domingo, setembro 30, 2012

O olhar surrealista sobre o consumismo em "Little Otik"

Se nos contos de fadas tradicionais ogros, lobos e bruxas ameaçam devorar crianças, em “Otesánek” (Little Otik, 2000) do animador e diretor checo Jan Svankmajer vemos o inverso: uma criança ameaça devorar seus próprios pais. Ligado ao movimento surrealista desde a década de 1970, Svankmajer oferece um olhar carregado de humor negro sobre uma cultura de consumo baseado na regressão infantil à compulsão e voracidade oral onde objetos assumem dimensões fetichistas e mágicas ganhando vida própria, e nos prometendo a redenção das frustrações. O olhar surrealista de Svankmajer questiona: estaria nessa verdadeira cultura da devoração do outro a origem das guerras, desigualdades e terrorismo do mundo contemporâneo? Membro do movimento de artistas...

quarta-feira, setembro 26, 2012

Espiritismo e iconolatria no filme "Chico Xavier"

Mais do que um filme que evita tratar o tema Espiritismo para um nicho de público especializado, "Chico Xavier" de Daniel Filho apresenta um sintoma do destino da religisiosidade e do sagrado na atualidade. Ao tratar o tema de forma comercial para um grande público (sejam ateus, católicos ou mesmo espíritas) acaba reduzindo o Espiritismo ao mínimo denominador comum de toda religiosidade na indústria do entretenimento: iconolatria e um, por assim dizer, ecumenismo pós-moderno que filtra a vida de Chico Xavier através do ideário pragmático da autoajuda. Depois da comédia de costumes, os olhos do cinema de massa do chamado período de “retomada” do cinema brasileiro volta-se para o Espiritismo e religiosidade. Depois do sucesso de “Bezerra...

domingo, setembro 23, 2012

Desconstruindo o yuppie em "Depois de Horas"

Depois da experiência da direção do filme “O Rei da Comédia” com um amargo Jerry Lewis e um esquizofrênico Robert De Niro, Martin Scorsese mergulhou de cabeça na paranoia e ansiedade em “Depois de Horas” (After Hours, 1985). O filme tornou-se o paradigma de um curioso subgênero da década de 1980, o “Desconstruindo o Yuppie” onde um protagonista certinho e bem sucedido é vítima de uma sequência de eventos em cadeia exponencialmente perigosos. Forma e conteúdo do filme coincidem com a própria experiência estética do espectador que caracteriza o cinema: o “deixar se perder” no fluxo da edição e montagem. Porém, “Depois de Horas” não consegue transformar-se em “cinema acontecimento”, limitando-se a um terapêutico “cinema recuperativo” que nos...

segunda-feira, setembro 17, 2012

Hollywood e a engenharia dos sonhos dos ratos do MIT

Coincidência? A vida imita a arte? Ou simplesmente o cinema hollywoodiano é um instrumento para tornar a agenda tecno-científica atual politicamente aceitável e natural para a sociedade? Uma dupla de pesquisadores do Departamento de neurociências do MIT anunciou em artigo publicado na “Nature Neuroscience” online o sucesso na manipulação do conteúdo de sonhos em ratos. Isso abriria a perspectiva de uma “engenharia dos sonhos”: o controle amplo das memórias através de bloqueios, seleção ou alteração. Isso faz lembrar uma série de filmes cujos roteiristas anteciparam ou simplesmente replicaram essa agenda de início do século: “Quero Ser John Malkovich”, “Vanilla Sky”, “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”, “Ciência dos Sonhos”, entre...

domingo, setembro 16, 2012

O corpo é uma prisão em "Quero Ser John Malkovich"

Muitos consideram o filme “bizarro”, “esquisito” e “sem sentido”. Antes das viagens ao interior da mente em filmes como “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças” (2004) e “Sinedoque: Nova York” (2008), o roteirista Charlie Kaufman nos oferece a estranha narrativa do filme “Quero Ser John Malkovich” (Being John Malkovich, 1999). Em parceria com o diretor Spike Jonze, Kaufmann conta uma parábola contemporânea  sobre identidade, mediações, avatares e reencarnação através de pessoas que querem encontrar a felicidade no corpo de outras pessoas. Como? Escorregando para o interior da cabeça de um famoso ator: John Malkovich. Você já se sentiu preso em seu próprio corpo, desejando ardentemente ir para outro lugar e ter um novo nome, novo...

sábado, setembro 08, 2012

Nos abismos metalinguísticos da TV Globo

No ônibus-estúdio do programa “Globo Esporte” da TV Globo o jornalista Tiago Leifert comanda uma espécie de “narrativa em abismo” em pleno CT do São Paulo F.C.: um programa televisivo em um estúdio itinerante mostra através do monitor que compõe o cenário um evento (coletiva do técnico da seleção brasileira de futebol Mano Menezes) programado para coincidir com o próprio programa esportivo global. Qual é afinal a notícia: a novidade do ônibus-estúdio estacionado no meio de um centro de treinamento ou a coletiva que, no final, era um “evento-encenação” programado para acontecer dentro da grade horária da emissora? Nesse abismo metalinguístico encontramos tanto o resultado da evolução histórica das mídias quanto a constituição do próprio...

sábado, setembro 01, 2012

A "zona cinza" do conservadorismo

Em debate na Faculdade de Ciências Sociais da USP sobre “A Ascensão Conservadora em São Paulo”, a filósofa Marilena Chauí sugeriu em sua fala uma interessante conexão entre os “aparatos neoliberais” oferecidos à classe média, o encolhimento da esfera pública e a expansão da privada e o conservadorismo político. Talvez tenhamos aqui uma novidade: a percepção de uma zona cinza ou desconhecida ainda não plenamente explorada nem pela psicologia ou pelas ciências sociais: seriam possíveis os aspectos sensoriais e cognitivos envolvidos nas diferentes "acoplagens" das pessoas com esses “aparatos” (automóvel, computador, celulares, TV etc.) moldarem visões de mundo e ideologias? Na história da ciência a psicologia social surgiu como uma tentativa...

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