científica “Zardoz” (1974) ainda têm algumas dessas
opiniões. Mais ainda, muitos não conseguem compreender o tom da narrativa: será
uma sátira, um drama, uma tragicomédia? Um filme estranho por apontar para um
novo modelo de ficção científica para a época, não mais utópico ou distópico, mas “hipo-utópico”:
chegamos ao futuro e ele não mais existe. Uma elite encontra a imortalidade e descobre
que Deus é um artifício: uma cabeça de pedra voadora que comanda o extermínio
de humanos para extirpar o mal da face da Terra.
O filme dirigido por John Boorman ("O Exorcista II-O Herege" e "Excalibur") é marcado por duas imagens
bizarras: uma gigantesca cabeça de pedra voadora que diz ser o deus Zardoz e Sean Connery (à época com 43 anos) fazendo um personagem brutal, trajando uma
espécie de tanga vermelha, um par de botas até os joelhos, com uma arma na mão
e uma longa cabeleira com trança, ou seja, o oposto da imagem sofisticada e
sexy que o imortalizou como James Bond nos anos 60.
Após ver o fracasso do projeto de uma adaptação cinematográfica
do livro de J.R.R. Tolkien “O Senhor dos Anéis”, John Boorman escreveu o
roteiro de “Zardoz” carregado de simbologia mística e esotérica e com uma ácida
crítica ao papel da religião como forma de dominação. Com um orçamento
baixíssimo e roteiro repleto de sequências e ideias surreais, o resultado foi
uma direção de arte que chega ao mal-gosto e até roupas de extras tingidas para
reaproveitar os figurinos.
Para compreendermos o porquê da estranheza que "Zardoz" provoca até hoje, temos que inserir o filme dentro de um especial tipo de
subgênero sci fi pós-moderno: o que
poderíamos chamar de “hipo-utopia”, para distinguir de termos como distopia e da
própria utopia.
segunda-feira, janeiro 16, 2012
Uma Semiótica do Poder das Imagens
segunda-feira, janeiro 16, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Uma imagem vale mais que mil palavras. Essa frase atribuída
a Confúcio resume a natureza do mais potente aparato de transmissão: a imagem.
Se Confúcio referia-se ao poder dos ideogramas , forma de comunicação simbólica onde duas ou mais imagens são fundidas
em um conceito, no Ocidente a imagem viveu uma verdadeira saga a partir das
origens rituais até ser convertida em feitiço ou fetiche - da religião à moderna Publicidade e Propaganda.
A genesis das imagens está nos rituais de morte e
fertilidade, vida e renascimento. A imagem como manifestação do invisível, a
representação de quem morreu para imortalizá-lo. Uma constelação de palavras
gravita em torno do conceito de imagem, todas elas derivadas dessas origens:
simulacrum (o espectro, fantasma), Imago (a máscara de cera, reprodução do
rosto do defunto), eidolon (ídolo, a alma do defunto que sai do cadáver, de
natureza tênue e, por isso, ainda corpórea, espectro). Todas essas ideias vão
se aglutinar depois no conceito de retrato, imagem.
Sendo ela simultaneamente uma vitória sobre a morte e
perpetuação pública de um ser ativo e radiante, a imagem abre as portas para a
divinização: para o homem do Ocidente é a sua melhor parte, seu eu imunizado e
posto em lugar seguro. A glória do herói grego, a apoteose do imperador romano
e a santidade do papa cristão representados por imagens (estátuas, moedas e
vitrais) ao longo da História atestam esse poder de transmissão não só da
divindade ou imortalidade, mas, também, da crença e do Poder.
Se pretendemos fazer uma semiótica não da imagem em si (já
farta na bibliografia da área), mas do seu poder na transmissão de crenças,
temos que analisá-la em um duplo aspecto: o religioso e o semiótico, isto é,
entender como a exploração religiosa vai fazer o ícone regredir para as formas
mais míticas e mágicas da imagem ao explorá-la como propaganda. Indo além,
entender como as modernas formas de Propaganda como a Publicidade são novas
versões do princípio religioso da exploração das imagens.
sexta-feira, janeiro 13, 2012
Em "Dead Set" o Reality Show Ri de Si Mesmo
sexta-feira, janeiro 13, 2012
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O gênero “reality show” já consegue rir de si mesmo? É o que parece quando descobrimos que a produtora holandesa Endemol, cujo maior produto é o “reality show”, produziu a série da TV inglesa chamada “Dead Set” (2008) onde uma epidemia transforma o mundo em zumbis... menos os participantes e a produção de um Big Brother que nada sabem o que está acontecendo fora dos muros da emissora. Combinando extrema violência, ironia e humor negro, a série faz referências às principais críticas e indignações contra o gênero. Se a Endemol consegue rir de si mesma é porque por trás há duas estratégias bem definidas: “Agenda Setting” e “tolerância repressiva”.
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