Em 2009 o jornal inglês “The Telegraph” contou a pitoresca história de
um mafioso napolitano que ameaçava comerciante locais com um imenso crocodilo.
Qualquer um deles poderia ser a próxima refeição do bicho se não lhe pagasse
proteção. É melhor ser temido do que amado, como afirmava Maquiavel? Depois de
pouca mais de uma década de pauta diária com Mensalão e Lava jato, intimidação
virou um “modus operandi” tautista da Globo. Traquejo tão natural que até invadiu outras editorias. Assim como a hábito do cachimbo entorta a boca. Até
na cobertura da Copa da Rússia. Às vésperas do jogo das oitavas do Brasil contra
o México, a Globo colocou sob suspeita o árbitro italiano em possíveis
conspirações no VAR (árbitro de vídeo) e, de quebra, requentou notícia antiga
sobre suposto envolvimento de jogador mexicano com cartéis de drogas. A Globo
apresentou o juiz e o jogador para o seu “crocodilo napolitano” intimidando-os
caso se intrometessem em seus interesses? Na verdade a mensagem da Globo não
foi para nenhum dos dois. Foi para os seus potenciais inimigos internos.
Principalmente porque, ao contrário da Copa de 2014, agora o sucesso da Seleção
é estratégico para Globo e mercado publicitário.
Conta-se
que em 2009 a polícia italiana encontrou um crocodilo, com quase dois metros,
na casa de um chefe da máfia napolitana. O mafioso justificou dizendo que era
de estimação, alimentado com ratos e coelhos vivos. Mas era de conhecimento de
todos que ele usava o imenso réptil para intimidar os comerciantes locais a
“pagar favores”.
Os
comerciantes eram “convidados” pelo mafioso a visitarem sua casa, para serem
apresentados ao bicho que vivia preso em um terraço. E ficavam sabendo que se
não pagassem os “favores”, seriam a próxima refeição do crocodilo. Mas apesar
de tudo, o mafioso acabou sendo detido mesmo por posse ilegal de animal
selvagem... – clique aqui.
“É
mais seguro ser temido do que amado”, escreveu Maquiavel. Intimidar surte
efeitos mais imediatos do que criar legitimidade.
E a TV
Globo, convertida em partido política de oposição na última década, entende bem
essa máxima maquiavélica: pavimentou o seu poder (o quarto poder) por décadas com
muita intimidação, na melhor tradição dos mafiosos locais napolitanos.
Exemplos
recentes não faltam como, por exemplo, para manter o Judiciário com rédeas
curtas: transmissões ao vivo das sessões do STF; dizer quem era quem do TRF-4,
em rede nacional no JN, na véspera de julgar o recurso de Lula; a repercussão
do tuite do General Villas Boas (exigindo dos juízes que atendessem ao “clamor
da sociedade” sob ameaça velada de um golpe militar), também no JN às vésperas
do julgamento do pedido de habeas corpus
de Lula no STF, são alguns dos “crocodilos napolitanos” que a Globo exibe para
aqueles que potencialmente possam importunar seus interesses.
Globo mantém Judiciário em rédeas curtas |
O linchamento é a próxima refeição...
O
linchamento midiático pelo “clamor popular”, em rede nacional, poderá ser a
“próxima refeição” do crocodilo do chefe mafioso.
A
prática tornou-se tão recorrente e sistemática que acabou virando um modus operandi tautista (tautologia +
autismo midiático) da emissora. Não importa editoria, tema ou notícia: se há
alguém, uma situação ou um resultado que potencialmente possam contradizer sua
narrativa interesseira, certamente será levado pela Globo a fazer uma visita ao
crocodilo do terraço.
Nem a
Copa da Rússia e os adversários da seleção brasileira escaparam do “convite”
intimidatório. Aliás, como vimos em postagem anterior, mesmo um evento
esportivo como a Copa de futebol na Rússia é alvo do tautismo crônico da Globo:
diante da ameaça do tradicional vilão do cinema e do telejornalismo (a
“estranha” Rússia, terra dos soviéticos, comunistas, hackers que ameaçam
eleições de outros países etc.) ser humanizado ou ocidentalizado demais pelas
transmissões ao vivo, o viés do jornalismo esportivo passou a descrever russos
como “frios”, que “não saem nas ruas”, vítimas da “ditadura” de Putin em um
país “intolerante à diversidade sexual”, e assim por diante – clique aqui.
Pois o
“crocodilo napolitano” da Globo reapareceu nos dias que antecederam a partida
das oitavas de final entre a Seleção e o México.
Agora o Brasil precisa ser campeão!
Como
todos sabemos, a necessidade do sucesso da Seleção na atual conjuntura
político-econômica brasileira é fundamental. Ao contrário de 2014, cuja Copa no
Brasil foi conduzida pela grande mídia como um evento que caminhava para a
catástrofe (e o “mineiraço” dos 7 X 1 da goleada alemã foi o ato final
conveniente por essa narrativa midiática), nesse momento Globo e mercado
publicitário aguardam ansiosamente a melhor performance do Brasil na Copa da
Rússia.
Primeiro, para criar alguma atmosfera otimista
para um negócio publicitário que vive mais da percepção do que da realidade -
depois que foram saqueados pelos brasileiros a panaceia dos saldos do FGTS como
solução de curto prazo.
E
segundo para uma função, por assim dizer, de “cimento ideológico”: num País de
14 milhões de desempregados e outros tantos de “desalentados”, repentinamente
promovidos a micro-empreendedores, a Seleção é a vitrine do discurso
mérito-empreendedor. Por exemplo, na campanha publicitária do Itaú a Seleção
não é uma equipe, mas um conjunto de técnicos e jogadores “que fazem a
diferença” – jargão individualista do dicionário do mérito-empreendedorismo.
Por
isso, nada melhor do que fazer a arbitragem e os adversários jogadores
mexicanos fazerem uma visitinha ao “crocodilo” global nos dias que antecederam
o jogo das oitavas.
Juiz e mexicano sob suspeitas
De
início, colocando o árbitro italiano Gianluca Rocchi sob suspeita, sugerindo
bizarras conspirações. Para começar, repetindo na cobertura de TV e no portal “Globo.com”
a informação de que o italiano tinha sido o assistente do V.A.R (árbitro de
vídeo) do “polêmico” Brasil 1 X 1 Suíça, quando a Seleção reclamou de faltas e
pênalti não marcados. Além de ter “tomado bolada de Neymar e ter dado cartão
amarelo ao jogador” na vitória do Real sobre o PSG de 3 X 1 na Liga dos
Campeões.
Para
depois requentar e expandir uma notícia que a própria emissora tinha dado
discretamente no ano passado: na véspera do jogo, no programa “Fantástico”,
retomou de forma sensacionalista a notícia de que o jogador Rafa Márquez
(veterano na sua quinta Copa do Mundo) é investigado pelo Tesouro americano por
suposto envolvimento com cartéis mexicanos de drogas. Em uma matéria bem editada, mostrando o
jogador nos treinos do seleção, trajando camisetas sem patrocinadores – “nenhuma
marca quer se envolver com um jogador suspeito”, deixou bem clara a reportagem.
Porém,
o leitor pode perguntar: mas o crocodilo napolitano da Globo tem assim tanto
poder de intimidação num evento internacional como a Copa na Rússia?
Afinal, a própria imagem da emissora e
seus jornalistas no exterior não é nada boa. Por exemplo, em tuite do
jornalista inglês Jonathan Wilson (cobrindo a Copa pelo jornal The Guardian) escreveu: “Não tenho nada
contra o Brasil, mas quanto mais cedo a TV Globo sair desse torneio, melhor.
Milhares deles, barulhentos e rudes no que deveria ser uma área de trabalho”...
Tão chatos que os 197 jornalistas enviados para a Rússia foram multiplicados em
milhares na cabeça de Wilson.
"... como são irritantes!"
A
impressão do jornalista inglês foi confirmada pelo colega Marcus Speller em
outro tuite: “Pode ser que a minha paciência esteja encolhendo mas... Jesus,
como são irritantes!”.
É
claro que essa prática mafiosa de intimidação não tem nenhum efeito em um
grande evento internacional como esse. Na verdade o “crocodilo napolitano” é
para consumo interno. É apenas um lembrete, um reforço subliminar, para mostrar
aos potenciais e possíveis inimigos internos (do passado, presente e futuro) do
que a emissora é capaz.
Martelar
o seu modus operandi, simular que
seus atos intimidatórios tenham alguma repercussão internacional: “tenham medo
de nós, seus ímpios! Um dia poderemos voltar o nosso canhão contra vocês!”.
Ou
também podemos encarar como um mero repique do tautismo crônico do jornalismo
da emissora: afinal o hábito do cachimbo entorta a boca – após anos do martelo
do Mensalão e Lava Jato diário na pauta do jornalismo, o “crocodilo napolitano”
acaba se esgueirando para outras editorias.
Certamente,
é nesse pano de fundo que deve ser interpretado o overacting do jogador queridinho da emissora e do mercado
publicitário: Neymar Jr. Numa conjuntura na qual o cimento ideológico do
mérito-empreendedorismo precisa ser injetado entre milhões de desempregados, a
imagem de um jogador “que faz a diferença” caçado por árbitros e jogadores
suspeitos é o melhor exemplo de
“superação” criado para incautos bestificados e desempregados sem esperança.
"Transparência emocional"
Enquanto
o mundo ri dos memes impagáveis que circulam nas redes sociais, aqui o mercado
alisa a cabeça do jogador enquanto mesas de debates da SporTV falam que Neymar
Jr. tem apenas “transparência emocional”...
Talvez
Neymar Jr. seja vítima do “jequismo” da Globo e de seus rudes e grosseiros
jornalistas. Assim como eles, Neymar joga para o público brasileiro na
esperança de criar alguma empatia publicitária com ele.
Afinal,
quem sabe até ele e seu pai empresário tenham medo de que a Globo, um dia, faça
um convite para visitar o “crocodilo napolitano”.
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