terça-feira, julho 29, 2014
Em "O Teorema Zero" Terry Gilliam revela seu niilismo gnóstico
terça-feira, julho 29, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Em “O Teorema Zero” (The Zero Theorem, 2013)
Terry Gilliam retorna aos temas das produções anteriores “Brazil, O Filme”
(1985) e Os 12 Macacos (1995), porém em um tom mais intimista e filosófico:
enquanto espera uma misteriosa ligação telefônica que revelaria o verdadeiro
sentido da vida, um analista de dados e programador é obrigado a comprovar
matematicamente o contrário: que um dia todo Universo acabará sugado por um
buraco negro e a vida não tem qualquer sentido ou propósito. Esse é o projeto
secreto de uma gigantesca corporação, comprovar matematicamente o “Teorema Zero” –
zero é igual a 100%. Gilliam vai abraçar alegremente esse niilismo gnóstico como
a última esperança de libertação – zero é igual a 100% se aproxima da filosofia
do filme “O Clube da Luta” de David Fincher: depois que perdermos tudo é que estaremos livres. Então encontraremos as
respostas dentro de nós mesmos.
Quem não se lembra daquela situação nas aulas de álgebra
e equações de segundo grau na escola onde você olhava para o enunciado da
equação e intuitivamente já sabia o valor de X? Você escrevia X = 15, mas o
professor não aceitava a reposta, embora correta, pois exigia que demonstrasse
o método resolutivo que fez chegar ao resultado.
Pois é exatamente sobre isso que trata o novo filme
de Terry Gilliam O Teorema Zero onde
Christoph Waltz faz um “triturador de entidades” (Qoen Leth, um analista e
programador de dados) que é incumbido de montar computacionalmente uma
gigantesca equação cujos enunciados comprovem que 0 = 100%, ou seja, que todo o
Universo um dia vai ser encolhido em uma pequena singularidade e engolir a si
mesmo em um buraco negro. Colocado em termos filosóficos, ele deve comprovar
matematicamente que a vida não possui qualquer sentido ou propósito, embora
intuitivamente suspeite (e procure negar) isso.
sábado, julho 26, 2014
Por que "E.T. O Extraterrestre" tornou-se um clássico AstroGnóstico?
sábado, julho 26, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Quase três gerações depois o filme “E.T. O Extraterrestre” (1982) continua emocionando, tornando-se um clássico como “O Mágico de Oz”. Como uma produção cinematográfica alcança esse estágio atemporal? O filme oferece mais do que uma história de amizade e amor entre um menino e um ser extraterrestre: de um lado refletiu a incipiente cultura adolescente dos subúrbios norte-americanos da época, mas também o arquétipo contemporâneo do Estrangeiro, a condição humana de alienação e estranhamento através de uma fantasia AstroGnóstica: o paralelo da condição humana com a de um ser extraterrestre querendo retornar para casa.
terça-feira, julho 22, 2014
"Killer Cuisine" faz paródia surreal dos chefes de cozinha midiáticos
terça-feira, julho 22, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A série de curtas “Killer Cuisine” (2010) do norte-americano Ross Goodman é uma surreal e hilária paródia dos clichês da gastronomia midiática: um cozinheiro, cujo avô foi um açougueiro na Alemanha à época do nazismo, fuma compulsivamente na cozinha enquanto manipula alimentos e facas de forma agressiva, sob uma trilha sonora que varia de um melancólico blues às músicas de terror B nos anos 1950. Enquanto isso uma mulher é amarrada e embebedada com vinho branco à espera de ser o próximo ingrediente culinário. Os curtas são uma verdadeira aula sobre aquilo que em linguagem cinematográfica se chama “efeito Kuleshov” e também suscitam um debate sobre os alimentos regidos pela lógica do “look” e do “light” dos chefes de cozinha midiáticos. Veja os curtas.
domingo, julho 20, 2014
"Transcendence" mostra fábula nietzschiana sobre tecnologia e poder
domingo, julho 20, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Crítica e público estão massacrando o filme “Transcendence
– A Revolução” (2014). Todos esperavam um sci fi clássico com super-heróis e
narrativas de ação e terror. Mas o filme nos oferece uma extrapolação do atual
discurso autopromocional das neurociências e ciências da computação através do
olhar de uma autêntica fábula nietzschiana sobre o Poder: a grande questão da
onisciência e onipresença de uma suposta superinteligência digital por trás de corporações
como Google e do projeto da Internet das Coisas não é a do Poder vulgar em
conquistar mais dinheiro e controle político: é o Poder pelo Poder, como jogo,
vontade de potência em transcender os limites da ética e moral humana
representado pela superação do próprio corpo.
Nelson Rodrigues dizia que toda unanimidade é burra.
Certamente essa máxima pode ser aplicada à forma como a crítica e o público
está recebendo o filme Transcendence – A
Revolução. Bilheterias decepcionantes nos EUA e Brasil e péssimas críticas
tanto aqui como lá.
“Muito conceito e pouca história para contar”,
“explicações incessantes”, “elenco estrelado (Johnny Deep, Morgan Freeman e
Cillian Murphy e Paul Bettany) que parecem não saber o que fazer trocando
frases soltas entre si”, “pretensioso e chato” etc. O que parece criar
estranhamento para os críticos são os desempenhos “contidos” ou até “robóticos”
do protagonista Deep e um filme que parece investir muito mais nas rimas
visuais e em conceitos abstratos do que em uma história dramática.
Crítica e público esperavam um “filme de ficção
científica” com super-heróis ou narrativas de ação e terror com um “sabor” de sci-fi, que é o que normalmente
Hollywood oferece. Mas o que o diretor Wally Pfister (desde o filme Amnésia diretor de fotografia dos filmes
de Christopher Nolan) foi uma verdadeira ficção científica: a partir da agenda
tecnologia atual, extrapolar para onde estamos indo e o que isso pode
significar para a raça humana, intelectual e espiritualmente.
sexta-feira, julho 18, 2014
Lição para trainees da TV Globo: análise de um vídeo "fractal"
sexta-feira, julho 18, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Sintoma? Ato falho? Autoparódia? Provocação?
Talvez seja tudo isso, um verdadeiro vídeo “fractal” (figura geométrica similar
a um padrão que se repete em escala maior) feito para promover o Programa de
Trainees 2014 da TV Globo. Certamente, a primeira lição para os trainees da
emissora poderia ser a de analisar esse vídeo performado por Marcius Melhem e
Marcelo Adnet: um general estilizado recruta jovens de 18 anos para o
alistamento na “maior emissora de comunicação do... Brazziilll” (o nome do País
em sotaque inglês). Sabendo-se das polêmicas origens da TV Globo no período da
ditadura militar, podemos encontrar no “teaser” promocional o reflexo da corda
bamba em que se encontra atualmente a TV Globo entre ter que ser politicamente
de oposição e, ao mesmo tempo, aparentar transparência e modernidade.
O “Banco de Talentos”, site de recrutamento onde a
TV Globo forma sua verdadeira reserva de mão de obra cadastrando candidatos a
diversos programas corporativos da emissora, publicou uma página do Programa de Trainee Globo 2014. Visualmente a página é interessante e até saudosa: lembra os
projetos visuais da extinta MTV Brasil com as fontes de texto irregulares, o
grafismo com ares retro e no destaque Marcelo Adnet em cena do vídeo
promocional do programa.
Se o gigante se conhece pelo dedo, esse vídeo
promocional é uma ótima oportunidade para os jovens candidatos conhecerem o DNA
da emissora na qual pretendem trabalhar. O site possui até uma página intitulada
“Conhecendo a Rede Globo” onde encontramos um daqueles textos com estilo
corporativo eufemístico falando de “missão”, “sonhos” e “líderes”.
quarta-feira, julho 16, 2014
Em Observação: "Teorema Zero" (2013) - o sentido da vida pela via negativa
quarta-feira, julho 16, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Quase 20 anos depois, o diretor inglês Terry
Gilliam está de volta ao gênero ficção-científica, mas as suas preocupações
filosóficas continuam as mesmas. Misturando distopia e religião, Gilliam em “O
Teorema Zero” (2013) pretende discutir qual o sentido da vida, já que a ciência
nos informa que todo o Universo um dia acabará em uma singularidade no interior
de um buraco negro. No interior de uma igreja abandonada o protagonista espera uma
ligação telefônica que lhe traga a resposta, mas o diretor parece pouco
preocupado com isso: ele abraça alegremente a ausência de sentido (a chamada "via negativa" da Filosofia), lembrando a
máxima do personagem Tyler Durden em “O Clube da Luta”: “Depois que perdermos
tudo, então estaremos livres”. Filme sugerido pelo nosso leitor Felipe Resende.
terça-feira, julho 15, 2014
Mídia esportiva sofre de transtorno semiótico bipolar
terça-feira, julho 15, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Entre as palavras e as coisas existe uma
estrutura fixa, pronta, que tenta capturar a dinâmica das coisas para
congela-las em mitos. Com a mídia esportiva não seria diferente: a cada Copa do
Mundo entra em funcionamento um discurso bipolar pronto para explicar os
fracassos do futebol brasileiro – ora nos falta racionalidade, organização e
planejamento; ora precisamos retornar “às nossas raízes” sufocadas pela mesma “modernidade”
defendida na Copa anterior. Essa mitologização do futebol teria duas funções:
neutralizar o acaso e a incerteza, eliminando a natureza lúdica do esporte, e
evaporar a História – deixar de fora desse discurso bipolar os fatores
midiáticos e político-econômicos que parasitam o futebol.
Na postagem anterior discutíamos que a goleada
acachapante sofrida pela Seleção no jogo contra a Alemanha tinha sido mais do
que um evento, mas o sintoma de fatores de influência midiática (“efeito
Heisenberg” e esquizofrenia midiática – clique
aqui). Mas nessa discussão acabamos achando outra coisa: descobrimos que a
imprensa esportiva parece ter um discurso pronto a cada fracasso do futebol
brasileiro em copas.
Embora seja um discurso estruturado e fixo, também é
dinâmico como fosse um pêndulo semiótico: ora os jornalistas especializados
culpam as derrotas pelo atraso, desatualização e falta de “modernidade” do
futebol brasileiro (que chamaremos de “fase 1”), ora falam de um excesso de
pragmatismo que faria a Seleção abandonar suas “raízes” (“fase 2”).
quinta-feira, julho 10, 2014
"Efeito Heisenberg" e esquizofrenia midiática derrubam a Seleção
quinta-feira, julho 10, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A mídia parece ter um discurso pronto para
cada traumática desclassificação nas Copas, em um movimento semioticamente pendular:
ora diz que falta “modernidade”, ora defende “tradição” ao futebol brasileiro. Mas
dessa vez, nada explica a anomalia de um 7 X 1. Pelo menos os comentários da
imprensa especializada foram unânimes: não foi placar de um jogo de futebol
profissional. Quem lida com semiótica e sincromisticismo sabe que quando
eventos tornam-se bizarros e anômalos deixam de ser meros acontecimentos para
se converterem em sintomas. No caso dessa partida, sintoma de dois fatores
extra-esportivos: o chamado “efeito Heisenberg” (a patologia de toda cobertura midiática
extensiva) e a esquizofrenia de uma mídia sob o desgaste de politicamente ter
que sabotar o evento e ao mesmo tempo faturar comercialmente.
Holanda 2 X Brasil 0, o jogo na Copa de 1974 que desclassificou o Brasil
para as finais; Itália 3 X Brasil 2, jogo que tirou a Seleção da Copa de 1982;
Holanda 2 X Brasil 1, jogo que eliminou a Seleção nas quartas na Copa da África
do Sul em 2010.
É interessante perceber nesses momentos de aguda comoção nas crises da
chamada “pátria de chuteiras” a construção de um script midiático para
racionalizar as catástrofes. Um script pendular que vai do discurso da necessidade
de “modernização” ao do “retorno às raízes”: de um lado a ideia de que o
futebol brasileiro está ultrapassado diante da modernidade europeia (a
revolução tática do “carrossel holandês” em 1974 ou a crítica ao futebol bonito
da seleção em 1982, mas sem a eficiência e aplicação europeias) e do outro um
futebol que ficara tão pragmático que teria esquecido “a arte” – como no caso
da comemoração do “fim da Era Dunga” acusada de abandonar o “futebol bem
jogado” em 2010. Ora a modernidade, ora a tradição.
terça-feira, julho 08, 2014
Matemática e Surrealismo: Carroll, Escher e matemagos
terça-feira, julho 08, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Em que momento a Matemática, a ciência do raciocínio lógico e abstrato, pode converter suas deduções rigorosas em surreais paradoxos visuais e lógicos? Surrealismo e matemática não se opõem, mas podem ser excelentes aliados. A férrea lógica matemática pode contribuir eficazmente em desmascarar a falta de lógica dos esquemas de pensamento e o funcionamento de sistemas opressivos. Muitos paradoxos, charadas e falácias matemáticas constituem autênticas sátiras dos vícios de pensamento da nossa cultura. Os romances matemáticos de Lewis Carroll e o insólito fascínio pelas imagens de M.C. Escher acabaram criando a lógica do “non sense” presente tanto em escritores como Kafka quanto em filósofos como Jean Baudrillard. Vamos explorar as possibilidades de encontros entre o Surrealismo e a Matemática.
domingo, julho 06, 2014
Em Observação: "Equilibrium" (2002) - totalitarismo, artes marciais e anti-depressivos
domingo, julho 06, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O filme “Equilibrium” um daqueles filmes que a gente nunca ouviu falar,
mas que quando assistimos ficamos surpresos pelo anonimato. Com visual,
figurino e fotografia que lembra muito Matrix dos irmãos Wachowski, o filme
mostra um sistema totalitário baseado na repressão de tudo aquilo que poderia
estimular no homem a expressão de sentimentos – arte, principalmente. Os
sentimentos seriam a pior parte da natureza humana, capaz de provocar guerras e
mortes. Por isso, todos seriam induzidos a tomar uma droga capaz de inibir
qualquer expressão de sentimentos. “Sacerdotes” especializados em lutas marciais e concentração Zen caçariam todos os “ofensores”
que teimam em manter objetos artísticos. Como um documento de época, “Equilibrium”
representaria o imaginário atual da banalização de drogas como Prozac ou
Ritalina onde um secreto sistema totalitário se desenha baseado na seletividade
dos sentimentos que devemos ter.
sexta-feira, julho 04, 2014
"L'Immortelle" criou a mulher metafísica para o cinema
sexta-feira, julho 04, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Quem não se recorda da personagem Sofia (Penélope Cruz) em Vanilla Sky (2001) despertando o
protagonista David Aymes aprisionado em uma simulação de realidade em um sonho
lúcido? Ou de Trinity (Carie-Anne Moss) que, graças ao seu amor, fez Neo
descobrir que era O Escolhido em Matrix
(1999)? Ou ainda da personagem Sylvia que fez Truman descobrir que sua vida era
uma prisão dentro de em um gigantesco reality show em Show de Truman (1998)? Personagens femininos fortes, sem história,
que surgem de repente na vida do protagonista para despertá-lo do sono das
ilusões que o prendem a esse mundo. Mulheres que muitas vezes sacrificam o seu
amor e a si mesmas pela redenção do herói e de toda humanidade.
Pois essas mulheres por trás de todos esses heróis do gnosticismo pop
cinemático descendem mitologicamente do personagem gnóstico de Sophia, o aeon que vai despertar no homem a
fagulha de luz interior (a gnose) para conectá-lo de volta à Plenitude. Mas
cinematograficamente, são devedoras de um cult
do cinema onde a mulher foi elevada a outro patamar, depois de décadas de
mulheres objetos, femme fatales e pin-ups: o filme francês L’Immortelle (1963). Aqui o diretor
Alain Robbe-Grillet (romancista e roteirista indicado ao Oscar no filme de
Allain Renais The Last Year at Marienbad
- 1961) eleva a mulher a um patamar metafísico - mas sem deixar de ser carnal e
provocante.
quarta-feira, julho 02, 2014
"Agnosia" revela formas alternativas da mente no cinema
quarta-feira, julho 02, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O filme espanhol “Agnosia” de Eugenio Mira e “A Origem” de Christopher
Nolan foram lançados no mesmo ano de 2010. São dois filmes com versões
diferentes para o mesmo tema: um thriller de espionagem industrial que envolve
a invasão da mente de alguém para extraírem um segredo que envolve interesses
corporativos. Um exercício de análise comparativa entre os dois filmes revela
diferentes formas de representar a mente humana: se na Europa a Psicanálise e a psicologia da percepção possuem prestígio no meio artístico e intelectual, nos
EUA a mente não é pensada como uma máquina desejante, mas informática onde
dados são deletados ou inseridos. Enquanto “Agnosia” é um conto gótico inspirado
em psicanálise, “A Origem” é o inconsciente traduzido pelas neurociências.
A análise comparada em cinema (o exercício de analisar diferentes visões
de filmes e diretores sobre um mesmo tema) sempre dá surpreendentes resultados
ao revelar as diferenças ideológicas e culturais de países ou de polos de
produção cinematográfica.
Um exemplo evidente é o filme espanhol Agnosia (2010) do diretor Eugenio Mira e escrito por Antonio
Trashorras. Assistindo ao filme, é impossível não comprarmos com o filme de
Christopher Nolan A Origem
(Inception, 2010), produção norte-americana lançada no mesmo ano da produção
espanhola. Ambos exploram o tema da espionagem industrial: há um segredo de
grande interesse industrial que está na mente de uma pessoa e que deve ser
extraído.
sexta-feira, junho 27, 2014
Por que nossa mente quer ser enganada?
sexta-feira, junho 27, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Militantes do
PSDB posando para fotografias ao lado de um display de papelão do candidato
Aécio Neves em tamanho real na convenção do partido e um jornalista que
confundiu o sósia do Felipão com o verdadeiro. Qual a secreta conexão entre
esses dois episódios? O estranho desejo humano de querer ser enganado. E a
filosofia da percepção e a neurologia podem explicar isso. Por que pacientes
que sofriam de afasia global e agnosia tonal ridicularizaram um discurso na TV
do presidente Ronald Reagan em 1985 enquanto os receptores normais o
consideravam um “grande comunicador”? Talvez o caminho seja entender a natureza
das “imagens-afecção” e a solução do enigma do porquê demoramos meio segundo
para ter consciência das decisões que o nosso próprio cérebro teve. A
contra-tática para combater a canastrice na política pode estar nas mão dos
filósofos da percepção como Brian Massumi e em neurologistas como Oliver Sacks.
As imagens dos
bonecos de papelão do candidato Aécio Neves na convenção do PSDB para que
militantes posassem ao lado do display e a “barriga” jornalística cometida pelo
colunista Mario Sergio Conti que confundiu o sósia com o verdadeiro Felipão revelam um
secreto sincronismo: o estranho desejo humano de querer ser enganado.
Em postagem
anterior discutíamos como era possível que ainda hoje a opinião pública ainda seja
mobilizada por táticas publicitárias e de propaganda tão estereotipadas,
exageradas, com personagens tão canastrões, caricatos, com gestos, expressões
faciais e poses tão overacting.
Péssimos atores que não conseguiriam passar pelo mais simples teste de seleção
do cast do filme de mais baixo
orçamento - sobre esse tema clique aqui.
Assistindo ao filme O Grande Ditador de Chaplin,
somos dominados por uma estranha sensação ao se questionar sobre quem teria
inspirado quem: a pantomima de Chaplin também estava presente nos gestuais e
discursos de Hitler e Mussolini. Quem se inspirou em quem? O gênio de Chaplin
não foi o de fazer uma caricatura genial de um ditador, mas de revelar a todos
que na política levamos a sério maus atores – Chaplin mostrou de uma forma
profissional o que Hitler e Mussolini faziam de forma canastrona.
terça-feira, junho 24, 2014
Curta "BlinkyTM" mostra as obscuras relações humanas com a tecnologia
terça-feira, junho 24, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O curta
metragem “BlinkyTM - Bad Robot” (2011) dirigido pelo irlandês Ruairi Robinson segue a
trilha temática análoga ao filme premiado pelo Oscar “Ela” de Spike Jonze: a relação
mágica e fetichista com os gadgets tecnológicos. Se no filme de Jonze um
usuário se apaixona por um sistema operacional, no curta de Robinson uma
criança acredita na promessa de um anúncio publicitário de que um robô de
estimação será capaz de reunificar a sua família, cujos pais estão em
constantes brigas. O curta é uma ótima oportunidade para discutir os efeitos do
descompasso entre os modelos de família perfeita apresentados pelo discurso
publicitário e as relações reais entre pais e filhos. Curta sugerido pelo nosso
leitor Felipe Resende.
Em um futuro
próximo toda casa terá um robô ajudante capaz não só de entreter seu filho como
de também fazer o almoço. Mas não se preocupe. É perfeitamente seguro... mas,
cuidado com o que você pedir para ele: o robô poderá interpretar ao pé da letra
o que você desejar e as consequências podem ser imprevisíveis.
O diretor e
animador irlandês Ruairi Robinson (indicado ao Oscar em 2002 com o curta Fifty Percent Grey) com o curta BlinkyTM - Bad Robot nos sugere como pode ser
perigosa a combinação dos velhos problemas humanos com a moderna tecnologia,
não só incapaz de resolvê-los como ainda podendo ampliá-los. Máquinas e seus
programadores são incapazes de inserir julgamentos éticos ou morais entre os O
e 1 das codificações. Mas os usuários dos gadgets
tecnológicos não veem dessa maneira e passam a ter uma relação fetichista ou
mágica, acreditando que aplicativos, programas ou robôs irão misticamente
encontrar soluções para nós.
sábado, junho 21, 2014
Barrigas e não-notícias na Operação Anti-Copa
sábado, junho 21, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Da “barriga” do
cão Caramelo em 2011 até a atual que envolveu o experiente jornalista Mário
Sérgio Conti e um sósia do técnico Felipão entrevistado como fosse o verdadeiro,
revela como jornalistas da grande mídia transformam-se em metralhadoras
giratórias sob a pressão do papel assumido de oposição política: atira-se
primeiro para pensar depois. Mas nesse momento a pressão só aumenta com o
hipotético cenário negativo para um ano eleitoral: de que não só a Copa seja um
sucesso de organização como, pior, a seleção brasileira seja campeã. Pela
dificuldade em montar bombas semióticas nesse momento (o ritmo dos jogos e dos debates
televisivos tem isolado protestos e incidentes de organização), a grande mídia
passou a mobilizar seu braço armado: os colunistas, sob o apoio das
não-notícias na Operação Anti-Copa.
Para quem
acompanha de perto as transformações da linguagem midiática, a tragédia dos
mortos nas enchentes e deslizamentos de terra nas serras fluminenses em 2011
marcou o início das coberturas jornalísticas politicamente comprometidas com o
papel de oposição ao governo federal.
Depois de uma
disputa eleitoral polarizada no ano anterior entre Dilma e Serra onde se
misturou política com religião, bolinhas de papel, intolerância e preconceito,
a grande mídia iniciou naquele ano um processo de coberturas jornalísticas cuja
pressão oposicionista que partia das reuniões de pauta explodia nos repórteres
que deveriam nas reportagens, enquetes, entrevistas ou depoimentos buscar
ansiosamente qualquer índice ou evidência da incompetência gerencial do
governo.
Um dos reflexos dessa ansiedade é a construção
de personagens nas narrativas jornalísticas, estratégia discursiva onde se
busca a legitimação de uma pauta por meio de um personagem elaborado muitas
vezes com signos retóricos e ficcionais. Na corda bamba entre a ficção e a
realidade, algumas vezes o jornalista despenca e surgem as vexatórias “barrigas”
- gíria
jornalística para designar uma grave bobeada de um jornalista que pensa estar
publicando um “furo” quando não passa de engano ou má fé do próprio repórter.
sexta-feira, junho 20, 2014
Por que Nova York precisa ser destruída?
sexta-feira, junho 20, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Quantas vezes Nova York já foi destruída no cinema,
literatura, rádio e TV? Monstros, alienígenas, catástrofes geológicas,
climáticas, destruições provocadas por lutas de super-heróis com vilões. Por que essa insistência das imagens de
destruição da “Big Apple” na cultura norte-americana? Pode parecer uma questão
supérflua de um cinéfilo diletante, mas se considerarmos que essas imagens são
irradiadas para todo o planeta pela indústria do entretenimento norte-americana,
passa a ser uma questão ideológica: o que na verdade Hollywood exporta para o
mundo: paranoia? Motivação subliminar para a obsolescência de produtos? Ou a
elaboração de um neoapocalipse necessário para a criação de uma nova religião
global? Vamos explorar algumas hipóteses sobre os porquês dessa obsessão
norte-americana.
Meridth Blake,
28, vive no Brooklyn, Nova York. Ele relata uma insólita cena quando estava em
uma estação do metrô: “Saí do trem e dei de cara com um pôster do filme Cloverfield com a Estátua da Liberdade
decepada. Subi as escadas para, em seguida, ver o pôster do filme Eu Sou a Lenda com a ponte do Brooklin
em ruínas. Pensei, ora! Outro filme que destrói Nova York!”.
Com uma
diferença de um mês de lançamentos, ambos os filmes contavam as desventuras de
protagonistas em uma Nova York destruída por monstros ou por epidemias. Isso
foi em 2008, quando os nova-iorquinos ainda sentiam os ecos da queda das torres
do WTC em 2001: “lembro-me da cena do filme Cloverfield
com pessoas correndo para se esconder em uma delicatessen com poeira e
escombros por toda parte. É tão obviamente uma alusão ao 11/09...”, destacou
Blake - leia "Filmakers View New York as a Disaster Waiting to Happen".
segunda-feira, junho 16, 2014
O ódio envenena e mata no curta "Cólera"
segunda-feira, junho 16, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Selecionado e
premiado em todos os festivais de horror e fantástico nos quais foi exibido, o
curta espanhol “Cólera” (2013) de Aritz Moreno é uma preocupante representação
contemporânea da escalada do espírito de linchamento, ódio e intolerância. O
curta comprova como o gênero, desde o filme “O “Gabinete do Dr. Caligari” de
1919 que teria antevisto o nazismo, é um termômetro da cultura e da sociedade
em cada momento: na Espanha, a crise econômica e o crescimento da xenofobia e o
ódio racial; no mundo a intolerância e o racismo como um mal viral e endêmico,
assim como a cólera. Além disso, o curta consegue em seus seis minutos de um único plano sequência fazer
uma síntese do psiquismo da personalidade autoritária: o ódio pode matar sua
vítima, mas também envenenar o próprio algoz.
O ódio envenena
e mata. O seis minutos do curta metragem Cólera
do espanhol Aritz Moreno nos impacta como um raio pela sua mensagem direta e
contundente. Rodado em um único plano-sequência que mistura os pontos de vista
de todos os personagens, o curta foi baseado em um comic book do norte-americano Richard Corben.
Selecionado e
premiado em mais de cem festivais em todo o mundo, podemos ler no poster promocional um verbete curto e direto: “Cólera: m. Pat. Enfermidade contagiosa epidêmica
aguda e muito grave” - veja o curta abaixo.
O curta relata
de forma crua a população agressiva e colérica de um vilarejo que pretende fazer
justiça com as próprias mãos. Armados com paus, pedras e espingardas pagarão as
consequências desse linchamento. Todos estão se dirigindo a um pequeno casebre
construído de forma precária com tábuas velhas e papelão, isolado no meio de um
campo. Lá se encontra o objeto de todo ódio da população, alguém que, segundo
eles, já teria causado “problemas demais”. “Finalmente uma vila limpa!”, brada
o líder do populacho enfurecido e levantando uma espingarda.
domingo, junho 15, 2014
Atratores estranhos e paradoxos da viagem no tempo em "Primer"
domingo, junho 15, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Vencedor no
Festival de Sundance e odiado por aqueles que vão ao cinema apenas para comer
pipoca e se divertir, o filme “Primer” (2004) do diretor Shane Carruth é um
quebra-cabeça sobre questões lógicas sobre a viagem no tempo: paradoxos,
lacunas, pontas soltas, causalidade. Esqueça o famoso “paradoxo dos gêmeos”
(Paradoxo de Langevin) sobre a relatividade das viagens no tempo. Esse é o
menor dos problemas nesse filme. Influenciado pelo ocultismo de Aronofsky de “Pi”
e os “warmholes” de “Donnie Darko”, o filme se defronta com as grandes
interdições estruturais do contínuo tempo-espaço que impedem o homem se libertar do
Tempo: as noções de atratores estranhos e da geometria recursiva da Teoria do
Caos. Filme sugerido pelo nosso leitor Marcos Garcia.
Primer se insere em um subgênero dos
filmes de ficção científica que poderíamos chamar de low sci-fi como Another Earth, Sound of My Voice, Safety Not Guaranteed etc. Filmes de baixíssimo
orçamento (Primer foi realizado com
sete mil dólares) onde os temas científicos são pretextos e muitas vezes apenas
um cenário para questões éticas e morais sobre relacionamentos humanos.
Carruth
obviamente foi influenciado pela intensidade ocultista de Darren Aronofsky do
filme Pi e os “warmholes” de Donnie Darko. Primer mostra como jovens engenheiros, com poucos recursos em uma
pequena garagem, constroem alguma coisa que envolve campo magnético e
manipulação da gravidade em pequenos objetos, mas que produz um inesperado
efeito colateral de possibilidade de viagem no tempo.
quinta-feira, junho 12, 2014
Praça Victor Civita é a Disneylândia do hiperliberalismo
quinta-feira, junho 12, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Estátuas e
instalações artísticas de lixo reciclado, teatro infantil falando sobre a
escassez da água, uma modelo sorridente num estande da Sabesp abrindo uma
torneirinha em um bebedouro para servir os visitantes com um copo d' água. Tudo isso com
os ventos trazendo o mau cheiro do Rio Pinheiros. Essa é uma tarde na Praça
Victor Civita, em São Paulo. Todos esses elementos têm uma secreta conexão.
Essa não é uma praça comum, mas um autêntico parque temático, a Disneylândia de
uma nova ordem futura onde a nossa sensibilidade está sendo moldada para
aceitar a suposta realidade que a Natureza é finita e escassa. Tudo em um mix de
entretenimento, cultura e estilo de vida que poderíamos chamar de “estética da
escassez”, embalagem estética da nascente ideologia do hiperliberalismo:
convergência do ambientalismo com a elite financeira e rentista como álibi para a mercantilização da água. E o Estado de
São Paulo é a vanguarda desse movimento no Brasil.
Sábado à tarde
com as crianças e esposa na Praça Victor Civita, em Pinheiros. Clima leve, descontraído
e colorido com ciclistas descansando preguiçosamente, crianças gritando e
correndo por todos os lados e uma simpática modelo ao lado do que parecia um
grande bebedouro com o logo da Sabesp em um pequeno estande.
A certa altura,
todos começam a se dirigir ao pequeno anfiteatro do parque. Ótimo! Um
espetáculo infantil para a criançada e a chance dos pais recuperarem o fôlego
depois de tanta correria. E a primeira atração era interessante: a trupe do Mad Science onde através de pequenas experiências com muita
confusão e risadas, ensinam para a criançada princípios
básicos de física, química e ecologia. Nada mais politicamente correto em um
parque cercado de instalações e esculturas feitas com lixo reciclado e diversas
hortas autossustentáveis em um lugar que, no passado, era um grande incinerador
de lixo.
O show inicia e
o vento começa a bater, trazendo o incômodo mau cheiro do rio Pinheiros, bem
próximo dali. Nesse momento, os atores do Mad
Science, em seus jalecos de cientistas e jeito amalucado, faziam uma breve
exposição sobre o ciclo da água e, numa alegoria envolvendo um galão cheio de
pequenas bolinhas de isopor, iam mostrando a proporção entre água salgada e
potável no planeta... Como a água potável é um bem escasso... Principalmente
com as alterações climáticas do planeta... por isso, a pouca chuva em São Paulo
e as represas secando... logo, devemos economizar para enfrentarmos o futuro...
segunda-feira, junho 09, 2014
Conceito "Cinegnose" é agora verbete em nova edição do Dicionário da Comunicação
segunda-feira, junho 09, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O conceito
criado por esse humilde blogueiro e a razão da existência desse blog – a noção
de “cinegnose” – foi transformado em verbete no “Dicionário da Comunicação –
segunda edição revista e ampliada”, lançado na semana passada pela Editora
Paulus. Juntamente com os verbetes “filme gnóstico” e “adgnose”, também criados nas pesquisas do blog, o "Dicionário
da Comunicação" organizado pelo Prof. Dr. Ciro Marcondes Filho abre a
oportunidade para que as pesquisas sobre as confluências entre Gnosticismo,
Cinema e Comunicação que foram iniciadas pelo “Cinema Secreto: Cinegnose” se
fortaleçam e ganhem espaço dentro dos estudos científicos da área. As pesquisas
iniciadas por esse blog se juntam, portanto, às pesquisas da chamada Nova
Teoria da Comunicação: o estudo do fenômeno comunicacional como acontecimento e
transformação pessoal e coletiva. E para o blog, a abertura para fenômenos
espirituais como a gnose.
Na semana
passada foi lançado em São Paulo o Dicionário
da Comunicação - segunda edição
revista e ampliada, pela editora Paulus, organizado pelo Prof. Dr. Ciro
Marcondes Filho da ECA/USP. Esse humilde blogueiro fez parte dos 80 colaboradores
nacionais e internacionais que trouxeram novas correntes de pesquisas e olhares
para a comunicação, incluindo diferentes linhas de pensamentos.
Nesta nova
edição do dicionário esse blogueiro que escreve essas mal traçadas linhas foi
convidado a transformar em verbetes alguns conceitos desenvolvidos por esse
blog dentro do nosso projeto de convergência dos conceitos da Teoria da
Comunicação e Cinema com o Gnosticismo: “adgnose”, “filme gnóstico”,
“cinegnose”, “arquétipos contemporâneos”, “agenda tecnocientífica”, “cinema
esquizo”, além de conceitos tradicionais da ciência da comunicação como “agenda
setting” e “mitologia” – no sentido dado pelo semiólogo francês Roland Barthes.
sábado, junho 07, 2014
A Copa das não-notícias
sábado, junho 07, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A grande mídia
esperou até o último instante, aguardando talvez alguma “bala de prata” que
prejudicasse, suspendesse ou, no mínimo, colocasse em xeque a realização da
Copa do Mundo no Brasil. Um evento que se tornou uma verdadeira dor de cabeça
para uma mídia que assumiu explicitamente a oposição política. Mas a Copa vai
começar e agora nada pode passar impune: uma nova etapa da guerrilha
semiológica iniciada no ano passado se inicia. A pauta negativa, “recomendação” interna da TV Globo
para todos os jornalistas na cobertura da Copa, revela uma novidade no paiol das
bombas semióticas: a não-notícia. Produto das revistas de celebridades e das
coberturas esportivas extensivas como Olimpíadas e Copa do Mundo, elas agora
estão sendo turbinadas politicamente por meio de duas estratégias semióticas: fazer
o espectador confundir causa e efeito dos acontecimentos e a armadilha da
generalização nas indefectíveis enquetes.
Desde as
grandes manifestações de junho do ano passado, a grande mídia (que de início
execrou como vandalismo e infantilismo político para, logo depois, procurar
inseri-las no plot narrativo da oposição na proximidade de ano eleitoral –
mensalão, PEC 37 etc.) mobilizando uma pesada artilharia semiótica de construção
de textos e imagens que sintetizem em um frame, fotograma, parágrafo, legenda
de foto etc. um conjunto de percepções e fragmentos ideológicos. Chamamos esse
arsenal de recursos retóricos e semiológicos de “bombas semióticas”.
Desde junho do ano passado uma variedade de bombas semióticas assolaram a opinião pública |
Ao longo desse
período detectamos diversos tipos de bombas: dessimbolizações,
infotenimento,
a
black bloc good bad girl, fotos-choques,
cavalos
de Tróia, guerrilha
de memes, exploração
fetichista de animais e mulheres, tomates
e inadimplência.
Isso sem falar de acidentes com jornalistas no momento em que montavam bombas
como, por exemplo, o caso da bomba semiótica do Enem ou a “barrigada” darepórter da rádio CBN que via no campus da USP mensagens cifradas análogas às
do tráfico de drogas nos morros do Rio de Janeiro. Essa variedade de bombas
semióticas teve um objetivo em comum: manter a opinião pública em estado de
constante tensão em um País supostamente à beira do abismo econômico e em
situação pré-insurrecional.
Mas agora
quando a agenda nacional passa a ser dominada pela Copa do Mundo, entra em cena
uma nova bomba semiótica: a da não-notícia. A grande mídia caiu em si que não
só vai ter Copa, mas como também manifestações de protestos podem ficar
isoladas ou, no mínimo, deslocadas na opinião pública em relação ao evento
esportivo internacional.
quinta-feira, junho 05, 2014
Max Headroom antevia o fim do jornalista e as bombas semióticas
quinta-feira, junho 05, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Voz sampleada,
gaguejante e distorcida de um personagem dotado de senso de humor cínico e
irônico. Era Max Headroom, personagem digital resultante de uma secreta
experiência da gigantesca Rede 23 de TV para substituir o jornalista estrela da
emissora numa conspiração para encobrir uma bomba subliminar que matava
espectadores. “Max Headroom” (Max Headroom, 1985), criado por Peter Wagg e exibido pela emissora inglesa
Channel 4, além de ser um ícone do imaginário ciberpunk da então nascente
tecnologia digital, foi um filme profético: já estava lá a futura precarização
do trabalho do jornalista até o seu desaparecimento através da tecnologia
telemática (repórteres guiados por telemetria e dependentes de controladores) e
as bombas semióticas criadas na atual guerrilha semiológica das mídias,
simbolicamente representados no filme pelos mortais “blipverts”.
As
representações dos jornalistas no cinema sempre ficaram em um movimento
pendular entre de um lado heróis investigativos e idealistas vivendo no
underground da sociedade e, do outro, ambiciosos e potencialmente corruptos.
Filmes como A Montanha dos Sete Abutres
(Ace in the Hole, 1951) e O Quarto Poder
(Mad City, 1997) mostram jornalistas inescrupulosos, ambiciosos e
manipuladores, enquanto Todos Os Homens
do Presidente (All the President’s Men, 1976) mostram Bernstein e Woodward
como a quintessência do jornalismo investigativo capaz de derrubar o presidente
da maior potência do mundo.
Já o filme
piloto de uma série chamado Max Headroom,
criado por Peter Wagg para o Channel 4 inglês em 1985, rompe com essa dualidade
das representações cinematográficas do jornalismo ao vislumbrar um futuro (na
verdade, a atualidade) onde as tecnologias telemáticas modificam radicalmente o
papel do jornalista: do profissional que buscava a notícia, que pesquisava os
dados brutos e buscava conexões, ao mero veículo de uma suposta transparência
da imagem tecnológica onde o repórter vira o protagonista da própria notícia. Tudo
isso para encobrir a própria precarização da profissão.
terça-feira, junho 03, 2014
Por que as aves atacam em "Os Pássaros"?
terça-feira, junho 03, 2014
Wilson Roberto Vieira Ferreira
Hitchcock não levava a sério as ideias freudianas e irritava-se com as interpretações psicanalíticas de seus filmes, principalmente do filme “Os Pássaros” (The Birds, 1963): “Idiotas estúpidos! Sempre estive consciente do que fiz em todas as minhas obras”, esbravejava. Mas as imagens dos pássaros atacando seres humanos em um pequeno vilarejo litorâneo tornaram-se atemporais, como se Hitchcock, mais do que roteirizar, dirigir, montar e editar, inconscientemente tivesse buscado seus insights tanto em fatos científicos ocorridos com aves em 1961 na Califórnia, quanto nos arquétipos do inconsciente coletivo da humanidade. Por isso, de todos os filmes do diretor (Hitchcock considerava o filme como o “menos Hitchcock” da sua carreira), “Os Pássaros” foi o filme que mais rendeu interpretações, sejam científicas, psicanalíticas, filosóficas e gnósticas: por que os pássaros de Hitchcock atacaram? É o que vamos tentar responder.
A crítica especializada
em geral considera o filme Os Pássaros
o último grande filme de Hitchcock, rodado em 1963 quando a reputação do
diretor estava no auge. O filme anterior Psicose
(1960) tinha sido um sucesso e a Universal Pictures deu para o diretor três
milhões de dólares para o seu próximo projeto. Hitchcock já havia se tornado a
marca exclusiva do cinema de suspense com narrativas sobre espionagem,
psicopatia, frieza, romance e muito humor negro.
Porém, Os Pássaros foi o filme que o redefiniu
ou, como o próprio diretor considerou, era o filme “menos Hitchcock” da sua
cinematografia até aquele momento: ele pela primeira vez se valeu da tecnologia
como os efeitos sonoros construídos por um instrumento eletrônico chamado
Mixtur-trautonium (o filme não possui trilha musical a não ser diegéticas –
crianças cantando na escola, som do rádio do carro ou quando a protagonista
toca ao piano); efeitos especiais indicados ao Oscar para criar os temíveis pássaros
assassinos; e a utilização de muitas tomadas externas, técnica que ele nunca
preferiu – costumava rodar os filmes completamente em estúdios.
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