Tal como os
violinistas do Titanic, a grande mídia sabe que terá que tocar a música até o
fim – as instituições entraram em acelerado estado deterioração: o “aerococa”
da comitiva de Bolsonaro, pego pela polícia espanhola, é apenas um pequeno
indício. Diante da audiência com Glenn Greenwald na Câmara (verdadeira aula de
jornalismo investigativo que valeu mais do que todos os congressos da Abraji),
na qual o jornalista alertou que nenhuma intimidação evitará as publicações do site
“Intercept” porque está amparado pela Constituição, a grande mídia sabe que
chega rápido ao seu “vanish point” – as máscaras terão que desaparecer e o
jornalismo ser rifado. Por isso que, paralelo à bomba relógio que representa a
Vaza Jato, a grande imprensa vem se “ajustando” ao que está por vir: a última
cruzada – afastamentos, demissões em massa e ameaças nas redações para manter
os jornalistas firmes nas rédeas e antolhos.
Paralelo ao terremoto da
Vaza Jato detonado pelo site Intercept, liderado
pelo jornalista Glenn Greenwald, a grande mídia televisiva parece iniciar um
movimento de “ajustes” para enfrentar o que estar por vir. Se não, vejamos:
a)
Como é do feitio dos rompantes de Silvio Santos, o SBT promoveu demissões em
série no seu Departamento de Jornalismo, cortando jornalistas e âncoras com
décadas de casa, além de produtores. Cabendo a um repórter, João Fernandes,
apresentar a última edição do SBT Notícias. Para depois saber que também estava
no “pacote” de demissões.
Rachel
Sherazade, âncora do SBT Brasil, também está no radar depois que o Napoleão de
hospício e patrocinador do SBT, Luciano Hang da rede Havan, pediu a cabeça da
jornalista quando ela se declarou decepcionada e enganada por Sérgio Moro,
diante dos vazamentos do Intercept.
Pouco
importa se, ao jogar no fosso o jornalismo da casa, o SBT correr o risco de
afugentar anunciantes. Silvio Santos quer mesmo os jabás e anúncios estatais do
governo Bolsonaro.
b) Depois de ancorar por 15 anos o programa de
maior audiência da emissora (“Domingo Espetacular”), o premiado jornalista
Paulo Henrique Amorim foi colocado no gancho da Record até o RH saber o que
fazer com ele – PHA edita um dos blogs de esquerda mais acessados do País e há
tempos as milícias digitais bolsonárias ameaçavam e exigiam o seu afastamento.
Motivo da
Record? Certamente os mesmos de Sílvio Santos.
Biruta de aeroporto
c) O
comentarista da Rádio Jovem Pan, o historiador Marco Antônio Villa, outrora
hidrófobo anti-petista obcecado pela agenda do prefeito Haddad (até ser vítima
de uma pegadinha (“media prank”) perfeita disparada pelo prefeito – clique
aqui), também foi colocado no
gancho. Para um mês depois o RH da emissora finalmente descobrir o que fazer
com ele: a demissão. Nos últimos tempos,
Villa tornou Bolsonaro o alvo principal das suas críticas, no estilo tão
desbocado quanto as desferidas contra o então prefeito de São Paulo.
Em tipos
bicudos de crise econômica, anúncios governamentais não podem ser colocados em
risco por uma biruta de aeroporto que virou com a mudança dos ventos...
d) Em outra
rádio, Band News FM, o inventor da expressão “petralha”, Reinaldo Azevedo, é o
novo alvo das ameaças das milícias digitais depois que se associou à divulgação
da Vaza Jato da equipe de Greenwald. Está certo que o dono do Grupo
Bandeirantes de Comunicação, João Carlos Saad, no “Fórum Band News”, criticou a
destruição da economia pela Lava Jato, afundando empresas estratégicas como a
Odebrecht.
Porém,
vamos ver até onde vai a “fibra crítica” de alguém que também mergulhou de
cabeça na euforia anti-PT.
e) Já na
poderosa Globo, o clima é de medo no Departamento de Jornalismo com o RH
acenando para a reformulação de contratos, renegociações salariais ou
simplesmente a demissão. Ameaçando de simples repórteres a grandes medalhões da
casa – âncoras, colunistas e comentaristas. Tal como os violonistas do Titanic,
a Globo sabe que tem que continuar tocando a música até o fim – defender Moro,
Deltan e Lava Jato.
Mas também
seus medalhões do jornalismo temem que novos vazamentos que virão poderão
sobrar para muitos deles e ferir de morte suas credibilidades no mercado das
notícias. Então, nada melhor para a Globo do que manter todos nos antolhos e
rédeas através do medo...
O “Jornalismo Snapchat”
Enquanto
SBT e Record rifam seu Jornalismo, a Globo tenta manter as aparências tocando o
terror nas redações.
E, para o
distinto público, apresenta o chamado “Jornalismo Snapchat”, como no “Fantástico”
do último domingo: a emissora foi até capaz de colocar no ar uma matéria isenta
e tecnicamente correta sobre os últimos vazamentos publicados pelo jornal Folha, em parceria com o Intercept. Tudo efêmero para criar um
simulacro de isenção: depois, ao longo da semana, vem ignorando tudo sem dar a
mínima continuidade ou repercussão.
Todos esses
movimentos da grande mídia são sintomáticos em relação ao terremoto atual e os
futuros tsunamis a ser gerados pela Vaza Jato.
No campo do
Governo o rubicão já foi atravessado – já há muito caíram as poucas aparências
racionais iluministas, com a aceleração da crise institucional: juízes e
deputados derrubam decretos presidenciais, enquanto, em reação, o presidente
revoga e reedita decretos rejeitados pelo STF e Congresso.
Também caiu
a ficha para as lideranças no Congresso que Bolsonaro não governa para o País,
mas para o “núcleo duro” fundamentalista, com a sua guerra cultural e
ideológica particular.
Agora será
a vez da grande mídia também chegar a esse vanish
point das aparências: livrar-se de uma vez do jornalismo e partir de forma
franca para a guerra da propaganda política aberta. Como começam a fazer SBT e
Record.
A bomba-relógio Glenn Greenwald
Principalmente
por terem diante deles a incômoda bomba-relógio que atualmente representa o
jornalista norte-americano Glenn Greenwald. Como ficou patente na fala do
jornalista na audiência na Comissão de Direitos Humanos e Minorias na Câmara
dos Deputados nessa terça-feira.
Em síntese,
em sua histórica fala, Greenwald deu três mensagens diretas aos oponentes:
a) A
Constituição brasileira lhe garante manter o anonimato da fonte e todo o
trabalho jornalístico investigativo do Intercept;
b) Ele,
assim como sua família, tem passaporte norte-americano. A qualquer momento poderia
pegar o primeiro voo e sair do País. Se ele estivesse realmente participando de
uma ação criminosa de hackeamento, não estaria aqui. Estaria fora do Brasil,
continuando a publicar os vazamentos;
c) Ele e o Intercept não têm medo das acusações do
Governo e dos políticos do PSL. Não passam de estratégias de intimidação e
propaganda política. E por um simples motivo: não têm evidências contra ele,
enquanto ele possui todas as provas contra os acusadores.
A fala de Glenn Greenwald
(uma verdadeira aula de técnica de jornalismo investigativo que vale mais do
que todos os Congressos promovidos pela Abraji – Associação Brasileira de
Jornalismo Investigativo) expôs publicamente a indigência intelectual e até
cognitiva dos poucos deputados do PSL que resolveram confrontá-lo – como o
parlamentar Felipe Barros que não entendeu o sentido de expressão “fonte
anônima”.
“Se a fonte era anônima,
como que você ficou muito tempo para proteger a sua fonte? Não se protege
aquilo que não conhece”, disse raivoso o deputado... Virou piada.
Felipe Barros: Indigência intelectual ou cognitiva? |
... Mas os indigentes estão no Poder
O problema é que, apesar da
indigência que chega ao nível cognitivo, os indigentes estão no Poder.
E mais problemático é que
tanto a esquerda “namastê” quanto o “PT jurídico” acreditam que com todo o
escândalo e desmoralização internacional (que ainda se soma à repercussão dos
39 quilos de cocaína encontrados com militar em avião presidencial da FAB na
Espanha, em escala para o Japão para encontro do G20 – clique aqui) o castelo de
cartas ruirá por si só: finalmente baixará a racionalidade iluminista no STF,
salvaguardará a Constituição, libertará Lula que liderará o País na volta aos
trilhos do emprego e do desenvolvimento.
E a extrema-direita irá
embora, envergonhada, para a lata de lixo da História.
Como afirma o cientista político
e coordenador do Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública da UERJ, João
Feres Junior, em entrevista na revista Carta Capital (26/06/2019), “a destruição das instituições desde o golpe
de 2016 foi tão grande que não vejo por onde as coisas podem ser consertadas.
Quem irá investigar Moro se ele é o chefe da Polícia Federal e um dos pilares
do governo Bolsonaro? Estou cético”.
O
governo Bolsonaro tem os seus 30% da opinião pública como o núcleo duro de
fundamentalistas para o quais pouco importam fatos ou evidências – afinal, na
pós-verdade, tudo é viés, conspiração e narrativa. No dia 30 prometem sair às
ruas espumando de ódio, com a visibilidade garantida pela grande mídia
televisiva.
Enquanto
a esquerda não liderar a ocupação das ruas pelos outros 70%, em protestos
contundentes (ou, citando novamente o jornalista Mino Carta, “derramar sangue
na calçada”), de nada adiantará toda a fibra investigativa de Glenn Greenwald e
de setores da grande mídia que começam a se aliar à investigação.
Moro
continua ocultando sua agenda da viagem misteriosa aos EUA. Bolsonaro dá apenas
repostas protocolares ao aerococa da FAB. Direitos, garantias sociais, o
patrimônio nacional e o próprio futuro de uma geração estão sendo pulverizados.
E todos no Poder parecem funcionar no modo automático, pouco se importando.
Por
que? Porque sabem que as ruas estão vazias.
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