sexta-feira, fevereiro 25, 2011

Walter Benjamin e o "Caveirão" de Brinquedo

O brinquedo Roma Tático Blindado (réplica perfeita dos “caveirões” do BOPE no Rio de Janeiro) escandaliza educadores e psicólogos que o acusam de induzir as crianças à violência. Mas se Walter Benjamin estiver correto, a imitação é a grande característica do jogo infantil: reproduzir o mundo adulto no espaço lúdico para subvertê-lo. O problema não só do “caveirão”, mas de todos os brinquedos industrializados, é que esse impulso espontâneo é desviado do jogo para o brinquedo-réplica. O problema não está na violência, mas para onde o impulso pela imitação da violência é conduzido.

Início de ano, começo de ano letivo para os meus filhos. Hora dos pais irem às compras com as listas de material escolar nas mãos numa peregrinação em busca dos melhores preços. No meio de uma busca entre as gôndolas de imensas papelarias em um largo em Pinheiros, São Paulo, dou de cara com um brinquedo, para mim, inusitado: um carro blindado todo negro, com riqueza de detalhes, uma réplica quase perfeita do famoso “Caveirão” – veículo usado pelo BOPE (Batalhão de Operações Especiais) no Rio de Janeiro para combater os traficantes nos morros. Só não é uma miniatura perfeita porque os fabricantes modificaram o nome para ROTB (Roma Tático Blindado).

O veículo está acompanhado de dois soldados fardados (boinas e coletes à prova de bala) e duas armas de brinquedo.

Segundo as notícias, esse brinquedo foi um sucesso de vendas no Rio de Janeiro, esgotando o estoque previsto para durar até o final do ano passado. Os “caveirões” sumiram das prateleiras já no Dias das Crianças.

É claro que os fabricantes aproveitaram o sucesso de bilheteria do filme “Tropa de Elite 2”: “Mas o que é isso? Um carro da polícia igualzinho ao do filme Tropa de Elite? Vou levar uns cinco”, como afirmou entusiasmada uma comerciante em uma distribuidora de brinquedos de Sorocaba.

Como não poderia deixar de ser, psicólogos e educadores se ergueram moralmente escandalizados com um velho discurso pronto: brinquedos com armas ou temas agressivos induzem a criança à violência. Velha crítica de fundo behaviorista que parece desprezar a inteligência ou espontaneidade da criança em nome de um modelo comportamental que a vê como um ser amorfo, sempre passivamente induzido e condicionado.

sábado, fevereiro 19, 2011

O Álibi Sci-fi Retro do Projeto MARS500: os objetivos bem terrestres de uma missão espacial

Para além do álibi sci-fi retro (viagens tripuladas a Marte), na verdade o Projeto MARS500 atende indiretamente a dois objetivos: agenda tecnognóstica do assalto à mente e consciência humanas e, segundo, o reforço da mitologia sobrevivencialista dos reality shows. 

Depois de uma viagem de oito meses, no dia 14 de fevereiro desse ano o russo Alexandr Smoleevsky, o italiano Diego Urbina e o chinês Wang Yue finalmente pousaram na superfície de Marte às 13h00, horário de Moscou, e deram os primeiros passos no terreno marciano. Após essa saída do módulo de serviço, eles irão se aventurar mais duas vezes pela superfície do planeta: dias 18 e 22 de fevereiro.

É o ponto alto do projeto MARS500 patrocinado pela ESA (Agência Espacial Européia) em parceria com o Instituto de Problemas Biomédicas de Moscou. Apenas um detalhe: tudo faz parte de um projeto que pretende simular uma viagem a Marte, lançado no primeiro semestre de 2009. Composta por uma tripulação de seis pessoas (três russos, um italiano, um chinês e um francês), toda a missão ocorre no interior de uma instalação de 500 metros cúbicos no Instituto de Problemas Biomédicos onde, desde junho de 2010, os seis homens estão confinados. O plano é que fiquem dentro dessa nave simulada até novembro de 2011.

O objetivo do programa MARS500 é estudar os efeitos mentais, psicológicos e físicos em um grupo que, numa viagem real a Marte, ficaria encerrado por longos meses em alojamentos compactos. O programa limita-se unicamente ao estudo desses efeitos, já que, na superfície da Terra é impossível simular a gravidade zero (a não ser por breves momentos).


quinta-feira, fevereiro 17, 2011

WALL-E e EVA: Disney faz Releitura do Gênesis Gnóstico

Em postagem anterior discutíamos o chamado “paradigma Disney” e nos perguntávamos como é possível animações voltadas para o público infantil tratar de temas tristes e até cruéis de uma forma lúdica e divertida. 

A animação “WALL-E” (2008) é um desses exemplos: uma fábula dark, cínica, sobre um planeta Terra devastado e tomado por lixo e escombros pacientemente compactados e empilhados por um robô, enquanto o que restou da humanidade se exilou numa gigantesca nave mais parecida com um shopping center onde o consumismo, ociosidade e conveniência são tão excessivos que acabaram produzindo seres que, de tão obesos, não conseguem mais manter-se em pé.

Nessa animação talvez encontremos a resposta para esse nossa indagação: o filme explora intensamente simbologias e arquétipos da interpretação gnóstica do gênesis bíblico. Afinal, a busca pela pureza, inocência e simplicidade do protagonista WALL-E é a busca pela transcendência, o retorno ao Paraíso perdido, a busca pela inocência infantil, aquela nostalgia que toda criança sente por uma unidade que foi perdida com a entrada forçada no mundo simbólico adulto (a escola, estudos, deveres etc.). E toda essa busca possibilitada pelo auxílio do robô high tech chamado de EVA, nome altamente simbólico para essa narrativa.


sexta-feira, fevereiro 11, 2011

O Gótico Gnóstico “La Casa Muda”: é possível o horror em tempo real?

Exibido no Festival de Cannes e no Festival do Rio 2010, “La Casa Muda” (Uruguai, 2010) de Gustavo Hernandéz é um suspense/terror que promete “o medo em tempo real”. Filmado num único plano- sequência, Hernandez surpreende o espectador ao inserir no filme (supostamente sem os truques dos planos e montagens) o tempo psicológico e a confusão entre percepção e projeção psíquica da protagonista. Ou seja, o filme insere elementos góticos e gnósticos em uma narrativa supostamente objetiva, onde a verdade não está nas imagens em movimento, mas nas fotografias.

Webcams, “vídeo-cassetadas”, reality shows e a popularização das câmeras digitais sem dúvida alteraram nossa sensibilidade em relação àquilo que definimos como “realidade”. As transformações ocorridas no gênero Terror no cinema, assim como a experiência do horror, certamente refletem essa evolução das mediações tecnológicas. Desde filmes como “A Bruxa de Blair” (The Blair Witch Project, 1999) há uma busca da experiência do horror em tempo real: o registro visual de uma câmera hesitante, em plano-sequência, tudo aparentemente sem cortes, a imagem granulada e borrada. O horror diante de uma realidade documental.

Esse movimento já era perceptível no cinema dos anos 70 como os primeiro horror explícito em “O Exorcista” (vômitos verdes e violência explícita), as lendas dos “snuffs movies” (Filmes violentos de caráter mórbido e sexual em que depois de violada e humilhada a vítima era assassinada) e o sucesso da série de vídeos VHS “As Faces da Morte” nos anos 80 (vídeos documentais de mortes bizarras).

O filme uruguaio “La Casa Muda” do diretor Gustavo Hernandez aparentemente se inscreve nessa tendência ao ser promovido como “o medo em tempo real” onde vemos 74 minutos de plano-sequência narrando a tentativa desesperada da protagonista Laura (Florencia Colucci) em escapar de uma casa que oculta um sinistro segredo. Além disso, o filme também é oferecido como baseado em fatos reais que teriam ocorrido em 1944 em um vilarejo no Uruguai quando foram encontrados dois corpos mutilados em uma casa de campo.

segunda-feira, fevereiro 07, 2011

Sinais do nosso tempo no filme "Enterrado Vivo": a vítima de uma sociedade terceirizada




Todo produto cinematográfico é histórico na medida em que é produto do seu tempo. Por isso carrega consigo, de forma indireta, inconsciente e subreptícia, as mentalidades ou as sensibilidades de cada época. Em "Enterrado Vivo" (Buried, 2010) o medo ou a fobia de ser enterrado vivo (tão presentes em obras literárias e cinematográficas) transforma-se em uma metáfora da amoralidade pós-moderna em uma sociedade dominada pela terceirização de empresas e serviços.

Assistir ao filme “Enterrado Vivo” (Buried, 2010) fez-me lembrar de outras obras (literárias e cinematográfica) que abordam esse medo que, de tão recorrente na História, transformou-se numa fobia (tafofobia). Cada uma dessas obras ofereceu uma abordagem sobre o medo de ser enterrado vivo em sintonia com a sensibilidade do seu tempo.

O medo e a fobia podem ser os mesmos, mas a sensibilidade em relação a tais muda. O terror metafísico e mórbido de Edarg Allan Poe em “O Enterro Prematuro” (1850), a brilhante adaptação desse conto pelo diretor Roger Corman em 1962 (o terceiro de uma série de filmes baseados na obra de Poe) e o atual “Enterrado Vivo” de Rodrigo Cortês, são três momentos em que esse mórbido tema é abordado, marcando a mentalidade de cada época: o horror metafísico de Poe, o enterro vivo como produto da morbidez da natureza humana em Corman e como o resultado da amoralidade pós-moderna em Rodrigo Cortês.

quinta-feira, fevereiro 03, 2011

A Mídia e os Cientistas "Cavalo de Tróia"

Quem não conhece a origem da expressão “cavalo de Tróia”? Diz a narrativa lendária que as legiões gregas deixaram o artefato de madeira oco, abrigando soldados gregos em seu ventre, junto às muralhas de Tróia. Os troianos acreditaram ser um presente dos gregos como sinal de rendição. Durante a noite os gregos deixaram o artefato e abriram os portões da cidade, que foi facilmente invadida, incendiada e destruída.

Atualmente essa expressão é famosa pela associação com códigos maliciosos (“worms”) que infestam computadores. 


Mas também podemos aplicar essa expressão “cavalo de Tróia” a um recorrente fenômeno do encontro entre a ciência e a mída. Mais precisamente, a exposição de cientistas na mídia onde expressam seus posicionamentos políticos “progressistas” ou “de esquerda”. Pela sua projeção midiática, passam a ser celebrados pela a intelectualidade e simpatizantes dessa ala política. Alguns passam a ser mais conhecidos pelas suas declarações políticas do que pela pesquisa cientifífica. Mas há algo contraditório: apesar dos posicionamentos midiáticos progressistas, os fundamentos das suas pesquisas científicas são conservadores, para não dizer reacionários em alguns casos.

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