domingo, maio 14, 2017

Cinegnose discute filme gnóstico, semiótica narrativa e jogos digitais na "Fatecnologia"


O cinema gnóstico. Gnosticismo nas ciências e nos jogos digitais e o Universo como um game de computador. As mito-narrativas gnósticas e as transformações da Jornada do Herói nas HQs e no Cinema. As semióticas das narrativas como ferramentas de produção textual, de roteiros e apresentações. Esses foram alguns dos temas discutidos por esse humilde blogueiro na 9a. Fatecnologia na Faculdade de Tecnologia de São Caetano do Sul (SP) na noite dessa última quinta-feira para uma plateia de interessados e participativos estudantes. E com uma conclusão final após diversas indagações: o Herói, assim como nós mesmos, não enfrenta “vilões”. Mas a nossa própria Sombra interior projetada na ilusão do mundo. Veja o vídeo e os slides do evento.


Este humilde blogueiro fez a palestra de encerramento da 9a Fatecnologia na noite dessa última quinta-feira (11/05) na Faculdade de Tecnologia de São Caetano do Sul, São Paulo. Com um auditório tomado majoritariamente por alunos dos cursos de Jogos Digitais e Segurança da Informação, foi apresentado o tema “Transformações da Jornada do Herói – do monomito à mitologia contemporânea nas HQs, Cinema e Audiovisual” - veja no final da postagem os slides e o vídeo da apresentação.

A apresentação tinha dois objetivos principais: primeiro, discutir o conceito de “narrativa” e como essa verdadeira ferramenta de comunicação - mostrar como a teoria semiótica encontra sempre o mesmo “monomito” em todas as formas narrativas, seja em uma apresentação acadêmica, em um texto científico, em um filme, nas HQs e jogos digitais.

E o segundo objetivo, mostrar como esse monomito que fundamenta todas as narrativas sofre na atualidade transformações com o desenvolvimento das mito-narrativas gnósticas, a partir do “Gnosticismo Pop” no cinema.

Diante de um público que se mostrou bastante interessado e participante (mesmo sendo a última palestra de uma semana de intensas atividades com minicursos, workshops e palestras), iniciei apresentando o conceito histórico de Gnosticismo (o conjunto de seitas sincréticas, surgidas no início da Era Cristã, que combinavam neoplatonismo, hermetismo e influências orientais como sufismo e budismo para interpretar de maneira mística a missão de Cristo nesse planeta) – a Paixão de Cristo, a própria narrativa e monomito da Jornada do Herói. 


Como as seitas gnósticas se desenvolveram e se espelharam pelo Ocidente, criando uma Cosmogonia e uma Filosofia cuja síntese popular está presente nos filmes gnósticos clássicos como Show de Truman e na trilogia Matrix dos Wachowski.

A palestra traçou ainda o percurso tecnocientífico do Gnosticismo no século XX desde a física quântica até chegar no surgimento do Tecnognosticismo, conjunto de narrativas sobre a imortalidade e as analogias da mente com os computadores que atualmente anima os pesquisadores e startups do Vale do Silício.

Jogos digitais e o Universo como um game de computador


Para chegarmos ao século XXI  com as teses do filósofo e matemático da Universidade de Oxford, Nick Bostrom, de que o Universo é finito é que todas as suas características (principalmente os fenômenos quânticos e tempo, espaço, volume pixelados) apontam para um gigantesco game de computador cósmico. E como muitos físico estão na atualidade levando a sério essa suspeita.

Com essa discussão, formulei uma hipótese que perpassou toda a palestra: seria a atual intensa atividade em produção e pesquisas em torno de games digitais online uma forma de criar um nível meta sobre a própria realidade? Citando o filme “O Décimo Terceiro Andar” (1999), estaríamos criando games no interior de outro game gigantesco no qual vivemos como uma nova forma de narrativa religiosa?


Semiótica da narrativa


Lançada essas questões, o autor dessas mal traçadas linhas partiu para a semiótica da narrativa, tentando estabelecer esse conceito de “monomito”. Ou em outras palavras, apresentar esse modelo canônico presente nas mais diversas narrativas.

Começamos com a tarefa nada fácil de sintetizar as ideias principais da Semiótica da Cultura de Julius Greimas: “trama narrativa” (Sujeito, Objeto de Valor, Ajudante, Oponente etc.) e “Programa Narrativo” (Estado e Transformação).

Também transitamos pela “Morfologia do Conto Maravilhoso” de V. Propp até chegarmos à Jornada do Herói do mitólogo Joseph Campbell.

              Apresentamos o “case” das animações da Walt Disney e Pixar: como as narrativas dessas produções evoluíram da morfologia do conto maravilhoso de Propp para a Jornada do Herói a partir de Toy Story (1995). E vimos, passo a passo, a construção do bem sucedido “Paradigma Disney” baseado no monomito dos personagens e etapas narrativas da Jornada do Herói.


As mutações do Herói


Nesse ponto, nos concentramos no personagem arquetípico do Herói e as suas transformações na cultura: dos Herói Épico e Trágico da antiguidade grega ao surgimento do Super-Herói no século XX. Mas principalmente as implicações éticas e morais dessa nova personalidade heroica – suas origens nos esforços de propaganda nazista na Segunda Guerra Mundial e a contrapropaganda dos EUA com os super-heróis da Marvel e DC Comics – Super-Homem, Capitão América etc.

A criação do Supe-Herói amoral, aquele cujo heroísmo é proporcional a ausência do sentimento de culpa, compaixão ou empatia – seu senso de Verdade e Justiça estaria acima do Bem e do Mal.

E por fim, a palestra acompanhou as atuais transformações da narrativa da Jornada do Herói com a popularização dos filmes gnósticos e sua mito-narrativa baseada em três tipos de protagonistas: o Viajante, o Detetive e o Estrangeiro.

Mitologia contemporânea


Vimos como, não só esses protagonistas se conectam aos três estados alterados de consciência que possibilitariam a Gnose (suspensão, paranoia e melancolia), como também se ligam a três episódios históricos que criaram as bases da mitologia contemporânea: as explosões experimentais das bombas H no deserto de Nevada nos EUA, o incidente supostamente ufológico em Roswell e a Área 51 e a surgimento da cidade de Las Vegas, irradiando uma visão de mundo hedonista e niilista para todo o planeta.



E sincronicamente, esses três episódios aconteceram no Deserto de Nevada – o Deserto como o arquétipo contemporâneo da condição humana: o cosmos hostil e inóspito que aprisionaria a humanidade por obra de um deus (o Demiurgo) que não nos ama.

Além do cinema hollywoodiano vimos como alguns filmes brasileiros exploram essa mitologia gnóstico-contemporânea como Insolação (2009, clique aqui) e Os Famosos e os Duendes da Morte (2010, clique aqui).

Nas perguntas finais o público teve intensa participação, o que ajudou a esclarecer o principais pontos discutidos. Principalmente a evolução histórica da figura do herói e a conclusão: nunca existiu o Vilão – ele é a própria projeção da Sombra do Herói.

O que se contrapõe ao maniqueísmo, principalmente da propaganda política e do cinema manipulado por ela.

Por isso, a narrativa da Jornada do Herói é uma jornada interna, psíquica, na qual cada personagem da narrativa (o Mentor, o Guardião do Limiar, o Arauto etc.) são personas do psiquismo. Assim como as cartas do Tarot são representações de arquétipos do inconsciente coletivo que se conectam com essas personas pessoais.

Por tanto, a mito-narrativa gnóstica (a mitologia contemporânea) transforma a Jornada do Herói: o protagonista deve enfrentar aquilo que ele mais teme, a sua própria Sombra. O Herói teme que a própria ilusão do mundo seja revelada e coloque em xeque a si mesmo.  



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