sexta-feira, junho 02, 2023

General do Comando Sul dos EUA fala em "intensificar o jogo"... E mídia obedece


Recentemente, após a embaixadora dos EUA visitar os estúdios da CNN, o canal de notícias “vazou” vídeo que provocou crise política que tornou inevitável a CPI do 08/01. Também, sincronicamente, após a general comandante do Comando Sul dos EUA, em reunião na Atlantic Council, falar em “intensificar o jogo” na geopolítica da América do Sul, o jornalismo corporativo também intensifica o tom dos chiliques de seus “colonistas”. Principalmente na terça-feira: depois de um dia inteiro de gritaria com a “passada de pano” de Lula no “amigo” Maduro, com timing e sincronismo a veterana repórter Delis Ortiz toma “um soco por toda imprensa” de segurança do GSI numa entrevista com o líder venezuelano no Itamaraty. Inexplicavelmente sem imagens, num ambiente totalmente mediatizado. “Intensificar o jogo” significa duas coisas: melar midiaticamente a geopolítica sul-americana; e tirar Lula do cenário internacional para só negociar no Congresso... mas, quando negocia, é porque “está de joelhos”. Grande mídia ouve bem os “apitos de cachorro” do Império.

“Por que essa região [América do Sul] é tão importante para nós? Com todos os seus ricos recursos...temos o triângulo do lítio vital para a tecnologia atual, Argentina, Bolívia, Chile... As maiores reservas de petróleo bruto descobertas na Guianas há pouco mais de um ano... petróleo, cobre, ouro... Os pulmões do mundo, a Amazônia... É fora do comum! Temos muito que fazer nessa região... tem a ver com a segurança nacional [dos EUA]. E TEMOS QUE INTENSIFICAR O JOGO”.

Sem eufemismos ou rodeios! Essa foi a fala direta da General quatro estrelas Laura Richardson, comandante do SouthCom (Comando Sul dos EUA), em um evento do Atlantic Council, think tank ligado à OTAN, no início desse ano. O império sem filtros: “Temos que intensificar o jogo”, referindo-se às conhecidas práticas de guerra híbrida para desestabilizar qualquer governo e que cause ruído na geopolítica norte-americana na região.

Sabemos que até recentemente, o “jogo” era o de empoderar a extrema-direita global nas diversas revoluções coloridas pelo planeta. E, no Brasil, o candidato manchuriano Bolsonaro, através de aliança com o PMiG – o Partido Militar Golpista.

Com a chegada dos democratas ao poder, extremistas como Bolsonaro tornaram-se disfuncionais. Afinal, a chamada direita alternativa (alt-right) tem uma agenda própria, anti-globalista, e que depois do prazo de validade torna-se descartável para o jogo geopolítico do Império.

Lula voltou à corrida eleitoral e chegou à presidência, na esteira do trauma ianque da invasão ao Capitólio. Para enfrentar uma semana depois da posse o seu próprio “Capitólio”: o “08/01”- a invasão dos prédios dos Três Poderes em Brasília por buchas de canhão açodadas pelo PMiG.

Tanto o Império quanto a grande mídia tupiniquim acreditavam no alinhamento automático (a “tornozeleira eletrônica” geopolítica) de Lula aos EUA. Ou que seus arroubos “populistas” do líder petista se limitassem apenas ao consumo interno de seu partido e eleitores – Venezuela, Mercosul, BRICS etc. 

O presidente Joe Biden bem que tentou garantir isso, como demonstrou a ansiedade da Casa Branca para agendar uma visita de Lula desde o resultado das urnas no ano passado.


Luz amarela

Bastaram três momentos para acender a luz amarela para o Império e a grande mídia brasileira que se considera uma subsidiária da TV OTAN: a visita de Lula na Argentina para estruturar o Mercosul e falar em “moeda única”; a visita à China onde, além de empossar Dilma Rousseff na presidência dos BRICS, confrontou a hegemonia do dólar no bloco de países do Sul global e relativizou o discurso EUA/OTAN sobre a guerra na Ucrânia; e a recepção com “pompa” (termo repetido ad infinitum pelo jornalismo corporativo) do presidente da Venezuela Nicolas Maduro para o encontro dos líderes sul-americanos em Brasília para a reorganização da Unasul.

Se o jornalismo corporativo já andava tenso desde o Gabinete de Transição às voltas com o tema da reponsabilidade fiscal, passou para o modo “chilique” (Laura Richardson diria “intensificou o jogo”): primeiro, ao inferir que Lula era um mal-agradecido por desdenhar os EUA: afinal, Biden tinha ligado a ele dando apoio à democracia brasileira, após o 08/01. E depois, jogando ao lado da chantagem do Congresso e do todo-poderoso da Câmara Arthur Lira. 

Supostamente, o governo estaria à beira do abismo e no garrote, sem habilidade de negociar com o parlamento. Por quê? Porque Lula esqueceu da política interna. Só pensa naquilo: geopolítica! Cadê a lendária habilidade de negociação política de Lula para socorrer os inabilidosos Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e Rui Costa (Casa Civil)?

À beira do abismo! Rumo à catástrofe! Eram os prognósticos dos “colonistas” após as derrotas da aprovação do Marco Temporal e a desidratação dos ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Originários – habilmente ainda tentaram jogar Marina Silva (a bomba-relógio semiótica do ambientalismo vs. desenvolvimentismo) contra Lula, como se tudo não passasse de uma conspiração do presidente contra a pauta ambiental, de olho no petróleo das costas do Amapá.

O jogo é tirar Lula da louca obsessão de ser líder do Sul global no xadrez geopolítico. Para isso foi feita a Lava-Jato: destruir o softpower brasileiro centrado na engenharia, gás e petróleo. Mas Lula acabou voltando... e os chiliques dos “colonistas”.


Grande mídia esperneia: a imagem da derrota... cadê o Lula?


Um soco SO CONVEEEENIENT!!!

Para intensificar ainda mais o jogo (HOW CONVEEEENIENT! apud Church Lady do Saturday Night Live), eis que a veterana jornalista da Globo em Brasília, Delis Ortiz, toma supostamente um soco no peito (mais conveniente ainda! Em uma mulher que tem uma prótese por causa de masectomia!) de um segurança do GSI e uma braçada no pescoço de um segurança venezuelano quando cobria, no Palácio do Itamaraty, a entrevista com Nicolas Maduro.

“Um soco em toda imprensa!”, declarou epicamente a jornalista, colando ainda mais a imagem de “ditador” e “autocrata” no “amigo de Lula”. Só que teve um problema: não houve sequer um frame dessa agressão – num único vídeo vemos apenas a jornalista querendo se pendurar em seguranças que estão de costas para ela.

Sequer uma imagem da agressão... num ambiente tão mediatizado como numa entrevista com o chefe de Estado... cercado de celulares e cinegrafistas... Por que nenhuma imagem que comprovasse um delito tão ostensivo num recinto repleto de dispositivos de gravação? Restou apenas o modus operandi da convicção...

Dúvidas justificadas: Delis Ortiz é uma crente da Igreja Presbiteriana de Brasília (entregou uma edição da Bíblia para Bolsonaro após um café da manhã com jornalistas em 2019), cuja filha assumiu a coordenação de relações públicas do gabinete de Bolsonaro, no mesmo ano. Como em política não há coincidências... tudo começa a revelar os dois elementos de uma não-notícia: timing e sincronismo.

O chilique cenografado da jornalista foi o desfecho previsível de um dia particularmente tenso para o jornalismo corporativo: chiliques cada vez mais intensos e histéricos o dia inteiro, repetindo ad nauseum o vídeo gravado em particular, com seu celular, pelo presidente de direita do Uruguai, Luis Alberto Lacalle Pou, criticando o termo “narrativa” utilizando por Lula para classificar as críticas a Maduro de ser um ditador, além de censurar e perseguir jornalistas.

Então, nada melhor do que terminar o dia com a explosiva notícia do “soco em toda imprensa” no meio de uma entrevista com o próprio ditador. HOW CONVEEEENIENT!


Sem imagens da agressão... apenas frames da repórter se jogando nos seguranças... que estão de costas



Intensificando o jogo

Claro que toda essa “intensificação do jogo” tem dois objetivos bem claros, consonantes com o Império:

(a) Como sempre, melar (pelo menos midiaticamente) qualquer pretensão de união em uma terra “preciosa e com tantos recursos”, como cobiça a comandante do SouthCom Laura Richardson;

(b) Dissuadir Lula a sair do cenário internacional mediante a criação de uma crise política autorrealizável: num Congresso naturalmente refratário a Lula (o Congresso mais conservador e reacionário da até aqui pequena história da democracia brasileira), o que é naturalmente previsível, torna-se para a lente dos “colonistas” uma catástrofe política – esquecendo-se das próprias armas do poder Executivo: vetos e a própria judicialização. As duas matérias aprovadas na Câmara (“derrotas de Lula” para a grande mídia) são flagrantemente anti-constitucionais.

Porém, não adianta Lula voltar ao campo da negociação com o parlamento, como na recente vitória da aprovação da MP da reestruturação dos ministérios.

Os “colonistas” e os “aquários” das redações ficaram satisfeitos? Não... o jogo deve ser intenso!

Se Lula volta à negociação, aí os problemas são outros. Dessa vez, com uma retórica semanticamente mais rica. 

Se acusavam Bolsonaro de “reeditar a velha política” com o “toma-lá-da-cá”, agora o vernáculo é mais expansivo: “Lula despeja dinheiro no Congresso com emendas parlamentares” (Bom Dia Brasil), “governo tem que dar algo em troca” (Merval), “presidencialismo de joelhos para evitar o fim do mundo” (Estadão), “Ultimato de Lira” (Uol), “Lula bate recorde de emendas: R$7,1 bi” (Folha).

De repente, o que mais cobravam de Lula (negociação) desapareceu das manchetes. A conotação agora é a da “velha política”. No sentido mais pejorativo possível. 

E a cereja do bolo para os “colonistas” se deleitarem: no texto aprovado da MP dos ministérios retiraram a extinção da Fundação Nacional da Saúde (Funasa), que será recriada. Para a grande mídia, a Funasa sempre representou ser um centro de corrupção. 

Prontamente, os “colonistas” começam a já aguardada semiose infernal: Funasa-corrupção-dar algo em troca-Lula de joelhos-dinheiro despejado no Congresso...

Num futuro próximo, só falta aparecer um novo Bob Jeferson que apresente denúncias sobre um novo Mensalão 2.0?

 

 

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