Sete astronautas despertam do sono criogênico em uma estranha espaçonave
que parece ter saído de alguma série sci fi dos anos 1960. Eles não sabem qual
o propósito de estarem ali, de onde vieram e para onde vão, e a nave parece
funcionar automaticamente Essa é a premissa do filme francês “Cosmodrama” (2015), uma
tragicomédia com uma evidente alusão sobre a condição humana nesse planeta.
Estreou esse ano no Festival Internacional de Rotterdam e a crítica
especializada vem definindo o filme como “a metafísica no espaço”. A cada cena,
a tripulação tenta formular teorias físicas, religiosas, filosóficas ou
semióticas sobre a natureza da espaçonave onde estão prisioneiros. Por isso,
“Cosmodrama” tem um evidente sabor gnóstico.
Diretor: Philippe Fernandez
Plot: Sete astronautas despertam do sono
criogênico em uma nave espacial e percebem que também estão acompanhados por
cães e macacos congelados. Ao despertar também percebem que perderam suas
memórias sobre de onde vieram, qual o propósito daquela nave espacial e para
onde estão indo. E a nave parece ser programada a funcionar automaticamente,
impedindo qualquer intervenção dos tripulantes.
Por que está “Em Observação”? – Premiado em
Cannes em 2008 com seu filme de estreia A
Faint Trembling of the Landscape, Philippe Fernandez lançou seu segundo
filme, Cosmodrama, esse ano no 44o Festival Internacional
de Cinema de Rotterdam.
Assistindo ao
trailer dessa tragicomédia, percebemos que o filme tem uma evidente estética
retro: parece que estamos na espaçonave Enterprise do capitão Kirk da série de TV Jornadas nas Estrelas na
década de 1960. Ou estamos no futuro? Além disso, Cosmodrama não apresenta ao
espectador nenhum dos elementos icônicos que atualmente dominam o gênero
ficção-científica: efeitos especiais, conflitos com aliens ou personagens que
lutam pela sobrevivência até o final.
Ao contrário, o
que temos a cada cena são diálogos sobre teorias metafísicas, filosóficas,
semióticas etc., sobre as relações do homem com o universo, mas, ao mesmo
tempo, desconstrói a tradicional
solenidade da forma como o gênero cinematográfico trata esses temas. E para
tanto, a tripulação é formado por um curioso conjunto de especialistas: o
astrônomo, o repórter, a psicóloga, a bióloga, o semiólogo, o físico.
Além de diretor de
cinema, Philippe Fernandez é professor de Arte Contemporânea na Universidade de
Bordeaux, França. Realidade que certamente está por trás das alusões com
evidente apelo gnóstico: a jornadas dos sete astronautas faz uma alusão ao
homem abandonado por Deus, largado em um cosmos aparentemente vazio onde tentam
preenche-lo com as mais diversas filosofias e teorias, da Ciência até a
Religião – de diálogos sobre a natureza dos buracos negros a discussões sobre o
Cristianismo e a Crucificação de Cristo.
Mas a própria
condição em que os astronautas despertam, é uma alusão à visão pessimista que o
Gnosticismo faz da reencarnação: sucessivas reencarnações onde a cada despertar
esquecemos da vivencia anterior, sendo condenados a recomeçar sempre do zero e
passando a vida inteira tentando recuperar a lembrança do que se perdeu por
meio da Ciência e da Religião. A reencarnação como um ciclo vicioso que nos
manteria prisioneiros a esse cosmos – filmes como Quero Ser John Malkovich já exploraram essas analogias – sobre isso
clique aqui.
O Cinegnose coloca esse filme “Em
Observação” (e por isso, ansiosamente à espera por um release em torrent) pela expectativa
de Cosmodrama ser uma produção CosmoGnóstica, isto é, de fazer parte de conjunto de
filmes gnósticos atuais como Show de
Truman ou Matrix onde os
protagonistas aparecem como prisioneiros em um mundo artificialmente criado por
um Demiurgo – e aqui em Cosmodrama
parece ser a espaçonave que funciona automaticamente para um destino ignorado
pela tripulação que, impotente, limita-se apenas a fazer conjecturas. Seria
essa a condição humana no planeta Terra?
O que esperar? - A
crítica especializada vem definindo Cosmodrama como “a metafísica no espaço”.
Mas não em um sentido aparentemente solene – o termo “metafísica” sempre parece
dar um ar de seriedade a qualquer produção. Bem diferente disso, os
intermináveis diálogos das cenas são irônicos, sempre procurando desconstruir não
apenas a Ciência e a Religião como a própria estética do gênero ficção
científica, com uma linguagem propositalmente retro e pastiche.
Para o Cinegnose, uma proposta cinematográfica
como Cosmodrama é bem vinda,
principalmente no cenário europeu dominado por filmes sobre o “humano demasiado
humano” – filmes sérios e profundos sobre as imperfeições e pecados humanos. Ao
contrário, filmes com inspiração gnóstica como esse invertem a discussão: o
pecado e a imperfeição não estão no homem, mas em um cosmos feito por alguém
que não nos ama.