Imagine um
thriller tecnocientífico que contasse com a consultoria de cientistas como
Einstein, Thomas Edison, Niels Bohr e Nikola Tesla. Mas não há colisores de
partículas ou fórmulas matemáticas. Há avançados experimentos na busca pela vida pós-morte.
Esse é o curioso filme indie “Einstein’s God Model” (2016) do diretor Philip
Johnson: como a busca de existências após a morte por meio de um Spectrographic
EMF Receiver construído por Edison nos anos 1920 revive o velho conflito entre
o modelo divino de Einstein contra o modelo ateu quântico de Bohr. Um grupo
bizarro de “cientistas” (um físico renegado, um anestesista e um médium cego)
irá confrontar Relatividade, Mecânica Quântica e Teoria das Cordas para buscar
o mito da “segunda chance” (corrigir em mundos paralelos erros cometidos nesse
mundo) e uma interpretação gnóstica da
Física que empurra os modelos teóricos para além da maior falha da Criação: a
seta do Tempo. Filme sugerido pelo nosso leitor Felipe Resende.
É conhecida a
aporia de Einstein em relação à física experimental quântica de Neils Bohr e o
princípio da Incerteza de Heisenberg. A descoberta de um mundo subatômico,
ondulatório, descontínuo, probabilístico e incerto, questionando o Universo
monista de Einstein (unido geometricamente num tempo-espaço curvo), fez ele
reagir: “Deus não joga com dados”.
Para o filme
sci-fi independente Einstein’s God Model
esse era o modelo “divino” do famoso físico. Einstein ainda acreditava em Deus
e achava que todo o conhecimento científico seria o percurso em direção a Ele,
o limite de todo o conhecimento universal.
Einstein
concebia um Universo onde o tempo seguiria uma única direção, como demonstra o
conceito de entropia da termodinâmica – perda de energia, desorganização,
morte. Em síntese: a ideia de seta do
tempo.
Mas a mecânica
quântica suscita a possibilidade de multiversos e o comportamento ondular do
tempo permitiria pensarmos para além dos limites que nos obrigam a vermos uma
única parte do tempo, sem percebermos as “ressonâncias” (Teoria das Cordas) de
outros tempos e dimensões.
Colisores de partículas e o pós-morte
Einstein’s
God Model (estreia do diretor Philip Johnson) entra nesse debate contando a
estória de físicos independentes que fazem uma exótica parceria com médicos anestesistas:
cansados de verem a comunidade de físicos estudarem o mundo subatômico em
grandes colisores de partículas para tentar comprovar as teses das cordas e da
mecânica quântica, decidem partir para outro campo – a existência da vida
pós-morte.
Para eles, no
momento da morte o cérebro humano pode perceber muito além da seta do tempo na
qual nos limitamos quando estamos vivos: do outro lado poderíamos perceber o
mundo subatômico, o universo quântico.
Einstein’s God Model é mais um filme sci-fi independente que faz
uma leitura gnóstica da física moderna, ao lado de produções recentes como Coherence (2013), Mr. Nobody (2009), Primer (2004), Don’t Blink (2014), The OA (2016), Synchronicity (2015) entre outros
em uma grande lista.
E a companhia
teórica (que o filme inclusive cita nos créditos iniciais como fossem
“consultores técnicos”) é de peso: Thomas Edison e o sua invenção Spectrographic
EMF Receiver, A. Einstein (“presidente em relatividade”), N. Bohr (“Chefe em
Operações Quânticas”), E. Witten (“Cartógrafo de Membranas Dimensionais”), J.G.
Wright (“Ótica Multiverso”), W.O. Neil (“Técnico em Telefonia Gravitacional”) e
N. Tesla (“Design do Spectrografic EMF Receiver”).
E por que uma
leitura gnóstica da física? Se o princípio da incerteza de Heisenberg veio
comprovar a suspeita do Gnosticismo de que a Criação é imperfeita e obra de um
Demiurgo, por outro lado potencialmente confirma a cosmologia gnóstica (a
pluralidade de mundos) e a também a possível transcendência da principal falha
que nos mantém prisioneiros nesse cosmos : a entropia.
A morte não
existira porque, através da gravidade (ou “grávitons”, as partículas das forças
gravitacionais), a morte significaria apenas o deslocamento de uma “membrana”
para outra através dos multiversos.
Como veremos,
apesar de toda ambição teórica do filme de pretender fazer uma espécie de
“Teoria de Tudo” (a velha ambição de Einstein da “Teoria do Campo Unificado” em
unir o mundo macro e micro) Einstein’s
God Model tem timing de humor, thriller e didáticas sínteses das principais
teses da física moderna.
O Filme
A estória
começa em 2002 num experimento no qual dois cientistas conectam um estudante
voluntário ao que parece ser um scanner cerebral a um sistema de som antiquado
com uma série de leitores e dials analógicos. A máquina foi
construída por nada menos do que Thomas Edison, um “Spectrographic EMF Receiver
feita dentro de um projeto secreto chamado “God Model Project” nos anos 1920.
Um dispositivo projetado para entrar em contato com os morto através de um
velho telefone preto.
A experiência
parece ter sido dolorosamente mal sucedida. Pulamos então para os dias atuais e
encontramos um jovem anestesista, Brayden Taylor (Aaron Graham), se defrontando
com a morte da sua namorada, Abbey – Kirby O’Connell.
Uma conversa
casual com um colega, leva-o a saber de experiências com uma droga chamada
Cetamina (que induz a percepções similares a pós-morte) e experiências
anti-éticas realizadas com elas por um físico brilhante chamado Carl Meinsehoff
(Darryl Warren) que, desde então, desapareceu.
Demora um pouco
para os personagens principais se unirem para novos experimentos com a velha
máquina de Edison: Craig (Brad Norman, a cobaia da experiência inicial) que
ficou cego e transformou-se em um médium capaz de contatar os mortos em uma
emissora de rádio evangélica; o físico Mastenbrook (Kenneth Hughes),
remanescente da experiência inicial e que tenta melhorar a máquina de Edison
conectando-a a um computador quântico – serão dele as principais linhas de
diálogo com as elucidações científicas sobre todo o processo.
Os efeitos
especiais são bastante impressionantes e criativos para uma produção
independente com um orçamento tão limitado. E apesar de todos os diálogos
discursivos em torno de relatividade, física quântica e teoria das cordas, o
filme segue em ritmo de thriller. Um verdadeiro thriller técnico-científico.
A Segunda Chance
Mas como em
todo filme que trata sobre a possibilidade da existência da sobrevivência da
alma (no filme fala-se em “sobrevivência da personalidade”) a curiosidade
científica é a menor motivação: tanto Craig como Brayden são movidos pelos
sentimentos de culpa, remorso e arrependimento – Craig involuntariamente teria
sido responsável pela morte de sua pequena irmã e Brayden acreditando que
poderia ter salvo a sua noiva, deprimida por ter sofrido um aborto
involuntário.
Como no filme The Discovery (clique aqui), ambos buscam a
oportunidade de, pelo menos, se despedirem de uma forma digna para se
libertarem da culpa e elucidar os fatos.
Mas o que é o
“Modelo Divino de Einstein” que a bizarra equipe de cientistas (um físico
renegado, um anestesista e um médium cego) tenta compreender para superar?
O Modelo Divino de Einstein
Há 60 anos,
Einstein foi questionado se acreditava em Deus. Então, o físico fez um diagrama
em uma lousa: um quadrado que representava todo o conhecimento (“Deus”) e um
quadrado menor, interno, que representa tudo o que aprendemos até a gora.
Einstein dividiu esse quadrado em quatro seções. No lado esquerdo, as coisas
que se movem acima e abaixo da metade da velocidade da luz; e do outro lado,
tudo o que é superior ou inferior ao tamanho de um átomo.
Seriam as áreas
distintas da Física: a Clássica, Relatividade, Quântica e a Relatividade
Quântica. A cada descoberta, empurramos o quadrado para próximo do limite do
quadrado maior. E quanto tempo levará para o quadrado maior ser preenchido pelo
menor? O tempo que levará para o homem se tornar Deus!
Mas para o
intrépido grupo de cientistas, as pesquisas pós-mortes levarão esse quadrado menor para além dos limites do quadrado maior supostamente representando “Deus”. Meisehoff
e Mastenbrook revivem no filme a velha aporia entre Einstein (crente em Deus) e
Bohr (ateu): o confronto entre o modelo cósmico monista da seta do tempo e
entropia contra o modelo do multiverso e de realidades multifacetadas nas quais
o princípio entrópico não existe – ou pelo menos é tomado em outro nível.
Esses
multiversos são chamados de “membranas” para as quais a “personalidade” do
morto se desloca por meio da força gravitacional.
Muito mais do
que outros filmes sobre a onda atual de produções sobre o tema do pós-morte, Einstein’s God Model faz uma estimulante
combinação entre o tema da “segunda chance” (a possibilidade de mundos
alternativos nos quais corrigimos nossos erros) com uma abordagem gnóstica da
Física: o caminho do conhecimento não é o de preencher o quadrado da Criação e
encontrar Deus. Trata de transcender, superando o maior defeito de toda a
Criação – o Tempo.
Ficha Técnica |
Título: Einstein’s
God Model
|
Diretor:
Philip Johnson
|
Roteiro: Philip Johnson
|
Elenco: Aaron Graham,
Kirby O’Connell, Kenneth Hughes, Brad Norman, Darryl Warren
|
Produção: Induction Productions, Tree of Shade
|
Distribuição:
Indie Rights
|
Ano: 2016
|
País: EUA
|
Postagens Relacionadas |