quarta-feira, agosto 31, 2022

'Não! Não Olhe!': resta algo na galáxia que não possa ser explorado como entretenimento?



Em “Não! Não Olhe!” (Nope, 2022) Jordan Peele abandona o terror racial de “Corra” e “Nós” para ingressar no terreno híbrido sci-fi, terror e muita metalinguagem e alusões ao cinema e cultura pop. Aproximando-se da crítica social de “Não Olhe Para Cima”. Algo ameaçador está vindo do céu sobre um rancho que fornece cavalos para produções de cinema e TV. A primeira reação dos protagonistas não é a de lidar com o horror cósmico, mas encontrar uma maneira de monetizar o estranho fenômeno. Numa cultura na qual Tik Tok, YouTube e canais de notícias 24 horas subliminarmente oferecem diante dos nossos olhos a promessa de fama da noite para o dia, como seria possível a expressão do horror cósmico com toda a sua intensidade numa cultura com tantas camadas semióticas nos separando da realidade?

segunda-feira, agosto 29, 2022

Terceira Via, "botão eject" e mais-valia semiótica no debate da Band


Para a grande mídia a senadora Simone Tebet foi a vencedora. Lula teve um “apagão”. E Bolsonaro fez um “ataque misógino”, ironicamente contra um notório desafeto de Lula, a jornalista Vera Magalhães. Somada à mais-valia semiótica de um estúdio que parecia alguma coisa entre o filme Tron e o Metaverso de Mark Zuckerberg, a fórmula de debate engessada, fragmentada e um intervalo publicitário ideologicamente maroto, o script era esse: Lula e Bolsonaro, os dois lados da mesma velha moeda, contra uma “Terceira Via” tão “moderna” quanto o cenário: digital e empreendedora. Lula não caiu na armadilha e ficou na retranca. Enquanto Bolsonaro conseguiu o que pretendia: criar um escândalo no campo simbólico em que fica mais confortável e engaja a base eleitoral: a guerra cultural e de costumes. Como em 2018, grande mídia ainda procura a alternativa “perfumada e limpinha”. E, de novo, Bolsonaro é o “botão eject”. 

Primeira coisa que chamou a atenção no debate da Band (organizado pelo grupo Bandeirantes, Folha de São Paulo, Uol e TV Cultura) desse domingo foi o inacreditável cenário para um debate entre candidatos em uma eleição. O que era aquilo? Políticos perdidos no interior do hardware do filme Tron? Será que seria realizada alguma palestra do TED? Um debate entre aceleradores de startups tecnológicas? Uma homenagem a Zuckerberg e o Metaverso? Ou seria um show da banda “Kraftwerk”?

Isso não é uma mera observação estética. Há uma mais-valia semiótica nesse enorme cenário que mais parecia um nowhere digital com os candidatos perdidos dentro dele. Parece que o processo de semiose (processo de significação capaz de gerar uma cadeia de signos partindo de uma premissa a partir da qual criam relações recíprocas entre significados) ou da cadeia de associações de ideias sugerida era essa: quarta revolução industrial, revolução digital, empreendedorismo, enfim, um wishifull thinking de um suposto Brasil do futuro.

Não por acaso no intervalo publicitário, um vídeo do Sebrae especialmente produzido exortava eleitores a apoiarem candidatos favoráveis ao empreendedorismo. Confortavelmente ao lado de uma também inacreditável peça publicitária da Havan, mostrando Luciano Hang motivando seus funcionários a defenderem a Pátria – para os entendedores, o próprio candidato Bolsonaro.

E pior. Em algumas afiliadas regionais da Band, a inserção de publicidade de Clubes de Atiradores – clique aqui.



Também não por acaso, a “Terceira Via” estava ali representada: Soraya Thronicke (a senadora candidata do União Brasil que disse que vira onça, como a Juma Marruá da novela “Pantanal”, para defender o Imposto único), a senadora Simone Tebet (ainda surfando na CPI da Covid) e o anarcocapitalista candidato do Partido Novo, Felipe “Quero Privatizar Tudo” D’Ávila. Todos falando bastante sobre empreendedorismo, privatização e “economia digital”. Para se contrapor ao “mofo” dos “economistas do PT”, como frisou a candidata-onça.

Pelo menos para esse humilde blogueiro ficou óbvio que a fórmula engessada do debate foi especialmente preparada trazer a Terceira Via para a ribalta – uma ribalta “moderna”, “high tech”, para se contrapor à “velha política polarizada” de Bolsonaro e Lula. 

A fórmula: a ginástica das constantes trocas de âncoras e entrevistadores, uma estranha “sala digital” do Google que checava os assuntos mais acessados pelos internautas/telespectadores – o tema “corrupção” teria sido o mais acessado. As pesquisas qualitativas durante e logo depois do debate disseram o contrário: os principais temas que chamaram a atenção foram emprego, economia e saúde. 



A “sala digital” nada mais foi do que um loop tautista (tautologia + autismo midiático): retroalimentava aquilo que própria fórmula do debate induzia.

Por isso, para a grande mídia, a grande vitoriosa teria sido a senadora Simone Tebet. É a única maneira da Terceira Via que pontua quase zero nas pesquisas ser turbinada: em uma fórmula de debate fragmentado, na qual os bordões (“a salvação do país é acabar com o Estado”, Felipe D’Ávila), fórmulas mágicas (o “Imposto Único”, Soraya Thronicke) surgem dentro de uma dinâmica maluca na qual quem não tem propostas promete tudo e quem tem proposta é obrigado a se conter pelo tempo exíguo – acrescenta-se ainda o tempo tomado por vinhetas, “sala digital”, autopromoções da Band, intervalo publicitário com vídeos que pareciam pontuar aquilo que alguns candidatos diziam no debate etc.

Jogar na retranca

Lula e seus assessores pareciam conscientes dessas limitações. O que muitos analistas consideraram como “derrota” e “mau desempenho” (comparando com a entrevista no JN) de Lula, na verdade foi uma tática de retranca, para não cair na armadilha óbvia: tornar Lula e Bolsonaro como os dois lados de uma mesma velha moeda, contrastando com o “novo” e o “moderno” (lembram do cenário estilo Tron?) representado pela “Terceira Via” com suas soluções mágicas privato-empreendedoras-fiscais.

Bolsonaro bem que tentou: provocou Lula com acusações de corrupção. Claro, esperando de Lula um contra-ataque do tipo “mas no seu governo tem mais”. Lula apenas recuou e listou todas as medidas adotadas em seu governo para facilitar investigações e transparência.


Tron? Kraftwerk? Metaverso?


Uma sabatina como a do JN e um debate engessado com franco-atiradores dispostos a tudo para serem notados como esse da Band são modelos incomparáveis – numa fórmula como a que vimos no domingo, candidatos na dianteira das pesquisas somente têm a perder.

Um modelo de debate que parece esvaziar o próprio evento em si. O debate da Band apenas serviu para fornecer um material bruto para posteriormente ser recortado, editado e ser transformado em clips para serem repercutidos nas redes sociais, como se cada “lacração”, “invertida” ou “jantada” fosse uma bala de prata eleitoral decisiva.

Guerra cultural

Enquanto isso, Ciro Gomes, preocupado em ser uma metralhadora giratória voltada contra Lula e Bolsonaro, perdeu uma grande oportunidade. Mesmo depois de ter respondido na bucha contra bordão do “vou-privatizar-sua-alma-à-meia-noite” Felipe D’Ávila: “o Brasil gasta valores de primeiro mundo na educação e entrega uma educação de terceiro mundo”.

Bolsonaro atacou a jornalista da TV Cultura quando a repórter abordou a importância da vacinação no País ao candidato Ciro Gomes (PDT) e criticou a postura de Bolsonaro no combate à pandemia. Após a resposta de Ciro, Bolsonaro começou uma série de ataques: “Vera, não podia esperar outra coisa de você, você dorme pensando em mim. Você é uma vergonha para o jornalismo brasileiro. Já está apelando", afirmou. Ele ainda a agradeceu, ironicamente, a oportunidade de falar "algumas verdades" sobre ela.



Ciro Gomes limitou-se a gargalhar e abanar a cabeça...

Porém, todo esse esforço da grande mídia (em particular esse da Band inserir os candidatos em uma semiose high tech) para encontrar uma opção mais “perfumada e limpinha” para fazer o serviço sujo neoliberal e anarcocapitalista, sempre deve ter um botão “eject”, no caso de dar tudo errado.

E, mais uma vez, esse botão chama-se Bolsonaro. Ao lado da comemoração do desempenho de Simone Tebet, a grande mídia repercutiu o ataque à Vera Magalhães – ironia: antipatia da jornalista por Lula é de conhecimento de todos.

Era tudo que Bolsonaro queria: toda a estratégia alt-right de comunicação precisa de telecatchs como esse. Principalmente quando volta as atenções da patuleia para o campo da guerra cultural e dos costumes. O campo simbólico no qual o chefe do Executivo mais se sente à vontade. Estratégia de prestidigitação para ocultar seu ponto fraco: a economia política.

 O que os “colonistas” do jornalismo corporativo denunciaram como “resposta lamentável”, “absurda”, “ataque misógino” (enquanto jornalistas e a Abraji divulgam as protocolares “notas de repúdio”), para Bolsonaro é nada mais do que um elogio: reforça simbolicamente a importância da guerra cultural e de costumes e serve de “apito de cachorro” para sua base ficar ainda mais engajada – somada a mais outro telecatch: a do ministro Alexandre de Moraes contra empresários bolsonaristas de Whatsapp.

Esse “botão eject” ficou ainda mais evidente no próprio intervalo publicitário cheio de más intenções semióticas: o véio da Havan exortando seus empregados aos valores patrióticos ao lado do Sebrae enaltecendo o maravilho mundo do empreendedorismo – onde a força de trabalho magicamente se converte em capital.

A contaminação metonímica é inevitável. 


Postagens Relacionadas

 

Entrevista de Lula no JN: Globo subliminarmente prepara o front 'se ganhar, não vai governar'

 

 

Entrevista do Jornal Nacional revela o domínio total de espectro da guerra híbrida

 

 

Eleições 2018 e 2020: Bolsonaro foi um 'candidato manchuriano'?

 

 

As guerras táticas da comunicação de Bolsonaro

 

 

domingo, agosto 28, 2022

Cat Stevens, modernidade líquida, viagem no tempo, nas entrelinhas das entrevistas do JN. É a Live de domingo


Tão espantado quanto o Kevin de “Esqueceram de Mim”, esse humilde blogueiro descobre que a Live cinegnose 360 chega na edição #70, nesse domingo (28/08), às 18h, no YouTube... E resistindo a todas as distopias. Depois dos comentários aleatórios, vamos abrir com os vinis de Cat Stevens e sua conversão ao Islamismo: a felicidade de estar triste. E também os filmes “Men” (a masculinidade tóxica na modernidade líquida) e “Efeito Flashback” (a angústia da geração millennial e a necessidade de filmes sobre viagem no tempo). E depois a derradeira edição do Pequeno Dicionário dos Eufemismos e Clichês Linguísticos da Grande Mídia. E a crítica midiática da semana: flagrante de manipulação da mídia OTAN na Ucrânia; Putin espera o “General Inverno” entrar em ação; Quais os objetivos da Globo na semana de entrevistas dos candidatos no Jornal Nacional?; Grande mídia faz chantagem econômica em ano eleitoral; Números do DataFolha: classe média e luta de classes. E conversas aleatórias no chat com os cinegnósticos. É nesse domingo!  

sábado, agosto 27, 2022

Entrevista de Lula no JN: Globo subliminarmente prepara o front 'se ganhar, não vai governar'


Lula foi impecável e vibrante. Mas para aqueles que ainda lembram do jornalismo de guerra da Globo, com seus “colonistas” e âncoras no modo “pitbull hidrófobo espumando de raiva” foi surpreendente o comportamento de Bonner e Renata Vasconcellos: uma espécie de fastio ou previsibilidade nas perguntas, como se estivessem fazendo um condensado ou “digest” de todos os clichês dos anos de guerra híbrida: corrupção, MST, Venezuela, Cuba... Na verdade, diante da ascensão irresistível de Lula, a Globo desistiu de confrontá-lo. A entrevista parece que serviu para um outro propósito subliminar: o reforço de pressupostos que servirão de munição para um hipotético segundo turno e além: “foi inocentado, mas não é inocente”; o presidencialismo de coalizão é intrinsecamente corrupto; polarização política inevitavelmente gera ódio e violência. Nas entrelinhas, a entrevista visou outra coisa: a desmoralização da Política. Para a grande mídia o front agora é outro: se ganhar, não vai governar!

Certamente os leitores devem lembrar da entrevista da então dupla de âncoras do Jornal Nacional, William Bonner e Fátima Bernardes, entrevistando Lula em 2006, no Palácio da Alvorada, em plena crise do mensalão. Foram 11 minutos que se transformaram numa discussão de Bonner com o presidente, batendo o bumbo apenas no tema corrupção. Discussão que no auge do conflito o âncora teve que ser sutilmente contido por Fátima Bernardes, interrompendo o ímpeto inquisidor do companheiro de telejornal – atiçado pelo Diretor de Jornalismo da emissora, Ali Kamel.

Como, também, não lembrar do indefectível croma key com aquele duto enferrujado jorrando dinheiro, que emoldurava cada vazamento seletivo dos procuradores da Lava Jato ao telejornal da Globo.

Mais ainda, uma edição inteira do Jornal Nacional em 2018 fazendo pressão pela prisão de Lula para sua imediata retirada da eleição presidencial – na oportunidade, Bolsonaro virou a única opção emergencial com o derretimento do candidato Alckmin, a primeira opção da grande mídia, da banca financeira e da Faria Lima.



Portanto, esperava-se que mais uma vez os poderosos canhões semióticos da Globo seriam apontados e disparados contra Lula na bancada do Jornal Nacional nesta quinta-feira. Todos os lados do espectro político estavam ansiosos por uma entrevista que poderia ser um ponto de viragem nesse tardio início de campanha eleitoral – aliás, por que, a cada eleição, as campanhas começam cada vez mais tarde e estão progressivamente mais “engessadas”?

O que se viu na quinta foi Lula relaxado, confiante, assumindo as rédeas da entrevista e criando espaços para demonstrar toda a sua experiência de governo quando presidente da República. Sua estratégia de demonstrar que era mais do que um candidato, mas um estadista, deu certo.

Mas o que realmente surpreendeu (partindo do Grupo Globo que foi uma das peças-chave em todo esforço na guerra híbrida brasileira em detonar diariamente bombas semióticas cujo resultado foi colocar as classes médias de verde e amarelo nas ruas empoderada pelo protofascismo do “Brasil profundo”) foi o tom preguiçoso e, até certo ponto, protocolar da dupla de âncoras do JN.


Entrevista do JN com Lula em 2006


Nada parecido com os anos de “colonistas” e apresentadores de telejornais que, atiçados pelo ponto eletrônico, pareciam pitbulls hidrófobos espumando de raiva. Pelo contrário, o percurso das perguntas foi previsível. Mais parecido como um grande condensado de todas as pautas anti-Lula dos anos de guerra semiótica, do Mensalão ao Petrolão da Lava Jato.

A entrevista

A entrevista começou com Bonner dizendo “o senhor não deve nada à Justiça, MAS vamos falar sobre corrupção”. A utilização da conjunção coordenada adversativa “mas” subliminarmente introduzia a principal tese de Merval Pereira e outros comensais da emissora: a de que Lula é foi inocentado, mas não é inocente. A ideia de que Lula não deve mais nada à Justiça graças a “tecnicalidades” ou “filigranas jurídicas”.

Este humilde blogueiro esperava que essa abertura da entrevista seria o ponto de partida de mais jogo pesado dos sabujos âncoras da casa, atiçados por Ali Kamel no ponto eletrônico.

Porém, o que se viu foi um previsível roteiro: diversas tentativas de cortar as falas de Lula para quebrar o raciocínio do entrevistado (modus operandi de entrevistas com “esquerdistas”), além dos temas “clássicos”: “E a Dilma, hein?”... “E a Venezuela, hein?”... “E Cuba, Hein?”... “E o MST, hein?”. Um previsível apanhado de todos os clichês que se esperaria para cercar Lula. Mas tudo o que ficou foi uma sensação de déjà vu.

Claro que as tentativas de corte de raciocínio deram erradas, devido ao rolo compressor discursivo do entrevistado – naquela noite, Lula estava particularmente inspirado.

Até ocorreram tímidas tentativas de trazer alguma novidade discursiva – temas que deveriam ser abordados com Bolsonaro, como orçamento secreto e intervenção na PF, foram jogados contra Lula.



 Agora sabemos que esses e mais outros temas como a corrupção de Michelle e dos filhos foram tirados da sabatina de segunda-feira num acordo com a Globo, como revelou o jornalista Ricardo Noblat: “"Nada de Fabrício Queiroz, rachadinha, mansão milionária de Flávio em Brasília, depósitos na conta de Michelle e coisas afins", escreveu Noblat. Afinal, Bolsonaro sabe dos dois calcanhares de Aquiles da emissora: a renovação da concessão da Globo ainda esse ano e o nome de Dario Messer (o “doleiro dos doleiros”, escrito na mão de Bolsonaro) que em delação afirmou que lavava dinheiro dos irmão Marinho, donos da Globo – clique aqui.

Jogo subliminar

Parece que o verdadeiro jogo da entrevista foi mais subliminar, o de reforçar certos pressupostos que servirão de munição, principalmente para um cada vez menos hipotético segundo turno ou mesmo vitória de Lula: 

(a) Insistiram com a pergunta “que lição o PT tirou?”, variação do “foi inocentado, mas não é inocente”;

(b) Lula será prisioneiro do grande mal do presidencialismo: o “toma-lá-da-cá”. Seu destino será repetir o mesmo jogo político de Bolsonaro com o Centrão.

(c) Ambos, Bolsonaro e Lula, são os dois lados da “polarização”, que gera ódio e violência – aliás, cobrado de Lula quanto à militância do seu partido. Como se a primeira vítima não fosse um quadro do PT, assassinado por um militante bolsonarista em Foz do Iguaçu.

Essa é a pedra de toque ideológico do jornalismo da Globo: a desmoralização da Política.


A pedra de toque ideológica: a Política é intrinsecamente corrupta


Lula foi hábil em, educadamente, mostrar para Renata Vasconcellos que isso não é “toma-lá-dá-cá”, é “usurpação do poder”: Bolsonaro não manda mais no País, mas sim Arthur Lira e seu orçamento secreto. Isso não é um mal inerente ao presidencialismo de coalizão, mas a oportunidade de Bolsonaro construir sua base de sustentação política às custas da renúncia do próprio poder Executivo – e acrescentaria, para a construção da base de sustentação do Partido Militar e o seu golpe militar híbrido cujo desfecho ocorreu em 2018.

Por que pedra de toque ideológica? Com a irresistível ascensão de Lula, a Globo desistiu de confrontar diretamente o líder petista, como fez em todos os anos de guerra híbrida. Agora, a questão é negar in totum a Política: o jogo político mostrado para a patuleia como irracional, viciado e intrinsecamente corrupto. Política é aquilo que atrapalha a racional gestão dos “mercados” (eufemismo para designar a banca financeira), afasta investidores estrangeiros e assim por diante.

Como os “colonistas” da casa martelam diariamente, ano eleitoral só atrapalha a Economia. Principalmente quando o País tenta a retomada econômica pós-pandemia – a “Pandemia”, o álibi para todos os crimes econômicos do anarcocapitalismo de Paulo Guedes.

Em suma: de um lado tivemos uma performance vibrante e impecável de Lula que soube aproveitar a oportunidade depois de anos de invisibilidade (pelo menos para o jornalismo corporativo); e do outro uma espécie de fastio ou preguiça de Bonner e Renata Vasconcellos, transformando o roteiro da entrevista em um condensado ou “digest” de todos os clichês de anos de jornalismo de guerra.

Agora o front é outro: se Lula ganhar, NÃO VAI GOVERNAR.

 

 

Postagens Relacionadas

 

Vai ter golpe? A História jamais será transmitida ao vivo pela TV

 

 

Após golpe militar híbrido, grande mídia executa script 'instituições estão funcionando'

 

 

PsyOp militar da pedagogia do medo e a 'Carta em Defesa da Democracia'

 

 

O golpe militar híbrido não foi televisionado

 

 

sexta-feira, agosto 26, 2022

Viagem no tempo e a angústia dos millennials no filme 'Efeito Flashback'


A Relatividade e a mecânica quântica alteraram radical nossa percepção tempo-espaço, ao ponto do tema da viagem no tempo se tornar um tema recorrente – o fascínio da “segunda chance” em que o passado poderia ser alterado. Mas nada como nesse século, em que o boom de produções sobre o tema reflete a angústia existencial da geração millennial: a angústia do crescimento, maturidade e a necessidade de fazer escolhas. “Efeito Flashback” (2020) é um bom exemplo: um jovem analista de informações que renunciou ao desejo de se tornar um artista visual encontra casualmente um antigo amigo do ensino médio. Um encontro que traz do passado memórias esquecidas que retornam como um flashback. Na verdade, o efeito de uma droga misteriosa da época que permitia escapar do espaço-tempo linear e experimentar vidas alternativas. Passado e presente se misturam em loop e deslocamentos, sem o usuário ter em que se apegar. O que traz a questão central desse boom sobre viagens no tempo: e SE eu tivesse feito outra escolha? Como seria a minha vida?

quinta-feira, agosto 25, 2022

A masculinidade tóxica e líquida no filme 'Men'


Tradicionalmente inspirada na matriz freudiana do Édipo (inocência, culpa etc.), o gênero do terror nesse século está mexendo em um novo lugar nos porões do inconsciente: a má consciência. Como mostra, por exemplo, o terror racial de Jordan Peele. “Men” (2022), de Alex Garland, dessa vez ingressa no terror de gênero: um conto de fadas sombrio no qual a masculinidade tóxica assume uma forma mutante, informe, amoral numa ordem patriarcal que se tornou “líquida”, na acepção de Zygmunt Baumann. Uma jovem viaja para uma idílica vila rural para se recuperar do trauma da morte do seu marido. Não demora muito para ela descobrir que se colocou no centro de um tipo diferente de trauma. Há algo de errado com este lugar, com essas pessoas, que por acaso são em sua maioria... homens.

quarta-feira, agosto 24, 2022

Entrevista do Jornal Nacional revela o domínio total de espectro da guerra híbrida



O mais importante na entrevista de Bolsonaro no JN não foram os seus 40 minutos, mas o que veio depois: de ponta a ponta no espectro político, dos QGs de campanhas às forças políticas, todos acharam que venceram. Por que essa espiral interpretativa? Porque há algo de anômalo que vai muito além do dito popular “cada um puxa a brasa para sua sardinha”: o domínio total de espectro do consórcio Partido Militar/Grande Mídia que conseguiu impor o script de normalização “as-instituições-estão-funcionando”. Por isso, o que chamou a atenção na entrevista foi o que não foi questionado a Bolsonaro: crimes de responsabilidade, inconstitucionalidade dos militares fiscalizando eleições, procrastinação da PF e Judiciário diante das provas semanais que o presidente cria contra si mesmo. Essas entrevistas e debates engessados dos candidatos na TV só podem acontecer sob um horizonte de eventos simulado: o da simulação da normalidade democrática, aceita por todo o espectro político.

domingo, agosto 21, 2022

Live Cinegnose: Ella Fitzgerald, privatizações metonímicas, golpe e pedagogia do medo, mídia e hipernormalização


Mudanças climáticas, ameaça de golpe, inflação, o humilde blogueiro fazendo parte das estatísticas dos desempregados e desalentados... mas a Live Cinegnose 360 resiste... nesse domingo (21/08), às 18h, chegamos à edição #69. Na sessão dos vinis, continuamos na vibe do jazz: Ella Fitzgerald – na encruzilhada entre a indústria cultural e a cultura das drogas no jazz. Depois, vamos para o cinema e audiovisual: como entender a série “Sandman” com a filosofia de Alfred Whitehead; e o filme “Viveiro”: o micro e o macrocósmico em um filme gnóstico. E a Parte IV do trepidante “Pequeno Dicionário de Eufemismos e Clichês Linguísticos da Grande Mídia”. Em seguida, a crítica midiática da semana com pauta cheia: grande mídia quer transformar eleições em “Guerra Santa”; o caso “Tchutchuca do Centrão”: a canastrice que se voltou contra a própria PsyOp; o jornalismo metonímico ataca outra vez com a privatização dos aeroportos; Globo quer normalizar tudo: do crédito consignado aos desesperados à onda de frio; Vai ter golpe? Não vai ter golpe? Grande mídia turbina pedagogia do medo com transmissões ao vivo “históricas”. Analistas do jornalismo corporativo não entram em acordo com números DataFolha. É tudo nesse domingo! 

Na segunda-feira, no YouTube, o leitor encontra a Live Cinegnose 360 #69 com minutagem, bibliografia e discografia. 


sexta-feira, agosto 19, 2022

Vai ter golpe? A História jamais será transmitida ao vivo pela TV



Nos últimos dias, nunca se ouviu ou se leu tanto o adjetivo “histórico”. Seja na mídia hegemônica ou na progressista. Adjetivando eventos que foram transmitidos ao vivo pela TV: a leitura da Carta em Defesa da Democracia na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, SP, e o discurso do ministro Alexandre de Moraes na solenidade de posse na presidência do TSE. "Históricas" defesas da Democracia. Mas será que a TV consegue mesmo mostrar ao vivo acontecimentos históricos? Ou será que a mídia só escolhe aqueles eventos que confirmem um script pré-estabelecido que já esteja rodando? Qual script? O roteiro do “golpe-pode-estar-à-nossa-espera-na-esquina”. Pedagogia do medo diariamente alimentada por notas plantadas (“agrojornalismo”) nos espaços diários dos “colonistas” dos principais veículos de imprensa. A História é feita por acontecimentos silenciosos, à margem de qualquer representação e racionalização. Enquanto o “histórico” midiático são sempre eventos ruidosos, estridentes e emergenciais. Telecatchs canastrões. 

quinta-feira, agosto 18, 2022

Para entender a série "The Sandman" com a filosofia de Alfred Whitehead


A “Filosofia do Processo” de Alfred Whitehead e os mundos fantásticos da obra de Neil Gaiman têm mais coisas em comum do que podemos imaginar. Ambos pensam numa inusitada cosmologia que rompe com a dualidade cartesiana ao proporem universos (no caso de Whitehead, de elétrons a pessoas) no qual se ingressam entidades metafísicas que criam o potencial, a criação, o novo. Em “The Sandman”, de Neil Gaiman, Morpheus e o reino dos sonhos; em Whitehead, os “objetos eternos”. A série Netflix “The Sandman” (2022-), adaptada pelo próprio autor, repleto de seres míticos que governam seus reinos que tangenciam com o mundo “real”, figura o mundo dos sonhos e sua espécie de “Biblioteca Akáshica” (referência teosófica de Gaiman) que representam como a humanidade cria os seus objetos eternos, os Perpétuos, como o repositório de todos os desejos e potencialidades de um mundo muito além do cartesianismo.

domingo, agosto 14, 2022

Live de domingo: Louis Armstrong, delírios do mundo conectado e o Brasil no dia da marmota


Vai ter golpe? Quem vai dar o golpe? Onde será o golpe? Certamente não aqui, na Live Cinegnose 360 #68, nesse domingo (14/08), às 18h, no YouTube. Pra melhorar o astral, na sessão dos vinis desse humilde blogueiro vamos conversar sobre Louis Armstrong: conflitos e contradições da personificação do jazz com a indústria cultural. Depois, dois filmes sobre tecnologia: “Dark Cloud” (a “patafísica” da Inteligência Artificial); e Werner Herzog e o seu documentário “Eis o Delírio do Mundo Conectado” fazem a pergunta: a Internet sonha com ela mesma? Em seguida, continuamos com o nosso épico trabalho: parte III do Pequeno Dicionário de Eufemismos e Clichês Linguísticos da Grande Mídia. E na crítica midiática da semana: o “hacker de Araraquara” tira a máscara; números da pesquisa Quaest/Genial confirmam a estratégia semiótica da profecia autorrealizável; Janones pra marqueteiro de Lula: guerrilha semiótica eleitoral; País é prisioneiro do “Dia da Marmota”; a leitura da Carta no Largo do São Francisco: a História nunca é transmitida ao vivo pela TV. E mais comentários e conversas aleatórias com os cinegnósticos. É tudo nesse domingo! 

Na segunda-feira, no YouTube, o leitor encontra a Live Cinegnose 360 #68 com minutagem, bibliografia e discografia. 


sexta-feira, agosto 12, 2022

'Eis o Delírio do Mundo Conectado': será que a Internet sonha com ela mesma?


O lendário cineasta alemão Werner Herzog dessa vez volta sua atenção para a Internet, no documentário “Eis o Delírio do Mundo Conectado” (“Lo and Behold: Reveries of the Connected World”, 2016). Um documentário centrado numa questão que só poderia surgir da mente de Herzog: será que a Internet sonha com ela mesma? Sim! E a World Wide Web é o seu sonho, criada sobre a rede de computadores iniciada nos anos 1960 como projeto militar e científico: a Internet. Porém, a WWW foi por um caminho bem diferente daquele imaginado por um dos pioneiros: Ted Nelson – um projeto que imaginava uma espécie de Biblioteca de Alexandria em hipertexto. Ao contrário, a WWW cresceu regida por uma lei dos cassinos de Las Vegas: a Lei dos Grandes Números, na qual a Banca sempre ganha. E suas consequências são desenvolvidas no documentário: o rebaixamento da noção de inteligência na “Inteligência Artificial” e a “Internet do Eu” com dramáticos dilemas éticos morais trazidos por um Internet com interface invisível – a Internet das Coisas.

quinta-feira, agosto 11, 2022

A patafísica da inteligência artificial em 'Dark Cloud'


Nada de bom pode vir de uma inteligência artificial. Pelo menos no cinema, desde que HAL 9000 decidiu matar a tripulação de uma nave no clássico “2001” de Kubrick. À primeira vista, um filme com o título “Dark Cloud” (2022), sobre uma paciente num tratamento terapêutico pioneiro em uma casa remota totalmente controlada por uma IA, já sugere ao espectador que as coisas também não vão acabar muito bem. Porém, “Dark Cloud” vai muito além do confronto máquina versus humanidade. Se no passado a IA tentava emular a inteligência humana revelando ser maligna pelo fato de não possuir alma, no pós-humanismo o Mal é de natureza “patafísica”: justamente por ser tão complexa, eficiente e precisa, ironicamente uma IA pode se voltar contra a própria finalidade para a qual foi construída – a Teoria dos Sistemas de Varela e Luhumann e o Teorema da Incompletude de Gödel talvez expliquem essa cilada lógica de todo sistema tecnológico.

sábado, agosto 06, 2022

Live Cinegnose 360: o enigma Miles Davis, 'journalist exploitation' na Globo e crítica midiática da semana


Como o Brasil e o mundo não deixam o humilde blogueiro em paz, continua a Live Cinegnose 360... nesse domingo, às 18h, no YouTube, a edição #67. Na sessão e vinis vamos de Miles Davis: o enigma da música afro-americana – como abriu os novos e perigosos caminhos do jazz. Depois, vamos discutir dois filmes: “She Will” (o identitarismo e antropologia da ordem patriarcal) e “Georgetown” (como a América pode ser enganada pela sua própria ilusão). Em seguida, vamos dar continuidade ao Pequeno Dicionário de Eufemismos e Clichês Linguísticos da Grande Mídia. Cinegnose encontrou a primeira bomba semiótica na guerra híbrida brasileira! Crítica midiática da semana: “journalist exploitation”, o modus operandi da TV Globo; o script “as instituições estão funcionando” e as estratégias de normalização da grande mídia; para quem vai servir o 5G? É nesse domingo. É na Live Cinegnose 360!

sexta-feira, agosto 05, 2022

Após golpe militar híbrido, grande mídia executa script 'instituições estão funcionando'


“Defesa da democracia”, “confiança no sistema eleitoral”, “Estado de Direito” são alguns de uma constelação de mantras diários repetidos pelo jornalismo corporativo. Ajuda a criar a imagem de uma grande mídia imparcial e crítica. Também retroalimenta a “pedagogia do medo”, a ansiedade de que um golpe poderá vir de qualquer lugar. Mas para que essa PsyOp funcione, é necessário mostrar que “as instituições estão funcionando”, paralisando a esquerda. Mesmo que as últimas notícias mostrem o contrário: militares no TSE revisando códigos-fonte, a anomalia da figura jurídica do ‘estado de emergência” na PEC Eleitoral e a oferta de crédito consignado para os desesperados beneficiários do Auxílio Brasil. A grande mídia normaliza e banaliza as anomalias inconstitucionais em série, criando o simulacro da normalidade institucional através de eufemismos e reportagens com angulações que ocultam o essencial: o golpe militar já aconteceu, mas foi híbrido... e ninguém viu. 

quinta-feira, agosto 04, 2022

Em 'Georgetown' a América é enganada pela sua própria ilusão



Washington DC é um verdadeiro Triângulo das Bermudas, habitado por poderosos, aqueles que tentam influenciar os poderosos e aqueles que escrevem sobre ambos. Gente, com muito dinheiro, status, posição e privilégios. Mas que, mesmo assim, não estão a salvo de serem enganadas pelas mesmas armas que fizeram a hegemonia da América: a ilusão e a mentira. Baseado em um caso real, “Georgetown” (2019), estrelado e dirigido por Christoph Waltz, acompanha um vigarista que fez carreira no centro do poder à base de falsos currículos, diplomas e certificados impressos a partir de sites fakes da Internet, citações de amizades fictícias e relações imaginárias com potências estrangeiras. Uma história que terminou em assassinato. E que aponta para o ponto fraco de um país construído a partir da imagem: a nostalgia de alguma essência real que nunca teve.

quarta-feira, agosto 03, 2022

Filme 'She Will': a antropologia da ordem patriarcal para além do identitarismo


À primeira vista, o filme produzido pelo mestre do terror Dario Argento e dirigido pela estreante Charlotte Colbert, “She Will” (2021) parece ser mais uma produção mainstream dentro da onda identitarista apropriada pela grande mídia e discurso corporativo – o chamado “neoliberalismo progressista”. Uma atriz idosa confronta-se com os fantasmas do assédio sexual quando, jovem, estreou em um filme cujo remake está para ser lançado. Buscando fugir de todo hype, viaja para as Terras Altas na Escócia. Lá encontrará as origens simbólicas de toda a ordem patriarcal: a lama primordial de uma floresta composta por cinzas humanas das vítimas das inquisições e o carbono negro da queima do carvão industrial. Por isso, “She Will” vai além:  Uma filme sobre abuso infantil, assédio sexual e envelhecimento feminino envolta na lama daquela floresta: a raiz antropológica de todas as desigualdades – a contradição Natureza vs. Sociedade, a Mãe Terra vs. o Deus Capital.

Tecnologia do Blogger.

 
Design by Free WordPress Themes | Bloggerized by Lasantha - Premium Blogger Themes | Bluehost Review