terça-feira, abril 19, 2016

Em Observação: "Zoom" (2015) - a metalinguagem até as últimas consequências



Um filme inspirado nas imagens recursivas e metalinguísticas do artista plástico M.C.Escher. São três histórias interligadas onde o desenrolar de uma determina o destino de outra como fossem narrativas dentro de outras narrativas, produzindo uma circularidade infinita. É o filme “Zoom”, uma co-produção Brasil/Canadá dirigida por Pedro Morelli. Recursividade e metalinguagem são temas do filme gnóstico – são formas linguísticas de desvelar a ilusão e mostrar o multifacetamento da realidade ao serem exploradas até as últimas consequências. Mas também são recursos perigosos onde o filme pode se transformar em mero exercício vazio de estilo. É o que o “Cinegnose” vai conferir.

Título: Zoom

Diretor: Pedro Morelli

Plot: Uma modelo sonha em ser escritora e prepara um romance sobre uma garota insatisfeita com sua própria imagem e, por isso, faz de tudo para conseguir suas próteses nos seios; por sua vez essa garota está produzindo uma HQ sobre um aspirante a cineasta que usa o sexo como forma de manipulação, cujo próximo filme é sobre uma modelo que tenta ser escritora.

Por que está “Em Observação”? - o leitor deve conhecer as obras mais emblemáticas do artista M.C. Escher tais como a mão que desenha uma outra mão e as suas famosas escadarias e estruturas que parecem ser infinitas. Tal como nessas obras emblemáticas de Escher, o filme Zoom explora três histórias interligadas onde o desenrolar de uma determina o destino da outra, produzindo uma narrativa emaranhada ou recursiva.

Cada segmento tem linguagem, ritmo e elenco próprios como, por exemplo, a sequência da HQ toda feita em técnica de rotocospia (precursor da captura digital do movimento, é uma técnica de animação a partir de uma referencia filmada) lembrando filmes como Waking Life (2001) ou O Homem Duplo (A Scanner Darkly, 2006).


A proposta de Zoom é levar ao extremo as ideias de metalinguagem e recursividade na narrativa cinematográfica.

O filme é uma co-produção Brasil e Canadá, contando no elenco com a brasileira Mariana Ximenes, o ator mexicano Gael Garcia Bernal e a canadense Alisson Pill. O filme foi rodado em locações de Toronto, Rio de Janeiro e São Paulo.

Dentro dessa estrutura metalinguística e recursiva, Zoom explora diversos sub-temas como a crítica sobre a busca da perfeição e os padrões de belezas, a maneira como nos tornamos prisioneiros de tendências visuais, contestações sobre a submissão da arte ao mercado – a certa altura o filme ironiza o próprio merchandising que a narrativa tinha acabado de fazer etc.

O Cinegnose tem um particular interesse em filmes que exploram metalinguagens e recursividade. Essas ideias de narrativas em abismo ou de filmes que explicitam para o espectador a própria ilusão da sua mídia (a edição, a cenografia, a montagem etc.) têm grande possibilidade de transcender de um mero exercício de estilo para um questionamento sobre a natureza do real: multifacetamento da realidade, desnudamento da ilusão da realidade assim como a ilusão do próprio filme etc.

A literatura romântica do sec. XVIII-XIX de William Blake ou Gerard de Nerval já explorava essa “ironia transcendental” – a ironia como elemento auto-reflexivo como tematização da lacuna ou distância entre a linguagem e a realidade empírica. As palavras somente dão nomes às coisas, mas não conseguem expressar a própria naturezas das coisas. Essa angústia fundamental dos românticos (o vazio entre a representação da linguagem e a presença do mundo) levou à desconstrução auto-reflexiva da linguagem e o apego ao misticismo em fontes gnósticas, cabalistas e alquímicas.


O Cinegnose já possui um histórico de filmes analisados que trazem para o cinema essa ironia metalinguística romântica  como Um Sonho Dentro De Um Sonho, Mais Estranho Que a Ficção ou Sinédoque, Nova York.

Portanto, o blog vai conferir se o projeto experimental de Pedro Morelli com o filme Zoom é um mero exercício de estilo vazio ou possui um conteúdo com implicações gnósticas ou existenciais, como nos filmes citados acima.

O Que Esperar? – A crítica parece que não vem poupando Zoom. Alguns apontam que o filme não tem nada de experimental ou inovador, consistindo num “mero apanhado da carreira do roteirista Charlie Kaufman – Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças e Sinédoque, Nova York. Outros apontam para um filme sem conteúdo e um mero exercício de técnicas e linguagens que a tecnologia cinematográfica atual pode oferecer. O argumento das três histórias seriam mero pretexto para o diretor Pedro Morelli brincar de estilo. Será uma pena se isso for verdade, pois dentro da cinematografia brasileira é um dos poucos filmes a levar o tema da recursão e metalinguagem tão longe. O Cinegnose irá conferir.

O filme já está em cartaz nos cinemas brasileiros.

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