domingo, novembro 08, 2015
Wilson Roberto Vieira Ferreira
O Curta da Semana dessa vez vai para uma produção brasileira: “Os Filmes
Que Não Fiz” (2008). A irônica filmografia de um diretor sem filmes. Se a
História é contada somente pelos vitoriosos para pisar na cara daqueles que
perderam, esse curta propõe o avesso: onde estão aqueles que apesar da
persistência, esperança e empenho acabaram perdendo e caindo no anonimato?
Cegos que somos pelos “cases” de sucesso, jamais conheceremos as histórias
humanas dos “losers”. Um curta ao mesmo tempo cômico e ácido sobre a realidade
do cinema nacional que não consegue transformar-se em indústria.
Sempre nos dizem
que as derrotas são importantes para que possamos tirar delas preciosas lições
para as futuras vitórias. Se isso é verdade, então por que a meritocracia se
baseia apenas em “cases” de sucesso? Por que na escola, na TV, nos livros,
sempre acompanhamos os casos vitoriosos, lições de sucesso e histórias de vidas
bem sucedidas?
Marx afirmava que
sempre a História era contada pelos vencedores. Mas onde estão aqueles que,
apesar do empenho, persistência e luta sempre perdem? O curta Os Filmes Que Não Fiz (2008) sabe onde
eles estão: no cinema brasileiro. Nas pilhas de “roteiros geniaaaais!” que se
amontoam nos escritórios dos produtores, nas pequenas produções precárias exibidas
em festivais no interior do País afora, naqueles diretores que nunca ganham uma
edital público ou sequer conseguem entrar na política de captação de
patrocínios.
No curta Os Filmes Que Não Fiz,
o diretor Gilberto Scarpa interpreta ele mesmo como um realizador que acredita
profundamente nos seus projetos que nunca conseguiu tirar do papel. Em tom ao
mesmo tempo cínico e melancólico, o curta foi feito nos moldes daqueles
programas de entrevistas com diretores famosos onde atores e colaboradores dão
seus depoimentos e construindo histórias de sucesso. Mas não para o anti-herói
do cinema nacional.
O curta é feito em metalinguagem e naquilo que em linguagem
cinematográfica chama-se “narrativa em abismo”: é um curta que mostra a
tentativa de produção de diversos curtas onde ainda acompanhamos vários making of. Diversos filmes dentro de um
filme.
Os pseudo-curtas são hilários: “O Aparecimento de Nossa Senhora” (um
raio de sol bate num adesivo da santa e projeta a imagem em uma janela
provocando comoção em um pequeno vilarejo); “A Farsante” (uma mulher pobre é
desmascarada por um telejornal por se passar como miserável para pedir dinheiro
nas ruas); “O Tradutor” (um cantor de músicas em inglês “embromation” é chamado
às pressas para traduzir o que um gringo à beira da morte está tentando dizer);
“Zelvis Não Morreu” (um homem é atingido por um raio e desperta num mundo
paralelo onde Elvis Presley jamais existiu); e “Maria, a Louca da Padaria” (uma
viúva recente é apavorada pela voz do fantasma do marido).
São pequenas histórias de losers
brasileiros, assim como o anti-diretor personagem de Gilberto Scarpa, pequenos
diabos canastrões que lembram o que certa vez disse Nelson Rodrigues sobre os
atores atuais: sempre intelectualizados e introspectivos, muito diferente do
ator canastrão do passado e que atingia o coração do público.
Mas o curta possui um subtexto irônico e ácido sobre o cinema
brasileiro: afinal, por que muitos filmes não são feitos no Brasil?
Astrologia?, como indaga ironicamente Gilberto Scarpa no curta. Certamente, o
curta nasce de uma realidade onde o cinema brasileiro não consegue
transformar-se em indústria e profissionalizar-se. Dependente do monopólio
televisivo da Globo Filmes e das panelinhas fechadas das intrincadas políticas
de captação de patrocínios.
Ironicamente o curta que fala sobre derrotas já acumula 39 prêmios. É o
fascínio que temos por perdedores e anti-heróis numa cultura asfixiantemente
meritocrática com reality shows onde acompanhamos pessoas se engalfinhando pela
vitória, telejornais que contam histórias de “gente que faz” e livros e mais
livros sobre pessoas aparentemente bem sucedidas que ensinam suas supostas
fórmulas para a vitória.
Ficha
Técnica
Título: Os
Filmes Que Não Fiz
Diretor: Gilberto Scarpa
Roteiro: Cristiano Abud, Gilberto Scarpa
Elenco: Gilberto Scarpa, Cristiano Abud, Ana Luísa Alves, Teuda Bara, Geraldo
Carrato, Carlos Cortez
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Sábado, 29 de Março
Bem Vindo
"Cinema Secreto: Cinegnose" é um Blog dedicado à divulgação e discussões sobre pesquisas e insights em torno das relações entre Gnosticismo, Sincromisticismo, Semiótica e Psicanálise com Cinema e cultura pop.
A lista atualizada dos filmes gnósticos do Blog
No Oitavo Aniversário o Cinegnose atualiza lista com 101 filmes: CosmoGnósticos, PsicoGnósticos, TecnoGnósticos, AstroGnósticos e CronoGnósticos.
Esse humilde blogueiro participou do Hangout Gnóstico da Sociedade Gnóstica Internacional de Curitiba (PR) em 03/03 desse ano onde pude descrever a trajetória do blog "Cinema Secreto: Cinegnose" e a sua contribuição no campo da pesquisa das conexões entre Cinema e Gnosticismo.
Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, organizado pelo Prof. Dr. Ciro Marcondes Filho e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
Neste trabalho analiso a produção cinematográfica norte-americana (1995 a 2005) onde é marcante a recorrência de elementos temáticos inspirados nas narrativas míticas do Gnosticismo.>>> Leia mais>>>
"O Caos Semiótico"
Composto por seis capítulos, o livro é estruturado em duas partes distintas: a primeira parte a “Psicanálise da Comunicação” e, a segunda, “Da Semiótica ao Pós-Moderno >>>>> Leia mais>>>