O homem da multidão do conto de Edgar
Allan Poe se encontra com o paradoxo quântico da famosa experiência do gato de
Schrödinger de 1935. É o curta “O Homem na Multidão”, adaptação do conto
original de Allan Poe feita pelo trio de alunos Aderbal Machado,
Ricardo Vos e Vitória Silva. O curta foi o resultado do trabalho de conclusão
da disciplina Estrutura de Roteiros ministrada por esse humilde blogueiro na
Universidade Anhembi Morumbi no curso de Produção Editorial em Multimeios. Um
curta enigmático e estranho, com uma pitada de Gnosticismo onde o encontro
somente é possível no estado de consciência suspensa entre a vida e a morte.
Um homem entrou em coma num hospital. Entre a vida
e a morte relembra de fatos ocorridos no dia anterior: irritado com o seu gato
que havia destruído um vaso, o vizinho invade o apartamento e leva o bichano
embora. Inconsolável, o homem agora procura seu gato. Observa a multidão
passando pelas calçadas, sentado em um café lamentando a perda.
Levanta-se e sai andando pelas ruas. De repente
ouve miados que parecem vir de uma pequena caixa segurada por um homem que
aparentemente é seu vizinho. Inicia-se então uma perseguição àquele suspeito de
ter sequestrado seu gato.
O final reserva para o espectador um enigma onde o
homem da multidão imaginado por Edgar Allan Poe se encontrará com o paradoxo
quântico da famosa experiência do gato de Schrödinger de 1935.
Esse é o curta O
Homem na Multidão (2016) de Aderbal Machado, Ricardo Vos e Vitória Silva. O
curta é um trabalho de conclusão da disciplina Estrutura de Roteiros ministrada
por esse humilde blogueiro no curso de graduação Produção Editorial em
Multimeios da Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo.
O desafio do trabalho de conclusão era fazer um
roteiro literário adaptado de um dos contos do escritor norte-americano Edgar
Allan Poe e transformá-lo em um curta. O objetivo principal era a confecção do
roteiro. Mas o trio de alunos conseguiu ir além, produzindo um vídeo enigmático
e estranho em um inusitado encontro entre Allan Poe e o paradoxo quântico da
experiência da caixa do gato.
Para quem não está familiarizado com a física
quântica, o físico austríaco Schrödinger tentou através dessa experiência
mostrar o aparentemente ilógico mundo das partículas subatômicas – o fato de
que uma partícula poderia estar em dois lugares ao mesmo tempo.
O físico quis transpor esse paradoxo para uma
situação fácil de ser visualizada: um gato está preso numa caixa que contém um
recipiente com material radioativo e um contador Geiger. Se o material soltar
partículas radioativas e o contador detectar, acionará um martelo que, por
decorrência, quebrará um frasco de veneno, matando o bichano.
De
acordo com as leis da física quântica, a radioatividade pode se manifestar
tanto como onda quanto partícula. Ou seja, na mesma fração de segundo, o frasco
de veneno quebra e não quebra, produzindo duas realidades probabilísticas
simultâneas. Segundo o raciocínio, as duas realidades aconteceriam
simultaneamente dentro da caixa, até que fosse aberta – a presença de um
observador e a entrada da luz intervindo nas partículas acabariam com a
dualidade.
Ambas
realidades existem simultaneamente dentro da caixa. Mas existe a chamada “decoerência
quântica” que garante que essa situação “decaia” para um dos resultados: vivo
ou morto. Isso impede que os “dois gatos” das situações diferentes interajam
entre si.
É nesse
ponto que o curta O Homem da Multidão
leva o personagem de Allan Poe para o mundo quântico: o paradoxo que ocorreria
no interior da caixa é levado para o próprio mundo do protagonista, lembrando
bastante o filme Coherence (2013),
onde complexos conceitos quânticos como “sobreposição”, “entrelaçamento” e
“decoerência” são levados para as tensões das relações humanas – sobre esse
filme clique aqui.
A
adaptação do curta acrescenta ainda um elemento gnóstico: o estado de suspensão
como estado alterado de consciência capaz de induzir a iluminação ou gnose – o
autoconhecimento. O protagonista está em coma, em um estado de suspensão entre
vida e morte.
Aqui o
curta marca uma diferença com o conto original de Allan Poe. Enquanto lá, após
perseguir o homem da multidão, o protagonista desistia porque aquele homem “não
se deixava ler” e que “há certos segredos que não se deixam contar”, aqui o
protagonista alcança seu objetivo ao defrontar-se consigo mesmo em um paradoxo
quântico ao estilo do gato de Schrödinger.