Um filme que merece ser revisitado por esse blog. Há muito tempo assisti ao filme e, pelo que parece, passei tanto tempo sem assisti-lo de novo talvez porque a própria crítica especializada o esqueceu: raramente encontramos o filme "Muito Além do Jardim" em listas dos melhores filmes. Embora a própria crítica reconheça que seja uma das melhores críticas à sociedade e à mídia feita pelo Cinema. Peter Sellers faz essa comédia dramática tentando separá-lo da imagem do Inspetor Closeau depois do sucesso comercial da série "A Pantera Cor de Rosa" nos anos 1970. Muitos o associam ao tema do filme "Forrest Gump" (1994), porém com uma diferença: se no filme com Tom Hanks as tiradas filosóficas sobre o nada são levadas à sério, aqui Peter Sellers utiliza todo cinismo e ironia para mostrar como as pessoas começam a levar à sério alguém que unicamente repete os clichês despejados pela TV.
Muito Além do Jardim
(1979)
Diretor:
Hal Ashby
Plot:
Chance (Peter Sellers) é um jardineiro quase obtuso, um homem que vive cercado de suas plantas
e de seu aparelho de televisão, as duas paixões de sua vida. Chance não sabe
ler, nem escrever nem manter uma conversa mais articulada, além de não ter
nenhum registro oficial e não tem a menor noção de uma existência fora da
mansão onde foi criado. Quando seu patrão morre, ele se vê, inesperadamente, frente
a um universo absolutamente novo e com o qual não tem a menor noção de como
lidar. Por obra do acaso, ele é atropelado pela limousine de Eve Rand (Shirley
MacLaine), a esposa de um industrial milionário que está às portas da morte.
Levado para o casarão onde o casal mora, servido por inúmeros empregados, ele
conquista a todos com seu jeito calado e discreto. Suas frases - todas tiradas
de programas de TV - e até mesmo seu silêncio constrangido são tidos como
geniais tanto por Eve e seu marido Benjamin (Melvyn Douglas) quanto pelo
próprio presidente dos EUA (Jack Warden), amigo da família. Aos poucos, Chance
começa a influenciar a todos a sua volta, inclusive despertando a paixão de uma
carente Eve.
Por que está “Em
Observação”? – O público e os críticos parecem ter relegado
esse filme ao quase esquecimento. Não é um filme citado corriqueiramente na
lista dos melhores. Por se tratar de uma crítica à sociedade do espetáculo e a
influência das mídias de massa na percepção da realidade, estranhamente nem é mais
lembrado em Faculdades de Comunicação. Assim como “Cidadão Kane” (Citzen Kane,
1941) de Orson Welles, deveria listar como videografia obrigatória em qualquer
curso de comunicação. Em uma época ainda de mídias de massa ainda não imersivas
como as digitais atuais com os seus efeitos dupla telas (carregamos nossos
celulares conosco para nos conectarmos com telas mesmo em encontros
presenciais), o filme mostra um homem que tudo o que conhece do mundo foi
através da TV, sem nunca ir além dos muros da mansão onde trabalhava como
jardineiro.
O curioso no filme é que o argumento (baseado no livro de Jerzy Kosinski
de 1971) em um protagonista cuja personalidade foi moldada por dois elementos
opostos: o manejo com terra e plantas no jardim e a observação estática do
mundo através dos raios catódicos do mundo convertido em tubo de imagens. Essa
contraposição pode produzir muitos simbolismos na narrativa do filme.
Principalmente pelo seu final que, pelo que posso lembrar depois de tanto tempo
(vi esse filme, talvez, em minha época de faculdade), é aberto, ambíguo,
permitindo múltiplas leituras.
O que promete: O diretor Hal
Ashby era conhecido pelo perfeccionismo: chegava a gravar 20 takes por cena. O
filme foi indicado para dois Oscars (ator com Peter Sellers – perdeu para Dustin
Hoffmann por “Kramer Versus Kramer” – e ator coadjuvante que acabou premiando
Melvyn Douglas). Para os críticos é a melhor atuação de Peter Sellers em toda
sua carreira. Ao ler o livro de Jerzy Kosinski que deu base ao roteiro do
filme, Sellers viu a oportunidade de mostrar suas qualidades como ator, já que
sua imagem estava muito associada à do Inspetor Clouseau da série “A Pantera
Cor de Rosa”.
Para muitos críticos, o filme “Muito Além do Jardim” é umas das melhores
críticas cinematográficas feitas à sociedade e à mídia.
Além disso, a crítica afirma que o filme lembra muito o protagonista de “Forrest
Gump” – alguém com QI abaixo do normal consegue sucesso inesperado. Porém, se
as tiradas sobre o nada de Forrest Gump são levadas à sério no filme como
profundas verdade filosóficas, em “Muito Além do Jardim” o tom parece ser mais
cínico e irônico. Por só falar em terra e plantas, as pessoas ricas e poderosas
acham que Chance está fazendo analogias e simbolismos filosóficos profundos. Mas
nada tem sentido: Chance nada mais é do que um autista que replica os clichês
da mídia...