terça-feira, junho 14, 2011
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Um contraponto ao atual filme “Agentes do Destino” (Adjustment Bureau, 2011) pode ser encontrado no episódio “A Matter of Minutes” da cultuada série “O Novo Além da Imaginação” (1985-89) onde o horror metafísico do conto original é mantido e desenvolvido. Ao contrário, em "Agentes do Destino" os elementos metafísicos e esotéricos do conto original de Philip K. Dick são apenas cenários para uma surrada estória de amor impossível.
Leitor desse humilde blog, Fábio Holfnik nos alertou sobre a existência de um conto da série “O Novo Além da Imaginação” (“The New Twilight Zone, 1985-89, continuação da série original que foi de 1959 a 1964 apresentada por Rod Sterling na TV CBS nos EUA) chamado “A Matter of Minutes” que seria baseado no mesmo conto de Philip K. Dick (“Adjustment Team” de 1954) no qual se baseou também o atual filme “Agentes do Destino” (Adjustment Bureau, 2011) analisado em postagem anterior.
Na verdade esse conto da série televisiva baseou-se em conto de outro escritor de ficção científica norte-americano, Theodore Sturgeon, no conto “Yesterday Was Monday” de 1941. De qualquer forma há uma incrível similaridade temática com o conto de K. Dick e o filme “Agentes do Destino”. Essa adaptação televisiva de 1985 do conto de Sturgeon apresenta um interessante contraponto com a conservadora abordagem do filme “Agentes do Destino”.
Ao contrário do filme atual em cartaz em relação ao conto de K. Dick, o conto televisivo da série “Além da Imaginação” mantém o horror metafísico original do conto de Sturgeon.
Como vimos na postagem anterior (veja links abaixo), embora o filme “Agentes do Destino” mantenha a atmosfera paranoica e o misterioso trabalho dos agentes/arcontes, elimina o horror metafísico, isto é, o misto de horror e fascínio, repulsa e atração por uma situação (a abertura do tecido da realidade e do tempo) que desafia a toda racionalidade e religiosidade. Na narrativa parece que esse fato potencialmente arrasador se transforma em mero cenário para a estória da luta dos protagonistas pelo amor impossível.
Ao contrário, na adaptação televisiva do conto de Sturgeon para a série “Além da Imaginação” esse horror dos protagonistas é brilhantemente mantido.
Na estória um jovem casal é acordado em uma manhã pelo barulho de marteladas, serrotes e batidas vindas do lado de fora e do interior da casa como se tudo ao redor estivesse em construção. Descem as escadas e encontram a casa tomada por estranhos operários azuis e sem rosto removendo ou trocando móveis e objetos. Saem de casa assustados e encontram tudo ao redor como se estivesse em construção em meio a operários e caminhões azuis. Ouvem uma voz berrando comandos aos operários e vão em direção dela, até que entram em um beco onde penetram em uma espécie de vazio, como um fundo infinito branco. Um estranho homem todo em amarelo os resgata e explica que eles foram tragados pelo tempo e que eles estavam em um intervalo entre um minuto e outro.
Ele é um supervisor de manutenção do tempo e mostra a elesexatamente como o tempo é mantido, revelando-lhes uma nova compreensão de comoo universo funciona: a cada minuto na história é essencialmente um mundo separado,que deve ser construído, mantido e derrubado uma vez que o mundo termina comele. Mas o supervisor avisa que eles jamais poderão sair dali para não revelarem a ninguém a verdadeira natureza do tempo. Começa antão a luta do casal para escapar daquele lugar nenhum.
Vertigem, paranoia, confusão originadas pela verdadeira quebra de paradigmas vivida pelos protagonistas em “A Matter of Minutes” se contrastam com as reações do protagonista David Norris em “Os Agentes do Destino”: mesmo após viver sucessivas experiências ontológicas, místicas ou metafísicas de quebra radical do princípio da realidade, mantém-se assertivo, seguro, tocando a sua rotina como político e empresário. Tudo o que interessa a ele é a luta pelo amor impossível por Elise travada com os agentes do destino.
Uma ficção científica distópica
O conto original “Yesterday Was Monday” de Sturgeon foi escrito durante a Segunda Guerra Mundial. É o início do período que será denominado como pós-moderno (pós-guerra) onde as transformações históricas (guerra fria), tecnológicas (informatização) e sócio-culturais (sociedade de consumo) vão produzir no campo da literatura sci-fi uma série de obras distópicas: ao contrário do utópico futurismo do período moderno, temos a partir desse momento futuros pós-apocalípticos, tecnologias escravizadoras, o esgarçamento da noção de tempo e a denúncia do artificialismo do que entendemos por realidade.
Thedore Sturgeon, Philip K. Dick ou Aldous Huxley (do livro “Admirável Mundo Novo”) são os representantes dessa verdadeira desconstrução do futuro.
Nesse conto de Sturgeon, por exemplo, encontramos em germe a concepção pós-moderna de tempo: fragmentada, pontual e não mais concebida como uma flecha que aponta para o futuro, mas como sucessivos “agoras”. Essa representação quântica do tempo de Sturgeon, ao apresentar os protagonistas lutando para mudar os seus destinos no interior de uma brecha entre os minutos do continuum temporal, abre a possibilidade (que será explorada na literatura e cinematografias futuras) do tempo como um hipertexto, isto é, cada “agora” como um potencial hiperlink de onde saltamos para realidades e futuros alternativos.
Ficha Técnica
Título: "A Matter of Minutes" - Série Além da Imaginação (Twilight Zone)
Episódio: #1.15
Diretor: Sheldon Larry
Roteiro: Rockne S. O'Bannon (baseado no conto "Yesterday Was Monday" de Theodore Sturgeon
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Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, organizado pelo Prof. Dr. Ciro Marcondes Filho e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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