sexta-feira, janeiro 24, 2020

Cresce aprovação a Bolsonaro: a esquerda à sombra das maiorias silenciosas


Era uma vez uma Oposição que achava que bastaria deixar Bolsonaro governar, tarefa para a qual é evidentemente desqualificado... e deixar sangrar até se demitir. Um ano depois, as coisas não estão bem assim: os números da pesquisa de opinião CNT-MDA deste mês revelaram um crescimento na aprovação a Bolsonaro. E que mais da metade dos entrevistados confia nas três grandes redes televisivas: Globo, Record e SBT. Bolsonaro continua um desqualificado (o início do apagão do serviço público começou com crises no INSS e Enem), mas a vitória, até aqui, na guerra da comunicação dá a vantagem da prestidigitação: a sua “guerra cultural”, na qual ganha de 7 X 1 de uma esquerda que caiu no alçapão deixado pela extrema-direita – a mídia progressista se esfalfa em denunciar que Bolsonaro é misógino, sexista, miliciano, pró-ditadura...  e daí? Para a maioria silenciosa, sobrevivendo no cotidiano, tudo isso é abstrato, “politicagem”. A grande mídia cria o chamariz com a pauta da guerra cultural (identidade, gênero, raça, etnia, meio ambiente etc.), aprisionando a esquerda em seu tautismo (tautologia + autismo midiático) – abandona a comunicação direta com a maioria silenciosa e se desconecta do deserto do real: a economia.

Bolsonaro é machista, misógino, fascista, miliciano, intolerante, xenófobo, ofende mulheres, índios, é sexista, racista, pró-ditadura militar, negacionista das mudanças climáticas e indiferente às questões ambientais. Não só a esquerda, mas também a grande imprensa nacional e internacional, acusa o ex-capitão da reserva de tudo isso... e daí? 
O que isso significa para o povão, imerso nos problemas do dia-a-dia entre o desemprego e o trabalho uberizado? Nada!
Pelo menos é o que sugere a Pesquisa CNT de Opinião, realizada em parceria com o Instituto MDA, de 15 a 18 de janeiro de 2020, mostrando os índices de popularidade do governo e pessoal do presidente Jair Bolsonaro.
Segundo a pesquisa encomendada pela Confederação Nacional do Transporte, a aprovação do desempenho pessoal do presidente Jair Bolsonaro registrou um salto significativo, de 41% para 48%; sua rejeição, por sua vez, caiu de 54% para 47%.
E isso num período que ocorreu o fato político mais significativo: a soltura do ex-presidente Lula, no início de novembro.




Também houve uma melhora expressiva na avaliação do governo: O percentual dos que acham o governo ótimo, passou de 8,0% para 9,5%; e os que acham o governo péssimo caíram de 27% para 21%. Somando as notas ótimo e bom, o governo registrou aprovação positiva de 34,5%, contra aprovação negativa (ruim e péssimo) de 31%. Na pesquisa anterior, de agosto, a aprovação positiva somava 29%, contra 39% de negativa.
Mais importante do que isso é a percepção e a confiança da população em relação à grande mídia. Mais da metade confia nos três grandes canais de mídia: Globo, SBT, Record.

A opinião pública não existe

Os resultados dessa pesquisa foram recebidos pelos blogs e sites progressistas, em sua maioria, entre o lacônico e a indiferença – entre a notícia sem análise ou simplesmente virando as costas e não falando nada sobre o assunto. 
Uma dessas exceções foi “O Cafezinho”, do jornalista Miguel do Rosário, que não só deu a notícia como também analisou os números que, segundo ele, representam um desafio para as estratégias de comunicação da esquerda – clique aqui
É claro que este Cinegnose partilha da tese do sociólogo Pierre Bourdieu: a opinião pública não existe! – nas pesquisas sempre a chamada “opinião” se confunde com “percepção” ou “sensação”. Ainda mais no contexto atual da pós-verdade: um grande arco que vai do menosprezo por fatos objetivos até a ignorância racional e o efeito “Dunnig-Kruger” – indivíduos acreditam saber mais do que especialistas por estarem abastecidos por clichês, sofismas e frases prontas transmitidas pela grande mídia e redes sociais.
Portanto, toda “pesquisa de opinião” deve ser recebida com um pé bem atrás. Porém, se ficarmos no campo das percepções e sensações os números da pesquisa MDA são importantes, principalmente porque a chamada Guerra Híbrida busca exatamente esse resultado – não se trata mais de propaganda política no sentido clássico (como inculcação político-ideológica ou doutrinária), mas de gerar atmosferas, sensações e dissuasão não mais numa opinião pública. Mas agora, num contínuo midiático atmosférico.


A dupla agenda

Nesse momento o contínuo midiático está ocupado por uma dupla agenda: de um lado, a guerra cultural que a grande mídia trava contra Bolsonaro (de ilações sobre as conexões do presidente com milícias e o assassinato de Marielle às pautas identitárias, étnicas, gênero e meio ambiente que ocupam o jornalismo corporativo); e do outro o clima de “agora vai” do crescimento econômico – das histórias motivacionais de desempregados numa enorme fila que acham emprego à maquiagem do desemprego através de contos igualmente motivacionais sobre empreendedores, que na verdade não passam de autônomos ou precarizados.
Essa é a agenda tautista (Tautologia + autismo midiático) que cria um fechamento operacional que isola o sistema midiático da realidade. O problema é que a esquerda é apenas reativa a esse contínuo midiático: vive, respira e reage à pauta definida pelas polêmicas criadas pela grande mídia e repercutida nas redes sociais.
A esquerda tautista é capturada por essa guerra já perdida por antecipação: a chamada “guerra cultural”, locus privilegiado da extrema-direita porque tira o foco da missão para qual ela chegou ao poder – cumprir à risca a agenda econômica neoliberal.
Bolsonaro apoia o feminicida goleiro Bruno? Roberto Alvim fez um vídeo nazi-fascista? Bolsonaro humilha Moro? Bolsonaro quer devastar a Amazônia? Um ministro tem sobre a sua mesa um livro enaltecendo o torturador Brilhante Ustra? A ministra quer abstinência sexual no Carnaval? A esquerda vive esse debate em looping, tautológico, reagindo com o fígado. O Ministro da Educação xinga Paulo Freire?
Vive por procuração o mesmo tautismo midiático. 


Guerra híbrida, guerra criptografada

O significa tudo isso para a maioria silenciosa? O que significa essa pauta para o brasileiro comum que corre, pedala ou dirige contra o tempo com uma mochila do Uber Eats nas costas? O que representam as denúncias de feminicídio, misoginia, racismo, intolerância para uma desempregada que vive na informalidade vendendo brigadeiros e café numa térmica num ponto de ônibus? Ou então para aquele estudante universitário que luta para pagar a mensalidade vendendo doces veganos para os colegas nos intervalos? 
A resposta a essas perguntas está expressa nos números da pesquisa CNT-MDA. 
A chamada “guerra ciptografada” é uma mutação da guerra híbrida após o impeachment de 2016. A linha de passes combinada entre Governo e jornalismo corporativo cria dissonâncias, ataques, provocações propositais, sempre no âmbito das batalhas “culturais” – finge conflitos e produz conflitos artificiais.
Por exemplo: Bolsonaro cortou verba publicitária da Globo? Ora, a Globo já há algum tempo é rentista – basta ver seu intervalo publicitário ocupado por bancos, empresas de crédito pessoal e corretoras de investimentos, valores e títulos. 
Denunciar Bolsonaro e sua trupe familiar e de ministros de fascistas e ditadores nada quer dizer para as massas. Para o cidadão comum imerso nos problemas cotidianos não passa de “politicagem”, um bate-boca particular entre a esquerda e seu malvado favorito.
O problema mais profundo é que essa guerra criptografada é confortável para a esquerda porque realiza seu pressuposto: o kantismo (relativa ao filósofo Emmanuel Kant) – a crença na boa vontade e no senso de obrigação moral em relação aos direitos universais.


O “nazista” Roberto Alvim: inside job?

A esquerda cai no alçapão da guerra cultural porque as provocações calam fundo e escandalizam – atingem os valores kantianos universais da dignidade, cidadania e liberdade. 
Um vídeo tão canastrão quanto o de Roberto Alvim (emulando Goebbles através da roupa, corte de cabelo, fisionomia e gestual, disposição cenográfica – bandeira, foto e a cruz – e ainda com trilha musical de Wagner ao fundo... bem, Alvim foi diretor de teatro) arranca indignação da esquerda e linhas de postagens e minutos com vídeos de denúncias indignadas.
Tão canastrão, overacting e estereotipado que até parece planejado – um esquete tão hilário quanto aqueles do programa de TV “Monty Python Flying Circus” da trupe inglesa de humor. Teria sido um “inside job” para manter a esquerda ocupada nesse loop interminável?
Para a maioria silenciosa, tudo não passa de politicagem e por isso se apega “no pensamento positivo, a alguma esperança de que as coisas vão melhorar”, como aponta o jornalista Miguel do Rosário. E acrescenta:
Ironia mais cruel é testemunhar o governo de extrema direita de Jair Bolsonaro inaugurar uma estratégia de comunicação que, com todos os seus imensos defeitos (autoritarismo, falta de educação, etc.), ao menos se esforça para manter uma comunicação direta com o público. Se a então presidenta Dilma tivesse se disposto a fazer 10% do que Bolsonaro faz em termos de comunicação, talvez não tivesse visto seu capital político ruir tão dramaticamente, e poderia ter evitado o impeachment.

O que fazer?

A esquerda ainda não percebeu os sintomas de uma espécie de “refeudalização da esfera pública”, muito próximo daquilo que Habermas (“Mudança Estrutural da Esfera Pública”) e Umberto Eco (“A Nova Idade Média”) antecipavam como movimento histórico regressivo: absorvidas pelos seus problemas cotidianos e amedrontadas, as pessoas escondem-se nas suas vidas privadas, alheias ao que se passa lá fora – na Idade Média, o poder político da Igreja e as Cruzadas. Hoje, escondem-se alheias às ameaças aos direitos e a vida cada vez mais difícil.
O que fazer? Sair dessa bolha tautista da guerra cultural com um discurso propositivo. O incipiente apagão do serviço público (represamento dos benefícios do INSS e os graves problemas dos gabaritos do Enem) que promete se agravar ao longo do ano é o desgaste anunciado do governo junto às questões cotidianas dos brasileiros. 
É um tema que a esquerda até aqui não explorou, enquanto está hipnotizada por coisas como a canastrice do ministro da cultura demitido.
As pitonisas e oráculos midiáticos da pauta econômica falam diariamente que a economia “pegou tração” e que a recuperação é “lenta”, mas “constante” e que até o final de 2020 tudo melhorará.
Então é o caso de cobrar, propositivamente, as melhorias – mostrar para os brasileiros se alguma coisa está mudando no seu cotidiano.
Mais do que falar em “frentes amplas” contra o fascismo e a escalada do autoritarismo (“fascistas não passarão!”), coisa abstratamente incompreensível para a maioria silenciosa imersa nos problemas do dia-a-dia, é necessário mergulhar na economia cotidiana – de forma didática, pedagógica.
Como abordamos em postagem anterior, na verdade há, por assim dizer, uma “sabedoria” nessas maiorias silenciosas – clique aqui
Por exemplo, desde que Lula foi condenado e preso, acreditava-se em lutas monumentais, resistências em trincheiras. Esperava-se um país paralisado e mobilizado, tornando a nação ingovernável para os usurpadores. Mas tudo o que viu foi silêncio das ruas, das favelas e periferias.
E que sabedoria há nesse silêncio? Até aqui, absorvida pelas guerras culturais impulsionadas pelas bravatas, provocações e escatologias de Bolsonaro e seus indefectíveis ministros, a esquerda não teve até aqui a menor intenção de conquistar corações e mentes dessa maioria silenciosa.
Em nenhum momento teve a iniciativa de explicar didática e pedagogicamente para o brasileiro comum das ruas no que as reformas e privatizações prejudicam e prejudicarão ainda mais o seu dia-a-dia no presente e no futuro.
 Seja através de formas físicas como folders, cartilhas ou a construção de sites, newsletters ou quaisquer formas de mídias alternativas à superficialidade das redes sociais. Aproveitar a estrutura partidária ou a máquina sindical para produzir veículos de comunicação que não falem somente para os convertidos.
A sabedoria dessa apatia das maiorias silenciosas reflete a própria desistência da esquerda pela conquista dos corações e mentes das massas – a busca de formas didáticas e pedagógicas que ajude a explicar nexos e relações de causa e efeito para o brasileiro que afunda a cara no aplicativo achando que um dia sua força de trabalho magicamente vai se transformar em capital. 

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